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  • LUANA PIOVANI

    8 de maio, 2016 Confira uma entrevista exclusiva com a super estrela Luana Piovani! Luana Piovani sempre povoou o sonho de todos os leitores da PLAYBOY. Foram anos e anos de espera até que a revista, agora de casa e cara nova, conseguiu trazer a atriz e modelo para a tão sonhada capa. O ensaio, clicado no Rio de Janeiro pelo genial Christian Gaul, mostra Luana sem retoques, às vésperas dos 40 anos, mãe de três filhos, natural como nunca. Linda como sempre. Essa Luana linda, cheia de vida, bem-humorada, concedeu uma entrevista exclusiva ao Inside Playboy Brasil, a primeira dedicada inteiramente ao seu ensaio. Sem retoques também na vida, Luana divide opiniões, acende paixões e discussões acaloradas. Mas aqui ela é unanimidade. E ponto final. Após 20 anos de um namoro platônico, quase impossível, finalmente você se rendeu aos encantos da PLAYBOY. Uma história de amor que rendeu frutos já que você, além de ser a grande estrela de capa, também assinou uma coluna na revista. Feliz com esse casamento? Foi um namoro longo, e até difícil, mas sabe que isso até foi bom?! Acho que nada fácil dá prazer de verdade. A conquista faz parte, agora todos nós estamos felizes. Mas casamento, casamento mesmo, não aconteceu. Vislumbrávamos a hipótese de uma coluna fixa, mas as negociações não foram adiante. O seu ensaio foi praticamente uma festa entre amigos. Além do fotógrafo, Christian Gaul, você trouxe o Rafael Senna, a Talita Castro, a Dulce Bernardi, fora a equipe da revista, pessoas incríveis como a Maíra Miranda e o Greg Souza. Como foi o clima nos bastidores? Houve algum momento curioso, engraçado, marcante, durante a produção das fotos? Definição perfeita! Foi exatamente como uma grande festa, estávamos todos muitos felizes em participar do  projeto e havia o nítido clima de celebração. Fora que é ótimo estar cercada de pessoas que a gente gosta, admira, torce. E esse clima acaba ficando impresso nas fotos. De curioso, eu posso citar que a equipe de produção era muito grande, então eu permiti que apenas cinco pessoas circulassem pela casa, os demais ficaram fechados no quarto, sem saber o que estava acontecendo, curiosos [risos]. O Fabricio Carpinejar escreveu o texto (belíssimo, aliás) que emoldura o seu ensaio. Qual a sensação de ser reverenciada por um dos mais sensíveis poetas brasileiros e que tão bem entende da alma feminina? Ah, eu fiquei extremamente feliz e me sinto muito privilegiada em ter palavras tão sublimes escritas ao meu respeito. Carpinejar não deve nada a Vinicius de Moraes. A PLAYBOY organizou uma super festa de lançamento para você em São Paulo. Nós estávamos presentes e falamos que, sem exagero, o local ficou iluminado quando você fez a sua entrada triunfal. As suas Noites de Autógrafos em São Paulo (onde também estivemos ao seu lado) e no Rio de Janeiro revelaram um verdadeiro séquito de fãs apaixonados por você. Como está sendo receber o carinho de todos esses admiradores? Vocês são uns queridos (fiz questão de escrever isso no seu autógrafo)! Eu digo que amor só faz conta de multiplicação, então quanto mais carinho recebido, mas carinho multiplicado. Eu esperava que as pessoas gostassem do resultado, mas a comoção foi maior, as mulheres têm elogiado demais, o que é uma reação muito simbólica. O que muda na vida de uma mulher após um ensaio nu? Ela se sente mais poderosa, mais desejada, mais respeitada, dona de si? Dá pra sentir a diferença no olhar que as pessoas lançam para você? Sinto-me tudo isso, mas também mais realizada, com a sensação de mais uma meta cumprida. E é engraçado que realmente as pessoas passam a te olhar de outra forma, talvez seja reflexo das nossas próprias transformações pessoais após um trabalho tão bem-sucedido. Podemos dizer que esse ensaio para a PLAYBOY foi o seu “SIM” para o empoderamento feminino, e as suas cicatrizes sem retoque, o seu grito de liberdade contra a hipocrisia, contra a ditadura do corpo perfeito? Sim, era exatamente essa a intenção, para provar que o humano, seja homem, seja mulher, seja o que quiser ser, também pode ser belo e com poucos retoques. Para finalizarmos, deixe um recado para os seus fãs e leitores da PLAYBOY. Que a nova Playboy e sua nova filosofia não decepcionem essa grande legião de fãs, quem gosta de bife é cachorro, os fãs da Playboy apreciam nu de qualidade. Meus amados, a palavra é gratidão. Saber agradecer todos os dias é o que nos engrandece como seres humanos. Obrigada! Lov. Lua. Por: Eder Cansino

