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JEAN WYLLYS | JULHO, 2014

Playboy Entrevista



Uma conversa franca com o jornalista, professor, escritor, ex-BBB e deputado federal sobre sexo com homens, sexo com mulheres, sexo solitário, Grazi Massafera, maconha, fome, deputados gays e o único porre que tomou na vida, em rede nacional


Aos 40 anos de idade, Jean Wyllys de Matos Santos é um sobrevivente. Nascido em Alagoinhas, no interior da Bahia, filho de uma lavadeira e de um pintor de automóveis, foi o quarto de sete filhos. Cedo começou a frequentar a igreja católica ligada à Teologia da Libertação, por meio das Comunidades Eclesiais de Base Na igreja, foi coroinha e ingressou na Pastoral da Juventude Estudantil e na Pastoral da Juventude do Meio Popular. Cedo também começou a trabalhar para ajudar em casa, como menor-aprendiz na Caixa Econômica Federal. Apesar das pressões familiares, nunca deixou de estudar. Assumiu sua homossexualidade aos 16 anos. Conseguiu uma disputada vaga na Fundação José Carvalho, uma entidade filantrópica de excelência em educação no interior da Bahia, para cursar o ensino médio técnico. Saiu com um emprego em Salvador, onde estudou jornalismo na Universidade Federal da Bahia e trabalhou nos jornais Tribuna da Bahia e Correio da Bahia. Destacou-se ao fazer um jornalismo engajado, fez mestrado na área cultural e tornou-se professor universitário. Tudo isso antes dos dois eventos que o tornariam conhecido nacionalmente: a vitória na quinta edição do Big Brother Brasil, em 2003, e a eleição para deputado federal pelo PSOL do Rio de Janeiro, cinco anos mais tarde.


Envolvido com o movimento pastoral, viu de perto o engajamento da Igreja na luta por minorias como menores, negros e camponeses, mas não entendia por que nem todos se incluíam nesse espectro. "Eu via a igreja cheia de pessoas parecidas comigo, vivendo o mesmo conflito que eu, gostando de outros garotos mas sem poder dizer, achando que aquilo era uma coisa suja. Porque o discurso na comunidade católica era um discurso contrário à homossexualidade. Eu via tudo aquilo e pensava: 'Por que a igreja não se abre para lutar contra as injustiças com os homossexuais?'" Começou a perder a fé naquela igreja, no que foi a gênese de uma das principais bandeiras na Câmara Federal e de sua vida: a defesa das minorias. O direito ao casamento civil igualitário para casais de pessoas do mesmo sexo e a descriminalização da maconha estão entre as causas mais destacadas de seu mandato, que termina este ano — ele ainda não sabe se vai concorrer à reeleição.


Jean Wyllys recebeu em maio o editor Jardel Sebba em duas ocasiões, em seu apartamento em Copacabana, para uma conversa que totalizou quase cinco horas, quando estava lançando o livro de crônicas Tempo Bom, Tempo Ruim Identidade, Políticas e Afetos (Editora Paralela). Desde a data da segunda conversa, no dia 16 de maio, uma churrascaria de Maceió foi obrigada a indenizar um casal de homens por ter se recusado a conceder o mesmo desconto oferecido a casais heterossexuais; o padre César Luís Garcia foi acusado, em Goiânia, de celebrar o sacramento durante a união de um casal homossexual e foi afastado de suas funções pelo arcebispo da cidade; o estado norte-americano de Illinois legalizou a união entre pessoas do mesmo sexo; a população dos 76 países que punem em lei os homossexuais (sete com pena de morte, 69 com prisão e punição corporal) chegou a 2,8 bilhões de pessoas; o Brasil registrou mais de mil casamentos civis entre pessoas do mesmo sexo; veio à tona a história do líder pastoral Marcus Lord, que à noite vira a drag queen Luandha Perón; e o jornal O Globo noticiou um baby boom entre casais homoafetivos, um ano depois da regra que facilitou o processo de reprodução assistida para eles. Atrasado para a primeira conversa, Jean pediu para responder a uma colocação sobre aborto que tinham escrito em seu perfil em uma rede social antes de ligar o gravador. E a conversa começou a partir daí.


PLAYBOY — Você é a favor da legalização do aborto?


JEAN WYLLYS — Claro!


PLAYBOY — Em qualquer caso?


JEAN — Em qualquer caso. Mas quando digo que sou a favor do aborto, quero que se criem regras claras de quando se pode ou não se pode abortar. Quando a ciência define que um feto, um embrião, quando ele pode sentir dor.


PLAYBOY — A ciência normalmente trabalha com um prazo, mas a lei trabalha com causas: hoje o aborto não é criminalizado em casos de estupro, feto anencéfalo e risco de morte para a mulher. Para você é uma questão mais de prazo do que de causa?


