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FÁBIO PORCHAT | JULHO, 2015

Playboy Entrevista


Uma conversa franca com o ator e roteirista do Multishow

e do Porta dos Fundos sobre fama, assedio, política, drogas,

religião, jesus, maria, mulheres, humor racista e o seu pé-frio

com o Clube de Regatas Vasco da Gama.


Domingo à noite em São Paulo. Cerca de 450 pessoas se reúnem em um tea­tro num shopping no centro da cidade para assistir ao espetáculo Fora do Nor­mal, stand-up comedy do ator, roteirista e humorista Fábio Porchat. Os ingres­sos custam de 80 a 100 reais. Quando Porchat entra em cena, vestindo cami­seta vermelha, calça cinza e um chine­lo de cada cor, o público vai ao delírio. Por duas horas ele anda, corre, pula e faz micagens. As piadas falam de casa­mento, relacionamentos, ganho e per­da de peso, índios e a diferença entre os metrôs de São Paulo e do Rio de Ja­neiro. Enquanto ele fala, a platéia, completamente hipnotizada, ri, garga­lha, grita e tira fotos. Ao final, todos assistem ao vídeo Programa Político, visto mais de 7 milhões de vezes no ca­nal de YouTube Porta dos Fundos e estrelado, é claro, por Fábio Porchat. Nascido em 1983, no Rio de Janeiro, fi­lho do político, roteirista e empresário cultural paulistano Fábio Ferrari Por­chat de Assis e da comunicóloga carioca Isabella Robinson, que hoje cuida das redes sociais do ator, Porchat foi criado na capital paulista, o que não o impediu de desenvolver uma paixão profunda pelo Clube de Regatas Vasco da Gama. Há 13 anos largou a cidade de São Paulo e o curso de administração na Escola Superior de Propaganda e Marketing pelo curso de atores da Casa de Artes das Laranjeiras. E foi no Rio que ele se tornou um dos grandes expoentes de uma nova geração de humoristas brasileiros. Nascida na internet, amamenta­da pelo stand-up americano, hoje ela prospera na televisão, no teatro, no ci­nema e, claro, também na internet, fe­chando um círculo e um processo de retroalimentação. O maior exemplo dessa cadeia e o próprio Porta dos Fundos. Criado em 2012 por Porchat, Gregorio Duvivier, Antonio Pedro Tabet (o Kibe Loco), Ian SBF e João Vicente de Cas­tro, O Porta cresceu exponencialmente, ajudando a catapultar as carreiras dos cinco e tornando-se no processo e maior canal brasileiro do YouTube e 27º maior do mundo. São mais de 10 mi­lhões de pessoas inscritas, o equivalente à população inteira da Bélgica, pouco menos que o canal do astro canadense Justin Bieber, mas à frente de gente co­mo a cantora colombiana Shakira, do cantor estadunidense Chris Brown e do canal oficial da NBA, a liga norte-ame­ricana de basquete profissional.


Hoje, Porchat continua no Porta, com a rotina de postar três vídeos por semana, mas também no cinema, por onde lan­çou este mês o filme Meu Passado Me Condena 2, segunda estreia com seu no­me este ano depois do autoral Entre Abe­lhas; na televisão, onde escreve para o programa global Esquenta!, de Regina Casé, e apresenta o programa de auditó­rio Tudo pela Audiência, no Multishow; na mídia impressa, onde publica semanalmente uma coluna no jornal paulis­tano O Estado de S. Paulo; e no teatro, onde, além do stand-up, está em cartaz com a peça Meu Passado Me Condena — espetáculos que ocorrem em dobradi­nha na cidade de São Paulo.


Foi logo depois de um desses double featu­res que o repórter João Pedro Jorge en­trevistou Porchat pela segunda vez. Na primeira sessão, realizada no lobby do hotel onde o ator estava hospedado, ele já tinha mostrado seu lado elétrico. Na se­gunda, nem parecia que tinha trabalhado por toda a noite de domingo. Saindo do teatro, ainda atendeu a uma fila de espec­tadores que queriam tirar uma foto. Du­rante a segunda sessão, que foi realizada em um restaurante no bairro do Jardim Paulistano, na zona oeste da cidade, foi interrompido por uma loira bem-vestida que pediu fotos e atestou: "Você é a salva­ção das minhas TPMs!"


No total, foram cerca de três horas e meia de papo em que Porchat falou sobre tudo, de política a ateísmo, passando por sua paixão por séries como The Walking Dead e a animação Family Guy. E não se esquivou nem na hora de falar sobre boa­tos que surgiram depois da fama.


PLAYBOY — Como você lida com as histórias que falam que você é gay?


FÁBIO PORCHAT — Eu lido numa boa, e enquanto isso não me atrapalhar para pegar mulher, está ótimo. Mas é en­graçado, né? No Brasil, todo mundo que é famoso ganha fama de gay, mas você já reparou que de quem é gay mesmo as pes­soas não falam? Eu nunca vi um boato dizendo que o [Marco] Nanini era gay, ou um rumor falando que o Luiz Fernando Guimarães é gay. De quem é gay mesmo as pessoas não falam. Acho isso curioso.


PLAYBOY — Se você fosse gay, falaria aberta­mente sobre o assunto?