  • ALINA, A FILHA DE FIDEL

    O dia em que contratei a filha de Fidel Castro para posar nua. Quando o Boeing 767-200 prefixo PP-VNP da Varig desceu o trem de pouso à chegada no aeroporto de Barajas, em Madri, na manhãzinha daquele 9 de março de 1998, uma segunda-feira, confesso estava apreensivo. Não por medo de aterrissagens. É que, em questão de horas, eu tentaria fechar uma negociação que, para quem na época era diretor de Redação de Playboy, poderia ser histórica, fazendo a revista estourar nas bancas e repercutir na grande mídia brasileira e internacional: tratava-se de levar para a capa e seu principal ensaio fotográfico, nua, ninguém menos do que a única filha – ele tem outros sete filhos – do ditador cubano Fidel Castro, Alina Fernández Revuelta. Não é que faltasse sucesso para Playboy, felizmente. A revista ostentava havia 20 anos a condição de maior publicação masculina do país. Além disso, com apoio forte da Editora Abril, times excelentes nas áreas de marketing, circulação e publicidade e uma equipe espetacular na redação, a gestão que iniciei em Playboy no final de 1994 vinha numa curva ascendente de vendas e de faturamento. Àquela altura, tínhamos alcançado quatro das dez edições mais vendidas na história da revista desde a sua fundação, ainda com o título de Homem, em agosto de 1975 – chegaríamos a nove das dez campeãs, quando deixei Playboy, no final de 1999. A edição do 20º aniversário, ostentando na capa Adriane Galisteu e contendo um forte pacote jornalístico, em agosto de 1995, batera todos os recordes brasileiros em bancas – mesmo alguns memoráveis, mas não inteiramente comprovados, como os da falecida O Cruzeiro – beliscando o milhão de exemplares. Legião Estrangeira, Congo em guerra e viagens com FHC Orgulhávamo-nos das realizações jornalísticas da revista, cujos editores e repórteres se desdobravam em todas as áreas, no Brasil e no exterior. Num perfil a cargo do escritor Fernando Morais, por exemplo, o ex-presidente Fernando Collor, na solidão da Casa da Dinda, acusou seu vice e substituto, Itamar Franco, de “traição”. Outros poderosos da vez estavam presentes em nossas reportagens e entrevistas: Antonio Carlos Magalhães, César Maia, Tasso Jereissati ou o presidente da Argentina, Carlos Menen. Fomos ao Congo (então Zaire) em guerra civil, a Hong Kong depois de passar do domínio britânico para a soberania chinesa, ao Iraque para ver como vivia, amava e se divertia a juventude sob a ditadura sanguinária de Saddam Hussein. Viajamos na comitiva do presidente Fernando Henrique Cardoso para revelar os bastidores de suas missões internacionais, contamos o drama de um brasileiro no corredor da morte em uma penitenciária da Flórida, nos Estados Unidos, reportamos o difícil trabalho dos 1.200 soldados brasileiros em missão de paz na conflagrada Angola e nos aventuramos nos confins do Djibuti, no Chifre da África, para narrar a história e as ações da mitológica Legião Estrangeira francesa. E por aí vai. Outras áreas de interesse também nos davam satisfação pelos resultados. O ministro da Educação, Paulo Renato, considerava o hoje extinto Ranking Playboy das Melhores Faculdades do Brasil “o melhor instrumento de avaliação do ensino superior brasileiro” antes da instituição do Provão pelo MEC, em 1996. Nossos concursos de contos incluíam no júri escritores do porte de Nélida Piñon, ex-presidente da Academia Brasileira de Letras, Lígia Fagundes Telles e Ivan Angelo. No capítulo charme, indispensável para a revista na época, havíamos, entre muitas atrações, contado as maravilhas do Principado de Mônaco, descrito os segredos e histórias do célebre Harry’s Bar, de Veneza, visto e reportado por dentro os desfiles da alta moda em Paris, com suas supermodelos maravilhosas, bem como o vidão dos multimilionários em St. Barthélemy, no Caribe. Fuga rocambolesca de Cuba Nada disso, porém, me removia a apreensão quando as turbinas do Boeing silenciaram e começou o desembarque em Madri, sob uma temperatura ainda fria do final de inverno. O sucesso alcançado, de acordo com os melhores manuais, não é suficiente para uma publicação: havia que continuar surpreendendo, informando e entretendo o leitor para sobreviver com saúde, sobretudo numa fase em que a internet já produzia estragos em jornais e revistas impressos. Alina, a “filha rebelde” de Fidel, fruto de um affaire de uma mulher casada e rica, Natalia “Naty” Revuelta, com o líder barbudo nos primórdios da luta contra a ditadura de Fulgencio Batista em Cuba, reunia sem dúvida condições para ser uma surpresa espetacular na capa de Playboy. Ela conseguira capturar manchetes do mundo todo ao fugir de forma rocambolesca da ilha em dezembro de 1993, rumo a Madri, com passaporte espanhol falso e um disfarce que incluía a imitação de um sotaque, roupas espalhafatosas e uma peruca encimada por um boné. No ano seguinte, de novo ganharia destaque na mídia ao protestar publicamente contra a presença de Fidel na Assembléia Geral da ONU, em Nova York. Posteriormente se conheceriam mais detalhes sobre a complicada, difícil e kafkiana história de Alina, para quem até os 10 anos de idade parecia tão certo como o nascer diário do sol o fato de seu pai ser o dr. Orlando Fernández Ferrer, o médico gentil e carinhoso com o qual a mãe se casara e tivera, antes dela, outra filha, Natalie. Um dia, de uma só vez, a menina ficou sabendo que o dr. Orlando, proibido pela revolução triunfante de manter clínica particular, fora embora para Miami com a irmã Natalie, e que seu pai de verdade era o barbudo grandão que mandava em Cuba, visitava a mãe com frequência em horas estranhas e agia como uma espécie de tio ou padrinho. Um pai frio, distante e... Avaro Ao longo da relação conturbada que viveriam anteriormente à ruptura de Alina com Fidel, aos 23 anos, ele se revelaria um pai frio e distante, com quem ela não conseguia falar ao telefone, que não respondia a suas cartas e chegou a passar quase dois anos sem encontrar tempo para vê-la nem para recebê-la no Palácio da Revolução. No plano material, mostrava-se mesquinho e avaro numa escala inimaginável: dava-lhe, de quando em quando, uma mesada próxima da esmola, presentes de camelô e, em seu primeiro casamento, ofereceu a título de “festa” alguns doces, uma salada de macarrão e dez garrafas de rum. Não bastasse isso, agia de forma despótica, até o extremo de um dia ordenar a prisão da própria filha como prostituta por ter-se enamorado de um estrangeiro, um italiano, que seria prontamente expulso da ilha e da vida da jovem. Aí deu-se a ruptura final de Alina com Fidel. Não é de estranhar, pois, que Alina recusasse o sobrenome Castro, oferecido depois de anos por Fidel como uma grande concessão, e a certa altura ela acabasse sofrendo de um grave distúrbio de fundo psicológico, a anorexia, dificuldade que pode chegar à impossibilidade de comer, que lhe deixaria sequelas. Mesmo assim Alina tocou a vida: morou em Paris durante um período em que a mãe exerceu funções na embaixada de Cuba, estudou balé, chegou a vencer competições de natação, cursou alguns anos de Medicina, trabalhou em diferentes funções, inclusive na de modelo da estatal cubana de moda La Maison, e teve uma filha, Alina-María Salgado Fernández, a "Mumín", do terceiro de seus cinco casamentos. Fizemos contato durante três longos anos Era com essa mulher de incrível biografia que eu iria negociar em Madri. A negociação, esperava eu, culminaria um longo e difícil processo de mais de três anos de contatos, pessoais, por telefone e por fax – estávamos no período histórico imediatamente anterior ao e-mail – entre Playboy e Alina, durante os quais conseguimos manter um quase milagroso sigilo (qualquer vazamento prejudicaria o efeito-surpresa que pretendíamos). Quando cheguei à revista, em novembro de 1994, mantinha a lembrança de, meses atrás, a filha rebelde de Fidel denunciando os abusos cometidos pelo regime cubano. Sempre procurei, nas funções que exerci, buscar boas histórias no vácuo de acontecimentos relevantes ou interessantes que a mídia trata e depois esquece. E uma das primeiras tarefas que encomendei ao redator-chefe Humberto Werneck, excelente jornalista, grande amigo e companheiro em outras redações, seria justamente investigar o paradeiro de Alina. Werneck conhecia Cuba muito bem e lá conservara proveitosa rede de contatos, fruto de várias viagens profissionais em diferentes ocasiões e para diferentes veículos. Buscaríamos, expliquei-lhe, um duplo objetivo: produzir um rico perfil da filha de Fidel para publicação e, adicionalmente, abordá-la com um convite para posar despida – mas só após estar de posse de todos os dados necessários ao texto. Não queria correr o risco de perdermos a reportagem caso a proposta fosse mal recebida. O convite não se fundava exclusivamente no nome de Alina: a julgar pelas fotos publicadas em jornais e revistas, a ex-modelo reunia condições estéticas para figurar na revista. Werneck lançou-se à tarefa e logo descobriu que Alina vivia no Estado da Geórgia, baluarte do conservadorismo do Sul dos Estados Unidos, na improvável, monótona cidade de Columbus, cuja única importância na ordem das coisas consiste em ser a terra do inventor do xarope que deu origem à Coca-Cola. A hora do convite e um prometedor "Por que não?" Demandou tempo e paciência convencê-la a atender ao telefone e, mais ainda, a recebê-lo, segundo o próprio Werneck contaria em texto que contém uma parte desta história, publicado na Mitsubishi Revista de junho de 2004, reproduzido, no mesmo mês, no Caderno 2 de O Estado de S. Paulo e que acaba de voltar à tona no recém-lançado livro de crônicas O Espalhador de Passarinhos (Edições Dubolsinho, 2010). Nossa persistência, contudo, venceu, e em fevereiro de 1995 ele embarcaria para os EUA, passaria quatro dias em Columbus, onde chegou via Atlanta, e produziria o rico perfil de Alina publicado na edição de abril da revista, sob o título “A filha do homem”. Alina conseguira permissão de Fidel para trazer a filha aos EUA e estava às voltas com um livro de memórias encomendado pela gigante editorial alemã Bertelsmann que não conseguia fazer avançar. Em sua nova vida, apanhava de instrumentos elementares do capitalismo, como talões de cheques e cartões de crédito, e contou ao repórter episódios dramáticos de sua vida e do relacionamento com o pai que nunca chamou de pai, embora só alguns dos narrados anteriormente neste texto. Estes só se tornariam públicos, junto a uma enxurrada de fatos sobre as infernais condições de vida em Cuba e o grau de violência e corrupção que ela testemunhara no regime, quando o livro finalmente veio à luz em Barcelona, em 1997, alguns meses antes de minha viagem: Alina – Memórias de la Hija Rebelde de Fidel Castro. De todo modo, em Columbus, Werneck cumprira com o costumeiro brilho a primeira parte da encomenda, ao recolher minuciosamente informações, declarações e impressões para o perfil de Alina. A segunda parte – o convite para posar – ocorreria no segundo dia de entrevistas, numa noite em que acompanhou a filha de Fidel à casa de uma amiga, Elena Días-Versón Amos. Esta senhora cubana radicada nos EUA, então com 68 anos, viúva de um magnata americano e personalidade ativa na ajuda a compatriotas exilados, acabou facilitando a tarefa de Werneck.  