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PAULO CÉSAR PEREIO | JULHO, 2006

Playboy Entrevista

Uma conversa franca com o ator mais maldito do Brasil sobre cocaína, cinema brasileiro, prisões, frustração com o governo Lula, Viagra e as mulheres maravilhosas que ele (não) pegou.


Ele desempenhou papel funda­mental na história do cinema nacional e teve em seus braços as atrizes mais gostosas, como So­fia Braga, Kate Lira e Vera Fischer. Mas está longe de viver do passado. O ator gaúcho Paulo César de Campos Velho, cujo sobrenome Pereio foi in­ventado por causa de uma pronúncia errada na infância, está mais vivo do que nunca — como entrevistador, no Sem Frescura, do Canal Brasil, ou na reunião dos depoimentos de amigos e desafetos no documentário Pereio Eu te Odeio, em fase de produção. Recentemente, participou de Árido Movie, do diretor Lírio Ferreira. Em 2007, vai completar 50 anos de carreira com um livro com seus escritos, Vale Somen­te a Escrita, que será lançado pela Edi­tora do Bispo, e uma mostra com os mais importantes dentre os mais de 40 longas-metragens em que atuou.


Mas quem entra desavisado no apartamento onde o ator mora, no centro de São Paulo, ou "nas vísceras da bes­ta", como ele gosta de definir, há de duvidar de tantas proezas. Não há lem­brança. Nenhuma foto, prêmio, nem um mísero DVD de algum de seus filmes. Ele confessa que até sente um pouco de nostalgia, mas espera pas­sar na televisão algum filme seu, e es­tá resolvido. Quanto aos prêmios, é bronca mesmo. “Prêmio é fragmen­tador. O Kikito é horrível, uma bun­da na frente e outra atrás. O Candango eu dei para uma amiga minha ba­ter no namorado.” Ele garante que todo o material do passado está com a Lara Velho, sua primeira filha, que controla sua agenda e é diretora do seu programa de televisão. "E ainda me livra de casar de novo, porque me faz companhia e organiza a minha vida", brinca.


Pereio foi casado três vezes. Primeiro com a atriz Neila Tavares, mãe de Lara, hoje com 33 anos. Da relação mais famosa, com a global Cissa Gui­marães, nasceram Tomás, hoje com 27 anos, e João, com 22. Finalmente, de seu casamento com Suzana César de Andrade, que não é do meio artís­tico, nasceu Gabriel, há 14 anos. Ho­je, sua base de operações é a Toca da Raposa um boteco pé-sujo de primei­ra colado ao prédio onde ele mora e onde se reúnem seus amigos, os mo­toristas que o levam para onde preci­sa. É lá que, dependendo do seu hu­mor, ele toma um café ou um uísque pela manhã. “E eles ainda servem uma rabada imperdível às terças-feiras”, completa. Às vésperas de completar 66 anos, este senhor de gestos intempestivos e voz inconfundível (que rei­na absoluta até hoje em narrações de filmes e comerciais) viveu os mais variados tipos, mas nenhum que te­nha ofuscado o personagem Pereio (a começar por esse sobrenome, in­ventado), que teve uma vida de fazer inveja a qualquer autor de dramaturgia. Casou com Cissa Guimarães quan­do ela, 17 anos mais jovem, ainda era menor de idade. "Ela me seduziu", ele garante. Essa união rendeu, além dos dois filhos, uma prisão, por falta de pagamento de pensão alimentícia. Fo­ram oito dias em cana, mas nada que Pereio já não conhecesse. Entre bri­gas em sets de filmagens, uma hones­tidade mordaz sobre seus colegas e um relacionamento longo, tortuoso e público com a cocaína, ele se firmou como um dos mais malditos artistas brasileiros.


Para a entrevista de PLAYBOY, Pe­reio recebeu o editor Jardel Sebba na Toca da Raposa por duas vezes, am­bas de manhã bem cedo, antes de su­bir até o quintal de seu amplo e con­fuso apartamento térreo. Na primei­ra, com um uísque; na segunda com um café. Na primeira, estava agitado, preocupado com uma viagem ao Rio que havia acabado de ser desmarca­da, fumando um cigarro atrás do ou­tro. Demorou a se sentir confortável. Na segunda, a do café, ele já havia comprado e lido o jornal e, bem mais tranquilo, quis acompanhar um pe­daço do jogo Inglaterra x Paraguai na Toca, antes de subir para a entrevista. "Eu torço pela Argentina", cochichou. Tem até explicação: ele nasceu na ci­dade gaúcha de Alegrete, na frontei­ra com o país de Carlitos Tevez. Mas a melhor maneira de entender sua tor­cida é perceber que, quando se trata de Paulo César Pereio, nada pode ser óbvio. Seu bordão, "porra", que serve quase como vírgula para suas frases, foi repetido 67 vezes ao longo de mais de cinco horas de conversa. Alguns deles você confere aqui.


PLAYBOY — Você contracenou em cenas quentes com algumas das mulheres mais gostosas do Brasil: Vera Fischer, Sonia Braga, Vera Gimenez, todas no auge. E sempre disse que não comeu nenhuma delas. Que história é essa?