PORCHAT — Não me importaria de falar. Afinal, eu sou come­diante. Se eu fosse um galã, talvez fosse mais complicado. Mas o comediante não tem esse problema. O [comediante] Paulo Gustavo, por exemplo, é gay e é adorado.


PLAYBOY — Você é gay?


PORCHAT — Não.


PLAYBOY — Uma pergunta clássica de PLAY­BOY: como foi a sua primeira vez?


PORCHAT — Foi horrível. Uns amigos me levaram a um puteiro. Eu era menor de idade, tinha 15 anos, então não podia estar ali, estava meio tenso. A moça era escrota, feia, esquisita. Chegou e falou: “Tira a roupa aí!” Minha segunda vez foi melhor, porque aí já foi com uma namoradinha. E foi bonitinho, a gente se amava, aquela coisa toda.


PLAYBOY — Em janeiro de 2013, você fez um 20P conosco e não quis falar sobre o assédio das fãs. Voltando ao assunto hoje: você sofre muito assedio das fãs?


PORCHAT — Olha, mesmo quando eu era casado tinha esse assédio, mas o assédio com o comediante é diferente. Você poder ver que, depois do espetáculo, fica muita mu­lher para tirar foto, mas é mulher casada que veio com o marido. Elas não querem namorar com você, elas querem tocar em você. A realidade é que ninguém quer dar para o comediante. O comediante é o amigão que te conta uma piada.


PLAYBOY — Esse assedio te incomoda em algum momento?


PORCHAT — Para mim, o problema é a pessoa deslumbrada quando chega falan­do: “Você é famoso, tira uma foto comigo”, mas nem sabe quem você é. Podia estar ali a Eliza Samudio, podia estar ali um assas­sino, que ela ia querer foto do mesmo jeito. Mas se eu vejo que a pessoa gosta do meu trabalho, que sabe o que eu faço, ela não precisa nem saber o meu nome...


PLAYBOY — Qual a pior coisa que te aconteceu em relação a assédio?


PORCHAT — É nego entrar no meu WhatsApp. Alguém descobriu meu número e mandou para todo mundo. Aí o cara pega, manda para um amigo,e ele te coloca num grupo de 100 pessoas.


PLAYBOY — As pessoas te colocam em grupo de putaria?


PORCHAT — Eu nem vejo os grupos. Vou saindo. Mas é um saco. Quando são pes­soas normais eu só bloqueio, mas quando é grupo, não tem o que fazer. As pessoas mandam mensagens: “Pô, você não res­ponde, você e um escroto mesmo. Trata mal o fã”. Porra! O cara pega meu telefone, entra na minha vida e eu que sou escroto?


PLAYBOY — Você já ficou com fã?


PORCHAT — Já peguei fã, sim. Mas não é aquela fã de fã-clube. É a fã que está no barzinho, chega em você e fala: "Nossa, você é ótimo. Te adoro". E você: “Senta aí, vamos conversar”


PLAYBOY — Seu sócio, o Gregorio Duvivier, dis­se em nossa entrevista de março de 2014 que você era o maior pegador do Porta. Quanto disso é verdade?


PORCHAT — Tem um fundo de verdade, sim. [Risos]


PLAYBOY — Em nosso 20P com você, se declarou grande fã da revista PLAYBOY. Já pegou alguma capa?


PORCHAT — Eu fui um com­prador assíduo de PLAYBOY. Devo ter umas 200 revistas em casa, mas, nesse sentido, não tenho nenhuma capa, não. [Risos.] Vou colocar isso como objetivo de vida: pegar uma capa de PLAYBOY.


PLAYBOY — Dá para ficar rico fazendo comédia?


PORCHAT — Se eu não ganhasse dinheiro trabalhando para caralho, eu me suicidava. Dinheiro eu ganhei. É que eu não gosto de carro, não gosto de roupa. Eu gosto de viajar e de comer bem. Eu como de tudo, de dobra­dinha a jacaré, ate podrão de estádio.


PLAYBOY — O que mais você fez com a grana que ganhou?


PORCHAT — Hoje eu tenho um apartamento em Laranjeiras, mas, tirando isso, eu gas­tei em viagens. Sou um cara normal, eu pego metrô, táxi, ônibus. É engraçado, porque o pessoal te vê andando de ônibus e pensa: "Ih, que merda, o cara tá malzão”


PLAYBOY — Você gosta de beber?


PORCHAT — Eu bebo saquê, porque não me deixa bêbado e porque cer­veja engorda pra caralho. Caipirinha você bebe três e fica louco. Então saquê você vai bebendo levinho, é gostoso e não te deixa bêbado. Gosto de saquê e vinho tinto.


PLAYBOY — Curte algum outro tipo de droga?


PORCHAT — Não. Nunca provei nada. Nem cigarro eu provei, por causa do cheiro.


PLAYBOY — Você nunca provou nenhuma dro­ga que não fosse álcool?


PORCHAT — Não. Sem­pre fui meio nerd, de ficar em casa jo­gando RPG ou Elifoot. Para você ter noção, um dia provei um brigadeiro de maconha e odiei com todas as minhas forças. Eu vomitei, passei mal. Sou um cara tão ligado que qualquer coisa que me desligue me incomoda. A bebida também faz isso, então eu nunca bebi para entrar em cena, por exemplo. Eu só consigo beber quando acaba o traba­lho. Aí, ufa, vou sentar e vou beber.


