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GREGORIO DUVIVIER | MARÇO, 2014

Playboy Entrevista



Uma conversa franca com o ator, roteirista e sócio do Porta dos Fundos e colunista da Folha de S.Paulo sobre religião, humor, sexo, preconceitos, Rede Globo e a sua recente introdução ao complexo universo dos secadores de cabelo


"Vamos batalhar essa manchete, vai..." Ao longo de uma entrevista com Gregorio Duvivier, é quase inevitável lembrar de um de seus personagens mais engraçados entre os muitos interpretados nos vídeos do grupo Porta dos Fundos. Em Entrevista, Rafael Infante é um ator divulgando sua peça e Gregorio, o entrevistador que insiste em buscar uma declaração polêmica a qualquer custo. Com os papéis invertidos, o entrevistador aqui não precisa se esforçar muito. Gregorio tem posições fortes e nenhum pudor em defendê-las com unhas, dentes e bons argumentos.


Nascido na zona sul carioca há quase 28 anos, filho da cantora Obvia Byington e do músico Edgar Duvivier e o mais velho de três irmãos, ele começou a fazer teatro aos 9 anos, literalmente por distração. O avô era analista da escritora Maria Clara Machado, fundadora do Teatro Tablado, para onde ele foi em busca de uma atividade socializante. Aos 17, estreava nos palcos com Z.É. — Zenas Emprovisadas, um dos primeiros espetáculos de humor de improvisação, ao lado dos amigos Fernando Caruso, Rafael Queiroga e Marcelo Adnet. Chegou a fazer bicos como tradutor de francês. Não passou da faixa laranja no jiu-jítsu. Fez teatro, cinema, escreveu e atuou na TV, até que em 2012 ganhou notoriedade com o Porta dos Fundos, cujos vídeos de humor anárquico levaram ao grande público seus textos e seus trejeitos. Desde o ano passado, é colunista da Folha de S.Paulo, onde mostra seu lado mais sério e engajado. Hoje vive do Porta dos Fundos, empresa com cerca de 40 funcionários da qual, além de roteirista e ator, é sócio, ao lado de Fábio Porchat, Ian SBF, Antonio Tabet e João Vicente de Castro. Participações em teatro e cinema e o ofício de colunista completam sua renda. Formado em Letras pela PUC do Rio, escreveu dois livros de poesia, o mais recente, Ligue os Pontos — Poemas de Amor e BigBang, do ano passado.


Gregorio conversou durante quase cinco horas com o editor Jardel Sebba, divididas em duas sessões. A primeira, na sede do Porta dos Fundos, em Laranjeiras, zona sul carioca, logo depois de ter dado entrevista a uma equipe da BBC londrina. A segunda, em um hotel na região da Avenida Paulista, no dia seguinte a duas apresentações de seu monólogo Uma Noite na Lua, em São Paulo. A peça, encenada originalmente por Marco Nanini em 1998, foi escrita e é dirigida por João Falcão, pai de Clarice, atriz, cantora, integrante da equipe do Porta dos Fundos e mulher de Gregorio. Como havia confessado no Rio que seu único vício era em café, a segunda conversa foi regada a 12 expressos duplos no lobby do hotel.


PLAYBOY — Você entrou numa discussão com Renato Aragão no programa Na Moral sobre as relações entre humor e religião. Mais tarde, ele afirmou que deu boas risadas com o Porta dos Fundos. Você deu boas risadas com ele também?


GREGORIO DUVIVIER — Muito, cara. De verdade. Falaram que fui muito reverente com ele, mas eu sou devoto de Renato Aragão. Mas ele é contratado por uma empresa que é muito reverente à família brasileira, à religião católica, e ele faz parte dessa emissora. Embora o humor dele seja anárquico, é um humor muito reverente à religião católica. Tem uma coisa endêmica ali, com todo mundo que é da Globo, o Roberto Carlos, por exemplo. Tem uma identidade da Globo que é católica, e acho muito estranho porque, porra, é a maior empresa do país! Será que é só por ibope? Quando ela diz que a família brasileira não está pronta para ver o beijo gay, não é humor, ela fala sério. Porra, aquilo é a vida do cara! Ele é gay, isso faz parte da vida dele. Por que ver isso é ruim e ver violência é tranquilo? Que mundo é esse?