JEAN — De prazo, de causa e de liberdade. O filho é fruto de uma relação entre um homem e uma mulher. Por que as leis de criminalização do aborto não se estendem aos homens, que também são responsáveis por aquele filho? Por que a mulher tem que carregar sozinha o fardo de ser criminalizada quando decide não ser mãe? Essa é uma primeira pergunta a se fazer. A segunda, acho, é ouvir a ciência, para dizer quando é seguro para uma mulher praticar um aborto ou não. Quando, com aquele ser em construção, o aborto pode infligir a ele ou não um dano, certo? E tem que ser levado em conta que a gravidez não é um destino. As mulheres não estão destinadas a serem mães. As mulheres têm que ter o sonho de serem mães até para poderem ser boas mães. Aborto não pode ser visto como um mero método contraceptivo, ou como um meio de controle familiar. O aborto não é isso. O aborto tem que ser praticado em casos necessários e no caso de a mulher acidentalmente engravidar e não desejar ser mãe. Nos primeiríssimos dias em que a mulher está grávida, e decidiu que não quer, que não pode ser mãe, ela poder abortar aquilo que ainda não é um ser, mas é um projeto de ser.


PLAYBOY — Você tem vontade de adotar uma criança?


JEAN — Tenho. Mas quero ter um filho meu. Até cheguei a projetar isso com uma amiga, a gente tinha um plano de ter um filho juntos, só que ela acabou engravidando de outro cara. Depois desse plano, minha vida entrou numa roda que não deu mais para pensar nisso. Nunca mais apareceu uma pessoa que eu tenha confiança e amizade, que me permita criar como pai e mãe, né? E que não vá tentar me tirar a criança. Hoje penso em adoção, que posso fazer sozinho. Não preciso casar para adotar.


PLAYBOY — Antes de assumir sua orientação sexual, teve relações com mulheres?


JEAN — Sim, tive namoradas e relações sexuais.


PLAYBOY — E foi bom para você?


JEAN — Foi, mas sempre com um sentimento de incompletude, faltava alguma coisa. Entenda, a prática sexual não determina a orientação. A identidade sexual não depende da prática sexual. Um homem heterossexual, que tem apenas relações heterossexuais, pode ter experiências homossexuais ao longo da vida, mas ele não se percebe como homossexual. O mesmo vale para uma pessoa homossexual. Eu tive experiências heterossexuais, mas a minha orientação era e é homossexual. Então, quando transei com mulher, ainda que do ponto de vista biológico eu estivesse me satisfazendo, chegasse ao orgasmo, de outro ponto de vista que não era biológico, que tinha a ver com a minha percepção de mim mesmo, do meu desejo, da minha completude como pessoa, isso não acontecia. Isso só aconteceu quando pude viver a minha orientação sexual plenamente, a partir dos 19 anos.


PLAYBOY — Até os 19 anos, todas as suas relações foram com mulheres? Havia desejo, então?


JEAN — Sim, tinha libido, tinha desejo, e tinha também, claro, um imperativo social. Havia uma norma, como ainda há, de certa forma, que impede que um garoto de 13, 14 anos, viva plenamente e assuma sua homossexualidade. Paquere na escola o seu colega, leve o namoradinho para casa, fale dele em casa, fale dele para os amigos, possa elogiar o galã da novela. Isso não é possível para uma pessoa gay. Então a sociedade heteronormativa meio que o constrange a adotar práticas heterossexuais, para que ele possa se inserir na sociedade.


PLAYBOY — Mas você já tinha consciência de que aquela não era a sua orientação?


JEAN — Plena consciência. A partir dos 14 anos, quando comecei a olhar os garotos também, tive certeza de que aquela não era a minha orientação, de que a minha orientação era homossexual.


PLAYBOY — Sua primeira experiência sexual aconteceu com quantos anos?


JEAN — Com 14. Fui seduzido, na verdade, por uma garota mais velha chamada Magnólia, ela tinha 28 anos. E foi o meu primeiro beijo, depois veio a primeira relação também. Eu a conheci em uma colônia de férias, depois a gente se encontrou algumas vezes. Foi muito bom, porque ela me deu essas primeiras noções. Ela foi quase uma educadora sexual. [Risos.] Mas é óbvio que meu desejo já existia para os meninos. Eu olhava os garotos de outro jeito, só não podia dizer isso. Conheci, mais tarde, talvez um ano, um ano e meio depois, duas pessoas que foram muito importantes, um professor de literatura da minha cidade e um amigo dele, ambos envolvidos com teatro amador e homossexuais assumidos. Eu os conheci na igreja e fiquei fascinado com eles. Porque eram inteligentes, eram cultos, ouviam músicas que eu, em geral, não ouvia. E eram gays assumidos, falavam abertamente disso, sem culpa. A partir deles que eu consegui me libertar, e aos 16 anos, me assumi como gay. Aí fui ter minhas primeiras experiências já em Salvador, aos 19 anos.


PLAYBOY — A Magnólia praticamente abusou de você?


JEAN — Não, ela foi uma educadora. Foi ótimo. A educação sexual e as informações que eu não tive na escola, né?


PLAYBOY — Nem em casa, imagino.


JEAN — Nem em casa. Minha mãe estudou até a quarta série. Meu pai era um pintor de automóveis, mesmo nível de escolaridade. Meus pais não tinham a educação formal para ter esse tipo de conversa com a gente. Então, de certa forma, isso foi muito bom.