Ao  saber que  o jornalista  trabalhava para  a edição brasileira de Playboy, doña Elena, financiadora da fuga de Alina, perguntou, com uma pontinha de malícia: – Mas o senhor não veio convidá-la para posar para a revista, não é? – Por que não? – rebateu Werneck, entrando pela primeira vez no assunto e agradecendo aos céus que a iniciativa partisse de doña Elena. Para sua surpresa, Alina repetiu a pergunta: – Por que não? A filha Mumín, porém, a essa altura com 17 anos de idade, escandalizou-se e expressou contrariedade: – Mamá, no digas eso! Usando um macacão e empurrando um carro enguiçado Naquele 8 de julho de 1998, minhas duas emissárias de confiança em Playboy seriam recebidas por Alina Fernández Revuelta, a filha de Fidel Castro, no decadente apartamento que ocupava na central Calle Bárbara de Braganza: móveis gastos, paredes com manchas, decoração modesta. A dona da casa não impressionou as visitantes: chegou atrasada ao encontro e vestia uma espécie de jardineira ou macacão cheio de manchas. Explicou que tinha ajudado a empurrar o automóvel enguiçado de um amigo. Como sempre, todavia, demonstrou simpatia e amabilidade. Enquanto Jaime, seu companheiro de então, preparava uma refeição constituída de várias e apetitosas pequenas porções, Alina exibia para as duas brasileiras lembranças de quando ele viajava pela Marinha Mercante. Em certo momento, Jaime contou à dupla de Playboy que a passada anorexia da mulher deixara sequelas: ela não gostava de comer diante de outras pessoas, tanto que mal tocou nos pratos servidos. O contrato, no entanto, não seria assinado ainda dessa vez. Alina queria um pequeno reajuste no preço, na tentativa de livrar-se de parte dos impostos. De volta ao hotel, Ana Maria me telefonou. Dei o OK por conta própria, certo da aprovação posterior do diretor Nicolino Spina, o que efetivamente ocorreu. A ética me impede de mencionar cifras precisas, mas havíamos atingido um volume de dinheiro suficiente para a compra de um apartamento de três dormitórios num bairro nobre de São Paulo. A celebração do acerto, a enfim, num restaurante mexicano de Madrid O documento, em versão final saída da própria impressora da interessada, enfim receberia a firma de Alina Fernández Revuelta no dia seguinte, 9 de julho de 1998. Ela se aprontara apropriadamente para a ocasião, com um vestido fino, bons sapatos, maquiagem e jóias. E se abriu com Ana, com quem estabeleceu desde o início grande empatia, dando conta de que mudara em boa parte as intenções desde a conversa comigo, em março: – Estou cansada de ajudar a todo mundo. Agora preciso pensar em mim e em minha filha. E expressou o desejo de que o ensaio fosse feito em Madri mesmo. Não queria viajar. Foi mostrar o que lhe parecia uma locação adequada – um apartamento pertencente a um amigo, sem nada de especial, a anos-luz do bom gosto e do luxo que usávamos para fotos em ambientes fechados. Ana e Ariani desconversaram. Aproveitaram, porém, para fotografar Alina com suas câmeras, material que levariam ao fotógrafo que escolhêssemos. Um pouco como celebração, o grupo decidiu almoçar num restaurante mexicano, Entre Suspiro y Suspiro, de um restaurateur amigo do casal que, tal qual o Alkalde de meu jantar de meses atrás, existe até hoje. Jaime ofertou a Ana e a Ariani, cada uma, uma caixa de caramelos da mesma e magnífica La Pajarita que eu já provara. O implacável verão de Madri vivia o auge, com um calor de 40 graus à sombra. Ana me telefonou novamente, exultante, contando que a novela terminara. A dupla de Playboy tinha vôo marcado para a noite do dia subsequente, e almoçou num restaurante da Plaza Mayor antes de voltar ao Brasil. Estava para acontecer a grande aventura. A escolha do fotógrafo: o grande J. R. Duran, é claro! Chegara finalmente o momento de planejar o ensaio. Desde havia muito me decidira pelo fotógrafo: J. R. Duran, cujo trabalho e imagem estavam fortemente associados à revista. Até ali, Duran fotografara nada menos que 121 ensaios de Playboy (e atingiria o espantoso recorde de 243 até outubro deste ano de 2010). Tratava-se não somente de um grande fotógrafo, mas de alguém que eu conhecia desde os anos 80, quando tive passagem anterior pela revista, com quem desenvolvi amizade fraterna e em quem confiava sob todos os aspectos. Após estudar as fotos de Alina trazidas de Madri, sugeriu que a clicássemos em Roma, distante de qualquer implicação política, e no charmoso Hotel Excelsior. Duran descreveu recentemente o hotel em seu blog: “Foi construído em 1906 e fica na Via Veneto. Bem no fim dela, lá no alto, quando a rua se encontra com os jardins da Villa Borghese. O prédio foi catapultado para o estrelato (o prédio, isso mesmo) no filme La Dolce Vita, de Fellini. Foi por entre as mesas espalhadas na rua, de seu bar – o Doney –, que apareceram as figuras dos primeiros e alegres paparazzi que depois se multiplicaram e reproduziram de uma maneira que nem o Marcelo Mastroianni poderia imaginar. Foi nessa mesma calçada que o desconhecido ator americano Lex Barker, fotografado brigando com a mulher, se pegou de tapas com os fotógrafos e ficou famoso.” “A partir dos cabelos de Alina, como vi nas fotos”, relembraria recentemente Duran, “imaginei recriar uma atriz italiana, talvez a Laura Antonelli, de lingerie e espartilhos pretos, estabelecendo no ensaio um tipo de relação com Fellini, com a Via Veneto, ou um clima meio Visconti,  meio Lampedusa”, referindo-se ao escritor Giuseppe Tomasi di  Lampedusa,  autor  do  romance  Il Gattopardo,  em que  se inspirou  o filme de título idêntico dirigido por Luchino Visconti, com Burt Lancaster, Claudia Cardinale e Alain Delon (O Leopardo, no Brasil). A suíte alugada por Ariani, repleta de sofás, poltronas e cortinas de veludo vermelho, favoreceria, sobretudo, o clima viscontiano. Erotismo com bom gosto e elegância Para ter algum controle sobre os passos de Alina, achei conveniente enviar Ana Maria a Madri para, de lá, partirem as duas e Jaime para Roma. Ana aportou no dia 5 de setembro na capital espanhola e, seguindo as instruções de Ariani, combinou com Alina irem, no dia seguinte, a um salão de beleza. À noite, pagando de seu bolso, foi assistir ao Balé e Orquestra da Ópera de Kiev no Teatro Lope de Vega, na Gran Via. A ida ao salão de beleza trouxe um pequeno contratempo: Alina não queria submeter-se a tesouras, pinças, tinturas e cremes de nenhum dos locais anteriormente pesquisados e julgados convenientes por Ariani, preferindo um cabeleireiro de sua confiança, num estabelecimento modesto. Mas hidratou e tingiu os cabelos, fez manicure e pedicure e teve as sobrancelhas depiladas. Os três provenientes de Madri se encontraram no hotel de Roma com a equipe vinda do Brasil: Duran, Andrea – uma assistente de seu estúdio –, Ariani e o cabeleireiro e maquiador Kaká Moraes. Se a equipe era pequena, trouxe uma bagagem imensa, com todo o conjunto de produção selecionado por Ariani. “Escolhi uma produção com base no preto – roupas, lingerie, sapatos”, conta Ariani. “Alina já não sendo mais uma garota, segui a norma de que o preto sempre afina a silhueta. Além do que é mais elegante, com ele se corre menos riscos, sem contar que, sendo um clássico, tinha tudo a ver com nossa locação. Levei também espartilhos, para alongar a região do ventre e muitas transparências, como musselinas e rendas, e sapatos de salto alto, devido a sua pouca estatura, 1,65 metro. Queríamos fazer uma matéria elegante, sutil – me preocupei muito com a sutileza da nudez. Imaginava o erótico do trabalho com vestidos entreabertos, pernas e sexo entrevistos, sem exageros”. A elegância incluía, somadas às malas de produção de Ariani e do vasto material de embelezamento de Kaká Moraes, jóias da H. Stern e de Antonio Bernardo. A experiência em viagens internacionais para a revista levara Ariani, espertamente, a colocar em si própria as jóias, como se dela fossem, para evitar maiores embaraços na alfândega italiana. No esplêndido Hotel Excelsior, com seu saguão de mármore, seus lustres de cristal, vitrais, quadros a óleo e pesadas cortinas, Ana e Ariani se instalaram na grande suíte que serviria de locação, onde também guardaram o que Ana denomina ter sido “uma montanha de malas de produção”. Para que Duran pudesse trabalhar na suíte, elas pulariam da cama às 6 da manhã dos três dias de trabalho previstos. O prato predileto de Roberto Marinho O primeiro encontro de Duran com Alina se daria no bar do saguão, com as bebidas iluminadas em azul no balcão de serviço, emoldurado por um vitral decorado e cadeiras