PAULO CÉSAR PEREIO — Nunca comi mulher nenhuma por ela ter feito uma cena comigo. Nunca caí nessa armadilha banal, imbecil. Não seria por isso que eu comeria uma mulher, seria falta de respeito consigo. Eu reverencio essas mulheres, não as jogo no lixo. Não ti­rei casquinha, acho que a coisa fun­ciona de outra maneira. E quando fiz Eu te Amo [com Vera Fischer e Sonia Bra­ga] , estava apaixonadíssimo pela Cis­sa. Porra, estou apaixonado por uma mulher e vou comer outra porque tive a chance?


PLAYBOY — E hoje, você está namorando?


PEREIO — Não, acabo de sair de uma rela­ção muito boa, muito confortável. Só entrei em pânico porque a moça que­ria casar e ter filhos. Era uma namorada muito legal e, quando terminou, me senti me devendo um pouco, sa­be? Não era muito convencional, ela tinha a casa dela, o carro dela, a vida dela, e eu a minha.


PLAYBOY — Você está sexualmente abstê­mio atualmente?

PEREIO — Não, eu tenho visitas. Tenho uma vida sexual regular. Sexo é fun­damental, sempre foi. Com 15, 16 anos eu batia p(*)ta o dia inteiro. Com a idade fica menos impositivo. Com o tempo você dá mais valor ao carinho, não tem tanta urgência em ejacular, sabe segurar, pensa também na parceira. Até porque a coisa é reflexiva.


PLAYBOY — Então você ainda tem noite, álcool e mulheres no cotidiano?

PEREIO — É parecido com a coisa de estar no palco e gostar de estar no palco. Fui um grande jogador de sinuca, por exemplo. Enjoei uma época, meu jo­go caiu, mas agora jogo sempre, pela volúpia de jogar. De festa eu não gos­to muito, vou a certos lugares, mas pre­firo ir sozinho. Inclusive ando sozinho no meio da p(*)ria. Agora quero fre­quentar um salão de barbeiro que é 24 horas, cuja clientela é quase toda de travecos, p(*) e cafetões. Me sinto em casa. Tem muito marginal, em to­dos os sentidos, econômico, social, que me reconhece, fala: "Olha lá o Pereio". E eu lido bem com isso. Ge­ralmente é chato, mas você tem de aprender a lidar com isso.

PLAYBOY — Ainda exerce o poder de sedu­ção nessas noitadas?


PEREIO — Sim, eu até falei para uma ami­ga minha que nem precisava f(*), só estar ali com uma moça, um bom vi­nho, soltar alguns galanteios, a moça ficar a fim. Isso eu curto. Eu me satis­faço com a coisa em si.

PLAYBOY — Mas chega junto?


PEREIO — Sim, mas não estou mais muito objetivo. Curto mais a circunstância, o jogo em si. Mas também não tem acontecido muito de uma pessoa me atrair, tem sido mais raro.


PLAYBOY — Por que você ficou mais exigen­te ou por que a libido está baixando?


PEREIO — Não é que estabeleça critérios, fico sempre pronto para acontecer. Não tem acontecido muito. Ou tem acontecido na medida certa. Tomo iniciativa, mas sempre valorizo o im­proviso. Estou mais sossegado, tenho mais fé no meu taco. E preciso me­nos de sexo.


PLAYBOY — E isso é bom ou ruim?


PEREIO — Eu acho bom. Teve um perío­do da minha vida que, p(*) que pa­riu, o pau mandava mais que tudo. Já aconteceu cada coisa...

PLAYBOY — Já experimentou remédio con­tra impotência?

PEREIO — Já, o Viagra, o Cialis e o Levitra. Por indução da namorada, aquela coi­sa de vamos lá agora. Esse Levitra dá um surto de paudurescência razoável.

PLAYBOY — Você passou a década de 90 lon­ge da mídia. Isso mexeu com a sua cabeça de alguma forma?


PEREIO — Não, porque na verdade eu que fugi, estava muito drogado. Achei que tinha de cair fora, então fui para Goiás, para uma cidadezinha pequena, lon­ge de tudo, que não tinha nem caixa de banco. Apaixonei-me por aquele lugar, pagava 70 reais de aluguel nu­ma casinha com pomar, e estava a 90 quilômetros do aeroporto. Cobra­va 4 mil reais por uma locução, fazia e voltava para lá para viver como um rei por um bom tempo. Até juntei gra­na. Porque onde eu morava antes, bi­cho, era só sair de casa que caía algu­ma coisa na minha mão.


PLAYBOY — Foi fugir da tentação?