PLAYBOY — Depois da Magnólia, com quantas mulheres você se relacionou antes de assumir a homossexualidade?


JEAN — Antes de me assumir, acho que namorei mais umas duas... E depois de me assumir, ainda fiquei com umas três mulheres.


PLAYBOY — Por quê?


JEAN — Ah, porque aconteceu, sei lá... Estava na boate, na noite, o carinho, o toque. Rolou um beijo, depois rolou uma transa. Mas eu já era assumido, e elas sabiam que eu era gay.


PLAYBOY — Você acha possível ficar com uma mulher hoje?


JEAN — É possível, sim. Desde que ela não venha com a perspectiva de conversão, de que vai me reorientar. Se não vier com essa perspectiva, pode acontecer. Assim como acontece com os homens e mulheres héteros.


PLAYBOY — Rolou recentemente?


JEAN — Recentemente, não. Acho que em 2008 foi a última vez que tive uma relação sexual com mulher. Só relação. O sexo, pontual. Um dia.


PLAYBOY — Aos 19 anos você teve a primeira relação com um homem. Foi melhor ainda para você?


JEAN — Foi uma maravilha, porque foi com um cara de quem eu gostava. Eu o conheci na primeira vez em que fui a uma boate gay na vida, em Salvador. Foi bacana demais, mas foi um choque. Quem me levou foi um amigo chamado Fábio, também da Fundação José Carvalho, onde estudei. A boate chamava "Ici" Kiss, era uma corruptela do nome da bala Ice Kiss. E aquilo era um cacete armado. Mas era tão incrível ir a um lugar onde as pessoas eram iguais a você... Era tão bacana ver as pessoas se beijando, sem medo de censura, de olhares. Lembro que estava em êxtase, fascinado, e um cara me puxou para dançar. Falei "não". Aquilo era tão novo para mim. Não dancei com ele, mas trocamos telefone. Era telefone do trabalho, não tinha em casa, então tinha que ter a hora certa de ligar, ou descer no orelhão para falar com ele. Uma ou duas semanas depois dessa conversa, a gente se encontrou. E foi muito bacana.


PLAYBOY — Foi a primeira vez que você viu dois homens se beijando?


JEAN — Foi. E o mais chocante, aquilo para mim era novidade, mas para as pessoas em volta era a coisa mais natural. Foi como chegar no paraíso. Um achado. É você encontrar a sua turma, literalmente, sabe?


PLAYBOY — Li que você está há muito tempo sem namorado, por causa da falta de tempo e do trabalho, é verdade?


JEAN — Não só por isso, mas porque a relação dos caras comigo mudou bastante. Já era diferente depois do Big Brother, e depois de ter me tornado deputado federal, representante eleito dessa comunidade, e fazer um mandato com tanta repercussão, tanta credibilidade, a relação mudou. Quando vou para a noite aqui no Rio, as pessoas querem falar de política. Elas têm histórias para contar, denúncias a fazer. Elas não me veem como uma pessoa a ser paquerada na noite.


PLAYBOY — Você não leva cantada dos homens?


JEAN — Não levo. No máximo, dizem que sou mais bonito pessoalmente [risos], mas não passa disso. Eu sempre percebo que fico muito feio nas fotos. Nunca me achei bonito, mas isso nunca foi um problema. Mas dizem isso.


PLAYBOY — Você está há quanto tempo sem namorado?


JEAN — Minha última tentativa de namoro foi um pouco antes do Carnaval, entre o fim do ano passado e o início deste ano, mas ele não segurou a onda. Se eu anuncio o namoro, esse cara vai automaticamente ganhar uma visibilidade, as pessoas vão falar dele por ser o meu namorado. As pessoas falam até dos homens que estão ao meu lado em lugares públicos, amigos com quem eu estou num jantar. A primeira impressão nunca é: "É seu amigo? É seu irmão?" Não, qualquer homem ao meu lado é meu namorado. Então tem que negociar isso, porque as pessoas, mesmo assumidas e orgulhosas, às vezes não querem essa exposição. Ele não quis.


PLAYBOY — Você já ouviu cantada no Congresso?


JEAN — Dos deputados, não. Das deputadas, sim. Já recebi cantadas de algumas deputadas. Mas de forma lisonjeira, bacana. Eu fiquei muito lisonjeado porque a Manuela D'Ávila [PCdoB-RS] disse: "Se você não fosse gay, nós estaríamos namorando". De deputados, nunca, mas de frequentadores e de assessores, sim.


PLAYBOY — Por que você ainda recebe cantada de mulher apesar de ser pública a sua orientação sexual?


JEAN — As mulheres têm essa fantasia. Elas me cantam muito. E eu acho bacana, porque muitas mulheres que conheço, amigas ou conhecidas, gostariam de ter um homem hétero que tivesse sensibilidade gay. Queriam um homem que não as trocasse, necessariamente, por futebol, quando estivessem vendo a novela.


PLAYBOY — Você prefere a novela?


