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DJ MARLBORO | JULHO, 2006



O DJ MAIS FAMOSO DO BRASIL E EMPRESÁRIO DE NOVE ENTRE DEZ ASTROS DO FUNK FALA COMO É FICAR SOB A MIRA DE UM FUZIL, DOS TEMPOS EM QUE ANDAVA SEIS HORAS PARA CHEGAR AO BAILE E JURA QUE NÃO PEGA NINGUÉM.


POR: ADRIANA NEGREIROS FOTO: EDUARDO MONTEIRO





1. O funk é uma dança sensual. As pessoas ficam com a libido atiçada nos bailes? Com certeza. Antigamente, eu achava engraçado. Ia na comunidade e via uma menina normal, pretinha, que não chamava a atenção. Depois via a menina no baile. Era impressionante. Uma menina co­mum quando começa a dançar funk, fica muito mais bonita e gostosa. Com a música, a sensual aflora.

2. Você presencia muita sacanagem nos bailes funks? Não. Ninguém bota o peru do lado de fora. Nin­guém sobe a calcinha pra meterem alguma coisa. Teve isso de a menina subir no palco e o cara dar um di­nheiro pra ela tirar a roupa, mas foi em um único baile e generalizaram. Também nunca teve dança da cadei­ra. Uma vez fizeram um DVD pornô, botaram um funk e um monte de gente trepando. Aí disseram que aquilo acontecia no baile funk. Mas não. O que tem é "proibidão", mú­sica que fala do tráfico.

3. Os traficantes já te pediram para tocar "proibidão"? Já. E com fuzil na mão. Eu falei: "Me des­culpa, mas isso eu não toco". Os ca­ras disseram: "Qualé, cumpade? Aqui é favela". Eu respondi: "É fave­la, mas não acredito que essa músi­ca vá fazer bem aos garotos". Porque se você toca uma música dizendo que o Comando Vermelho é bom pra cacete, aquele moleque que não tem perspectiva de vida vai acredi­tar no crime. Bandido você tem que conversar com ele de igual pra igual. E eles admiram isso nas pessoas. Eles não gostam de pessoas que ficam fa­zendo simpatia. O traficante manda tocar música tal, nego vai lá e toca. Aí eles acham que o cara é bucha. Tem que bater de frente. 4. Para tocar na favela, você precisa pedir autorização para os traficantes? Não, eu tenho passagem li­vre. Entro e saio na boa. Eles vêm fa­lar comigo. Só não vou subir o mono 2 da manhã se não tiver baile. Os ca­ras vão me dar uma dura.

5. Alguns funqueiros do morro dizem que você compra uma música por 200 reais e depois não paga os direitos autorais para os autores. Vo­cê acha que se eu me aproveitasse do pessoal da favela, podia andar na rua? Eu podia andar com o seguran­ça que fosse que estava f(***). Eu subo na favela na maior boa, inde­pendentemente da facção que man­da. Quantos parentes desses meni­nos que dizem que roubei estão no tráfico? Eu vou roubar esse moleque? 6. Então de onde surgiu essa histó­ria? Existem DJ's na comunidade que cobram 50 reais pra um menino ir no computador e fazer a música. Quando a música fica boa, eu pego o menino, pago 200 reais pra fazer a música novamente. Eu tiro o cara da favela, boto dentro do estúdio. E o au­tor da música vai receber os direitos autorais. A minha editora tem 16 anos e nenhum processo de direitos. 7. Você edita as músicas que recebe. Como era a versão original de "Atoladinhe [hit do, MC Bola de Figo]? Era "Tô ficando enterradinha". Não dá. Você sabe que na favela a sexualida­de é precoce. Eu vou ficar incenti­vando isso? Duplo sentido eu aturo, porque a maldade tá na mente das pessoas. O Bonde do Tigrão se cha­mava Os Putão da Loura. Eu falei: "Já pensou ir na Xuxa com esse no­me?". Sensualidade é uma coisa. Por­nografia é outra. 8. Tem muita candidata a funqueira dando mole pra você pra ficar famosa? Eu sou meio feinho, mas sem­pre tive sorte com as mulheres. Ago­ra, cara, trabalho é trabalho, putaria é putaria. Em casa eu brinco, passo a mão na bunda, mas no trabalho eu me transformo. Se a música for boa, eu toco, independentemente de sair comigo ou não. Se fosse assim, eu não teria tocado Tati Quebra Barraco e Deize Tigrona. Até porque elas são comprometidas [risos]...


9. Quem é a sua namorada? Não te­nho. Trabalho muito. Cada vez mais eu fico sem comer ninguém.


10. Como foi sua primeira vez co­mo DJ? Com 16 anos, num baile com um amigo. Eu já fazia expe­riência de mixagem em casa, com a vitrola da minha avó e um toca-disco de piquenique. Na hora da música lenta, o DJ pediu pra eu colocar umas músicas enquanto ele ia ao banheiro. Fiquei nervoso, tremia e não conse­guia acertar a faixa.