PLAYBOY — Você e um cara elétrico. Quantas horas dorme por noite, mais ou me­nos?


PORCHAT — Depende. Hoje eu durmo pouco, porque acordo cedo. Eu conto mais a hora em que eu vou acordar. Gosto de ter pelo menos cinco horas de sono.


PLAYBOY — E você fica fazendo o quê?


PORCHAT — Eu escrevo. Nunca acordei para escrever na minha vida. Então eu basicamente trabalho, leio e vejo séries, o que na minha cabeça tam­bém é trabalho. Quando eu vou para casa e vejo uma série, estou relaxando, mas também estou trabalhando. Eu analiso para entender aonde as coisas estão indo.


PLAYBOY — O que você curte assistir?


PORCHAT — Estou assis­tindo Unbreakable Kimmy Schmidt, e tam­bém The Killing e The Walking Dead. Eu vou abrindo frentes. É muita série e mui­ta série boa. E eu curto desenho. South Park e Family Guy. Os Simpsons também. Quando falam que o Porta dos Fundos passou dos limites, eu penso: “Cara, vai assistir South Park”. Lá o demônio estupra a Oprah Winfrey, que dá à luz Osama Bin Laden, que vomita o Obama.


PLAYBOY — O Porta dos Fundos tem 10 milhões de inscritos. Você pensou que che­garia a esse ponto?


PORCHAT — Não. Eu queria, claro, que reconhecessem meu trabalho, que eu pudesse mostrar para muita gente, mas nunca achei que fosse ter isso.


PLAYBOY — Os comentários críticos do YouTu­be te incomodam?


PORCHAT — Não me apego a isso. Se você for ler os comentários, sempre tem alguém falando alguma merda. Quem comenta no YouTube é uma molecada de uns 14,15 anos.


PLAYBOY — Você já comentou algum vídeo no YouTube?


PORCHAT — Eu também não. Dá um puta trabalho, tem que se inscrever, fazer login. Quem tem tempo para isso? Outro dia o Bruno Mazzeo estava me con­tando que estava discutindo no Twitter e quando foi ver era um moleque de 12 anos! Cara, porque eu estou perdendo meu tem­po com um cara de 12 anos?


PLAYBOY — E críticas no geral?


PORCHAT — Ninguém lê crítica, isso não é problema. Claro que é chato quando criticam, mas não interfere no nosso trabalho. O público não lê crítica. O público mal lê, que dirá crítica...


PLAYBOY — Mas alguma crítica já te abalou?


PORCHAT — Uma coisa que me incomodou foi ser acusado de plágio, porque se tem uma coisa que a gente preza é ter uma ideia original e trabalhar de forma original. Esses dias filmamos um puta vídeo com­plicado, e eu estava vendo Family Guy e vi uma cena idêntica. Pensei: “Fodeu, vamos ter de jogar fora”. E jogamos fora.


PLAYBOY — Você é um cara que gosta de futebol. Viu algum jogo na Copa do Mundo?


PORCHAT — Sim. Eu estava no 7 a 1, foi o único jogo do Brasil em que fui ao estádio, para você ver. Pelo menos estive num negócio que vou poder contar para os meus netos. Ainda vamos falar desse jogo por muito tempo.


PLAYBOY — Que sorte...


PORCHAT — Pois é. Eu não sou exatamente pé-quente com futebol. A primeira vez em que eu fui ver o Vasco foi um empate com o Juventude. Eu fui morar no Rio de Janeiro em 2003, e o Vasco só foi ganhar o Carioca de novo este ano! Quer dizer, eu fiquei o Rio inteiro sem ver a porra do Vas­co campeão! Mas, pelo menos, a primeira vez em que eu fui ao Maracanã o Vasco ganhou do Flamengo, 1 a 0, gol do Pedrinho, aquele que vivia machucado.


PLAYBOY — Por que tantos humoristas torcem para o Vasco?


PORCHAT — É porque é uma piada. Só pode ser. [Risos]


PLAYBOY — Que tal a volta do Eurico?


PORCHAT — É Um retrocesso. O Vasco era um time muito queri­do ate os anos 1980. Aí chegou o Eurico Miranda e fez as pessoas odiarem o Vasco. Ele que inventou esse marketing de “o Flamengo o nosso inimigo”! É um marke­ting. Essa imagem de entrar em campo para brigar com juiz, de fazer essas coisas meio folclóricas. O Dagoberto deu um depoimento outro dia e o Eurico ficou bravo. Falou: “Ninguém pode dar um de­poimento diferente do meu!” Como as­sim? Você pega bode de um time por causa de um cara.


PLAYBOY — Quem era seu ídolo quando você estava crescendo?


PORCHAT — Edmundo. Eu gos­tava do Romário, mas o Romário estava em todos os times. O Edmundo, não. Mas confesso que tive uma época de Mauro Galvão. Nunca fiz gol, então eu tinha uma identificação maior com o Mauro.


PLAYBOY — Você jogava de quê?


PORCHAT — Eu era goleiro. Um goleiro de médio para razoável.


PLAYBOY — Você gosta do Romário como par­lamentar?


PORCHAT — Eu não acompanho fielmente, mas algumas coisas que eu vi dele, críticas que ele fez à CBF, são ótimas. Ele luta muito pela CPI da Copa, o que é óti­mo também. Uma pessoa que vai contra a roubalheira no futebol é bem-vinda.