PLAYBOY — Ao mesmo tempo, você sempre se refere a outros veículos como reacionários. Não é estranho que você tenha trabalhado na Globo sem problemas em relação a isso?


GREGORIO — As pessoas demonizam a Globo, e acho que tem um lado dela que é muito perverso, sim, mas artisticamente há uma liberdade. A Rede Globo, com a qual eu não tenho nenhuma ligação, que fique bem claro, é uma emissora que abarca muito as diferenças. O jornalismo da Globo é muito reacionário. Ao mesmo tempo, o Guel Arraes não é reacionário, o Jorge Furtado não é reacionário. A Record é muito mais demonizável, o SBT é muito mais demonizável. A Band é de um grupo ruralista, e o CQC não toca no assunto. O CQC é um programa foda, que tem um puta cunho político interessante, mas fronteiras muito nítidas. Você nunca vai ver o CQC falar sobre Código Florestal, porque a Bandeirantes tem um rabo muito preso com os ruralistas.


PLAYBOY — Um dos esquetes do Porta dos Fundos, Preparadora de Elenco, faz uma "homenagem" a uma profissional do meio, a Fátima Toledo, que tortura os atores. Você sofreu na mão dela?


GREGORIO — Fiz uns 500 testes na vida, e um foi com a Fátima Toledo. E é muito doido, você fica de quatro, babando, duas horas... Hoje posso me permitir certas coisas, não preciso mais fazer teste.


PLAYBOY — Ela fazia isso mesmo com atores conhecidos?


GREGORIO — Total. Tem aquela história de que o Wagner Moura brigou com o Lázaro Ramos, e eles são melhores amigos. Brigaram no processo de preparação porque ela ficava incitando. Acho que foi em Cidade Baixa.


PLAYBOY — O teste que você fez com ela era para que filme?


GREGORIO Paraísos Artificiais. Fiz para o Tropa de Elite também, para o personagem do Caio Junqueira. Ela pôs um heavy metal, e fiquei horas pulando. Horas. Me incomoda um pouco quando o ator é uma marionete. Você passa o dia inteiro babando no chão, com a língua para fora, e nem te ligam para falar se você passou ou não. Teste de comercial também era punk. Teve um que eu estava no meio do deserto e achava um coco e um pote de maionese. Botava a maionese no coco, provava, olhava para câmera e falava: "Hum, que delícia". O coco estava apodrecido, a maionese, quente. Hoje, a maior vantagem de trabalhar há um tempo é parar de fazer teste. E poder dizer coisas, deixar de ser marionete, também é muito bom.


PLAYBOY — Parar de fazer comercial também?


GREGORIO — É. Dizer não para comercial ridículo é algo que tenho feito muito. Digo não para uma porrada de coisa. Por exemplo, bateu aqui no Porta o Friboi. Nem sou vegetariano, mas não acho legal. Não gosto de alimentar o frigorífico. Ainda mais frigorífico que está suspeito de ter uma porrada de contravenção, suspeito de corrupção com o filho do Lula. Não quero me meter no meio disso. Nem sei se eles são culpados ou não, só não acho bom me meter em coisas escusas, que tenham ligação com a política.


PLAYBOY — O deputado e pastor evangélico Marco Feliciano (PSC — SP), ao reclamar do Especial de Natal do Porta dos Fundos, perguntou por que vocês não faziam piada com muçulmanos. Por quê?


GREGORIO — Por várias razões. Nenhum muçulmano vem bater na minha porta perguntando se eu conheço a palavra de Maomé. Não tem representantes do islamismo no Congresso, que eu saiba. No Brasil, eles não sonegam imposto e nem têm conta no exterior.


PLAYBOY — Você está dizendo que os evangélicos fazem isso?


GREGORIO — Sim, é o que estou dizendo. As igrejas, evangélica e católica, não pagam imposto no Brasil. Então, o nosso dinheiro de alguma maneira está sustentando essas igrejas. Enfim, a gente mora no Brasil e todo humor é cultural. Se morássemos nos Estados Unidos, nós falaríamos de mórmon. Por que nunca falamos de mórmon? Por que nunca falamos de hinduísta? Eu nunca conheci um hinduísta. Agora, 90% do Brasil é cristão. Como a gente não vai falar de cristianismo? E tem outra razão que me deixa muito puto com essas comparações do Feliciano. O que ele está dizendo é: "No Irã vocês iam ver uma coisa, pena que a gente não está no Irã para vocês verem..." Eles têm inveja dos fundamentalistas? É. Então é legal o que o Irã faz? Vocês não são bonzinhos por não matarem a gente. A postura dos fundamentalistas islâmicos é que é absurda. Não é a de vocês que é a sensata, entendeu?