PEREIO — Da oportunidade. Os católicos falam muito da ocasião do pecado. Mas deixa eu te falar uma coisa sobre drogas. Se você tiver um bom canal, consegue qualquer coisa. Não preci­sa subir o morro, negociar com a po­lícia, nada disso. Tu anda por essas ruas aí, na rua Augusta, onde tem a vi­da alegre, chega a um botequim e o cara já te oferece alguma coisa. Quem quer dar um tequinho vai ali e dá, pronto. Tudo isso, inclusive o cigarro e o álcool, pede uma administração subjetiva, pessoal. Eu cheguei ao limi­te de muita coisa. Já tenho essa cultu­ra de mim mesmo, sei como funcio­na. Se tivesse desde o início me com­portado como um monge, teria hoje a saúde de 30 anos atrás, e estaria mi­lionário, com uma fortuna no bolso. O grande lance é atingir um equilí­brio. Não cheguei lá ainda, de vez em quando ainda piso na bola, escorrego, aí recebo os sinais do mundo exterior, da maneira como as pessoas me olham, das coisas que estou perdendo. E do meu mundo interior, de não conse­guir dormir uma noite, por exemplo. Encomendei esta bolinha [mostra um pote], uma anferamina, para poder be­ber mais. Podia tomar uma por dia. Uma vez tomei uma a mais, porque fiquei de porre ao meio-dia e queria tomar outro à noite, e passei dois dias bebendo água e vitamina. Aí faço a vi­gília, pago o preço e entro num pe­ríodo monástico.


PLAYBOY — Por quanto tempo você foi viciado em cocaína?

PEREIO — Eu emburaquei legal nos últimos dez anos de vício. A cocaína eu condeno. Me dou ao luxo de usar, ra­ramente quando não tenho nada para fazer. Se tenho de trabalhar no dia seguinte, não sou louco de fazer isso. Às vezes tem o sentido de abrir a válvula, destampar a panela um pouco, diminuir a pressão. Eu abro a válvula e depois volto para o monastério. Eu gosto de beber. Costumo dizer que não bebo socialmente, eu vomito so­cialmente. Quando bebo, não é pou­quinho, é bastante.

PLAYBOY — E faz m(*) quando bebe?

PEREIO — Quando bebia cachaça, fazia m(*). Agora não, estou velho.

PLAYBOY — Consegue quantificar quanto gastou em cocaína até hoje?

PEREIO — Não, mas já gastei muito. A boa era muito cara. Cheguei até a "cozinhar" uma vez, fazer a química toda. Veio a pasta de caminhão, lá de Co­rumbá, e eu tinha um amigo quími­co. Basta ter o éter industrial, mas eu não lembro mais as proporções. Pri­meiro botava o éter, depois a acetona, e quando jogava o ácido dava a rea­ção. Depois coava. Mas eu só fiz aos pouquinhos, jus for the fun of it...

PLAYBOY — Às vésperas dos 66 anos, você se sente velho? Tem medo de morrer?

PEREIO — Para fazer o Rei Lear, ainda preciso botar maquiagem, mas no futebol, por exemplo, Romarinho, com 40, já está velho. Quanto à mor­te, não tenho nenhum pânico. Se ti­vesse me comportado como um mon­ge, com uma educação perfeita, che­garia aos 100 anos tranquilamente, porque saúde é recuperação, e eu já me recuperei de muitas porradas. Es­tou meio gasto, isso sim. Acho que, se chegar até uns 80 anos, já está bom. Tive, em certos momentos, a volúpia da limiaridade. Cheguei à beirinha do precipício, mas foi só. E gosto de ser velho. Há certos limites, mas ser velho é bom. Conforme vou envelhecendo, vou gostando mais de mim. Vou me acostumando mais co­migo, curtindo meus hábitos. O que poderia é ter trabalhado melhor a minha voz, que é boa, mas está aca­bando. Ainda tem um salto, mas eu a estourei usando mal.

PLAYBOY — Por que aliar a carreira de ator à de entrevistador no Sem Frescura?

PEREIO — Houve uma reformulação no Canal Brasil, que estava indo para o buraco. O Paulo Mendonça, meu ami­go, assumiu o canal e me chamou. Ele teve a ideia do meu programa, e cha­mou também o Selton Mello, o Pau­lo Betti, a Angela Ro Ro. O programa do Selton se chama Tarja Preta. Acho que não tem ninguém no Brasil mais tarja preta do que eu. Então o Pauli­nho deu esse nome, Sem Frescura, pa­ra sacanear a Leda Nagle, que fazia o Sem Censura. Ela não gostou, parece, o que eu achei muito bom, porque nunca fui muito com a cara dela...


PLAYBOY — E o seu jeito esculachado de entrevistar dá audiência?


PEREIO — Quando dava entrevistas nos pro­gramas do Jô Soares e do Abujamra, eu percebi que todo cara que vinha me entrevistar estava brifado. Alguns até tinham uma equipe que ligava an­tes perguntando coisas da minha vi­da, para o cara meio que se proteger, já saber as coisas que ia falar. No pro­grama da Luciana Gimenez começa­ram a me perguntar sobre as entrevis­tas que eu havia dado e, em uma, eu disse que não casaria mais, se tivesse de fazer isso de novo seria com um ho­mem. Aí um cara só queria saber se eu pretendia dar o c(*) ou não! Fato é que conviver com homem é muito mais fácil que com mulher, mas não precisa f(*), claro. A Luciana me cen­surou, e eu expliquei a ela que a pala­vra vinha do latim, que significava cavucar, mas se ela quisesse eu poderia falar por elipse, estrangular o pele ver­melha, afogar o ganso, molhar o bis­coito. Aí ela perguntou o que era uma elipse... Teve uma opinião bacana, não lembro de quem, que dizia que o pro­grama do Pereio era bom porque era um troço que parecia que ia dar tudo errado e, no final, não dava errado. Mas em alguns momentos deu erra­do, sim. Teve um cara que eu come­cei a enjoar dele no meio da conver­sa. Eu olhava para a terceira câmera e fazia aquela cara de "porra, que saco". Na entrevista do [Ivald] Granato, eu dormi.