de couro sobre as quais pendia um enorme lustre cor de âmbar. Duran notou que Alina, sorridente e tranquila, só comia uma ou outra azeitona. Não quis jantar com a equipe, preferindo que Jaime providenciasse algo para comer no quarto. O trabalho começaria logo de manhã, e o time de Playboy refez as energias no restaurante Nino, funcionando desde os anos 30 perto da Piazza di Spagna. Duran se lembra de haver pedido fagioli al fiasco, um prato à base de feijão branco com sálvia que o dono lhe segredou ser o preferido por um frequentador brasileiro assíduo e célebre: o dono das Organizações Globo, Roberto Marinho. O bom clima da véspera não se repetiria na suíte pronta para o ensaio. “Quando ela olhou para as roupas”, relata Ariani, “não conseguia esconder uma expressão de insatisfação”. Alina não se constrangeu em despir-se diante do fotógrafo. Estava, entretando, travada e alheia. Ainda por cima, carrancuda: não sorria de jeito nenhum. “Ela estava péssima, e dizia às claras que não se interessava pelo ensaio, e sim pelo dinheiro”, recorda-se Ana Maria. “Mostrou-se desde o início extremamente blasée”, completa Ariani. Um problemaço: Alina não conseguia sorrir Experiente, Duran deixou o barco correr. “Nunca me preocupo com o primeiro dia porque a feitura de um ensaio é um processo”, ensina. O panorama passou realmente a pesar no segundo dia. “Normalmente levo as coisas para o terreno de to play, em inglês, ou seja, brincar, que consiste em a pessoa deixar de ser ela mesma para se transformar em alguma personagem”, diz Duran. “Com Alina, porém, essa situação nunca acontecia”. Durante o primeiro encontro no bar, rememora Duran, “parecia tudo excelente, não percebi um sinal do que iria encontrar. Talvez eu fosse mais inocente do que sou hoje”. O problema dela, acrescenta, “não foi a nudez, foi que ela não estava lá”. Ariani vai na mesma linha: “Eu tinha certeza de que ia dar certo. Ela não transparecia esse ar pesado que surgiu depois”. Durante as sessões de foto, Ariani procurava animá-la: – Está ficando ótimo! Olha que foto linda! E Alina, próxima ao descaso: – Sí… Ana Maria rememora que Duran provocava, brincava, sugeria: – Rite um poco! (“Ria um pouco”). E Alina: – Reir de qué? “Na nossa conversa no bar, ela riu bastante”, ressalta Duran. “Foi a última vez que a vi rindo”. A certa altura, o fotógrafo pediu que todos – Ariani, a assistente, o maquiador – saíssem e conversou a sós com Alina. As coisas estavam indo bem, ela apareceria bem nas fotos, havia harmonia na equipe, não se divisava problemas à vista – mas era necessário ter um ar mais entusiástico, um olhar mais insinuante. Era preciso sorrir. – No río jamás – alegou Alina, contra todas as evidências testemunhadas anteriormente por Werneck, Ariani, Ana e o próprio fotógrafo. “Sem algo que crie uma empatia com o leitor da revista”, explicaria Duran em recente conversa, “um ensaio de nu não funciona. É preciso um olhar interessante e pelo menos um meio sorriso. Pode ser uma Gioconda. No caso de Alina, no começo tudo parecia ótimo, mas acabou se tornando um pesadelo”. Ariani não se esquece: “Ela tinha uma tristeza permanente nos olhos, uma mágoa constante. E não dizia ‘estou insatisfeita’, mas ‘sou uma pessoa insatisfeita’”. 30 rolos de filme, e o desapontamento Com dois dias e meio de sessões de fotos, de três programados, Duran declarou o trabalho terminado. Clicara cerca de 30 rolos de 36 fotos cada, em cromos (slides). Ana e Andrea aproveitaram a folga imprevista para conhecer as Catacumbas. Ariani começou a arrumação de toda a vasta bagagem. A equipe voltaria na noite do quarto dia, em voo para São Paulo. No tempo restante, Alina animou-se a acompanhar Ana e Andrea e conhecer o Vaticano. Ariani, que estivera anteriormente em Roma a passeio e trabalho, preferiu caminhar um pouco pela esplêndida vizinhança do hotel e comprar, para presentes, garrafas de limoncello, licor de limão típico do sul da Itália. Feitas as despedidas, ela preocupava-se com o que os filmes mostrariam. Não sem razão. Em São Paulo, o próprio Duran não escondia o desapontamento quando levou uma seleção de fotos já reveladas à redação, no 15º andar do moderno e imponente Edifício Abril, na Avenida Marginal de Pinheiros. Trazendo o selo de qualidade de Duran, elas estavam impecáveis: a luz, os enquadramentos, as poses, os ângulos, os fundos, as cores. Para quem eventualmente se preocupava com as formas de Alina, não havia maiores problemas: as fotos exibiam uma mulher madura, mas dotada de encantos, com seios firmes e pernas bonitas. A expressão da filha de Fidel, porém, configurava um anticlímax: rosto sério, quando não fechado, ar indiferente ou mesmo contrafeito. Em centenas de slides, nem um mísero sinal de felicidade a iluminá-la. Depois de muito ver e rever as fotos, discuti-las com o próprio Duran e com nosso campeoníssimo diretor de Arte, Carlos Grassetti – profissional extremamente meticuloso e exigente –, pensar e repensar, levei-as ao meu chefe editorial, Thomaz Souto Corrêa, com meu veredito: daquele jeito, não queria publicar. Explicaríamos a Alina as razões, procederíamos a um distrato, pagaríamos uma multa, mas o leitor de Playboy não veria uma mulher tristonha e sem luz nos olhos. Thomaz chegou a hesitar, diante do tamanho do furo em alguma medida jornalístico que tínhamos em mãos, mas concordou. Grassetti também, e igualmente Marcos Emílio Gomes, jornalista de grande quilate que me acompanhara em diferentes redações e, àquela altura, trocara o posto de editor especial com Werneck e assumira como redator-chefe. Duran, no final das contas o autor das fotos, aprovou integralmente a decisão. O distrato assinado por Alina Fernández: fim da história. Piquei todos os filmes em pedacinhos, em casa. O diretor de Masculinas entendeu minhas razões e passamos ao distrato, que não representou grandes dificuldades, exceto uma sangria nos cofres da Editora Abril de aproximadamente 11% do valor do contrato e um indisfarçável dissabor de Nicolino, que solidariamente, mas contrafeito, engoliu o sapo. Eu e Ana Maria conversamos várias vezes com Alina por telefone, trocamos um bom número de mensagens de fax e acertaram-se os detalhes. Os papéis seguiram por correio expresso e voltaram assinados. Cumprida a burocracia do Banco Central, Alina recebeu a multa e nos enviou um recibo. O processo todo alongou-se até abril de 1999. Uma das exigências incluídas no distrato: se qualquer das fotos viesse a ser publicada por uma revista da Abril ou de alguma forma vazasse, deveríamos pagar-lhe o valor integral do acordo. Não houve, porém, esse perigo. Duran, naturalmente envolvido no processo de discussão sobre a não-publicação, concordara com minha decisão e me trouxe todos os rolos de filmes, incluindo os cromos inaproveitáveis. Com a Abril de posse do recibo de quitação, um certo dia, esperei a redação esvaziar-se e, na mesma noite, com uma tesoura e muita pena, dediquei-me a picar, um por um, os rolos e as fotos. Gastei meia hora e ganhei dedos doloridos. Finalmente, tomei o cuidado de recolher os pedacinhos, um a um, num envelope, levá-los para casa e jogá-los no lixo doméstico. Tudo terminado – quase quatro anos de esforços literalmente jogados no lixo –, julguei cumprido meu dever para com a qualidade da revista e para com o leitor. Alina, por seu turno, declarou-se aliviada. Em carta pessoal posteriormente enviada a Ana Maria, e que Ana teve a gentileza de me mostrar, escreveu: “Como ya sabes, esta operación abortada casi me satisface más que si hubiera sido todo um éxito”. Conclusão da história, anos depois: dei um tiro no pé Alina, posteriormente, regressou da Espanha aos EUA, onde seu livro autobiográfico foi traduzido como Castro’s Daughter: An Exile’s Memoir of Cuba e publicado em 1998 pela editora St. Martin’s. Escreveu um segundo livro, igualmente publicado nos EUA, mas em espanhol, sobre anorexia, em parceria com uma pesquisadora quase homônima, Aliana Fernández, Uma Hoja de Alface – Anorexia, una Enfermedad (editora Plaza y James, 2002) . Hoje vive próximo a Miami, é âncora de um talk show de rádio diário e noturno na emissora WQGA-1140 AM e escreve a cada dois domingos artigos, em geral, mas não exclusivamente, sobre assuntos cubanos no jornal The Miami Herald. Falei com ela dias atrás. Contou-me que não está mais unida a Jaime, que vive em Barcelona, mas continuam muito próximos e amigos. A filha, Mumín, 32 anos, naturalizou-se cidadã americana numa solenidade em Miami Beach, em 2004, e mantém sua privacidade sob espesso muro de silêncio, recusando-se a falar com jornalistas em qualquer circunstância. Leal a um pedido meu, Duran guardou absoluto segredo sobre esse assunto durante esses 12 anos. Recentemente voltamos ao tema, e perguntei-lhe se Alina fora a mulher mais travada que já fotografara. Ele respondeu: – Foi a única. E foi a única matéria minha que não saiu. Pois deixe-me surpreender Duran e, provavelmente, minha ex-equipe e quem leu esta história até aqui: se pudesse voltar no tempo, a matéria teria, sim, saído. Levei anos para chegar a essa conclusão, mas arrependi-me da decisão tomada em 1998. Hoje, considero que agi com rigidez excessiva em relação aos parâmetros de qualidade que exigia da revista e, com isso, dei um tiro no pé. O ar sisudo de Alina não tirava a beleza das fotos, nem prejudicava a revelação de seu corpo e muito menos impediria a edição de Playboy de ser um furor, com a filha de Fidel Castro, nua, no esplendor de uma suíte de um hotel de luxo de Roma. Agora, porém, em todos os sentidos, é tarde demais. E não existe uma foto, uma única foto, para mostrar como poderia ter sido. Ricardo Setti. Advogado e jornalista, atuou nas mais importantes redações do Brasil. Considerado o melhor diretor de redação (1994 a 1999) da história da PLAYBOY, foi redator-chefe entre 1985 e 1986. Este texto foi cedido pelo mesmo, sendo publicado originalmente em seu site pessoal.