PLAYBOY — O Porta dos Fundos é um grupo de opiniões políticas fortes. Qual a sua posição?


PORCHAT — Eu acompanho, mas não de­fendo partido. Acho tudo uma merda, todos péssimos. Acredito mais nas pes­soas, e são poucas as que sobram. O Romário mesmo é um dos poucos que levou a sério o trabalho de deputado. Acho que ele é melhor do que 80% dos que estão no Congresso. A gente preci­sa descobrir quem são as maçãs boas. Os Marcelos Freixo, os [Fernando] Gabeiras, os [Eduardo] Suplicy.


PLAYBOY — De quem mais você gosta?


PORCHAT — O Eduardo Paes, por exemplo), está fazendo um bom trabalho. Mas claro que não está tudo bem, que tem nego morrendo, cara esfaqueado, a Lagoa está poluída, não sei onde não vai poder ter prova nas Olimpíadas...


PLAYBOY — Você acha que o Rio está se preparando bem para os Jogos?


PORCHAT — Olha, está tudo andando, tudo funcionando, acho que vai ficar tudo bem. Ainda mais pelo que agente imaginava. Agora, claro, era uma ótima oportunidade para despoluir a Baía de Guanabara, era uma oportuni­dade para tentar resolver e pacificar de verdade. Mas, aos trancos e barrancos, acho que a coisa está indo razoavelmente. No fim vai ficar tudo certo.


PLAYBOY — Em quem você votou nas últimas eleições?


PORCHAT — No Rio, eu votei no [Luiz Fer­nando] Pezão, porque era a escolha entre o suicídio e o Pezão. Eu até escrevi um esquete para o Porta dos Fundos falando sobre isso. Você “justifica” seu voto. Por­ra! Eu tive de votar nele, porque era isso ou [Marcelo] Crivella. Era isso ou [Anthony] Garotinho. Um desespero, uma tristeza. É difícil eleger alguém direito no Rio, puta que pariu.


PLAYBOY — O Porta dos Fundos é frequentemente chamado de petista...


PORCHAT — Mas é que a internet é muito bipolar. As pessoas te acusam de ser dos dois lados O tempo todo. Você é de esquerda, você é de direi­ta. Eu já fui acusado de ser flamenguista! [Risos] Te chamam de petista e te chamam de tucano, não tem o que fazer.


PLAYBOY — O Porta dos Fundos é um grupo de esquerda?


PORCHAT — O Kibe [Antonio Tabet] é totalmente de direita, totalmente tuca­no. O Greg é totalmente PT. Quando o Gregório disse que votaria na Dilma [Rousseff], a gente não deixou de fazer episódios sacaneando a Dilma, e isso também não impediu o Gregório de brincar. O legal é brincar com todo mundo, sacanear a Dilma, o Aécio [Neves], a Marina [Silva] e todo mundo que estiver ali disputando as eleições.


PLAYBOY — Alguém já foi poupado de brinca­deira por uma visão política dos membros?


PORCHAT — Não. Claro que algumas causas são de alguns dos membros e não dos outros. O Greg é um cara empenha­do em entender esse assunto da descriminalização da maconha, por exemplo.


PLAYBOY — Você diz que não gosta de maconha. É favorável à legalização?


PORCHAT — A política atual de drogas deu errado. Isso é nítido. Não funcionou. No mundo inteiro não está rolando. Eu, por acaso, não fumo ma­conha, mas acho que essa ideia de "ah, meu Deus! Se você fumar maconha vai virar um bandido assassino, vai pegar meu filho e vai matar um monte de gente” é errada. Eu nunca vi alguém fumar maconha e ir para casa bater na mulher, ou fumar ma­conha e atropelar uma pessoa.


PLAYBOY — Você acha que a legalização funcionaria no Brasil?


PORCHAT — Algo me diz que esse é o caminho. Claro, tem que ter uma série de estudos, mas alguns países já estão liberando com ótimos índices, como o Uruguai, que é um país menor que o Brasil, e tal, mas também os Esta­dos Unidos estão liberando. É só em al­guns estados, mas acho um avanço, principalmente em relação ao que acontece no Brasil. Hoje, com a criminalização, um playboy é pego com 10 gramas e é liberado. Mas se for um preto, pobre, nordestino, é preso e encarcerado. O racismo é barra pesada.


PLAYBOY — Mas voltando: o Kibe é de direita, e o Gregório é de esquerda. Você é...?


PORCHAT — Já disse: não me apego a partido político. Acho o PT, o PSDB e o PSB uns lixos. Todos esses partidos finan­ciados por empreiteiras são uns lixos. Como pode uma mesma empreiteira apoiar os três candidatos à presidência? Esses partidos estão pouco se importan­do com o povo. Eles querem lucrar, que­rem ganhar dinheiro.


PLAYBOY — O que você achou dessa recente onda de manifestações políticas no Brasil?


PORCHAT — Essas do impeachment ? Do "Fora Dilma”? Eu não fui. Sai a Dilma e entra o Michel Temei? Qual é a grande onda? O país ficou dividido, uma metade não que­ria a Dilma e a outra queria. Então é óbvio que nos próximos quatro anos a metade do país que não queria vai reclamar da mulher e a outra metade vai elogiar.


PLAYBOY — O que você acha da Dilma?