PLAYBOY — O cara do enjôo era chato?


PEREIO — Não, ele tem até um trabalho bacana, faz uns bonequinhos. Mas sei lá, fui enjoando do cara. Olhei para a câmera e fiz cara de quem estava en­joado mesmo. Quando dormi, foi por­que me deu a lombra. Por causa dis­so, nos dias de gravação, a Lara me proibiu de almoçar. Eu adoro o Gra­nato, está cheio de coisas dele aqui em casa, mas foi lombra mesmo, ele esta­va falando e eu apaguei. E foi pro ar, o cara falando e eu lombrado. A personalidade que quis dar ao meu programa era o inverso do normal, era arriscar o erro o tempo todo. Acho que foi isso que deu audiência. Dar chance ao entrevistado de dizer coi­sas que eu não sei. Pensei numa frase para cunhar uma característica do programa, que era: "O erro é Deus". Sabe uma coisa naquele estilo "Deus é fiel"? Pensei também em criar uma frase desse mesmo tipo dizendo: "O cão é fiel". Que porra é esta de que Deus é fiel? Isso é coisa de quem não acredita em Deus...

PLAYBOY — Você acredita?

PEREIO — Não acredito em nada. Tenho formação católica, nasci numa famí­lia católica, e muito novo devo ter ti­do um período místico. Mas ouvia fa­lar em santos que levitavam, e eu que­ria e não levitava porra nenhuma. Não acredito em nada.

PLAYBOY — Mas frequentou a umbanda...

PEREIO — É porque eu nunca tive uma mu­lher que não fosse macumbeira ou fis­surada em alguma religião. A Neila Tavares estava envolvida com isso e por causa dela diziam que eu era mé­dium, então botei roupa branca e fui a um terreiro, mas foi um vexame. Eu não sinto nada, tenho até um pouco de inveja de quem sente aqueles tran­ses. Fomos numa reunião em Jacare­paguá, e resolvi fingir. Mas baixou um santo que não era para pintar, um pre­to velho que mandava, e já tinha ou­tra mandando lá, e só podia ter um que manda. Eu quase propus uma dis­sidência, e pintou um clima ruim. Eu inventei um preto velho que não fala­va, só enrolava folha de guiné e tinha uma perna. A Neila recebeu uma pe­na, e o pessoal do centro avisou que era melhor ela não voltar mais lá. Ou seja, deu m(*).

PLAYBOY — Você mora sozinho. Sente-se um homem sozinho hoje?

PEREIO — Não, eu tenho uma certa roti­na. Compro jornal de manhã, tomo uma vitamina de frutas, porque estou querendo emagrecer. Faço o meu ma­carrãozinho ao pomodoro com o mo­lho que compro ali na padaria Eu gos­to de cozinhar, me acalma, e sempre busco novos gostos. Isso só veio com a idade, eu não tinha a mínima idéia nem de como fervia água, mas aos poucos peguei gosto e comecei a me obstinar. Gosto de ficar o dia inteiro em casa, leio pra c(*), adoro ver os noticiários da televisão. Às vezes saio à noite, mas não muito. Não gosto mui­to de receber nem empregada. Tem uma senhora que vem uma vez por semana e deixa as coisas em ordem, e eu procuro manter essa ordem.

PLAYBOY — Você vai ganhar um documen­tário, o Pereio Eu te Odeio. Muita gen­te já te esculhambou nas gravações?

PEREIO — A ideia do documentário, que foi minha, surgiu para botar as pes­soas me esculhambando oficialmen­te. E é engraçado porque houve uma resposta negando financiamento que falava em nome do respeito ao mito Pereio, do cinema e das artes brasi­leiras, que queriam sacanear com aquele projeto. Mas a ideia foi minha! Não sei quem já gravou depoimento. Parece que teve uma empregada que me esculachou legal. Falou aquelas m(*) domésticas, de chegar bêbado em casa e quebrar a porta. O que aconteceu foi que o casamento com a Cissa deu certo uma época, depois não mais. E mais tarde a separação não deu certo, a gente estava separa­do e morria de tesão. Esse foi o pior período. E nessa fase o que aconte­ceu de m(*) não está no gibi, de ela trancar a porta da casa, eu ir lá e que­brar a porta na porrada. Sou um ca­ra muito performático, hooligan mes­mo. O que já me quebrei todo de porrada não é brincadeira. Já bati e apanhei muito, acho que apanhei mais do que bati. Não sei brigar.


PLAYBOY — Já bateu em alguém famoso, além do diretor lpojuca Pontes, naque­le entrevero no Festival de Gramado, em 1979?