  • ANDREA BELTRÃO | OUTUBRO, 1985

    DEPOIS DE VIVER A DOCE ÂNGELA EM CORPO A CORPO, ELA CORTOU O CABELO PARA SER A ZELDA, DA ARMAÇÃO ILIMITADA: FAZENDO A CABEÇA DE SURFISTAS E GAROTÕES, A ANTIGATA MAIS GOSTOSA DA TV. POR: CARLOS COSTA FOTO: FLAVIO COLKER Até estrelar, ao lado de Kadu Moliterno e André de Biasi, o programa Armação Ilimitada — uma das meninas dos olhos da Rede Globo, por sua linguagem jovem, criativa e inovadora —, a carioca Andrea Viana Beltrão, 22 anos, acumulou um belo currículo. Aos 13 anos, começou um curso de teatro como mais um passatempo além do colégio e da natação, sua atividade preferida. Quando, dois anos depois, levou uma tijolada na cabeça, encenando a peça Flictz, de Ziraldo, na favela do Vidigal, na Zona Sul carioca, já tinha seu primeiro contato com o público. Bem diferente da acolhida que recebeu vivendo a Angela, a namorada catarinense abandonada por Rafael/Lauro Corona na novela Corpo a Corpo. Nascida em Ipanema, de pais separados — o comerciante Júlio César e a professora Marilena —, Andrea trabalhou, entre outras peças, em Brincando com Fogo e Recordações do Futuro, com o grupo Alanhas e Manias, onde tinha como parceira outra promissora atriz, Débora Bloch. Garota Dourada, As 7 Vampiras e O Rei do Rio são seus trabalhos no cinema (os dois últimos em fase de lançamento). Foi no apartamento da mãe, com quem mora no Leblon, que Andrea recebeu o redator-chefe Carlos Costa para esta entrevista. 1. Você encantou o Brasil com a doçura da Ângela, na novela Corpo a Corpo. Agora, em Armação Ilimitada, cor­tou o cabelo e faz um tipo antigostosa. Como é isso? É, não tem nada a ver com o ti­po Márcia Porto, porque também não tem nada a ver comigo. Aquele gênero de mulher gostosa que as pessoas dizem [com voz caricata]: "Que bunda gostosa", "Que peito gostoso!" Não estou falando da Márcia, mas dessas gostosas que pas­seiam por aí, que querem ser sex-symbol. Tudo bem, se o trabalho delas é ser gostosa, acho incrível. Mas para mim essa estética do gostoso não satisfaz. 2. E você não se sente gostosa? Sei lá. Tem pessoas que me amam muito, que eu amo. E para elas eu sou gostosíssima, um tesão. Posso não ser para outras. Da mesma maneira que existem pessoas que são um tesão para mim, e outras não. Mas eu nunca quis a unanimidade dos tesões, de dizer: "Eu sou o tesão brasileiro". Não quero ser símbolo de nada, porque senão eu vou me castrar. E o barato de ser ator para mim é isso: poder ser a ingênua Ângela, a independente Zelda ou uma detetive no filme As Sete Vampiras. 3. Mas você não é contra "tesão" e talento, não é? A Vera Fischer, por exemplo... Claro, porque ela cresceu, e eu aplaudo de pé! Mas ela teve que lutar, porque, quando ela começou a trabalhar sério, todo mundo ficou "vuduzan­do": "lh, a Vera quer ser atriz, mas que coisa péssima..." Mas ela conseguiu, por­que tinha talento dentro. Aliás, sou muito mais pelo que a pessoa leva dentro. Tem atriz que você encontra na rua e diz: "Ah, que cocozinho, que mulher feia!" Mas ela sobe num palco e se transfigura. A Lucé­lia, por exemplo, baixinha, com aqueles óculos grandões que mais parece uma professorinha, quando sobe no palco, vi­ra um mulherão. Não tem que ser gosto­sa pra ser atriz. O certo é o contrário. 4. E por que você foi escolhida para ser a Zelda, em Armação? Se não me engano, andaram convidando alguns modelos tesões para fazer esse papel, mas aí viram que não ia dar, porque o tesão chegava, era muito gostoso e tal, mas na hora de falar "Lu­la", ficava [com voz de deboche, meio fanho­sa] "Luu-laa", entendeu? Então, sabe, quando me convidaram, deu aquele gos­tinho de "vou poder provar uma coisi­nha aí". Eu não esperava que a Zelda fos­se pintar pra mim. Mas aí fiz, e deu cer­to. Então, começaram com o negócio "Ela é a antigata", o antiisso, antiaquilo. Mas eu não estou a fim de levantar ne­nhuma bandeira dessas. Isso de antigata me irrita da mesma forma que quando vêm com a pergunta: "Qual é a proposta jovem do programa?" 5. Como você sentia o fato de "ser do ramo" há oito anos e as pessoas te tratarem como iniciante? É, diziam que eu fazia a Ânge­la, tímida e bem-comportada, e não con­seguiria viver a Zelda, personagem todo pra fora, bem engraçado. Pô, há oito anos que só fazia comédias. Encontrei Gilberto Braga num jantar, e ele me dis­se: "Você sabe que eu não te conhecia, comecei a escrever o teu personagem, a Ângela, você se adaptou tão bem que eu achei que você era ela!" Foi preciso al­guém dizer a ele que eu realmente esta­va compondo um tipo. 6. E qual é a "proposta" da Zelda? Um barato! Filha de um pai exi­lado, ela voltou ao Brasil há três anos e pouco. Nisso, encontra dois surfistas, que ela nunca pensou que fossem fazer sua cabeça como homens... e acaba se apaixonando — pelos dois! E aí o relacio­namento vira um triângulo aberto. Os três sabem que se transam e tudo bem. Ela enrola, vai levando, e isso é o gancho para a história rolar... A Zelda é uma ga­rota que ganha dois gatos da TV brasilei­ra, que são o Kadu Moliterno e o André de Biasi. As gatinhas de 14, 15 anos fi­cam molhadinhas por eles! 7. Você curte um surfista? Nunca convivi com um surfista, para mim pinta como uma coisa meio bo­çal, na maioria das vezes. "Ei, brô, bara­to, legal". Brô por brother, irmão. Eu não falo essa linguagem. Não que seja preconceito, porque também falo gíria. Mas esse lance de ir à praia, fumar maco­nha, ficar vendo televisão... Faço tudo is­so, claro, mas esse não é o meu dia. 8. E como são os surfistas André de Biasi e Kadu Moliterno? Ah, aí tem um lance muito dife­rente, que eles usam para o trabalho de­les. Quando às vezes terminamos a grava­ção, eles olham pro mar e dizem: "Ei brô, vamos nessa!" e vão pegar uma on­da. É natural neles, mas a diferença é que eles não ficam só nisso. O André ar­ma mil e umas, o Kadu também. Sem eles o programa não seria nem metade do que é, não aconteceria. Os dois são ul­traprofissionais e cuidam de tudo. Dá prazer trabalhar com eles. 9. E o trabalho em Armação é muito pesado? Depende de cada programa. O texto vem pronto, criado pela equipe de autores — o Calmon, Patrícia Travassos, da Blitz, Cristina Nazaré e Daniel Más. Mas sempre podemos dar alguns toques no texto. O programa é muito rápido, mas a criação é feita com muita antece­dência, tem muita externa, com surf, mo­to, vôo, esqui. E isso dá muito trabalho, porque algumas cenas são mirabolantes. Depois, há ainda todo o trabalho de mon­tagem em estúdio, para conseguir efeitos como o da brecada do avião em pleno ar, no episódio do Prefeito Perfeito, e a faixa de propaganda continuando a pas­sar no vídeo. 