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DANIELA FREITAS | OUTUBRO, 1998



A bodyboader fala de namoro, ciumeira e da emoção

de ser bicampeã mundial


POR ANDRÉ SANCOVSKY

FOTO NANA MORAES


Curiosa, Daniela Freitas não agüentou esperar a noite de Natal para ganhar seu presente. Uma semana antes fuçou aqui, mexeu acolá até encontrar a prancha de bodyboard que havia pedido aos pais. Logo, ela já estava nas águas da Barra da Tijuca, desde então seu habitat natural. "Comecei a pegar onda só por curtição", recorda doze anos depois essa garota queimada de sol, corpo definidíssimo pela malhação e pelas ondas, cabelos dourados e olhos castanhos. "Não sonhava me tornar campeã mundial." E menos ainda, claro, bicampeã, como fez na temporada mundial de 1997.


Mas dois meses depois daquele Natal ela já disputava torneios amadores no Rio de Janeiro e colecionava vitórias, até vencer o campeonato brasileiro profissional de 1992 e os campeonatos cariocas de 1993 e 1994. Com os prêmios Daniela montou um patrimônio nada desprezível para uma atleta de 24 anos: uma Chevrolet Blazer preta zerinho, uma casa de três quartos em Kapollei, no Havaí, em sociedade com o marido, o bodyboarder havaiano Lanson Ronquilio, e um Honda Acura. Agora procura apartamento na Barra, sua base carioca.


Daniela sempre contou com o apoio da família para seguir em frente. O pai, Mário Soares, é administrador de empresas e dono da MS Empreiteira. A mãe, Arlinda Freitas Soares, é dona de casa e grande cozinheira, segundo "Dani" e o irmão, Márcio, um ano mais velho e estudante de Informática. Mas essa harmoniosa composição entrou em colapso quando os pais se separaram, há quatro anos, e Daniela contraiu uma verminose. Entre a crise e a doença, ela perdeu 8 quilos e, junto com a saúde, a temporada de 1995. Chegou a pensar em pendurar a prancha e reabrir matrícula no curso de Comunicação Social na Faculdade da Cidade, no Rio.


Daniela passaria, ainda, pelo fim de namoro com o também bodyboarder Guilherme Tâmega, até completar a fase baixo-astral. Com a saúde recuperada, no final de 1995 ela viajou para a Califórnia, atrás da preparação física que lhe devolvesse a massa muscular. Em três meses retornou aos 51 quilos, perfeitos para os 1,63 metro de altura.


Daniela falou com cuidado de questões íntimas, como a sua primeira vez. "Foi há bastante tempo", é só o que diz ao repórter André Sancovsky.





1. Rola muita azaração durante as competições? Isso é querer saber demais [risos]. Mas posso contar que comecei a flertar com o Lanson na comemoração da etapa que venci em Chiba [no Japão], em 1996. A gente se conhecia há anos e, de repente, não sei por quê, olhei para ele e pensei: "Estou apaixonada" [gargalhadas]. Tomei coragem e cheguei nele. O pior foi que levei o maior fora. O Lanson tinha uma outra namorada.


2. Como reagiu à rejeição? Morri de vergonha. Só que, olha só o destino, entramos no mesmo vôo rumo a Paris. Pedi desculpas pela noite anterior e acabamos conversando durante toda a viagem, 12 horas! [Risos.] Ali o conheci de verdade. Antes, sentia atração física. A rejeição me deixou mais apaixonada. Ele provou, sem querer, que é fiel. Isso é fundamental.


3. Vocês começaram a namorar na hora? Que nada! Ficamos nos encontrando durante cinco meses sem dar nem um beijinho, até ele resolver o problema com a namorada. No dia do meu aniversário, começamos a namorar em plena Califórnia [risos].


4. Na hora de competir, você passa um batom, arruma o cabelo? Nas competições só fico preocupada com as ondas. Minha nota não vai mudar se estiver maquiada. Mas é claro que me cuido. Uso protetor solar fator 30, passo condicionador para dar brilho aos cabelos.


5. Seus dois relacionamentos sérios foram com bodyboarders. Só eles têm chance com você? [Risos.] Agora sim, porque estou casada. Mas isso nunca foi uma regra. Até tive uns casinhos com pessoas de fora do meio. Mas sempre preferi os atletas, porque eles não saem muito à noite e compreendem a minha rotina de treinos e viagens.


6. E transar antes de uma prova, ajuda ou atrapalha? [Longa pausa.] Depende. Geralmente estou tão ligada na prova que não penso nesse assunto. Às vezes não quero, em outras sinto vontade. É um meio-termo que me deixa livre para fazer o que achar melhor.


7. Você tem algum ritual antes de uma competição? Quando entro na água, faço uma oração e peço que Ele me mande ondas boas. Mas não sou supersticiosa. Minha única mania é competir sempre com a prancha que usei nos dois campeonatos que venci.