PLAYBOY — O Feliciano não reflete uma parcela significativa da população brasileira que tem direito de ser representada?


GREGORIO — Sim, só que a democracia brasileira tem que se proteger dela mesma. Ela tem que dizer: "Isso é um atentado à democracia, é um crime de ódio". Existe crime de ódio, e ele não está no Porta dos Fundos. Eles falam, por exemplo, em perseguição religiosa. A gente nunca falou o nome do Feliciano, nunca citou o nome dele. A gente fala de Jesus, que é uma figura histórica que ele não detém. Ele acha que é filho ou esposa de Jesus. Eu nunca o processei por dizer que Deus assassinou John Lennon ou que o continente africano é atrasado porque as religiões negras são diabólicas. E isso me ofende. Fico puto porque sagrado para mim é a igualdade das raças.


PLAYBOY — Vocês fariam piada com candomblé ou com umbanda?


GREGORIO — Sim, porque faz parte da nossa cultura. Mas por que não tem tanto? Porque não tem tanta graça bater em quem já apanha. A Globo faz piada com candomblé há 50 anos, tinha lá o Chico Anysio fazendo o Painho. Porque a tradição é bater no desfavorecido. Bater no pobre, no negro, no gay, nas mulheres. É um humor que a gente se recusa a fazer. Acho muito mais engraçado rir do poderoso, e o poder brasileiro é cristão. Nenhum presidente brasileiro se elegeu sem fingir que era cristão. A Dilma finge que é cristã, eu acho. Não sei se ela é ou não, mas ela faz esse circo. O Fernando Henrique era cristão? Fingiu que era. Todo presidente brasileiro finge. Por quê? Porque são 90% da população. Se existe uma perseguição no Brasil não é aos cristãos. Fazer esquete sobre Jesus é perseguição?

PLAYBOY — Você é ateu?


GREGORIO — Sou ateu.


PLAYBOY — Mas consegue entender que uma pessoa que tenha fé eventualmente sinta-se atingida com um vídeo que brinca com o que ela acredita?


GREGORIO — Total. Pode se ofender, mas daí achar que é crime, é aí que entra a perversão deles, na minha opinião. Se a gente cometeu algum erro na vida, foi de mau gosto, nunca cometemos um crime.


PLAYBOY — Houve mau gosto no Especial de Natal?


GREGORIO — Nem um pouco. Mas entendo acharem que é de mau gosto. Agora entrar com processo criminal e achar que o gosto dela é a verdade é absurdo. Porque meus dogmas são ofendidos o tempo todo. Estava na Folha, no jornal que eu escrevo, no Editorial de hoje escrito que "nenhuma pessoa tem a obrigação de gostar de ver dois gays se beijando". Tem razão? Talvez. Mas e se trocar gay por negro? "Nenhum ser humano tem obrigação de gostar de negros." Fica meio esquisito, né? Etnia, orientação sexual ou o sexo com que a gente nasce são coisas inerentes ao ser humano, não são escolhas que se pode julgar. Mas não vou processar criminalmente toda vez que um imbecil disser uma imbecilidade dessas. Vou perder muito tempo.


PLAYBOY — O Feliciano está processando vocês?


GREGORIO — Ele e a Associação da Família Brasileira estão processando a gente. Ambos por causa do nosso Especial de Natal, baseado na lei de intolerância religiosa. É uma lei que diz que você não pode escarnecer de um objeto religioso. O que eu acho uma palhaçada. O que é um objeto religioso? Pra quem é um objeto religioso? Porra, a maconha é um objeto religioso para os rastafáris! O que é sagrado para quem no mundo? Quem é que determina isso? Quando a gente ri de religião, está rindo do poder. Os caras têm uma bancada fortíssima, um lobby muito forte, dinheiro no Brasil e no exterior...


PLAYBOY — O que eles estão pedindo?