11. Quando você começou a tocar pro­fissionalmente? Nessa mesma época. Meu pagamento era em disco. Pra ir ao colégio, eu tinha que pegar dois ônibus. Quando o tempo estava bom, eu pegava só um ônibus e fazia o resto a pé. O dinheiro que econo­mizava usava pra ir ao baile no fim de semana. Quando minha mãe desco­briu, cortou o dinheiro do ônibus. Eu tinha que ir a pé pro colégio. Quan­do chovia, não ia. E assim fui perden­do aulas, até desistir de estudar. 12. Sem o ir dinheiro, como você fazia para ir ao baile? Eu pegava a bicicleta dos meus irmãos. Até que eles descobriram e resolveram desmontar. Aí eu ia a pé. Era um percurso de seis horas. O dono ficou com pena e pas­sou a me dar o dinheiro da passagem. Também consegui um emprego de operador numa FM. Tocava Roberto Carlos de meia-noite até 6 da manhã e dormia em cima dos discos. 13. Você ficou rico? Rico? O que é isso? Claro que não! Tenho um apartamento no Méier, subúrbio. Meu pai mora de aluguel.


14. Por que seu apelido é Marlboro? Um cara da turma disse que eu era da Terra de Marlboro porque mo­rava longe, no subúrbio, e não tinha sotaque carioca. Eu nasci no Rio, mas com um ano fui pra Brasília. Meu pai foi trabalhar na construção da cida­de. Quando eu tinha 11 anos, nos mu­damos para Foz do Iguaçu. Com 15 voltei pro Rio de Janeiro. 15. Você é o queridinho das celebridades. Por quê? Eu sou DJ há 27 anos e sempre toquei pra essa gen­te. A Samara Felippo ia pros bailes quando tinha 12 anos. O Bruno Ga­gliasso também. Essas pessoas cresce­ram e continuaram gostando de mim. Mas eu tô descolado nesse negócio de celebridade. É mais fácil eu ficar com uma menina que mora na favela do que com uma famosa. As pessoas vi­vem muito de glamour. 16. Funk era coisa de carioca e agora você faz sucesso em São Pau­lo e no Carnaval de Salvador. Como vo­cê conquistou novas praças? Eu come­cei a tocar numa boate de São Paulo de 15 em 15 dias, numa quarta-feira, que é um jeito de botar o funk no quin­tal. Tinha a turma do contra que fala­va mal. Mas já estreei tombando e ho­je me apresento toda semana. Tem três anos que eu toco em Salvador. Fui levado pelo Beto Jamaica [ex-vocalista do É o Tchan!]. E quando você ouve funk na Bahia, parece axé, porque eles tocam com aquele tamborzão. 17. Qual a diferença das letras de duplo sentido do funk para músicas de axé, como a da boquinha da garrafa? Tudo é música brasileira. Sempre vai enaltecer a sensualidade. Se você pegar o forró, só tem duplo sentido. Até o rock: "Só quero sexo", ou "passei a mão na bunda e não comi ninguém".


18. Por que o funk carioca faz su­cesso no exterior? O funk brasileiro é diferente de tudo o que se faz por aí. Tem elemento do samba, da folia-de-reis, da capoeira. Se você ob­servar a melodia de uma música co­mo "eu só quero é ser feliz, andar tranquilamente na favela onde eu nasci", vai ver que é meio samba-enredo.


19. Em que país você mais gostou de se apresentar? Eslovênia. Antes da minha apresentação, to­cou um DJ alemão. Todo mundo fi­cou parado. Quando eu comecei a tocar funk, virou um Carnaval. Ti­nha eslovena dançando até o chão. Umas mulheres loiras, tudo rebo­lando. E quando eu levo as dança­rinas, nego fica louco. Também gos­tei de tocar em Nova York e em Bar­celona. Porque você vai num lugar, nego começa a divulgar e de repen­te você vira uma lenda. Os caras fa­lam absurdos de mim. Tá todo mun­do comentando o meu trabalho sem nem me conhecer.


20. Quando um funqueiro assina contrato com uma gravadora grande, entra na sua lista negra e você não toca mais. Por quê? Quando a gente começou, sempre quis apoio das grandes gravadoras. Mas fomos rejeitados. Isso nos obrigou a nos organizar. Comemos o pão que o diabo amassou. Não acho justo que agora que está tudo lindo queiram começar a lançar disco de funk. Peraí! Quem se f (***) fomos nós. Eu tenho que tocar o que é da minha editora. Não vou tocar o que é da Sony. O Bonde do Tigrão, por exemplo, fechou com a Som Livre e ficou de fora.


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