PORCHAT — Você pode fazer críticas e analisar friamente o que se fez e se deixou de fazer no governo do PT, mas, de uma forma geral, tirar ou não tirar a Dilma não vai fazer diferença alguma.


PLAYBOY — Mas nas últimas eleições, você ficou de qual lado? Do “quero Dilma" ou do “odeio a Dilma”?


PORCHAT — Eu votei no Aécio no segundo turno e na Marina no primei­ro, porque eu acho que nenhum governo deve ficar mais de 12 anos no poder. Aí fica a mesma mamata. Todo mundo lá dentro já sabe como é o caminho do rou­bo. É bom mudar, para os novos ladrões terem que reaprender a roubar.


PLAYBOY — Você já votou no PT?


PORCHAT — Votei no Lula no segundo mandato. Acho que o Lula e o PT tiveram nas mãos a grande chance de mu­dar este país. Eles estavam com a faca e o queijo na mão. Mas ficaram tão preocu­pados em se manter no governo que perderam essa chance. Mas o Lula fez grandes coisas. Ele foi um bom presidente.


PLAYBOY — Votaria nele de novo?


PORCHAT — É difícil falar disso, porque quando a gente defende o Lula, começam a falar que ele é ladrão, mas se esquecem que a reeleição do Fernando Henrique [Cardoso] foi um negócio bem conturbado, que teve até uma CPI por causa de subornos para políticos votarem a favor da ree­leição. Então, se a Dilma está se reele­gendo, a culpa é do FHC.


PLAYBOY — Você votou na Marina. Não é es­tranho votar numa candidata evangélica?


PORCHAT — As pessoas falam mal da Marina por ela ser evangélica, por ser contra as pesquisas com células-tronco, mas a Dilma também é contra o aborto. E como você defende o Aécio? O Aécio fez um aeroporto na fazenda do tio dele. Cada um ali tem milhões de problemas, e só umas cinco qualidades. [Risos.]


PLAYBOY — Mas o Porta tem certa predileção para piadas com evangélicos, não?


PORCHAT — Contra evangélicos? Não acho. Acho que é mais com a religião católica A gente até brinca com pastor, mas é um número bai­xo de vídeos. O Especial de Natal, por exemplo, não era focado nos evangélicos.


PLAYBOY — Mas vocês fazem bastante piada com religião...


PORCHAT — Eu sou fascinado por esse assunto. Leio muito sobre religião, e dos esquetes religiosos do Porta, uns 80% fui eu que escrevi. Sou ateu, mas religião é uma coisa de que eu gosto mui­to, acho interessantíssimo. Acho que toda escola deveria ter aula de religião.


PLAYBOY — Como assim?


PORCHAT — Aula de religião. Não da religião católica, mas uma aula para en­sinar o que é a religião, como ela afeta nossa vida. Uma aula para as pessoas entenderem que a religião vem lá de trás, que a história de um cara que era segui­do por outros 12 caras, que morreu e que ressuscitou tem em, sei lá, 20 religiões. Na índia, que deve ter umas 100 crenças, pelo menos dez falam de uma mu­lher que era virgem e teve um filho.


PLAYBOY — E por que isso ajudaria?


PORCHAT — É muito níti­do. Para mim tudo isso é uma junção de coisas, de lendas e de histórias, que eram uma forma de ensinar as pessoas. E são lendas bacanas. Jesus era um cara legal, que falava "ame ao próximo”. Pena que, lendo isso, a pessoa ainda assim queira matar gays. Peraí! O cara falou que era para amar ao próximo! Não tem em nenhum lugar na Bíblia o trecho “mate o gay”. Não tem nenhum lugar falando: “Se ele é gay, bata nele com uma lâmpada na Paulista”.


PLAYBOY — A Bíblia é uma coisa boa?


PORCHAT — Não importa, porque as pessoas não seguem a Bíblia. Se os homens seguissem a Bíblia, eles não fariam a barba, apedrejariam mulheres menstruadas na rua e não comeriam carne de porco. Mas as pessoas seguem só o que querem seguir. Aí é mole! A pessoa acre­dita muito naquela passagem da Bíblia, mas naquela outra, não. Aquela lá era forma de dizer da época, mas quem é que define o que era forma de dizer? E quem define que uma época acabou e que podemos parar de seguir isso ou aquilo? Quem disse que Inri Cristo não é a encarnação de Jesus? Nós não sabemos... Mas ia ser muito divertido se fosse. [Risos]

PLAYBOY — Essa é uma questão de interpretação, não?


PORCHAT — Como qualquer obra, a Bíblia também pode ser interpre­tada... Mas não se pode pegar uma coisa de cada! O brasileiro é assim: "Eu vou à missa, mas acendo uma vela para o meu santo e pulo sete ondinhas". Afinal de contas, O que é isso? Ou você é espírita, ou é católico, ou é da umbanda. É tão difícil defender a religião que fica até constran­gedor atacar. Por isso que é legal brincar. Brincar com Jesus e brincar com a Bíblia.


PLAYBOY — Mas essa também é uma questão política, não?


PORCHAT — É que está interferindo na minha vida. A religião é um atraso. Você não discute células-tronco por causa de religião, você não discute aborto por causa de religião. É muito louca essa história do aborto. Parece que toda mulher vai ter que abortar, que o aborto vai ser obrigatório. Você vai chegar grávida e o médico vai falar: “Vixe, senhora, não vai ter jeito. Vai ter que abortar’. [Risos.]