GREGORIO — O Feliciano pediu 1 milhão de reais. Não sei baseado em quê ele fez essa conta. Acho que nem quer tirar o vídeo do ar, só o dinheiro. A Associação, não sei, e tem um terceiro cara, em Recife, todos por causa do Especial de Natal. Está na Justiça.


PLAYBOY — Você acha que, dada essa obsessão dele com a questão do homossexualismo, o Feliciano é um gay enrustido?


GREGORIO — Não. E acho que é pequeno reduzir assim, é algo que até me incomoda um pouco. Quem fala: "Esse cara é um gay enrustido", como se fosse ruim ser gay. Talvez ele seja, mas isso passa longe do problema dele. O problema dele é ser um boçal, ter um entendimento pífio dos textos sagrados e do que é democracia. Além de boçal é perverso, usa a lei sempre a favor dele. Quando quer fazer declarações homofóbicas, advoga pela liberdade de expressão, e quando quer que não riam dele, advoga pela lei contrária. Ele quer poder falar absurdos dos negros, dos homossexuais, das mulheres, fazer declarações racistas, homofóbicas, mas não quer que zoem Jesus. Isso não tem a ver com homossexualismo enrustido, tem a ver com caráter.


PLAYBOY — Mas você tem uma opinião a respeito?


GREGORIO — Não, cara. Só acho estranho aquele cabelo, aquela chapinha. Mas, de novo, isso não tem nada a ver com homossexualidade enrustida. Tem a ver com vaidade. E com mau gosto.


PLAYBOY — Quando você escreve um texto como o Remissão Voluntária, uma de suas colunas da Folha, no qual você se coloca como o tumor do senador José Sarney, não se sente tão intolerante quanto seus algozes?


GREGORIO — Sim, porque, como falei, eu tenho meus dogmas. O relativismo absoluto é impraticável.


PLAYBOY — Você teve medo de ser processado?


GREGORIO — Não, porque não falo o nome dele. Além disso, ele é mais esperto do que esses líderes cristãos, sabe que estaria vestindo a carapuça. Essa coisa do Sarney serve para um monte de gente, para a família dele e para uma série de políticos. No humor você sempre bate em alguém, não pode fugir totalmente da agressividade. O Sarney está no poder há 30 anos, ele manda no Brasil, praticamente. Por isso, não me incomoda ser agressivo com ele, porque estou sendo agressivo com um poderoso. Então, eu tenho medo, sim, de ser intolerante com aqueles que critico. Mas tento ser, pelo menos, intolerante com a maioria, com o poder. Acho muito bom que a Folha não tenha medo de opiniões divergentes. O [editor executivo do jornal] Sérgio Dávila me ligou para falar do texto do Sarney, e achei legal porque ele ligou na terça, no dia seguinte. "Recebi a coluna no sábado, mas não queria falar com você antes de sair porque ia parecer censura. Acho que você pegou um pouco pesado..."


PLAYBOY — Você acha que errou o tom no texto sobre o Sarney?


GREGORIO — [Enfático.] Acho que passei do tom. Do meu tom pessoal. Tento ter um tom que não deseja a morte de ninguém. E aquele texto, de alguma maneira, deseja. Não sei nem se chegou a ele. Não sei se ele lê. Sei que ele escreve. Mas, pela qualidade do livro dele, sei que ele não lê.


PLAYBOY — Você leu os livros dele?


GREGORIO — Na verdade, li o texto do Millôr zoando o Marimbondos de Fogo que é maravilhoso, então de alguma maneira eu li. Eu li a crítica.


PLAYBOY — Ter 1,69 metro de altura é uma questão?


GREGORIO — É. Adoraria ter uns centímetros a mais.


PLAYBOY — De altura?


GREGORIO — Sim, de altura. Estou satisfeito com meus centímetros lá embaixo. Se pudesse trocar 2 centímetros de pau por 2 centímetros de altura, acho que trocaria. Está sobrando lá embaixo? Está sobrando. Estou bem. Meu pau já foi documentado no Porta em alguns vídeos. É um pau supernormal. É um pau legal.


PLAYBOY — Foi muito usado antes de casar?


GREGORIO — Não, meu pau não frequentou muita gente, teve mais qualidade do que quantidade.


PLAYBOY — Mesmo quando era mais moleque?