8. Por que você largou a carreira de modelo? [Taxativa.] Não larguei. Essa história começou quando quis fazer um book e calhou de, na mesma época, gravar a reportagem Musa Espetacular para o programa Esporte Espetacular [da TV Globo]. Aí a agência Class [hoje extinta] me convidou. Aceitei a proposta achando que iam ligar minha imagem ao esporte. Quando vi que não era bem assim, saí fora.


9. O esporte nunca atrapalhou seus estudos? Só tive problemas quando entrei na faculdade, em 1993. Perdia muitas aulas. Fiz um período e tranquei. É impossível ser atleta profissional e estudar ao mesmo tempo.


10. Competindo em vários lugares diferentes, você nunca sente falta da sua casa, do seu quarto, da comida? Morro de saudade, principalmente do empadão de frango que minha mãe prepara. O fuso horário é outro problema, assim como os costumes de cada lugar. Na Califórnia, por exemplo, as pessoas jantam cedo, na Europa comem bem tarde. [Pausa.] Mas esses pequenos sacrifícios não contam perto das coisas boas que o bodyboard me proporciona.


11. Onde estão as melhores ondas do mundo? [Direta.] No Havaí. As ondas da Praia de Pipeline são perfeitas porque são fortes, ocas e tubulares. No Havaí existem vários lugares bons. [Pausa.] Só tem uma coisa que me desanima: as praias andam cheias demais por lá. Às 7 da manhã já tem cinqüenta pessoas em cada pico, às vezes nem dá para treinar direito.


12. O bodyboard proporciona um bom retorno financeiro? Por enquanto, só aos primeiros do ranking. O reconhecimento do esporte no Brasil melhorou, mas ainda há muito o que fazer. Quando venci a etapa de Cintra [Portugal], fui recebida pelo presidente Jorge Sampaio. Aqui fui bicampeã e não me mandaram nem uma carta. Se bobear, o presidente nem sabe o que é bodyboard.


13. Qual é a sensação de tornar-se bicampeã do mundo? [Animada.] A emoção foi ainda maior. Na primeira vez eu era a favorita absoluta e agora estava disputando palmo a palmo com a Mariana [Nogueira, bodyboarder também carioca]. Quando anunciaram minha vitória, joguei a prancha, que voou a uns 2 metros de altura. Foi demais!


14. Depois do bicampeonato ficou mais fácil negociar contratos? [Direta.] Ah, sim, claro. Minha relação com os patrocinadores passou a ser mais profissional. Sou uma atleta que dá um bom retorno de mídia. Mas não sei nada sobre cifras. Meu empresário, [o ex-nadador] Djan Madruga, é quem cuida dessa parte.


15. Como as outras atletas reagem ao seu sucesso? [Séria.] Depois que fui bicampeã começou a rolar um clima estranho por parte de uma outra atleta em relação a mim. Acho que foi por ciúme das minhas vitórias. Nem dou bola. Tanto que não vou dizer o nome. Só digo que ela disputa títulos comigo.


16. Algum fã já fez loucuras para chegar perto de você? [Pausa.] Teve um cara que tentou me agarrar numa boate aqui no Rio. Tive que ser grossa nessa ocasião, uma coisa que detesto. Mas em geral sou muito bem tratada.


17. Não a incomoda a responsabilidade de ser citada como um exemplo para outras garotas que estão começando na prática de algum esporte? Eu gosto disso, claro! Procuro dar um bom exemplo para elas. Sempre me dediquei ao esporte, nunca usei drogas. Algumas meninas me ligam, pedem toques. Atendo sempre.


18. Até quando você vai competir? Pelo menos até os 30 anos, mas daqui a uns quatro anos devo dar uma parada. Pretendo engravidar. Depois vou voltar. Quando parar vou abrir uma loja de comida natural, no Brasil ou no Havaí. Até lá eu resolvo [risos].


19. Quando você chegou com seu primeiro título mundial aconteceu o sumiço de uma bolsa sua no aeroporto. Como você resolveu essa história? [Séria.] Foi uma covardia. O maior clima de festa, o Aeroporto [Internacional do Rio] lotado de pessoas da imprensa me esperando e, de repente, minha mala some. Prometi até uma prancha para quem devolvesse alguns objetos. Mas só recebi de volta meus documentos e a agenda.


20. O que havia mais lá de tão importante? Um monte de coisas. Principalmente a jaqueta que só as campeãs do circuito mundial ganham. Ainda bem que os organizadores me mandaram outra. E no campeonato de 1997 recebi a minha segunda jaqueta. Agora tenho duas! [Risos.]


PRODUÇÃO CRISTINA FRANÇA E BEBEL MORAES

CABELO E MAQUIAGEM RICARDO MORENO


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