JEAN — Eu prefiro a novela. Ou um homem que elogiasse o cabelo delas quando elas cortassem.


PLAYBOY — Sexo faz falta na sua vida? A ponto de não conseguir trabalhar direito, por exemplo?


JEAN — Claro que faz, mas não a esse ponto! [Risos.] Fiquei três meses no Big Brother sem fazer sexo e até sem me masturbar. Eu não me masturbava lá dentro. Eu sou uma pessoa sexual como outra qualquer, mas o sexo não ocupa essa centralidade na minha vida. E ainda bem que nós, humanos, mulheres e homens, podemos fazer sexo com nós mesmos com a masturbação. Ajuda muito. Às vezes, a masturbação é melhor do que certas companhias. [Risos.]


PLAYBOY — Falando em Big Brother, como você foi parar no programa, em 2005?


O meu objetivo no Big Brother foi acadêmico. Uma curiosidade acadêmica. Eu estava fazendo mestrado quando o Big Brother surgiu. O meu mestrado era na Universidade de Letras, um programa de letras e linguística. Mas a área de concentração da minha pesquisa era a dos estudos culturais. O programa surge como campeão de audiência, e começa a mobilizar multidões, e as pessoas batendo no programa. Ele já nasceu criticado. Os críticos só derrubavam o programa. E mesmo assim a audiência só crescia. Por que a televisão seduz? Por que esse programa especial seduz? Esses questionamentos me fizeram querer estudar o Big Brother. E aí eu decidi fazer a inscrição. Era uma aposta no escuro. E fui selecionado. O curioso é que depois conheci as pessoas que fazem a seleção, e elas me disseram que o meu vídeo destoou de todo mundo. Todo mundo ficou fascinado.


PLAYBOY — E foram uma loucura esses três meses?


JEAN — Não, mas teve um efeito o confinamento sobre mim. Três meses em uma casa, né? Perdi a fome, perdi o sono. Eu dormia pouco, não conseguia comer. E era a comida que eu fazia, porque eu era um dos poucos que cozinhava. Chegou um momento em que era insuportável, fui para o confessionário e pedi para sair. Eu não estava aguentando mais.


PLAYBOY — Com quanto tempo de casa aconteceu isso?


JEAN — Acho que tinha dois meses. Só que, em dois meses, a gente não tem noção do que está acontecendo aqui fora, e eu era o protagonista do programa. O país já tinha defendido a minha figura. Eu já era favorito para vencer o programa. Mas eles não podiam falar: "Fica, porque se você sair o programa acaba". Então tentaram me convencer de outro jeito: "Falta tão pouco. Segura a onda". E aí eu falei: "Ok, então eu vou segurar". E foi passando e eu venci a programa.


PLAYBOY — Você se sentiu discriminado lá dentro?


JEAN — Eu fui discriminado, fato, mas nada que já não tivesse vivido aqui fora. Nunca tinha acontecido, até então, de um candidato receber mais da metade dos votos da casa na primeira semana. Na primeira semana, assim? Ninguém te conhece ainda a ponto de odiar. Óbvio que votaram porque eu era gay, e perceberam que eu era um grande candidato. Um candidato com repertório. E tinha gente ali que já era profissional. Eu tinha uma intenção acadêmica, não via o programa regularmente. Eu dava aula à tarde e à noite, às vezes eu pegava o programa, às vezes não. Eu via o programa dessa perspectiva de uma curiosidade acadêmica. E essas pessoas estavam no programa procurando fama. Era outra relação.


PLAYBOY — Agora, você, melhor que todos nós, sabe que é um programa que trabalha estereótipos. E você era o gay...


JEAN — [Interrompendo.] Não, eu não era o gay! Se fosse o gay, não teria vencido o programa. Eu dei a oportunidade da construção de diferentes narrativas a meu respeito, e foi isso que me levou a vencer o programa. O fato de ser gay e produzir essas outras identificações foi muito bom para a comunidade gay em geral. Foi um combustível para esse público, porque eu era um homossexual produzindo um acréscimo de estima sobre a comunidade. Mas eu só ganhei o programa porque era o professor, o nordestino, tinha uma excelente relação com as mulheres, com as mães. Eu era inteligente, era intelectual, então as pessoas que não admitiam que assistiam ao programa passaram a assistir. O Roberto DaMatta, o Zuenir Ventura, o Renato Janine Ribeiro, grandes intelectuais deste país escreveram pela primeira vez sobre o Big Brother por causa da minha presença ali.


PLAYBOY — A Grazi Massafera ficou sua amiga lá dentro, e meses depois do BBB ela estrelou nossa edição de 30 anos, em agosto de 2005. Você viu o ensaio? Gostou?


JEAN — Não sei. É um ensaio comportadíssimo, parece mais um ensaio de moda do que um ensaio de PLAYBOY. É a minha avaliação. Acho até que a Grazi conduziu de uma maneira muito certa. Ela tinha cacife para isso. Continuou tendo, inclusive. Neste país, posar nua dá um glamour, mas tira do lugar de namoradinha do Brasil, onde Grazi estava quando saiu do BBB. E ela não perdeu isso. Ela nem mostra a xereca direito. [Risos.]