10. Como foi feito isso? Na montagem da cena, pega­ram a gravação do avião voando com a fai­xa de propaganda; num determinado mo­mento, substituíram a imagem do avião por uma outra dele parado em maquete, mas deixando a faixa da primeira ima­gem correr. Dava a impressão de que o avião havia parado no ar. Eu curto muito ficar na sala de edição dando palpites. Os recursos da televisão são incríveis. 11. É, dá para notar que você está fascinada pela televisão. O programa é bem diferente da novela. Eu me sinto como no teatro, com muita liberdade para criar. Me dá a sensa­ção de que esse programa casou comigo. E, por sorte, a Globo vê Armação com bons olhos, por ser engraçado, com uma lingua­gem ousada. E o Guel Arraes está conse­guindo isso na direção do programa. 12. No seriado, a Zelda vive um mé­nage à trois. E a Andrea, como vive? Atualmente vivo um tanto con­fusa. Nesse momento estou sozinha. E não é porque não ame ninguém. Pelo contrário, estou amando demais e sendo amada também. Mas já estive numa fase em que queria casar, ter filhos e outras cositas más [pausa]. Depois, em outro mo­mento, queria ser livre, transar com quem quisesse, se alguém quisesse ficar comigo pra sempre, que ficasse, mas entendendo minha liberdade, meus namorados. Agora não sei definir direito meu momento. Es­tou em estudos [risos], porque amor é uma coisa muito complicada, né? 13. Você se sente muito aflita pe­rante a vida? Um pouco: mas essa ansieda­de já passou. Com 12, 13 anos, por exem­plo, eu vivia louca para ter a minha pri­meira experiência, para trepar. Com to­do gás. Aos 13, namorava um homem de 25, e vivia pedindo a ele "Trepa comi­go?" [risos]. Eu queria ter minha vida in­dependente, passar para o degrau se­guinte, olha só a piração! Não sei se já ti­nha essa consciência da coisa, mas eu gos­tava dele, tinha tesão, e ele enrolando. Depois, aos 14 anos, com outro namora­do, consegui. Foi na casa dele. A gente já namorava, dava uns beijos, tirava um sar­ro, aí esse namorado, um cara de uns 22, finalmente topou. Cheguei em casa e fui logo contando pra minha mãe. "Mas já? É cedo demais!", ela disse. 14. E aí você sossegou? Passou ao menos a ansiedade. Porque o adolescente tem aquela coisa de ser grandão, desengonçado. Eu ainda sou um pouco assim, mas agora tenho mais consciência do meu corpo, do meu tamanho. Na época, era tudo grande, feio, e acho que essa necessidade de experimentar, de fazer a "passagem", veio um pouco a reboque disso. 15. E você é de ser fiel? Na minha profissão, acabo tra­balhando em trinta lugares, encontran­do pessoas maravilhosas, inteligentes e lindas. Que acabam me apaixonando. Po­de ser até que nem transe, porque tenho paixões que duram 5, 6 anos e em que não pinta sexo. É tesão de cuca, de estar junto, de inventar coisa. O tesão físico, se vier, vem depois, acontece ou não. Mas os meus envolvimentos acabam me enrolando demais. Então, agora estou so­zinha, e tranqüila. Às vezes bate uma soli­dão, mas é um sentimento com que es­tou começando a saber lidar. Antes, quando sentia isso, jogava toda a carên­cia pra cima do parceiro. "Ah, você não gosta de mim." Não ter compromissos desobriga, é melhor... 16. E como você convive com sua fama? Esse lance de as pessoas olha­rem na rua, olham pra todo mundo que faz novela ou aparece na televisão. En­tão, passo um pouco por cima. Antiga­mente ainda ficava meio nervosa, por­que é estranho ir ao banco, um caminho que se fazia normalmente até meses atrás, mas agora o caixa diz: "Vem aqui, que estou vazio" [risos]. Daí a partir para "é, eu estou realmente representando o novo estilo da menina de 20 anos", isso não, que não vai me levar a lugar ne­nhum. Tenho mais é que trabalhar, co­mo sempre trabalhei, ser do jeito que sou. Agora, o sucesso pode pirar. 17. E você pirou? Passei uma grande parte deste ano preocupada com isso, entendeu? Não queria mudar minha vida por causa da primeira página do Caderno B [do Jornal do Brasil], da revista Contigo, en­tendeu? Queria continuar na minha, por­que às vezes a gente muda sem perceber. Eu e a Débora Bloch, que é minha gran­de amiga, do grupo Manhas e Manias, éramos unha e carne, só não somos ago­ra porque a filha da puta está trabalhan­do lá em Pelotas, em Santa Catarina [rin­do]... É no Rio Grande do Sul, né?... Nun­ca fui boa em geografia. Bom, eu repara­va nas mudanças da vida de Debbie, com o sucesso bombástico, melhor atriz do Brasil, maior estrela. Ficava observando, porque começam a te exigir, tem que ir na festinha de não sei quem, tem que ir aqui, tem quê. Aí eu pensava: "Ah, comi­go não, não vou ter que ser gentil ou mais simpática". Ficava tensa, com medo de que isso pudesse me acontecer. Mas acho que, graças a Deus, continuei sendo a mesma Andrea Beltrão, ficando em ca­sa lendo, queimando de vez em quando meu cigarrinho, tocando piano. 18. E como foi queimar um cigar­rinho? Foi um divertimento [pausa]. Sem querer dar nenhuma bandeira. Só me grila quando publicam com destaque "Fulano de tal é viciado em cocaína", co­mo fizeram com um amigo meu da Glo­bo. Acho que todos temos coisas mais sé­rias para cuidar. O que me preocupa é a qualidade do meu trabalho. 19. Você teve informação sobre sexo? Agora é diferente, tem até aula na escola [pausa]. Mas eu não tive isso não. Tinha era OSPB [Organização So­cial e Política do Brasil], só decorar nome de presidente. O máximo foi alguma tro­ca de informação com amigas. Mas, quando fiquei grávida pela primeira vez e tive de fazer aborto, fui com minha mãe numa clínica de Botafogo. Uma ex­periência horrível, porque é uma tremen­da vacilada ficar grávida podendo não fi­car... e porque estava indo pra interrom­per um lance. Pô, eu quero ter filhos, en­tão batia na cabeça: "Pode ser agora... mas agora não vai ser legal..." Isso ma­chuca fundo. Mas não dava, ter um filho naquela época teria sido um erro. 20. Em quem você vai votar? É minha segunda eleição. Da outra vez, fiquei com o PT. Agora, fico com Marcelo Cerqueira e João Saldanha, para a Prefeitura do Rio. É a única cha­pa que me cheira melhor. O quadro no Rio é desolador. São Paulo ainda tem o Fernando Henrique Cardoso, uma pessoa digna, não é um vira-casaca. Dos can­didatos do Rio, não conheço bem o passa­do de nenhum, até porque eles escondem isso, têm vergonha do que já fizeram. Mas política não é o meu barco, sou de uma geração que nasceu quando estou­rou a bomba no Brasil, houve persegui­ção contra um tio, sociólogo, num caos que não quero nem lembrar. Mas no que me cabe, eu luto até o fim. Pelo teatro, por exemplo, que é a minha barca. Entrevista publicada em outubro de 1985, ed. 123. Editora Abril, São Paulo - SP.