PEREIO — O Ipojuca Pontes sempre foi um Ipojegue. Sofria de todos os sintomas da síndrome da burrice, e era cãozi­nho da Tereza Rachel, que, por sua vez, era uma pessoa detestável. Eu não sou bom de briga, mas tenho impul­sos de avançar, de quebrar tudo. Em geral me f (*). Poucos dias atrás fiz uma m(*). Um cara organizou um livro que era uma coletânea de textos e pediu para que eu lesse um trecho num recital junto com outras pessoas. Preparei uma coisa legal, esperei a mi­nha vez e fiz uma performance. Le­vantei a bola, botei uma puta azeito­na na empada do cara. Depois teve uma comemoração num restaurante japonês, e eu nem queria ir, mas fui. Lá, o cara começou a implicar comi­go. Quando perguntei da grana que ele tinha me prometido pelo traba­lho, ele continuou me cortando. Eu falei que, se a mãe dele não o tinha educado, que ele receberia educação na cadeia. Ele me mandou tomar no (*). Eu falei que era no (*) da mãe dele, e nessa hora me tiraram de lá. A porta do restaurante era fina, eu de­tonei ela. Isso faz uma semana. Para você ver que eu ainda faço m (*).

PLAYBOY — Isso tudo contribui para uma certa mitologia do personagem Pereio, que você parece gostar de cultivar...

PEREIO — Por isso que não sou muito de outros personagens, acho que a mi­nha pessoa é mais interessante que qualquer personagem. Repito o Pereio porque ele é um cara performático. E o meu texto é, frequentemente, melhor que os textos que me dão.

PLAYBOY — Mas você não teve medo de ser esquecido nesse tempo?

PEREIO — Não, justamente porque o que fez diferença foi que construí muito bem essa mitologia. Foi uma coisa mais ou menos pensada. Existem normas de comportamento para vencer na vi­da, como decorar texto direitinho, e eu não consigo decorar texto que eu não gosto. O verbo decorar tem a ver com coração, em inglês é by heart. Exis­te um regulamento para o sujeito que quer construir uma carreira, e eu nun­ca me comportei segundo ele.

PLAYBOY — Mas essa mitologia mais aju­dou ou atrapalhou?

PEREIO — Não sei, mas serviu para que pu­desse ficar três, quatro anos fora de combate e não ser esquecido. Decla­ro sinceramente que o reconhecimen­to nunca me serviu, sempre gostei mais do exercício da arte dramática, de uma busca minha, pessoal, do que do aplauso. A minha grande volúpia sempre foi estar no palco, nunca a de receber crítica favorável.

PLAYBOY — Mas a Sonia Braga já declarou que, no fundo, você é um fofo.

PEREIO — É uma boa jogada, né? Não sou cafajeste, de jeito nenhum. Mas até que é uma estratégia interessante. Ci­tando Maquiavel, "o mau inteirinho e de uma vez só, e o bem aos poucos, em doses homeopáticas". Essa mito­logia do machão é um troço esquisi­to. Você sabe muito bem que, quan­do está a fim de uma mulher, não a ganha coçando o saco ou escarrando. A minha maneira de não ser um su­jeito escroto é cultivar um sofisticadíssimo senso de escrotidão. Interior­mente, não tenho nenhuma rigidez afetiva, pelo contrário, tenho até uma certa obesidade afetiva. Talvez essa ri­gidez que passo seja uma espécie de filtro para também não ficar aberto a qualquer um que chega. Eu sou com­posto de uma grande fragilidade.

PLAYBOY — Mas perdeu trabalhos por causa da mitologia?

PEREIO — Sim, mas, por outro lado, me livrou de fazer coisas que não queria. Por exemplo, se você está duro e te oferecem uma nota que vai quebrar um galhão para fazer algo que você não quer, é bem possível que você acei­te. Já me ofereceram muita coisa. A assessoria de relações públicas da Presidência da República queria que eu fizesse anúncios, em março de 1974, cuja assinatura era "março, dez anos construindo o Brasil". Fiquei a fim pra c(*) , mas não dava. Teve ou­tra que queriam que fosse Papai Noel num outdoor. Também não dava.

PLAYBOY — Você foi fiel nos casamentos?

PEREIO — Quando era mais guri, não era exatamente infiel, mas tinha tesão em muitas mulheres.

PLAYBOY — E celebrava os atos?

PEREIO — Na medida do possível. Mas não era infidelidade. É que fidelidade não estava no contrato. Só com a maturi­dade que comecei a achar que isso era um bom negócio. Que, numa relação, é possível cultivar uma certa unidade. Eu tenho uma tendência mimética, se começar a andar com jogador de fu­tebol, daqui a pouco estou de chutei­ra; se começara fazer teatro com uma turma tal, eu dou uma certa aboiola­da. Por isso, dedico minha vida a cul­tivar a minha unidade.

PLAYBOY — Essa unidade chegou tarde?

PEREIO — Chegou quando comecei a cul­tivar a sabedoria. Casei pela primeira vez aos 19 anos, e esse casamento não durou nada. Ela estava grávida e, mes­mo depois de casada, quis tirar o fi­lho. Foi traumático pra c(*). Eu não queria, mas para ela era importante, e por razões um pouco fúteis, tipo "ah, o que os outros vão falar...".

PLAYBOY — Esse aborto teve algum reflexo na sua vida?