PLAYBOY — No BBB, em algum momento você teve medo do ridículo?


JEAN — Eu tive um medo só. Quando estamos vigiados na nossa intimidade, tem aspectos nossos que nos escapam, e eu tinha medo de revelar uma face minha que decepcionasse minha mãe, meus irmãos. Mas resolvi correr o risco. Mas do ridículo não, de jeito nenhum. Era muito seguro de mim, tinha 29 anos, professor universitário, arrimo de família, morava sozinho, tocava a vida. Já sabia lidar com a adversidade.


PLAYBOY — Oficialmente, há um deputado assumidamente homossexual, que é você. Extraoficialmente tem quantos?


JEAN — Alguns. Tem deputados que estão no armário. E não os estou condenando por estarem no armário. O armário também é uma estratégia de defesa. Fazer o outing é bom em todos os sentidos, porque viver com medo é viver pela metade. Mas cada um sabe onde o sapato lhe aperta o calo. Fazer o outing também é ser potencialmente vítima de violência, simbólica e real. Você pode levar uma lâmpada na cara na Avenida Paulista, ou ser espancado até a morte em uma rua. Então, não vou condenar alguém que se mantenha no armário.


PLAYBOY — Devem ser quantos os deputados no armário hoje?


JEAN — Não faço ideia. Mas tem. E as pessoas não deveriam tratar isso como piada. Acho que as pessoas devem sofrer por estar no armário e algumas delas podem até ter uma relação tensa comigo, porque uma pessoa que está no armário sempre acha que quem está fora do armário vai abrir a porta.


PLAYBOY — Você percebe isso?


JEAN — Um pouco. Mas jamais vou fazer isso. Eu só abriria a porta do armário de um canalha que estivesse publicamente condenando os homossexuais. Aí, sim. Para ele aprender. Ficar no armário é uma coisa, agora permanecer no armário, atacando os homossexuais, é outra. Isso eu jamais vou admitir.


PLAYBOY — Você apoiou a candidatura da presidente Dilma no segundo turno, em 2010, depois de eleito deputado federal. Esteve com ela nesses quatro anos?


JEAN — Deixe eu falar da Dilma. No segundo turno, o PSOL liberou o partido para votar em quem quisesse, mas vetou o voto no Serra. Ou seja... [Risos.] Eu falei: "Gente, por que não declaramos logo, abertamente, apoio à Dilma?" Eu não só votei na Dilma como a apoiei. Deliberadamente. Mesmo contrariando alguns setores do partido, porque acho que devemos ter responsabilidade. Tem horas que o partido precisa pensar de uma maneira mais republicana e ampla. Eu achava que a Dilma era a melhor opção naquele momento para o Brasil. Naquele momento, votei nela e fiz campanha para ela no segundo turno.



PLAYBOY — Está arrependido?


JEAN — [Pausa.] A Dilma me decepcionou em certos aspectos. Por ela ser mulher — e isso foi muito utilizado, "a primeira mulher a chegar na presidência da república" —, eu achava que essa marca de gênero faria diferença em relação aos governos Lula. E, para a minha surpresa, o Lula se mostrou mais à esquerda que a Dilma, digamos assim. Os governos Lula foram mais progressistas e mais atentos às minorias. A todas as minorias. Achei que o governo dela avançaria, e não avançou. Acho que ela recuou no aspecto dos direitos humanos das minorias. Acho que foi uma falha.


PLAYBOY — Você se decepcionou neste primeiro mandato como deputado federal?


JEAN — Muito pelo contrário. O que dizia na campanha e o que esperei na campanha aconteceu no meu mandato. Eu o conduzi e levei aonde esperava levar.


PLAYBOY — E os embates cornos deputados antagônicos aos seus pontos de vista, como Jair Bolsonaro [PP-RJ], Marco Feliciano [PSC-SP] e João Campos [PSDB-GO]?


JEAN — Tenho adversários que respeito e tenho inimigos políticos. Uns são adversários políticos. Os inimigos são aqueles que são paredes, que você não atravessa e com as quais não dialoga. Pois ao divergir de alguém e ser uma porta, há a possibilidade de uma abertura, mas há sujeitos que nem têm essa possibilidade de abertura. Esses são paredes e esses são inimigos. E com esses aí não tem diálogo. Eu não diria que o João Campos é uma parede. O Jair Bolsonaro eu considero uma parede e o Marco Feliciano eu nem tenho opinião sobre ele. [Risos.]


PLAYBOY — É possível conversar com eles durante a convivência na Câmara?


JEAN — Eu encontro com eles o tempo todo, mas não converso. Eu não converso com um cara desses. Eu não converso com um cara que me chama de veado, escroto. Eu não converso, não tem conversa com uma pessoa dessa. Não tem conversa com uma pessoa que empurra uma mulher e a chama de vagabunda. Não tem conversa com quem cria um sistema de difamação na internet contra mim. Mas essas duas pessoas são exceções nas minhas relações e exceção inclusive no próprio parlamento. Não acho que eu deva dar muita importância.