PLAYBOY — Você é a favor do aborto?


PORCHAT — Sou a favor de discutir isso. Porra, você não discute nada por causa da religião! Não discute nem droga direito, pelo amor de Deus! Da homossexualidade você não pode falar, não pode falar sobre casamento gay. Olha o atraso! Essas pessoas estão impedindo o mundo de evoluir. E tudo por causa de uma crença. A pessoa pode acreditar no que ela quiser, mas quando começa a interferir na minha vida, é um problema.


PLAYBOY — Esse posicionamento já trouxe al­guns problemas para o grupo, não?


PORCHAT — A gente não teve problemas, não. Aliás, é até engraçado quando as pessoas falam que tivemos problemas com religião, porque uma imensa parcela de religiosos acha o Porta legal para caramba. Quando a gente brinca com pastor, evangélicos já vieram falar: "Caramba, a gente passa esse vídeo lá. A igreja passou para mostrar como se comporta um pastor escroto”.


PLAYBOY — Mas e os problemas como deputado federal Marco Feliciano?


Teve problema com o nosso primeiro Especial de Natal, porque o Feliciano se ofendeu com uma passagem em que aparecia a Nossa Senhora. Aí que a gente descobriu: você pode bater em Jesus, bater em Deus, mas não em Nossa Senhora. Não sei por quê. Acho que é porque ela é a mãe, porque ela é virgem. Sei lá. Com ela que não pode brincar. Mas a gente brinca mesmo assim.


PLAYBOY — Vocês nunca foram processados?


PORCHAT — Não, nunca. É curioso isso. As pessoas acham que a gente está sendo processado o tempo todo, mas não. O próprio Felicia­no tentou entrar com um processo, mas ele perdeu antes de chegar na gente.


PLAYBOY — Já sofreram alguma ameaça por causa desses esquetes?


PORCHAT — Não. O máximo que acontece é a pessoa estar mui­to revoltada e xingar. Mas nunca sentimos esse tipo de medo. Na época do [atentado contra o jornal francês] Charlie Hebdo, teve gente que falou: “Tá vendo, seus cagões? Por que vocês não fazem piada com muçulmano?” É uma espécie de vingança cristã, saca? Tem que expli­car para essa pessoa que Deus não quer que ela pense assim. [Risos]


PLAYBOY — E por que vocês não fazem piada com muçulmano?


PORCHAT — A gente faz piada com muçulmano, sim! Mas, claro, a gente vai fazer bem mais piada com cristão. Essa é a nossa realidade. Alguém aqui no Brasil sabe alguma passagem do Alcorão? Como é que eu vou fazer uma brincadeira com Maomé se ninguém vai entender? Não tem graça. Se você pegar o Especial de Na­tal do Porta e reassistir, vai ver que ele é muito divertido. É muito engraçado ver o anjo tentando explicar para o José o que está acontecendo com a mulher dele, ver Jesus com medo de ser pregado na cruz. É engraçado porque a gente conhece essas histórias. Conhece Jesus, Maria... A gen­te não conhece Maomé e a galera de Mao­mé, que eu nem sei quem são.


PLAYBOY — Vocês não têm medo de ultrapassar um certo limite?


PORCHAT — Não. Zero. Eu nem penso nisso de patrulha, do que vão pensar os religiosos. Eu não me apego mesmo. A gente pode até saber que vai dar um puta trabalho, que neguinho vai brigar. Mas acho que nenhum vídeo do Porta caiu porque era pesado. Às vezes cai por não ter graça. Mas por ser pesado, nunca.


PLAYBOY — Vocês não têm medo de nada?


PORCHAT — Temos medo de errar a piada, de não ter risada, de formular errado. Mas o lance é o seguinte: você tem que fazer a piada. Ne­nhuma piada nova tem a mesma força de uma piada que está há dois meses sendo contada. Piada sem graça você vai fazer.


PLAYBOY — Pode fazer piada com negros e ho­mossexuais, então?


PORCHAT — Porra, a gente já falou de racismo para caramba no Porta. Tem um esquete da Ku Klux Klan que eu escrevi. Pó, já fiz piada com negro, já fiz com Hitler, já fiz com muçulmano. Não tem essa. Claro, quando você faz uma piada, tem que saber que tipo de briga você vai querer comprar. Tem que entender a piada. Você está atacando pessoas? Você quer atacar essas pessoas?


PLAYBOY — Pode piada com tudo?


PORCHAT — Acho que dá para fazer piada com o ceguinho, com preto, com branco, com chinês, com japonês, com argentino, com português, com mulher, com tudo! Minha questão é: qual a graça de fazer piada com a "mulher burra”? Pô, isso é tão antigo. O Porta nunca vai fazer uma piada de loira burra não por política, mas porque não tem graça.


PLAYBOY — Qual é o limite, então?


PORCHAT — Não dá para responder. A piada boa vem do mesmo lugar que a piada ruim, da mesma cabeça, do mesmo ponto. Não é uma receita de bolo, que eu vou botar três colheres de sal, mas se eu colocar duas e meia desanda.


PLAYBOY — O que influencia para uma piada ser ruim?