PEREIO — Só numa relação muito tempo depois, com uma moça que tentou ter filhos, mas já havia feito vários abor­tos. Ela fez todos os exames e não ha­via nada que indicasse que ela não poderia ter filhos novamente, então se levantou uma suspeita a meu res­peito. O que bati de p(*)ta em laboratório... É uma situação meio esqui­sita, você chega lá, a moça te dá um frasquinho, te indica um banheirinho. Tive de fazer isso três vezes, até levei uma PLAYBOY uma vez, vocês me que­braram um galhão. Era uma america­na, não era nenhuma mulher conhe­cida. O Tarso de Castro [fundador do Pasquim] dizia que bom mesmo era tocar p(*)ta para mulher conhecida. Nós éramos muito amigos, moramos juntos, depois ele teve de fugir para o Uruguai e o Gabeira veio morar comigo. O Gabeira é um grande bra­sileiro, é o meu mentor político.

PLAYBOY — Mas você já havia sido militan­te do Partidão, ou seja, sua relação com a esquerda é antiga, certo?

PEREIO — Quando eu era guri. Eu era ro­mântico, sabe? Ia nas reuniões, mas não prestava muita atenção. Ia para comer as mulherzinhas, porque as co­munistas davam. Fui membro do Par­tidão, assinei ficha, e fui filiado ao PDT também, tinha uma relação com o Bri­zola desde a Cadeia da Legalidade.

PLAYBOY — Continua sendo de esquerda?

PEREIO — Estou pensando em criar um partido, o Partido Ígneo, PI. Ígneo, de fogo, pela preservação dos vulcões. É ótimo porque não precisa fazer nada, nem pode chegar perto.

PLAYBOY — É uma forma irônica de se declarar frustrado com a esquerda?

PEREIO — Apesar de ser de esquerda, eu sempre acreditei em certos teóricos capitalistas. O esquerdismo radical é uma maneira de não pensar. Ideolo­gia, na minha opinião, é falsa cons­ciência. Prefiro sempre pensar por mim mesmo. Hoje consigo formular isso, mas medularmente sempre tive essas convicção. Bicho, pensa um pou­co: como fim do stalinismo muita gen­te ficou sem pai nem mãe. O último stalinista vivo é o Oscar Niemever. Mesmo um cara como o [José] Dirceu é acusado de stalinista como defeito, de forma pejorativa.

PLAYBOY — Mas você votou no Lula?

PEREIO — Votei. Nunca havia ganho uma eleição na vida, essa foi a primeira. Meu primeiro voto foi no [Marechal Henrique] Lott, estava louco para vo­tar no Jânio [Quadros], mas naquele tempo eu era vassalo de Moscou e a ordem era votar no Lott. Fiquei um tempo sem votar em ninguém por pre­guiça, desinteresse. E nunca acreditei no Lula. A minha trajetória não é mui­to diferente da dele, nasci na frontei­ra com a Argentina e não fiz o primá­rio, me alfabetizei sozinho. Nunca gos­tei muito de estudar, mas sempre acreditei no conhecimento. Sempre li muito, inclusive com certa disciplina. Esse elogio à ignorância do Lula me é repugnante.

PLAYBOY — Então esse não foi um voto muito convicto?

PEREIO — Se tivesse prestado mais aten­ção, talvez não votasse nele. Eu fui em cana pelo rapto do [Charles] Elbrick [embaixador dos Estadas Unidos no Bra­sil em 1969], ou seja, o Dirceu deve a liberdade dele ao Gabeira e a mim. Fui preso na Operação Bandeirantes. Eu não percebi que o lance da qua­drilha era de poder. Bicho, nesse tem­po todo este país não foi governado.

PLAYBOY — Como chegaram a você na Operação Bandeirantes?

PEREIO — Os caras tinham meu telefone no aparelho, eles me achavam meio porra-louca, mas confiavam em mim. Eu também tinha ligações via mulher com um daqueles movimentos de 1968. Veio uma francesinha para cá e me apaixonei por ela. Lembro que co­meti certos heroísmos, mas só para me exibir para a moça. Sempre se con­fundiram na minha cabeça o patrio­tismo, o heroísmo e o erotismo. Fre­quentemente eu me engajava num movimento porque tinha uma mulher que eu queria comer, e também por sentimentos românticos.

PLAYBOY — Quanto tempo ficou preso?

PEREIO — Uns sete, oito dias. Era ali na [rua] Tutóia, eles colocavam um ca­puz na gente enquanto era conduzi­do. Sentei pelado na cadeira do dragão, uma cadeira de metal que tinha focinhos que foram enfiados nos meus dedos, e um cara ficava seguran­do o aparelho de choque de maneira que eu o visse. Senti que ele não esta­va muito a fim de usá-lo. Os policiais ficavam me fazendo pressão, que nem aqueles babacas do programa da Luciana Gimenez. Chegaram a me pen­durar pelado. mas o cara não me deu o choque. Eu até pedi, "me dá logo esse troço, porra", mas ele não deu. Tinha um cara da Aeronáutica, um da Polícia Marinha e um capitão do Exército. O chefe era o major Valdir, os sar­gentos eram Guimarães, não tinham nome, e tinha um capelão, bichona, que me deu uma Bíblia. Com frio, ras­gava a Bíblia e me agasalhava com ela.