PLAYBOY — O PSOL nasceu depois do escândalo do Mensalão. Sob essa perspectiva, o ministro Joaquim Barbosa é um herói? Um homem que você admira?


JEAN — Ele é um ministro do Supremo Tribunal Federal, que é falível. Admiro a história do Joaquim Barbosa. Admiro as pessoas que venceram adversidades, que tinham tudo para não acontecer e aconteceram. Lula é um caso desses. Eu sou um caso desses. Joaquim Barbosa também. Mas não acho que ele seja um herói nacional e não acho, necessariamente, que ele venha agindo com justiça.


PLAYBOY — Como um homem politizado e com formação de esquerda, José Dirceu e José Genoíno eram pessoas que você lia, admirava, acompanhava?


JEAN — A história do José Genoíno e a história do José Dirceu na esquerda são incontestáveis. As lutas desses homens contra a ditadura militar são memoráveis. Os erros cometidos por eles não apagam nem obliteram as lutas de ambos. Tratar o Mensalão como o maior escândalo da história do país, como a imprensa tentou fazer, tentar dizer que a corrupção é propriedade do PT, isso é desonestidade intelectual. Todos sabemos e a própria imprensa noticiou à época a compra de lotes de deputados para garantir a reeleição [de Fernando Henrique Cardoso, em 1998]. Não podemos esquecer o esquema de corrupção montado pelo Carlinhos Cachoeira. Quando a gente falar de corrupção, que gangrena as estruturas públicas no Brasil, não podemos dizer que ela é própria do PT. Ainda que a corrupção, como um câncer, tenha se espalhado pelo governo do PT, infelizmente, e talvez isso tenha decepcionado as pessoas, porque depositávamos esperança nesse governo. Mas não é exclusividade dele.


PLAYBOY — A corrupção não é exclusividade do PT e o Mensalão pode não ser o maior escândalo de corrupção da história do Brasil. Mas não é exemplar que essas pessoas estejam presas?


JEAN — Acho que é exemplar que elas tenham sido punidas, mas não acho que elas precisavam estar presas. Acho que elas poderiam ter recebido multas. Acho que poderiam ter penas alternativas, socioeducativas. Sou uma pessoa que defende o direito penal mínimo. Sou a favor de medidas socioeducativas para crimes que não sejam contra a vida, como crimes hediondos, sequestros e torturas. Psicopatas e sociopatas podem e devem estar encarcerados porque são ameaças à coletividade. Mas essas pessoas não são. Todos tinham uma responsabilidade pública e todos deveriam ser punidos, mas estou falando da natureza da pena. Por outro lado, eu fico pensando que somos um país que sempre encarcerou os pobres.


PLAYBOY — Nesse sentido que pergunto se não é simbólico.


JEAN — É simbólico que os crimes de colarinho branco levem para a cadeia. Por outro lado, eu defendo amplamente, não apenas para essas pessoas, mas para todos, que o direito penal seja mínimo. Que a prisão como pena seja aplicada apenas nos casos em que a pessoa é uma ameaça à vida dos indivíduos. Mas crimes contra propriedade, dos pequenos ladrões e mesmo esses crimes do colarinho branco, sou muito mais a favor que o Estado tirasse tudo da pessoa. Que devolvesse tudo aos cofres públicos para ser aplicado em políticas públicas, reparando os danos que o roubo causou, muito mais do que a prisão. Acho que o bolso pune muito mais do que a prisão. A prisão dessas pessoas foi simbólica, mas temos outros corruptos que estão livres. Mas a punição tem que haver. E acho que é um erro ficar negando, tem que fazer essa mea culpa.


PLAYBOY — A descriminalização da maconha é um tema sobre o qual você já escreveu a respeito na imprensa e é autor de um projeto de lei na Câmara. Você já experimentou maconha?


JEAN — Experimentei. Das drogas ilícitas, só experimentei maconha. Não cheguei a ter uma relação, só experimentei na época da faculdade, que até a chamavam de "faconha", pela incidência de usuários. Então, essa foi a minha relação com a maconha do ponto de vista do uso. Do ponto de vista intelectual, de compreender o impacto da maconha na saúde e o impacto da política de drogas, a política de repressão à maconha, foi como jornalista. Como repórter, cobrindo a realidade de Salvador, sobretudo a realidade das periferias da cidade.


PLAYBOY — Sua experiência como usuário foi boa?


JEAN — Foi ótima. Só não uso mais porque é ilegal, eu estaria sendo irresponsável. E não quero comprar maconha "manchada", podemos dizer assim.


PLAYBOY — Se fosse legal você usaria?


JEAN — Usaria. Faria uso recreativo, naturalmente.


PLAYBOY — Você teve medo de experimentar outras drogas?


JEAN — Não tive medo, mas não tive vontade. Oportunidade eu tive. Nada de julgamento moral, nem medo. Não tive vontade. E você tem que fazer as coisas quanto tem vontade.


