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SERGIO MENDES | SETEMBRO, 2010



O músico brasileiro mais famoso no exterior fala sobre suas lembranças do Beco das Garrafas, a infância em Niterói, a carreira de carpinteiro de Harrison Ford, Jorge Benjor, Lady Gaga, Frank Sinatra e o famoso show no Maracanãzinho em que Simonal roubou a cena


POR JARDEL SEBBA

ILUSTRAÇÃO OTÁVIO SILVEIRA





1. O Beco das Garrafas, em Copacabana, está sendo revitalizado. Qual é a sua lembrança de lá? Tenho muita saudade daquela época, os anos 1960. Era um lugar mágico onde músicos, compositores, artistas de todas as áreas se encontravam e faziam uma grande música. Foi berço de muita gente boa. Eu inaugurei o Bottle's Bar com meu trio, formado por Tião Neto no baixo e Silvinho na bateria.


2. O que você bebia naquelas noites? Naquele tempo eu ainda não havia descoberto o vinho. Às vezes tomava um whiskinho com muito gelo e água mineral, mas na maior parte do tempo tomava mesmo Grapette, Mineirinho e guaraná. Hoje meu grande prazer é beber um belo vinho com meus amigos. Não tenho um rótulo preferido, gosto de vários, depende da ocasião e da comida que ele vai acompanhar.


3. Esse whiskinho do Beco era batizado? Dava dor de cabeça? Naquele tempo não se falava em bebida batizada. E, como eu tomava muito pouco whisky, não sentia dor de cabeça.


4. Entre os músicos brasileiros, quem são os seus amigos? São muitos, graças a Deus. Jorge Benjor, João Donato, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Carlinhos Brown, Guinga, Hermeto Pascoal , Toninho Horta, Liminha, Pedro Bernardas, Marcelo D2, Mika Mutti, Paulo Aragão e a moçada do Maogani, Paulo Moura... Esses, entre tantos outros.


5. Você vive longe do Brasil há muitos anos. Do que sente mais falta de Niterói, sua cidade natal? Niterói foi onde nasci e cresci. Tenho muita saudade e ótimas lembranças desse período da minha vida. Minha infância e minha adolescência foram muito alegres. Niterói era um paraíso. Ainda não existia a ponte, e tínhamos de ir para o Rio de barca. Era uma grande aventura! Eu adoraria um dia poder fazer um show na Praia de Icaraí.


6. O pessoal fala que nem o índio que fundou Niterói, o Arariboia, consegue olhar para a cidade, uma vez que sua estátua está de costas para ela e de frente para o Rio... Adoro Niterói! Só tenho belas memórias da minha infância e juventude.


7. É verdade que Harrison Ford foi seu carpinteiro? Sim, ele construiu o estúdio de gravação no quintal da minha casa antes de se tornar o Han Solo da série Star Wars. A gente só conversava na época sobre os detalhes do estúdio. E ele era um excelente carpinteiro. O estádio ficou lindo!


8. Que outros astros do cinema viraram seus amigos? Foram e são muitos. Entre eles Fred Astaire, Gene Kelly, Burt Lancaster, Michael Caine, Harrison Ford, Jerry Lewis, Dean Martin, Angie Dickinson , Henry Mancini, Sidney Pollack...


9. Entre os ídolos da música que você conheceu nos Estados Unidos, qual foi o encontro mais marcante? Sem dúvida, os encontros mais marcantes foram as duas turnês que eu fiz com Frank Sinatra, uma em 1967, outra em 1980, e um especial de TV que fiz com Fred Astaire em 1968.


10. Conta para a gente alguma coisa de Frank Sinatra que você viu de perto e nunca esqueceu. Nunca esqueci a generosidade dele. E a maravilhosa experiência que foi fazer turnês com o cara que foi o cantor mais famoso de todos os tempos.