PORCHAT — Tudo! Depende do momento, da situação. Eu posso fazer uma piada de humor negro sobre morte e, no dia seguin­te, morrer assassinada uma pessoa arras­tada. Fodeu! Minha piada vai virar de um puta mau gosto. Então não tem essa defi­nição. Tudo interfere na sua piada. A situação que o país vive, onde ela foi veicu­lada, a entonação que você usou. Aquela do Rafinha [Bastos] do estupro, por exem­plo. Se no jornal aparece que é legal estu­prar, você pensa que esse cara é um louco, que precisamos prender. Mas não foi exatamente isso que ele falou. É de mau gosto a piada? Realmente é. Mas quando você tira ela do contexto, fica pior. Aliás, essa é a minha questão com dar entrevis­ta. Se você tirar uma manchete falando “Fábio Porchat afirma: agora pode fazer piada com veado!” fodeu.


PLAYBOY — Dá para fazer uma piada muito ra­cista ou uma piada muito homofóbica e ser engraçado?


PORCHAT — Dá. Tudo pode ser engraçado. Uma mulher pode tropeçar na sua frente, cair e você achar engraçado. Machucou outra pessoa, é horrível rir dis­so. Mas você ri. Tudo pode ser engraçado. Dá para fazer piadas engraçadas sacanean­do o Holocausto, sacaneando o nordesti­no, sacaneando o Hitler, sacaneado a minha mãe, sacaneando o meu pau...


PLAYBOY — Então não tem problema chamar um negro de macaco, por exemplo?


PORCHAT — É legal chamar o cara de macaco? Não, né? Então por que estamos lutando para voltar a chamar o negro de macaco? Só porque antes podia? Porque Os Trapalhões faziam piada chamando o Mussum de macaco?


PLAYBOY — O Renato Aragão falou, em entre­vista a PLAYBOY, em janeiro deste ano, que “na época dele, gays e ne­gros não se incomodavam com esse tipo de piada”. Você acha que eles não se incomodavam mesmo?


PORCHAT — Não é que eles não se incomodavam, mas eles achavam normal. Fazer isso era tido como normal, e isso é uma merda. É bom quan­do as coisas mudam. É legal que as pesso­as lutem pelos seus direitos, que lutem pelo fim do racismo, do sexismo, da homofobia. Mas isso não deve tirar meu direito de poder brincar com tudo isso.


PLAYBOY — Como assim?


PORCHAT — O problema não está no humor, está no mundo. As pessoas estão mais serias e mais conservadoras. Isso reflete no humor. Veja como as pessoas hoje não sabem mais como se portar, não sabem como falar as coisas. Pode chamar cego de cego, ou é deficiente visual? Nós ficamos sem saber. E aí tem umas coisas absurdas, como o livro da Agatha Chris­tie, O Caso dos Dez Negrinhos.


PLAYBOY — O que tem ele?


PORCHAT — Ele não se chama mais O Caso dos Dez Negrinhos. Mudou. Agora é E Não Sobrou Nenhum. Porra! Teve tam­bém aquele caso da peça que a menina nem tinha assistido, mas viu uma foto com o cara pintado de negro é fez campanha no Facebook para proibir [em maio deste ano, a peça A Mulher do Trem foi suspensa depois de repercussão negativa aos atores que usavam black face, técnica em que brancos encenam o papel de negros]. Ela nem viu, nem sabia se a peça era uma crítica. É uma loucura, e é censura. Como assim “você não pode fazer essa piada”? Como vai funcionar isso?


PLAYBOY — O politicamente correto não tem a ver com uma certa patrulha ideoló­gica que existe no Brasil?


PORCHAT — Não, porque isso é no mundo todo. Esses dias, os atores de Os Vingadores fizeram uma piada em uma coletiva de imprensa sacaneando a Viúva Negra. Disseram, sei lá, “ah, ela é uma piranha”. E os ativistas foram recla­mar que não podia falar uma coisa dessas. Eles tiveram que pedir desculpas porque eles chamaram uma super-heroína de pi­ranha. [Risos] É muito doido isso, né? Não pode agredir a Mulher-Maravilha. Porra! Mas ela nem existe! Tenho certeza de que hoje seria impossível o Caco falando "Cala a boca, Magda!" no Sai de Baixo.


PLAYBOY — Talvez as mulheres naquela época não se incomodassem...


PORCHAT — Ah, mas isso foi em 1997, né? Já era uma época mais pra frentex, para usar um termo antigo. A época de Os Trapalhões, década de 1980, é uma época bem outra. De 1997 para cá, houve mudanças, mas de Os Trapalhões para cá, vieram mudanças muito mais profundas. Eu li outro dia que a cada 20 anos o humor vira, o humor muda, e vem uma nova gerração. E faz sentido. Aqui no Bra­sil, tivemos o Chico Anysio e o Jô [Soares], depois veio a TV Pirata com os Cassetas, e aí Porta dos Fundos com [Marcelo] Adnet, Tatá [Werneck], [Dani] Calabresa.


PLAYBOY — Qual a principal diferença dessa geração para as outras?


PORCHAT — Essa geração é muito autoral. Ela escreve e fala o que quer. E com as novas mídias, com a inter­net, abriu-se um leque muito grande de opções. Se você for pensar, era impossível alguém há dez anos fazer sucesso sem es­tar na Globo. E isso é ótimo. Os Barbichas são um sucesso na internet, e nem na TV estiveram. Abriu-se uma possibilidade grande de essa galera mudar o humor.


