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ELZA SOARES | DEZEMBRO, 2002


Eleita a "cantora do milênio" pelos ingleses e recém-redescoberta pelos brasileiros, La Elza conta que chora muito, sente orgasmo ao cantar e reza para nunca perdero tesão

POR VANESSA CABRAL

FOTO EVERTON BALLARDIN


"Recebi o CD Do Cóccix até o Pescoço, de Elza Soares, e, desavisada, pus para tocar. Durante uma semana, a vida parou de rodar à minha volta. Dormia e acordava com os versos de Chico Buarque, Caetano Veloso, Arnaldo Antunes, Luiz Melodia, José Miguel Wisnik, Jorge Benjor, Oswald de Andrade, Carlinhos Brown e até Letícia Sabatella entoados na ousadíssima voz da cantora. Elza nos sacode do cóccix até o pescoço! Fui assim, terapeutizada, conhecer aquela senhora. Tanto já se ouviu falar de Elza da Conceição Soares. Do seu nada convencional affair com o craque Garrincha, nos anos 60. Da morte do filho Garrinchinha (Manoel Santos), num acidente de carro em 1986. Da trajetória caleidoscópica entre o sucesso e o fracasso e da recente indicação, pela emissora inglesa BBC, para a melhor cantora do milênio. Do seu up-to-date namoro com o estudante de jornalismo Anderson Lugão, de 26 anos, e da idade que a cantora não revela, mas calcula-se em 65 bem floridas primaveras.


Pediram-me 20 perguntas para Elza Soares. Deus, como tirar 20 perguntas de um best-seller ambulante, recheado de episódios pitorescos?, pensei. Segui o conselho dado pela cantora numa entrevista: 'Improvise'. Lá fui para o Hotel Hilton, no centro de São Paulo, sem nenhum papel nas mãos. Apenas o gravador e a fita cassete virgem à espera do orgasmo.


Pois dona Elza deixou a equipe de PLAYBOY esperando três horas. Quando o tédio já havia contaminado a expectativa de encontrá-la, ela chega. Black power, sim, mas arrogância zero: 'Meus amores, desculpem-me. Chorei a noite toda. Como mãe, não me conformo com uma filha que mata os pais', disse, assustada pelo caso da estudante Suzanne, que confessou ter tramado, com o namorado e o irmão dele, o assassinato do pai e da mãe, em São Paulo. Isso é Elza Soares, alguém que abre parênteses no sucesso e reza por quem está em baixa. Minha vontade foi abraçá-la. No fim da entrevista, depois de me fazer gargalhar como criança, foi ela quem me abraçou. 'Deus é tudo e o amor é mais.' Parecia que eu tinha tomado um passe. Mãe Elza é uma garota infernal", conta a jornalista Vanessa Cabral, escalada para esta entrevista.





1. Caetano Veloso disse: "Finalmente Elza tem o CD que a representa". Do Cóccix até o Pescoço representa o quê? Esse CD ainda é um ensaio. Agora eu começo a ter a liberdade de soltar a voz. Nas gravações anteriores, fui muito dirigida. Eu falava "gente, eu já substituí a Ella Fitzgerald, fui descoberta no exterior pelo 'papai' Louis Arms-trong, cantei ao lado de Astor Piazzola. Excuse me!" Cantar é ter atitude e arriscar. Eu quero abusar, dar os meus agudos e os meus graves também. Totalmente free.


2. O que você sente quando se dá essa ousadia no palco? Orgasmo total. Vou buscando a voz da boca do estômago e, de repente, ah! [dá um gemido], estou em êxtase. Melhor do que qualquer droga. A música é uma droga e eu estou sempre drogada. E tem outras coisas na vida que eu também gosto muito. Adoro um homem [risos]. Sexo é tudo na vida de uma mulher.


3. Há mulheres que dizem que perderam o interesse sexual após uma certa idade. Não aconteceu com você? É quando a mulher fica mais quente. Será que sou diferente? É esse meu lado animal. Quero devorar [entoa a voz rouca]. Não acredito que as mulheres percam o interesse pelo sexo. Acho que perdem o interesse pela vida. Será que eu vou perder o tesão um dia? Vou fazer muitas orações para que não aconteça comigo. É o prazer de viver, cara! Eu levanto cantando.


4. Elza tem um lado ranzinza? A manha faz parte da sedução. Aquela coisa da fêmea no cio. E, se o cara não está muito a fim, tem que ser esperta. Fico manhosa, peço para deitar no colo, aí a mãozinha já escorrega [risos]. Se ame. E desse amor próprio, comece a distribuí-lo por aí. Eu me amo. Cuido da saúde, malho duas horas por dia, arrumo lindamente minha cama para dormir. Eu era muito pobre e ter um lençol de linho era um desejo de infância. A mesa de jantar também tem que ser linda. Para me vingar das latas de goiabada [risos].


5. Envelhecer a apavora? Eu não tenho idade. Tenho 24 horas de vida. Na Europa, é digno ter idade; aqui é decadência. Envelhecer com dignidade é importante, por isso eu corro na esteira feito louca [risos]. Pode ser que agora nosso país, com uma cara de brasileiro no poder, respeite os cidadãos. Até então era um tal de falar francês. Está na hora de comer angu. Fubá dá um moral danado.


6. Sua trajetória é uma montanha-russa. Você não se preocupa com dinheiro? Gosta de arriscar? Gosto muito de arriscar. Gosto de plástica [cirurgia], de dieta, de malhar, que são grandes riscos. Gosto de dar um agudo não ensaiado. A vida é assim, uma ousadia. E fico muito triste com o mundo em decadência, com o ser humano que não valoriza o outro.