GREGORIO — Mesmo, eu era muito devagar. Fui transar pela primeira vez com 17 anos. Fui um adolescente devagar, distraído, nunca fui muito bom com as meninas.


PLAYBOY — Isso te angustiava de alguma forma, ser virgem aos 17 anos?


GREGORIO — Angustiava, a maioria dos amigos já tinha transado. Mas nem todos. Todo mundo acha que é absurdo ser virgem com 17 anos, e não é. Muita gente é. Acho absurdo pais que levam o menino embaixo do braço para transar em puteiro. A sexualidade tem de vir sem pressão, sem obrigação.


PLAYBOY — E como rolou?


GREGORIO — Com uma namorada, que também era virgem e era até mais velha, ela tinha uns 20 anos. A gente era muito apaixonado, então foi muito legal. Por isso que digo que transei com muito pouca gente. Namorei com ela por quatro anos, depois emendei outro namoro de dois anos. Eu namorei muito. Adoro namorar, inclusive o aspecto sexual melhora em qualidade.


PLAYBOY — Nunca foi de pegar na night?


GREGORIO — Não, mas não por uma questão ideológica, de ser contra isso. Nunca frequentei a night, pra começar. Sou péssimo, danço muito mal. Na adolescência as pessoas se pegavam muito em boate, começava com aquela abordagem da dança, e sempre fui troncho. Na adolescência eu levei muito toco, muito, ia pra boate e levava uns 30 tocos. Aí comecei a namorar e me achei no namoro. Não ter a obrigação de sair para pegar gente é muito bom, esse conforto de já garantir o meu sábado é muito bom. [Risos.] O solteiro tem aquela obrigação da caça, ele é um nômade que tem de trazer para casa um javali. A garantia do afeto é muito boa.


PLAYBOY — Um cara que foi virgem até os 17 anos deve ter boas lembranças da PLAYBOY, certo?


GREGORIO — Com certeza. A Tiazinha foi um ícone na minha adolescência, as duas edições [março de 1999 e março de 2000]. A Deborah Secco também. Na primeira edição [agosto de 1999], ela estava linda, tinha um peito lindo normal, uma bunda linda normal. E na segunda [agosto de 2002] ela voltou toda turbinada, foi uma decepção para mim na época. Aquilo me marcou. Ela estava linda e é muito bonita até hoje, de verdade. Mas eu acho ainda mais bonita mais cheinha, e ela tem mania de ficar muito magra. Eu lembro também da Vera Fischer [janeiro de 2000], ela estava muito natural, muito bonita.


PLAYBOY — Você casou há poucos meses. Qual foi a grande descoberta que você fez sobre o casamento?


GREGORIO — Foram descobertas triviais. A Clarice tem quatro secadores de cabelo. É uma coleção. Um dia ela chegou na loja e perguntou: "O que você tem de novidade em secadores de cabelo?" [Risos.] Porra! Caralho! Descobri que alguns têm uma tampa aberta e dá para fazer uma escova. Existe um que é mais potente. Existe um que tem velocidades... Secador de cabelo é um mundo, cara! Aquilo inclusive tem que ter outro uso, não é possível que sirva só para secar o cabelo. Queria inventar um que fosse também torradeira, que eu pudesse colocar uma torrada...


PLAYBOY — Em algum momento você teve dúvidas da sua heterossexualidade?


GREGORIO — Não, sempre fui muito devoto de mulher, sempre achei as mulheres tão bonitas, tão encantadoras. Sempre tive amigos muito próximos, melhores amigos, mas nunca passou pelo desejo, não. Nunca achei o corpo masculino atraente.


PLAYBOY — Você é filho de dois músicos. Teve uma criação liberal? Os seus pais fumavam maconha dentro casa?


GREGORIO — Nem tanto. Era uma criação liberal no sentido de sempre ter sido instigado a contestar. Nunca vi meus pais, por exemplo, fumando maconha. Devem ter fumado muito. Mais velho, aos 18 anos, depois de ter tomado uma dura e levado porrada da polícia, eu contei essa história para o meu pai e ele disse: "Cara, quando quiser fumar maconha, fuma em casa". Fumei com minha avó. Minha avó fumava muita maconha. Ela tinha 80 anos e o médico receitou para combater uma questão óssea, eu acho. Ela começou a fumar e amou. "Como perdi minha vida sem fumar maconha? É a melhor coisa que tem...", ela dizia. Passei a fumar maconha com ela. Viveu até os 92 anos fumando maconha, em plena sobriedade mental.