PLAYBOY — Vocês foram para Portugal para gravar Meu Passado Me Condena 2. Algum motivo específico?


PORCHAT — Portugal é um lugar ótimo, incrível, um país lindo, de visual maravilhoso. E tem a língua que é igual e facilita a gravação. E é um lugar que é pouco explorado pelo nosso cinema. A gente fala pouco de Portugal, conhece pouco da cultura portuguesa, embora eles conheçam muito da nossa.


PLAYBOY — Aconteceu algo engraçado pela, di­gamos, literalidade dos portugue­ses?


PORCHAT — Teve um causo maravilhoso. Na cena em que a Miá [Mello] cai do cavalo, a gen­te contratou uma duble para fazer e, no dia da filmagem, ela não sabia andar a cavalo. Ela só sabia cair. Como assim? Não faz o menor sentido isso! [Risos]


PLAYBOY — É frustrante para você que Entre Abelhas, também lançado este ano, não tenha tido o mesmo espaço de Meu Passado Me Condena 2?


PORCHAT — Ele teve espaço, sim. Mas é outro público. Eu acho bom que seja outro público. É legal pegar aquele cara que está acostumado a me ver e dar um susto nele. A gente não pode dar só o que querem.


PLAYBOY — Mas qual era a diferença? Por que é outro publico?


PORCHAT — Entre Abelhas é um pro­jeto antigo. Quando ele surgiu, lá atrás, a ideia era o Ian [SBF, diretor do Porta dos Fundos] dirigir e eu atuar. Só que há dez anos, isso era impossível. Eu não conse­guia nem fazer uma ponta num filme, que dirá protagonizar um... Mas, mesmo assim, começamos um processo a quatro mãos. Isso por dez anos. E esse processo fez muito bem ao filme. Ele amadureceu.


PLAYBOY — Faltam comédias maduras no cine­ma nacional?


PORCHAT — Não acho. Eu gosto de transitar em diferentes tipos de humor, e acho legal as pessoas virem a trás de mim. Então meu programa com a Tatá [Tudo pela Audiência] é um programa de auditó­rio, Meu Passado Me Condena é uma comédia romântica, o Entre Abelhas é uma tragicomédia, o Vai Que Dá Certo é um filme de galera, meus artigos no Estadão são uma espécie de crônica com um outro tipo de tom. Eu gosto de passear por todos esses lugares, de experimentar. Gostaria muito de fazer um filme de zumbi, por exemplo. Acharia ótimo. Quero que o público me relacione com bons projetos. Que diga: "Isso foi feito pelo Fábio, deve ser bom”.


PLAYBOY — Mas Entre Abelhas não recebeu tan­ta atenção quanto esses outros pro­jetos...


PORCHAT — Claro que ainda tem inúmeros outros problemas. As pessoas tem muito preconceito com filme nacional, acham que o cinema nacional é uma merda, e têm uma mentalidade antiga de que tudo que é feito nos Estados Unidos é bom. A con­corrência é dura aí você pega no mesmo cinema uma comédia do Leandro Hassum e do Adam Sandler, qual o cara vai ver?


PLAYBOY — Mas o Adam Sandler também é cri­ticado por fazer comédias rasteiras.


PORCHAT — O que eu estou querendo dizer é que as boas comédias daqui são tão boas quan­to as de lá, e que aqui tem comédias ruins, sim, mas dizer que qualquer comédia americana é melhor que a nossa não é verdade. Mas, claro, lá o esquema é dife­rente, é uma indústria. Quer fazer um filme do Super-Homem? A MGM pega e investe trocentos bilhões de dólares.


PLAYBOY — Mas o publico brasileiro procura comédias rasteiras?


PORCHAT — O público quer comédia, sim. Comédia no Brasil é o que vende, e isso é histórico. Isso vem desde a pornochanchada, do Mazzaropi. E hoje segue com a Ingrid [Guimarães] e com o Hassum.


PLAYBOY — Mas frustra que você, estando em duas frentes, receba menos atenção em seus trabalhos “sérios” do que nas comédias “fáceis”?


PORCHAT — Mas não é fácil. Duvido alguém pegar um filme e fazer como o Hassum faz. Tem muito come­diante querendo fazer essa comédia fácil do Hassum e não consegue. Tanto que não é todo filme que faz sucesso. Super Pai não foi bem. Aquele do ano novo, A Noite da Virada, também não. Algumas pessoas chamam público, não sabemos por quê.


PLAYBOY — Não tem a ver com a publicidade da Globo Filmes?


PORCHAT — No caso do Hassum? Não, não acho. A Heloisa Périssé fez um filme agora e não deu certo. O Luiz Fernando Guimarães fez um filme, ti­nha publicidade e não deu certo. Não tem uma fórmula mágica.


PLAYBOY — Você tem medo de que daqui a 20 anos o humor mude e você não tenha mais espaço?


PORCHAT — Eu tenho medo de me re­petir e, principalmente, medo de não per­ceber quando meu humor ficar ultrapas­sado. De ficar com um humor velho. E eu tenho medo de não me dar conta disso. Esse é um dos piores medos que eu tenho, porque essa profissão é de altos e baixos. Hoje eu estou dando entrevista para a PLAYBOY. Daqui a dois anos, talvez ninguém mais queira saber de mim.


POR JOÃO PEDRO JORGE

FOTOS RENATO PIZZUTTO


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