PLAYBOY — Você cita em uma entrevista que usa álcool de forma recreativa. Você teve um pai alcoólatra. Nunca tomou um porre de cair?


JEAN — O único porre de cair na vida que tomei foi em cadeia nacional, no Big Brother. Depois disso, nunca mais. Curioso, pois só fui usar álcool recreativamente depois da morte do meu pai. Enquanto meu pai era vivo, eu só tomava refrigerante. Ele faleceu em 2001. Tive essa experiência com a maconha na faculdade e, em 2005, tive o meu primeiro porre, logo em cadeia nacional. Faço uso moderado do álcool, porque não gosto do mal-estar que ele provoca quando você excede o seu uso. Dá tontura, ânsia de vômito, e vomitar é uma coisa horrível. Quer dizer, o corpo faz todo um movimento involuntário para jogar para fora, quando o movimento normal é que jogue para dentro, para que a gente engula. É horrível, não gosto da experiência. Me dá tontura. Não me dá bem-estar. Então, vou bebendo e quando percebo que cheguei ao ponto em que estou bacana, que o álcool já me deu um bem-estar, um prazer, eu paro e tomo uma água.


PLAYBOY — Você fala pouco no seu pai. Foi muito difícil para um homem com baixa escolaridade no interior da Bahia ter um filho que se assumiu gay aos 16 anos?


JEAN — Olha, eu não falei pra ele. Eu falei para os meus irmãos e para a minha mãe. Com o meu pai eu nunca tive uma conversa aberta sobre a minha homossexualidade.


PLAYBOY — Ele soube por causa deles?


JEAN — Não sei se ele chegou a saber. Acho que ninguém contou para ele. Ele soube porque pai e mãe são sempre os primeiros a saber, e os últimos a acreditar. Mas nunca tive essa conversa com meu pai. Desde que eu me entendo por gente, a minha relação com ele não era uma relação muito boa. Nos primeiros momentos da minha vida ele não teve uma relação afetuosa como ele tinha, por exemplo, com o meu irmão, no que eu posso inferir que era por causa da minha homossexualidade. Quando criança, eu gostava de coisas de menina. Eu não me comportava como os outros meninos.


PLAYBOY — Você brincava de boneca, por exemplo?


JEAN — Eu gostava das bonecas das minhas irmãs. Eu gostava de viver vestido, de camisa. Eu andava calçado, mesmo com as sandálias remendadas com grampos de cabelo, porque a gente era muito pobre. Então, por não me enquadrar nesse papel de gênero, eu sofri uma rejeição. Um pouco do afastamento do meu pai em relação a mim se deu por causa disso. Para um homem educado em uma cultura machista, como a em que ele foi educado, ter um filho assim não era uma coisa bacana. Então aí, por conta disso, eu desenvolvi com meu pai uma relação sempre tensa, e isso junto com o alcoolismo dele. Eu lembro de a gente esperando ele em casa, esperando alguma coisa para comer, e ele chegava sem nada, bêbado. Fui o primeiro filho a bater de frente com ele. O primeiro a discutir e reclamar porque ele chegava bêbado, reclamar porque a gente tinha que buscá-lo bêbado nas vendas. Eu mantive uma distância do meu pai.


PLAYBOY — Vocês chegaram a se aproximar antes da morte dele?


JEAN — Em 2000, eu tinha voltado para Alagoinhas para visitar minha mãe, acho que era um Natal, e quando cheguei em casa ele estava doente. Ele estava havia uma semana de cama, com uma gripe. Tinha ido ao médico, e minha mãe falou: "Seu pai está sem beber". Ele não bebia havia uma semana, porque estava doente, tinha ido a um hospital público em Alagoinhas e o médico passou um anti-inflamatório, uma coisa assim. Eu vi que ele estava com um caroço no pescoço. Fui olhar e falei para a minha mãe: "A gente vai ter que levá-lo para Salvador para fazer um exame melhor". Ele fez o exame e lembro que quando fui para Salvador com ele, eu não tinha carro, ele foi sentado ao meu lado no banco do ônibus. De repente, eu olhei para ele e pensei: "Meu Deus, que abismo me separa desse homem". A partir dali, começou um processo de perdão. Um perdão silencioso, tácito, entre nós dois, eu e ele. O diagnóstico do exame foi um câncer na base da língua. E, daquele momento, foram nove meses até ele morrer. E para mim isso foi muito duro, porque durante esses nove meses, a gente se redescobriu como pai e filho, sabe? [Chora.]


PLAYBOY — Pelo menos ele morreu em paz com você...


JEAN — Sim. E ele sempre soube [da orientação sexual]. Ele sabia. Eu já tinha inclusive levado namorado em casa. É claro que eu não apresentei como namorado para ele, mas é claro que ele sabia. E ele morreu com muito orgulho de mim, embora fosse um homem muito de direita.. [Risos]


PLAYBOY — Eleitor do Feliciano?