7. Você costuma chorar? Choro muito, cara. Mas prefiro driblar a tristeza e conviver com a alegria. Eu sou essa garota infernal, black power. E contar dinheiro me deixaria miserável. My name is now. Eu vivo o agora. Tenho medo de planejar o futuro porque a vida é incerta.


8. Já recebeu cantadas de mulher? Uma apertou tanto minha bunda que rasgou a meia-calça. Cássia Eller me cantava 24 horas por dia. Ela falava com aquele vozeirão "um dia eu te como!" Eu ria e dizia: "Não vai comer, não, bicho. Esse maracujá está sempre azedo, tô fora!" Me divertia com ela.


"Cássia Eller me cantava 24 horas por dia. Ela falava com aquele vozeirão: 'um dia eu te como!' Eu ria e dizia: 'não vai comer, não'"

9. Em uma entrevista, uma mulher me disse que se via diminuída no ato sexual. Você já se sentiu assim? Pelo amor de Deus! No ato sexual a mulher cresce. O corpo necessita. É que ela ainda não achou quem transasse bem. No dia em que ela encontrar, aí meu bem, me desculpe.


10. Como expert no assunto, tamanho é documento? Não posso falar do reduzido porque só conheço somas [risos]. Sempre me dei bem com grandes medidas. Nunca vi um pequenininho.


11. Sua vida sexual com Garrincha é um dos mistérios da mitologia erótica carioca. Vocês passaram cinco dias num apartamento na Urca à base de sexo ou isso é lenda? Com o Mané, meu bem, não tem nada de lenda. Passamos cinco dias a sexo, pão e leite. A gente só abria a porta para pegar o pão e o leite, que o leiteiro deixava, e caía na cama. A gente era assim. Compulsão. Acho que sou ninfomaníaca, gosto muito da coisa.


12. Quando você descobriu o orgasmo? Quando me casei, aos 12 anos, eu queria soltar pipa. Achava muito feio aquele homem me babando toda. Só descobri [orgasmo] depois que fui mãe. Mané que me fez ver as estrelas. A mulher precisa se conhecer. Do cóccix até o pescoço.


13. Do cóccix até o pescoço, onde dói mais e onde dá mais prazer? Dói muito pancada no pescoço. Beijo no cóccix é mais gostoso.


14. Você já bateu em alguém? Já briguei muito na rua. Uma vez enfiei um secador de cabelo numa mulher em um salão, em Copacabana. Eu quietinha e a mulher falando mal da Elza Soares, xingando, que Elza e Garrincha são uma vergonha, nem sabia que eu era eu. Me levantei e disse "a senhora conhece Elza Soares?" "Conheço", ela respondeu. "Ah! Não conhece, não. Esta aqui é a Elza Soares"; e tasquei o secador nela. Foi hilário.


15. Você namora um homem de 26 anos. O que você diria para uma senhora que a chame de indecente? Meninos, não confiem em mulher muito comportada. Todo diabo tem seu rabinho preso no porão. Seria horrível se eu fosse santa. Já imaginou o povo colocando florzinha no pé de Santa Elza Soares? Aquela santa preta, black power, com cara de fome? O ser humano tem obrigação de ser bom. Mas adoro meu lado diaba, impulsivo. Sou a pessoa mais normal do mundo por causa da minha loucura, cara!


16. E ciúmes? Sou muito ciumenta, mas gozado que eu nunca tive ciúme do Mané. Eu sabia que ele era sacana pra cacete. Não adiantava ter ciúmes.


17. Você confia nos homens... Qualquer mulher que confia demais num homem é maluca. Mas a culpa é nossa, nós os fizemos desse jeito. A gente cria homem para ser macho. comer todas. Eu prefiro fechar os olhos. Quando ele chega em casa, sugo tudo e fico satisfeita. E não encho o saco do cara.


18. Mas, Elza, e a traição? Não gosto dessa palavra. É uma dor que quando dói é para ficar atento. Porque dói em quem faz e em quem é vítima. Eu sou mulher de um homem. Se enjoar dele, eu parto para outra sem cerimônias.


19. Você se relaciona com homens mais velhos ou tem preconceito? Com esse meu jeito, coitado do velho, morreria [risos]. Os velhos se assustam. Gosto muito da minha life. Embora tenha passado por momentos que senti "este buraco é profundo, não saio dessa nunca mais". Quando perdi meu Garrinchinha [o filho], queria ficar muda, perdi 16 quilos. Dói muito perder as pessoas. Por isso não me apego a bens materiais. Sou livre. Só entro de roupa no palco porque é necessário. Senão entrava nua.


20. Você quer posar nua? Lógico. Para mostrar que o poder da mulher existe sempre. Não acredito nessa coisa "caiu, despencou". Mulheres do meu Brasil, cuidem-se! [grita]. Se você se cuidar fica tudo durinho, com a auto-estima no céu. Eu gosto demais da Elza Soares. Para posar nua, vou colocar um silicone lindo e tatuar o bumbum com a frase "Made in Brasil". Atenção, Cynthia [Cynthia de Almeida, diretora da PLAYBOY]: "Tem um recado para você que a Elza mandou/ mandou/ Ela disse que quer posar, particular/ nua". [Improvisou um sambinha.]


PRODUÇÃO FAWSIA BORRALHO ASSISTENTE KATHIA MARTINS

MAQUIAGEM EDUARDO ARAUJU



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