11. Você voltou a fazer sucesso neste século. Houve de fato uma fase de baixa na sua música antes disso? Se houve, como se manteve trabalhando nesse período? Não houve uma baixa. Eu somente fiquei sem gravar discos por alguns anos, mas durante esse tempo continuei fazendo shows pelo mundo.


12. Você tem uma relação muito próxima com as canções de Jorge Benjor, a começar por Mas Que Nada. Como vocês se conheceram, e qual é a relação de vocês hoje? Conheci o Jorge no Beco das Garrafas. Foi nessa época que ouvi Mas Que Nada, Chove Chuva, entre outras, pela primeira vez. O Jorge tinha uma qualidade especial, uma levada de violão totalmente diferente do que se fazia naquela época. Sou muito grato a ele por ter escrito Mas Que Nada, que foi e continua sendo a canção mais importante da minha carreira. No meu disco Bom Tempo, lançado neste ano, regravei País Tropical. Acho que Mas Que Nada é hoje a canção brasileira mais conhecida no mundo. E Jorge é um querido amigo. Nós nos vemos de vez em quando quando nos cruzamos pelo mundo. E é sempre um grande prazer encontrá-lo.


13. Você já conhecia os DJs que fizeram o disco de remixes de Bom Tempo? Qual é a sua relação com a música eletrônica? Gosta de algum DJ brasileiro em particular? O disco de remixes do Bom Tempo, feito por grandes Djs internacionais, traz uma visão mais dançante das músicas, que é uma maneira de apresentar as canções a um público mais jovem, que frequenta discotecas. Conheci o trabalho deles por intermédio do meu filho Gustavo, que tem 23 anos e é especialista nessa área. Ele sugeriu a maioria dos nomes. Aí do Brasil só conheço o trabalho do DJ Marlboro. E gosto muito dele.


14. Então você conhece clássicos como Melô da Mulher Feia? Conheço. E não só gosto muito do trabalho dele como acho o funk carioca genial!


15. Você se sente injustiçado toda vez que alguém lembra seu show que o Simonal abriu no Maracanãzinho, em 1969, dizendo que ele roubou a cena naquela noite? Às vezes parece que o seu show não existiu. Você se recorda daquela noite? Pelo contrário! Foi uma noite maravilhosa, com vários convidados sensacionais, e sempre me senti muito honrado por ter tido a participação do Simonal no meu show. Na época, ele era considerado simplesmente o artista mais popular do Brasil. Só tenho ótimas memórias daquela noite.


16. A turma da Bossa Nova ficou conhecida, entre outras coisas, por ter sido um grupo muito fechado. Diversos artistas já declararam que não se sentiam aceitos naquele time na época. Você se sentiu aceito por eles ou não? Isso fez alguma diferença na sua vida? Eu realmente nunca senti isso. O Beco das Garrafas, que você citou, por exemplo, era um lugar muito democrático, onde todo mundo podia entrar e participar. Para você ver como as coisas eram, eu era muito jovem na época e fiz meu primeiro disco com arranjos dos maestros Tom Jobim e Moacir Santos, que se tomaram meus amigos para toda a vida.


17. Houve algum desgosto ou frustração entre os motivos que o levaram a sair do Brasil? Não, nenhum. Só houve mesmo a minha grande curiosidade, minha vontade de viajar, conhecer o mundo e tocar nos mais variados lugares.


18. Você acompanha a cena atual da música brasileira? Sabe quem são Tulipa Ruiz, Mariana Aydar, Bruna Caram, Silvia Machete? Eu infelizmente não conheço o trabalho delas, mas gostaria de conhecer.


19. O maior fenômeno da indústria pop americana dos últimos anos é Lady Gaga. O que você acha dela? Toparia ser regravado por ela? Ela de fato se tornou um fenômeno no mundo inteiro. Acho que a Lady Gaga é muito interessante como personagem. Eu, sempre muito curioso, adoraria tocar um pianinho para ela cantar. Se ela topasse, claro...


20. Ela também toca piano. Pelo jeito que toca e pela voz, que canção você sugeriria para um dueto? Uma bela canção do Tom Jobim.


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