  • NANDA COSTA | AGOSTO, 2013

    NOSSA MULHER EM HAVANA A estrela Nanda Costa encarna o espírito caliente do país do rum, da rumba, da santeria e da sensualidade transpirante. FOTOS BOB WOLFENSON Cuba é quente, provocadora, especialmente em Havana: as ruas descascadas de uma era romântica, a música em cada esquina, a sensualidade do povo. Os cubanos, que enfrentam as dificuldades sem perder a alegria, são exuberantes. Cuba é um país diferente, mas não deixou de ser tipicamente latino-americano. O Estado de inspiração comunista restringe a religião, mas a população cultiva o sincretismo. Predominantemente católica, é também adepta da santeria — a umbanda com a cor local. Apesar de lá ser também proibido ou malvisto tudo o que vem dos Estados Unidos, o jeitinho cubano permite a devoção ao coelhinho de PLAYBOY, tão popular e recebido com simpatia no país quanto o Brasil e as nossas novelas. Aparece nos vidros dos carros, nas paredes, nos riquixás à moda cubana e na imaginação da população masculina. Tal combinação nos permitiu abrir uma janela de extraordinária liberdade no pais da censura, como se verá no ensaio de capa desta edição de aniversário, que, dessa forma, torna-se duplamente histórica. Com a colaboração do fotógrafo Bob Wolfenson, um astro da câmera que tra­zemos de volta a nossas páginas, nosso di­retor de arte Eduardo Hirama, acompa­nhado da editora Fabiana Moritz, foi a Havana com a atriz Nanda Costa e equi­pe para produzir uma velha mágica: fa­zer parecer fácil o trabalho que você vai ver. Contou com colaboradores inespe­rados, como Roelis Román Roa Zolue­ta — chamado, para simplificar, de "An­dré". Além de guia, André se transfor­mou num simpático e eficiente faz-tudo: de segurar guarda-sol até — sortudo! — fa­zer algumas aparições ao lado de Nanda. — Thales Guaracy, diretor de redação. Suor, talento e coragem POR QUE A ATRIZ NANDA COSTA ARREBATA CORAÇÕES AQUI E ACOLÁ Por — Ricardo Arcon O ano de 2013, ninguém duvida, é de Nanda Costa. No papel principal da última novela das 9 da Rede Globo, Salve Jorge, a atriz de 26 anos enfrentou sem medo o desafio de brilhar em meio a um elenco que contava com estrelas consagradas e tarimbadas, como Giovanna Antonelli e Letícia Spiller. Estreante como protagonista de um folhetim, mas já laureada por trabalhos no cinema, ela mostrou na TV a mesma determinação que a acompanha desde quando trocou Paraty (RJ), onde nasceu, por São Paulo, aos 14 anos. E que revela agora nas páginas de PLAYBOY. Na vida real, Nanda Costa é ainda mais for­te que Morena, a personagem criada pela dramaturga Gloria Perez. Longe do pai, que deixara a família anos antes, a adolescente Fernanda Costa Campos Cotote saiu da ci­dade fluminense em busca de se tocou uma atriz de sucesso. Foi morar com uma tia por parte de mãe "por quem era louca". Depois de apenas cinco meses na capital paulista, sofreu um baque: a perda da "tia Paula", morta num acidente de carro. Quando seu mundo desabou, Nanda poderia ter soter­rado todos os seus sonhos. Decidiu, porém, permanecer na cidade. Passou a morar num pensionato de freiras exclusivo para mulhe­res e a se dedicar com afinco à dramaturgia. Tal empenho, hoje, se reflete em seu currí­culo. Embora jovem, acumula dez papéis no ci­nema — alguns lhe renderam prêmios de melhor atriz. Com Sonhos Roubados, de 2009, levou esta­tuetas em festivais do Rio, de Paris, de Biarritz e de Miami; com Febre do Rato, de 2011, foi lau­reada em Paulínia. Antes de Salve jorge, fez três novelas: Cobras e Lagartos, de 2006; Viver a Vida, de 2009; e Cordel Encantado, de 2011. Atuou, também, numa peça de teatro e em sé­ries e especiais na TV. A atriz se dedica com entusiasmo a tudo que se propõe a fazer. Para o ensaio de PLAYBOY, desnudou-se sem receios em Havana, capital de um país em que reinam censuras diversas, e provou como beleza e fama são atributos menos importantes que coragem e talento para testar limites, quebrar tabus e atingir objetivos. Nanda Costa, em resumo, é a típica mulher brasileira: brejeira, guerreira e genuinamente encantadora. Ga­nhou, PLAYBOY. É evidente a sintonia que rolou entre você e o Bob Wolfenson. Como foi posar nua para as lentes dele? Na noite anterior, estava superansiosa. Acordei várias vezes durante a madrugada. Eu me olhava no espelho, via como estava o corpo, imaginava as posições que iria fazer. Apesar da vontade, nunca tinha trabalhado com o Bob. Foi legal conhecê-lo já num trabalho de tanta importância, num momento tão especial Tinha certeza de que o ensaio ficaria com muita qualidade. O olhar dele e o apoio da equipe me deram muita segurança. Posar nua não é nenhum bicho de sete cabeças. Foi uma experiência incrível. O que aconteceu de mais curioso durante o ensaio? Houve um probleminha com a polícia cubana, certo? Pois é. Estavamos fotografando no Malecón [famosa orla de Havana] , e o pessoal gritou: “Bota o short, fecha o casaco, rápido!” Era um policial que se aproximava. Ele me viu de relance. Saí do carro conversível e fui para a perua da produção. Começou um bafafá — o guarda querendo ver documentação, perguntando se estávamos fazendo fotos de nu, se a mulher era cubana... Ele começou a fazer um certo terror. Chegou a dizer: “Estas ruas têm câmeras, hein?!” Aí, quando a coisa me pareceu bastante séria, fui lá. E aí? O policial ficou sem reação quando me viu. Depois, disse: “Pena que não posso tirar uma foto contigo, pois estou fardado”. Ele sabia que eu era a Morena de Salve Jorge. Em Cuba passa muita novela da Globo. Segundo o próprio, ele e outros oficiais já tinham assistido à novela, para decidir se liberavam ou não sua veiculação no país. Enfim, negociei de tirar uma foto com ele mais tarde no hotel, sem a farda. E acabou dando tudo certo. Os cubanos se aglomeravam nos lugares a onde você ia. Isso Ihe deu medo? Não. Eu estava tranquila. Tem a uma história engraçada, reference a foto da barbearia. Eu estava ali completamente nua e compenetrada. Dai um homem, um popular, quebrou uma proteção junto ao topo de uma escada a poucos metros da gente, se debruçou no vão e começou a gritar para mim: "Te quiero, mi amor... Te quiero..." Eu séria, concentrada e pelada, e o cara falando putaria lá de cima. [Risos.] Você já tinha ficado nua em cena. No filme Febre do Rato (2O11), sua personagem urina na frente de um poeta e se masturba lendo um panfleto. Pela arte vale tudo? Ator não pode ser careta, ter amarras e preconceitos. Procuro ser o mais generosa e aberta possível na hora de analisar um trabalho e atuar. Mas, claro, tem coisas que não faria. Essa questão é  muito complexa. No caso de Febre do Rato, achei o roteiro muito interessante. Sabia que a personagem era questionadora, que seria um filme polêmico. Mas, um vez que visto a roupa da personagem, não tenho problema algum em tirá-la. Para quem você dedica este ensaio? Olha, a Morena era uma personagem muito forte, marcou muito. E muitas pessoas têm dificuldade de separar a Nanda Costa da Morena. E acho que este ensaio é uma virada. Então o dedico a todos que pensam que sou a Morena. Principalmente no começo de Salve Jorge, teve gente que a criticou. Como você segurou a onda e conseguiu manter-se focada no trabalho? Grande parte dessas críticas foi fruto de preconceito. Falavam: “Quem é essa atriz?”; “Que personagem ela fez?”; “Será que vai segurar a onda?” Para muita gente, eu era música nova. E há pessoas que não estão abertas para o novo. Claro que havia também aqueles que realmente não aprovavam o trabalho. E isso é bom. Assim se abre um canal para o debate, para a argumentação. Quando só falam bem, pronto: todo mundo já pula para o próximo assunto. Segurei a onda porque sou superexigente. Jamais me acomoda, sempre quero melhorar. Escutei muito os profissionais com quem trabalhava e a Gloria (Perez) segurou no meu braço e falou: “Vai, é isso que eu quero”. A novela também foi alvo de críticas. Disseram, por exemplo, que a trama tinha cenas inverossímeis e erros de continuidade. Concordemos num ponto: você bater num mulherão do tamanho da Claudia Raia, a Lívia Marini, seria difícil. Ou não? A Morena podia bater na Lívia, sim, porque ela tinha uma fúria... A Morena é o José Aldo [lutador brasileiro de MMA]: baixinha, mas é punk! Sua família sempre apoiou você na carreira? Sim, muito. Hoje minha família são minha mãe, minha avó materna, minha irmã e meu irmão. Sempre tive muito apoio deles porque saí de casa cedo, aos 14 anos. Mesmo adolescente, já era muito responsável e estudiosa. Você saiu de Paraty em busca de que exatamente? Sempre fui muito comunicativa e desde pequena falava que seria atriz. Nessa idade decidi trocar Paraty por São Paulo, onde havia boas escolas de teatro. Minha vida mudou radicalmente. Fui morar com uma tia, a Paula, por quem era louca. Mas, quando fazia cinco meses que morava na cidade, ela faleceu num acidente de carro. Agente estava indo passar em Paraty o Dia das Mães com a minha mãe. Fui com um primo no carro dele e minha tia foi sozinha no dela. Lembro que ela até brincou: “Vai me abandonar e ir com ele, é?” Ficamos todos muito mal. E você continuou em São Paulo. Sim. A partir daí, falei: “Quero dar alegria a minha família e ser motivo de orgulho”. Agarrei o sonho de ser atriz com todas as minhas forças. Morei em vários lugares. Primeiro num pensionato de freiras, na região dos Jardins. Fiquei um ano lá, entre 2002 e 2003. Estudei na Escola de Atores do Wolf Maia, que me deu uma bolsa e depois uma chance na televisão, na novela Cobras e Lagartos. Acho que ele viu naquela menina um olhar de mulher, meio sofrido, talvez. Eu conto assim, rápido, mas até chegar à TV foi um longo caminho. Estudei teatro por cinco anos, fiz inúmeros workshops, estudei e trabalhei muito, inclusive em restaurante japonês. Em algum momento da sua infância ou adolescência você passou dificuldade financeira? Quando conto a história da minha vida, as pessoas acham que passei fome. Isso nunca existiu. A dificuldade era estar distante de uma vida confortável em Paraty. Minha vida pode ter sido um pou­co difícil em São Paulo, afinal estava lon­ge da familia, mas fui eu que decidi seguir esse caminho. Buscava realizar um sonho. E agora, que você realizou seu so­nho em alto estilo, conte qual é o lado ruim da fama. A fama é um pacote com ônus e bônus. Quero preservar minha in­timidade, mas, independentemente disso, saem muitas inverdades na imprensa, as pessoas inventam. Isso é muito chato. Não gosto de deixar nas bancas a minha vida pessoal. Já o assédio do público conside­ro incrível. Só não gosto quando é desres­peitoso. Estou lá no aeroporto de cabelo preso e óculos escuros e vem uma pessoa e me pede para soltar o cabelo e tirar os óculos para uma foto. Pô, e aí, se você diz que não, te chamam de antipática. "Ah, é o preço da fama, ninguém mandou ser famosa!" Não é por aí. Respeito é fundamental. Quando o público vai vê-la atuan­do novamente? Não sei ao certo. Estou envolvida com três filmes: Língua Seca, que deve começar a ser rodado em janei­ro de 2014 e estrear em novembro; Meu Tempo é Agora, em que farei a mulher do [cantor] Marcelo D2; e tem ainda o Love Film Festival, que vou terminar de filmar. E na TV, nada de concreto por enquanto. Por falar em D2, qual sua opinião sobre a descriminalização da ma­conha? Cigarro é liberado e faz mal pra caramba. Sei lá, se proibissem, será que iam fumar mais? Acho que proibição é uma coisa... É difícil bo­tar minha opinião, porque vou fazer um filme que fala sobre a legalização. Não sou contra a legalização. Você já fumou maconha? [Risos.] Melhor não, né? Olha, sou mais care­ta do que parece. As pessoas acham que sou supermoderna, mas sou normal. O que você faz quando não está tra­balhando? Gosto de ficar em casa, des­cansando e ouvindo vinil. Tenho uma co­leção com uns 500 discos. Gosto de ouvir Elis Regina, Djavan, Cartola, Adoniran Barbosa, Ella Fitzgerald, entre outros. E literatura? Amo Guimarães Rosa; meu livro de cabeceira é Grande Sertão Veredas. Para finalizar, que recado você daria às suas colegas atrizes lindas o talentosas que ainda não aceitaram nosso convite para posar nua? Que é do ca­ralho! Assim, para uma amiga, diria que é do caralho. Para uma atriz com quem não tivesse intimidade, falaria apenas "faça". UM PEQUENO TEXTO DE AUTORIA DA NOSSA ESTRELA DE ANIVERSÁRIO, NANDA COSTA, 26 ANOS, QUE RESUME BEM O MODO COMO ELA ENXERGA A VIDA. ATENTE AO AGORA "Atente ao agora, que a frase acima já se foi. O tempo todo é assim. Tudo o que é vira era. Atente, atento, agora ao presente, que de tão presente que se é vai embora e deixa sempre um novo agora de presente" REALIZAÇÃO FABIANA MORITZ TRATAMENTO DE IMAGEM BRUSH STYLING FABRICIO MIRANDA BELEZA WILSON ELIODORIO PRODUÇÃO DE MODA TOM MARTINS ASSISTENTE DE PRODUÇÃO EXECUTIVA BRUNA ROSSI ASSISTENTES DE FOTOGRAFIA PEDRO BONACINA E RENATA TEREPINS AGRADECIMENTO ESPECIAL ANDRÉA LUZ, MARCELO SEBÁ, MARINA MORENA Publicado em agosto de 2013, ed. 459. Editora Abril, São Paulo - SP.