JEAN — Não chegava a ser eleitor do Feliciano, mas era eleitor do Antonio Carlos Magalhães. [Risos.] Eu lembro que Gilberto Gil, naquele disco Realce [1979], aparecia de trança, com umas contas de búzio no cabelo, e o meu pai falava: "Preto que se respeita não se veste desse jeito". [Risos] Ele tinha introjetado o racismo. Ele tinha essas coisas assim. Eu lembro que, durante a eleição de 1989, eu e meus irmãos estávamos bastante envolvidos com a pastoral da igreja católica, onde o PT tinha uma presença muito forte. Nós não tínhamos idade para votar ainda, mas estávamos muito envolvidos na eleição de Lula, e meu pai era Collor. Rapaz, como a gente brigava... Desde o primeiro turno!


PLAYBOY — Vocês passaram fome?


JEAN — Muita.


PLAYBOY — Que memória que você tem disso?


JEAN — A de não fazer refeição nenhuma. De só fazer uma refeição porque foi dada comida para a gente. Muitas vezes. De ir para escola com fome, eu e meu irmão. Era muito comum na escola onde a gente estudava os meninos desmaiarem de fome. Eu e George, meu irmão, vimos vários colegas nossos desmaiarem de fome, ou serem levados porque estavam tontos, e estava claro que aquelas pessoas estavam passando fome, assim como a gente. Então desde cedo pesou sobre a gente essa responsabilidade de ter de trabalhar, ter de se virar.


PLAYBOY — Você lembra de ter sentido dor física?


JEAN — A fome, uma hora, morre no corpo. Tem uma curva em que você não sente mais fome. Você sente aquele buraco no estômago, e a gente às vezes ia dormir com fome. Mas uma hora passava.


PLAYBOY — Dos seis irmãos, uma morreu. Você chegou a conhecê-la?


JEAN — Não. Ela nasceu em 1973 e eu, em 1974. Ela morreu de febre. Morreu cedo. E eu tive uma profunda desnutrição, uma disenteria seguida de desnutrição quando bebê, e fui dado como morto. Quer dizer, mamãe achou que eu estava morto, falou com meu pai que eu tinha morrido, e ele saiu para comprar caixão para mim. Eu era pagão, não tinha sido batizado ainda, e minha mãe chamou dois vizinhos para me darem umas palavras de batismo, para que eu não morresse pagão. Não lembro quantos meses tinha, era menos de um ano. Minha mãe disse que, quando puseram a vela na minha mão, a cera caiu e eu reagi. E chorei. Eu estava vivo.


PLAYBOY — Um milagre?


JEAN — Não, foi só um engano.

PLAYBOY — Falando em milagre, você passou parte da sua vida na Igreja Católica, e cristãos de diferentes matizes costumam crer que Deus não aceita, ou condena, a sua orientação sexual.


JEAN — Nem todos os cristãos.


PLAYBOY — Boa par te deles.


JEAN — Você poderia dizer que boa parte deles, mas não todos.


PLAYBOY — Você acha que Deus está com você independentemente disso? Por exemplo, quando você está sozinho em casa, você pede a Deus? Ele é presente na sua vida?


JEAN — Sim. Deus é presente na minha vida. A minha concepção de Deus não é esse Deus masculino, forjado pelo judaico-cristianismo no nosso imaginário. Deus para mim são os mistérios. Deus para mim é aquilo que a razão humana não explica. Deus para mim é um princípio, uma energia feminina, masculina. Uma energia inspiradora, criadora. A energia das artes, da inspiração artística. A energia do transe, do êxtase. Isso para mim é Deus. E na relação com esse Deus, a minha homossexualidade não é julgada, não é condenada, não é dita como errada.


PLAYBOY — Mas esse é aquele mesmo personagem que mandou o filho à Terra, que salvou Maria Madalena?


JEAN — [Silêncio.] É... De certa forma, é o mesmo. Acho que Jesus, aquele que é considerado Cristo, o revolucionário palestino, acreditava em um Deus que era judaico. O Deus da Judeia. Mas Jesus já tinha sacado essa compreensão quando ele falava do Deus amor. Era um homem que não podia fugir dos limites da sua ética, e os profetas da religião dele, que era o judaísmo, representavam esse Deus com uma face masculina bélica. Ele não podia fugir disso, mas já compreendia que Deus tinha um outro sentido quando ampliava a ideia do amor e do perdão. Esse Deus que ele pregava já não era aquele Deus vingativo. Já não era o Deus que conduziu Josué na batalha de Jericó, que mandou passar no fio da espada os inimigos. Esse Deus já era um Deus do amor. Um Deus do perdão.


POR JARDEL SEBBA

FOTOS ANDRÉ VALENTIM


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1 commento


Ademar Amâncio
Ademar Amâncio
28 mag

Muito boa a entrevista,mas tenho de fazer certas correções,ele não se enquadra na categoria homossexual,é bissexual convicto,e também discordo dessa 'completude' entre homens,a gente,o passivo,só sente dor e nada mais,intestino não é órgão sexual,enquanto o ativo (que geralmente é o hétero) só serve pra sujar o pênis e o lençol de fezes - Reencarnar gay é o pior carma do mundo,não consigo viver de mentira.

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