PLAYBOY — Falando em cana, a Cissa Gui­marães mandou te prender por falta de pagamento de pensão alimentícia...

PEREIO — [interrompendo] Aquilo foi ciú­me de útero. Você pode chifrar uma mulher à vontade que ela tira de le­tra, mas ela não suporta ciúme de úte­ro. Eu nem estava casado com ela, mas fiz um filho em outra mulher, e tinha acabado de sair de um acidente que me quebrou toda a cara. Quando saí dessa história, estava sem um puto por causa da operação. A Cissa ficou sa­bendo e me botou em cana pedindo 30 mil dólares. Ela sabia que eu não tinha como pagar. No dia de visita dos presos, e tinha cela com até 150 caras, tinha mais jornalista para me entre­vistar do que visita para os outros. Sa­quei que a Cissa tinha a chave da ca­deia, e só falei bem dela, disse que ela tinha toda a razão. Ela sempre teve bronca de escreverem o nome dela errado, Cissa com cedilha. Numa das entrevistas, falei: "É Cissa com dois es­ses, bota aí que eu estou dizendo isso". Nesse dia ela mandou me soltar.

PLAYBOY — E se te jogassem na cela com os 150, não rolou medo na hora?

PEREIO — Bicho, medo, depois de pegar Operação Bandeirantes? Claro que tem aqueles filmes com um cara en­rabando o outro na prisão. Mas o pes­soal da polícia gosta muito de sair no jornal, e eu falei muito bem da ma­neira como estava sendo tratado.

PLAYBOY — Você não guarda nenhum ran­cor dela por isso?

PEREIO — Sou um sujeito temperamental, intempestivo. Estouro tudo o que te­nho para estourar, depois passa. Não abrigo nenhum rancor no coração. E ficar em cana não foi, de todo, uma experiência ruim. Minha simpatia era muito mais pelos que estavam presos do que pelos que me prenderam. Os homens cuidavam da minha agen­da, me avisavam quando tinha jorna­lista. Eu até tinha de jogar duro, dizer que só ia atender de tal a tal hora. Polícia adora aparecer.

PLAYBOY — Nos anos 80, deram uma bati­da num apartamento de um traficante, você chegou logo depois, e quando per­guntaram o que você tinha ido fazer lá, você disse: "Vim comprar cocaína": Não é dar muito mole?

PEREIO — Perguntaram e eu disse: "Vim comprar cocaína". Se tivesse ido à farmácia, teria ido comprar remédio. Foi igual a quando bati o carro no mor­ro, virado, ao meio-dia. O que fui fa­zer lá? Vou dizer o quê? Fui ver a em­pregada... Porra, conta outra!

PLAYBOY — Isso foi pouco depois de Eu te Amo [de Arnaldo Jabor, 1981], filme que fez grande sucesso. Isso o impediu de ser mais popular, um Tony Ramos?

PEREIO — Não, a minha mitologia envol­ve a transgressão, a minha clientela es­pera de mim um procedimento trans­gressor. Eu apostei também em cons­truir um ser artístico, um ser que é uma obra de arte, com sua composi­ção maldita. Se sair na página policial, essa construção só se enriquece.

PLAYBOY — Você prefere o Arnaldo Jabor cineasta, com quem trabalhou, ou o Jabor comentarista político atual?

PEREIO — O Jabor tem bom texto e bom discurso. E era meu chapa, eu gosto dele. Só acho que ele tem uma ten­dência à direita, muito bem disfarça­da numa retórica brilhante. Não sei, é uma posição que observo nele. Gos­to do cinema dele, mas acho que ele não quer mais fazer cinema. Ele tem um texto muito bom, mas se você for no cerne da coisa, a tendência é per­versa. Acho que é medular, ele deci­diu defender quem está no poder.

PLAYBOY — O Diogo Vilela te convidou para fazer Hamlet e depois te expul­sou do elenco. O que aconteceu?

PEREIO — Aquilo foi uma brincadeira. Co­meçou a pintar um baixo-astral, o es­petáculo estava engessado, e eu esta­va over careta na época, um monge. E começou a pintar uma implicância do Diogo comigo. Houve uma come­moração qualquer, eu telefonei para o elenco convidando, e quando caiu na Rita Elmôr, fiz uma brincadeirinha na secretária eletrônica: "Tara, você é minha tara, magrinha". Foi o pretex­to para me tirarem. Ela era carne mi­jada, já tinha filho, trabalhava na Glo­bo. Mas o espetáculo era engessado.

PLAYBOY — Mas você já começou no cine­ma arrumando confusão, em Os Fuzis...

PEREIO — O problema ali é que a gente ia filmar em dez semanas e acabou du­rando seis meses. Acabou o dinheiro, precisava ter sol, seca, todo mundo se desentendeu nesse set. Ficamos seis meses convivendo sem filmar.

PLAYBOY — E como foi a convivência com o Nelson Rodrigues?