PLAYBOY — Você ainda fuma?


GREGORIO — Fumo. Fumo, de verdade, quase nunca, até porque a qualidade da maconha do Brasil é horrorosa. E não compro baseado no Rio com traficante, nunca comprei. Eu tenho muitos amigos que plantam.


PLAYBOY — Mas não tem uma famosa de Pernambuco?


GREGORIO — Nunca fumei essa lendária. A qualidade da maconha no Rio é podre. Ao proibir a maconha, você a torna letal, porque não tem controle de qualidade. Outra razão essencial na questão da legalização é aumentar a qualidade da droga. Sou a favor não só da legalização, mas de uma campanha de desmitificação. Por isso acho muito bacana o Fernando Henrique, por exemplo, se manifestar. Hoje, se você for prender todo mundo que fuma maconha, não existirá classe artística, não existirá classe intelectual, não existirão as redações... É um número muito maior do que as pessoas imaginam os que fumam maconha.


PLAYBOY — Maconha teve algum papel contigo em criação?


GREGORIO — Não. Eu, por exemplo, nunca fumei maconha para trabalhar. Porque acho horrível. Para mim é uma droga social, que nunca me levou para outras drogas. Experimentei ácido, que também acho totalmente inofensivo. Nunca experimentei cocaína. Acho que meus amigos que experimentaram se deturparam. A cocaína é uma droga que deforma o caráter das pessoas, como o álcool. Com o álcool você faz coisas que não faria se estivesse sóbrio. Você pode ser agressivo, pode bater em outras pessoas... Tem drogas que deformam a personalidade, que jogam a pessoa no ralo. Essas devem ser combatidas.


PLAYBOY — Entre os sócios do Porta dos Fundos está o Antonio Tabet, que faz o site de humor Kibe Loco. O site foi acusado de se apropriar de ideias alheias na internet, ao ponto de "Kibar" ter virado um verbo. O que acha disso?


GREGORIO — O Tabet é das pessoas mais criativas que já conheci, de verdade. Ele é um furacão de ideias, e nenhum dos vídeos que ele escreveu aqui foi acusado de plágio. Pela minha experiência com o Kibe, ele é uma das pessoas mais criativas e originais que conheço, mesmo. O Porta dos Fundos é a prova de que essa fama é injusta, na minha opinião.


PLAYBOY — Outro sócio é o Fábio Porchat, que se destacou como ator no cinema e na TV. Em setembro passado ele se separou da mulher e uma colunista escreveu que um comediante muito em evidência teria se separado porque seria homossexual enrustido. Vocês, do Porta, pegaram essa notícia e emendaram, em tom de piada, para ele aproveitar e sair do armário. Você estava nessa brincadeira?


GREGORIO — Não, eu só vi depois. O Porchat é muito hétero, muito, isso é tudo o que posso dizer sobre ele. Ele já pegou muito mais gente do que já houve edições da PLAYBOY. E quando digo gente, são pessoas do sexo feminino. Por isso que a gente brincou com isso, porque ele realmente não é. Se ele fosse, a gente não cutucaria esse vespeiro. Pelo Porchat eu coloco a minha mão no fogo.


PLAYBOY — Outro sócio é o João Vicente de Castro, que hoje cuida da parte comercial do Porta dos Fundos. O que ele fazia no começo do grupo?


GREGORIO — Já preparava essa parte. Ele já chegou com algumas parcerias previstas. Ele vende o Porta muito bem. O contrato que a gente tem com a Itaipava é maravilhoso e não altera em nada o conteúdo. Isso é uma obra dele, que bate o pé.


PLAYBOY — Como é o contrato com a Itaipava?


GREGORIO — Aparece só a garrafa deles no fundo do quadro. Eles não interferem em nada, não tem que citar, não tem que beber...


PLAYBOY — Não ter que beber é a melhor parte?


GREGORIO — [Risos] Cara, adoro cerveja, até Itaipava. Até Itaipava é foda... Gosto de cerveja, inclusive Itaipava, foi o que quis dizer...


PLAYBOY — Como vocês lidam com as vaidades? Se gravam, por exemplo, seis textos do Porchat e nenhum dos outros roteiristas, isso começa a causar um ruído?