PEREIO — Quando eu era casado com a Neila, ele escreveu uma peça para ela, O Anti-Nelson Rodrigues. Eu dirigi e atuei. Fui bem amigo dele. O Nelson era um sujeito muito interessante, ia pro meu camarim tomar cafezinho loucamente e fumar escondido da ir­mã. Era um homem riquíssimo inte­riormente, não bebia nada, molhava os lábios com um pouquinho de champanhe. Tinha dois motoristas, não dirigia, e duas secretárias, quase todos bolivianos. Ele não enfiava a mão no bolso, era uma das secretárias que pegava as coisas para ele.

PLAYBOY — Você conviveu com muitos homossexuais. Nunca ficou tentado a experimentar para ver como era?

PEREIO — Havia uma família de negros perto da minha casa, o Conrado, que era bonitão, e o Djalma, que era ma­grinho e fresquinho. Ele ficava na fren­te de casa conversando sobre filoso­fia, e mais tarde se confessou apaixo­nado por mim. A violência da paixão me assustou. Mas aceitei que ele me pagasse umas cubas-libres.

PLAYBOY — Foi o mais perto que você che­gou de uma experiência homossexual?

PEREIO — Não, eu mandei meu pau à m(*) duas vezes. Na primeira, estava no Rio sem ter onde dormir, e o Ary Toledo se hospedava no apartamento do Gilberto, uma bicha com quem eu já tinha trabalhado. O Ary me con­vidou para dormir lá no sofá, e já acor­dei com o cara chupando meu pau, aí f(*). Mas não gostei muito. A se­gunda vez, eu fazia Antígona, a grana era pouca, então topei fazer um show na Galeria Alaska que era um bofe com um monte de gays, e eu era o bo­fe. O líder era um travesti chamado Bijou Blanche. Um dia tomei um por­re, pau duro, coração mole, rolou. Mas ele era um cara respeitado, o por­teiro chamava ele de "seu Bijou".

PLAYBOY — Por que o cinema brasileiro não conseguiu desenvolver uma indústria?

PEREIO — Primeiro, por que nunca se per­mitiu que fosse produzido negativo no Brasil? O que mais encarecia os fil­mes era a película. Há outros aspec­tos. Por exemplo, remessas de lucros. O cinema tem produção, exibição e distribuição. O produtor tem 30 por cento, o exibidor, que tem o patrimô­nio, 50 por cento, e o distribuidor, 20 por cento. Isso porque ele não aplica um puto e distribui o que ele quer. São cinco distribuidoras americanas que até hoje controlam o mercado.

PLAYBOY — Mas não houve problemas de origem, filmes ruins, notas frias, sub­venções do Estado a fundo perdido?

PEREIO — Entrar num discurso estetizan­te é muito difícil. Mas observo que 99% do que vem do cinemão ameri­cano é m(*). E é receita. Limite é um filme do c(*), até hoje é um dos me­lhores filmes feitos no mundo. O ou­tro que o Mário Peixoto quis fazer, não deixaram. O Cangaceiro também. Por que não se tira uma c(*) de có­pias e distribui no mundo inteiro?

PLAYBOY — O Estado brasileiro tem que dar dinheiro para se fazer filmes?

PEREIO — Acho que não. Tem é que mu­dar o jeito de fazer. Nada de chapa branca: é preciso fazer filme digital de baixo orçamento. É fazer digital e mandar direto para a Vinte e Cinco de Março [rua de comércio popular de São Paulo], nem entrar no mercado. É uma solução para sair dessa porra desse mercado manipulado.

PLAYBOY — Mas esses caminhos alternati­vos não estão funcionando tão bem no mercado fonográfico...

PEREIO — É, o Lobão procurou o Gilber­to Gil e só conseguiu numerar as có­pias. Mas o Gil no Ministério é uma m(*). É o bobo da corte. Ele deu 9 milhões de reais para o Cirque du Soleil, e não dá 100 mil reais para a gente fazer uma peça de teatro.

PLAYBOY — Você esperava mais dele?

PEREIO — Nunca levei fé. Celso Furtado, quando foi ministro da Cultura, tinha uma verba de 0,03% da receita do Es­tado. E não vá querer comparar Cel­so Furtado com Gilberto Gil...

PLAYBOY — Por fim, qual seria o epitáfio perfeito de Paulo César Pereio?

PEREIO — "Next week get organized." Ou então uma frase que disse para a Cis­sa quando ela me deu um pontapé nos colhões e, para justificar, disse: "Mas é porque eu te amo". Então me ama menos. "Me amem menos" seria um bonito epitáfio.


POR JARDEL SEBBA

FOTOS CACALO KFOURI


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1 Comment


Ademar Amâncio
Ademar Amâncio
Jun 27, 2023

Vamos por parte,não é porque contracenou com Sônia Braga,Vera Fischer e Vera Gimenez,que ele tenha tido chance,como ele insinuou,de comê-las - E,o ''ignorante'' Lula,tem um discurso mais denso e sofisticado que o dele - A maioria dos homens também mandam o ''pau à merda'' quando saem com mulheres,no mais,eu nunca entendi ele ser escalado como galã do cinema nacional,mas gostei de sua franqueza e tomara que consiga se libertar de todos os vícios.Fui.

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