GREGORIO — Não. O que rola são os textos que a gente gosta. O Porta é maior que tudo isso. Eu gosto pra caralho dos textos do Porchat. Tem isso mais por parte dos atores. E a escalação tem que ser também meritocrática. Ao mesmo tempo, temos que recompensar a dedicação desses atores, porque eles faziam o Porta quando era de graça. Não ganhavam nada e iam lá gravar com a gente.


PLAYBOY — Já rolou ataque de ciúme por causa disso?


GREGORIO — Ataque não. Mas reclamações, muitas. "Estou aparecendo pouco, estou gravando pouco, caralho!" Isso tem. A Letícia [Lima], por exemplo, escreve no Twitter: "Porra, Porta, um tempão que ninguém me chama". O negócio é falar.


PLAYBOY — A Letícia sempre é mencionada pelos nossos leitores. Você tem curiosidade de vê-la na PLAYBOY?


GREGORIO — Pra caralho. Acho ela muito gata.


PLAYBOY — Não tem medo da sua mulher?


GREGORIO — Não, acho que a Clarice tem mais curiosidade do que eu até. A gente veria junto.


PLAYBOY — Um de seus primeiros trabalhos na TV foi a série global O Sistema (2007), selecionado pelo Selton Mello. Conseguiu ter uma dimensão do talento dele?


GREGORIO — Sou muito fã do Selton , acho ele um gênio. Ele faz o negócio que mais amo, que é o cara ser um ator autor. Mas entendi o que você quis dizer... Não faço ideia, nunca tive acesso às dimensões do Selton. Essa é uma fama muito cruel, porque a pessoa não pode se defender. Acho uma merda essas famas. A da cenoura do Mário Gomes. É uma coisa que persegue o cara a vida inteira e não se sabe se é verdade. Um taxista ouviu falar do Richarlyson e Henri Castelli, você sabe dessa história?


PLAYBOY — Não.


GREGORIO — Rolou um boato de que o Richarlyson e o Henri Castelli teriam tido um caso, e o taxista me falou: "É verdade!" Que verdade? Taxista tem mania disso, reverberar seja lá o que for. Gente, vamos parar de reverberar as coisas sem saber. Nunca chupei o pau do Selton Mello, nunca dei pro Richarlyson...


PLAYBOY — Quais serão os próximos alvos do Porta dos Fundos?


GREGORIO — Se a gente conseguir mudar alguma coisa nessas eleições, batendo em todos os lados... Inclusive, a crítica mais contundente de humor até hoje ao PT foi do Porta. As pessoas nos acusam de governistas, só porque a gente fala mal da direita, mas falamos mal pra caralho do PT e do governo. Quero continuar fazendo isso, quem sabe a gente consegue mudar algo.


PLAYBOY — Posso presumir que entre Dilma, Aécio, Eduardo Campos e Marina, você vai votar nulo...


GREGORIO — Vou ver quem são os outros, os menores. Nas últimas eleições, votei no Plínio [de Arruda Sampaio, do PSOL], um cara relevante, interessante, inteligente. O estado do Rio está complicado, estamos entre Pezão, Garotinho, Crivella, Cesar Maia e Lindbergh. Triste pra caralho. Para a comédia é bom, porque vamos poder bater em todo mundo. Se tivesse um candidato grande de quem eu gostasse muito, isso poderia atrapalhar meu julgamento.


PLAYBOY — Para terminar, uma pergunta já clássica: qual é o limite do humor?


GREGORIO — Não tem limite. Pode tudo. Não é crime fazer piada ofensiva, só é feio. Humor ofensivo a minorias é criminoso? Não, é feio, é de mau gosto, passa muito mais pelo bom senso, pela educação. O amigo do seu pai se matou, você fala para ele: "Se matou porque não te aguentava, seu merda", no enterro do cara. Isso é crime? Não, é só escroto. Humor que esbarra em tragédia, por exemplo, é complicado. Falar de estupro achando que vai ser engraçado, pode tentar, mas vai ser difícil conseguir, porque há mulheres sendo estupradas de verdade. Não é preciso ter lei, não é preciso impor limites ao humor. O que é preciso é que você imponha limites na sua cabeça.


POR JARDEL SEBBA

FOTOS CAROLINA VIANNA


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