  • N.º 01 AGOSTO DE 1975: LÍVIA MUND

    DE HOMEM PARA HOMEM PONTOS DE VISTA ASSESSORIA CINEMA — Francis Ford Coppola FUTEBOL — José Inácio Werneck BAZAR LIVROS — Roberto Drummond ARTES PLÁSTICAS — Pietro Maria Bardi MÚSICA POPULAR BRASILEIRA — Paulinho da Viola MÚSICA ERUDITA — Isaac Karabtchevsky DINHEIRO — Paulo Samuelson GUERRA EM LÍNGUA DE SOTAQUE — ficção por Jorge Amado (veja o conto) VALERIE — mulher A CRISE MONETÁRIA — artigo por John Kenneth Galbraith A SANGUE-FRIO — humor por Gahan Wilson MEDICINA S.A. — debate L. R. Pinto e Rodrigues da Silva LÍVIA MUND — poster A MAIS LONGA DAS NOITES — lenda por Salernitano Masuccio OS MELHORES BARES DO MUNDO — bebida por E. Greenberg UM CONTO DE FADAS — ficção por Vladimir Nabokov CONFIE NO MDB — opinião por Célio Borja CONFIE NA ARENA — opinião por Franco Montoro A HISTÓRIA DA DISTENSÃO — artigo por C. Castello Branco LAPIDUS, DIOR, CERRUTI E CARDIN — moda O RESPEITÁVEL SENADOR — sátira por Hermilo Borba Filho KENNEDY NA INTIMIDADE — memórias por Benjamin Bradlee A ARTE DE SER PATRÃO — artigo por Jean Paul Getty A PASSAGEM DA TERRA — ficção por Arthur Clarke MINHA VEZ — Pelé Publicada em agosto de 1975, ed. 1. Editora Abril, São Paulo - SP.

  • N.º 03 OUTUBRO DE 1975: BIBI VOGEL

    DE HOMEM PARA HOMEM PONTOS DE VISTA ASSESSORIA CORREIO BAZAR FUTEBOL — José Inácio Werneck LIVROS — Roberto Drummond CINEMA — José Augusto MÚSICA ERUDITA — Isaac Karabtchevsky MÚSICA POPULAR INTERNACIONAL — Rogério Duprat DINHEIRO — Paul Samuelson MÚSICA POPULAR BRASILEIRA — Paulo Vanzolini ARTES PLÁSTICAS — Pietro Maria Bardi PORTUGAL — memórias por Érico Veríssimo BIBI VOGEL — mulher AS GRAÇAS DO INFERNO — humor por M. Ffolkes MCNAMARA E A FOME — entrevista O CEPEFÊ — ficção por João Ubaldo Ribeiro (Ver o conto) LOURÊNIA — poster UMA TROCA DE ENVELOPES — lenda por A. Houssaye CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA — artigo por A. Villas Bôas 14 DRINQUES PARA O CALOR — bebida por E. Greenberg O INVERNO — ficção por Tennessee Williams MARIA DELLA COSTA — mulher UM IATE PARA ESTRADA — idéia por Syd Mead SALVE SEU CORAÇÃO — artigo por Euclydes Marques O ADMIRÁVEL MUNDO DE HEMINGWAY — opinião O ÁTOMO — debate por Goldemberg, Ianni, Soares, Távora PÔQUER — jogo por B. Golson e J. Carroll AS FÉRIAS — ficção por Ray Bradbury Publicado em outubro de 1975, ed. 3. Editora Abril, São Paulo - SP.

  • N.º 02 SETEMBRO DE 1975: FERNANDA BRUNI

    DE HOMEM PARA HOMEM PONTOS DE VISTA ASSESSORIA LIVROS — Roberto Drummond TELEVISÃO — Pietro Maria Bardi BAZAR MÚSICA POPULAR INTERNACIONAL — Rogério Duprat MÚSICA ERUDITA — Isaac Karabtchevsky DINHEIRO — Paulo Samuelson FUTEBOL — Marcos de Castro TEATRO — Gianfrancesco Guarnieri O DIA DA NUVEM — ficção por Fausto Cunha FERNANDA BRUNI — mulher EU FUI AGENTE DA CIA — entrevista Philip Agee TAITI — viagem CLAIRE — poster O SACRIFÍCIO DO GUERREIRO — lenda POBRES HOMENS DE OURO — artigo por Aguinaldo Silva AS MOTOS DE TODOS OS DESEJOS — serviço TECNOLOGIA OU MISTICISMO? — debate por Watts e Clarke VOCÊ PODE SER UM BOM EXECUTIVO? — teste AH, SE TIVESSE DIVÓRCIO! — sátira por Bráulio Pedroso UM DIVA PARA O DR. FREUD — artigo por Morton Hunt UM JANTAR FRANCÊS — comida por Thomas Mario SEM SAÍDA — ficção Frederick Forsyth INSÔNIA — ensaio por Henry Miller (Ver o ensaio) MINHA VEZ — opinião por Nelson Pereira do Santos Publicado em setembro de 1975, ed. 2. Editora Abril, São Paulo - SP.

  • N.º 05 DEZEMBRO DE 1975: SUSANA GONÇALVES

    DE HOMEM PARA HOMEM PONTOS DE VISTA ASSESSORIA POLÍTICA — Carlos Castelo Branco DINHEIRO — Paul Samuelson BAZAR LIVROS — Roberto Drummond MÚSICA POPULAR BRASILEIRA — Fernando Lobo FUTEBOL — José Inácio Werneck MÚSICA ERUDITA — Isaac Karabtchevsky CINEMA — Sérgio Augusto ARTES PLÁSTICAS — Pietro Maria Bardi O CRIME PERFEITO — sátira por Chico Anísio A NEUROSE DOS RICOS — ensaio por J. K. Galbraith SUSANA GONÇALVES — mulher ESTE NATAL É DE GRAÇA — humor O PÊNALTI MALDITO — ficção por Plínio Marcos PRAZERES DEBAIXO D'ÁGUA — esporte LEILA — poster BOLÍVAR, O LIBERTADOR DE MARINA — lenda OS PRESENTES DE NATAL MARISA BERENSON — mulher O PAPO DE MOHAMMED ALI — entrevista (veja a entrevista) RÉVEILLON PARA DOIS — comida por Thomas Mario UMA GRANDE FESTA — comida por Paul Bocuse A ARGENTINA E SEUS FANTASMAS — artigo por Newton Carlos O PASTOR — ficção por Frederick Forsyth COMO VOCÊ É NA INTIMIDADE — teste O ASSASSINATO DE MARILYN MONROE — artigo por Anthony Scaduto (veja o artigo) O DESTINO DO HOMEM — artigo por Sir Julian Huxley Publicado em dezembro de 1975, ed. 5. Editora Abril, São Paulo - SP.

  • N.º 04 NOVEMBRO DE 1975: CHARLOTTE RAMPLING

    DE HOMEM PARA HOMEM PONTOS DE VISTA ASSESSORIA DINHEIRO — Paul Samuelson ARTES PLÁSTICAS — Pietro Maria Bardi MÚSICA POPULAR BRASILEIRA — Fernando Lobo BAZAR FUTEBOL — José Inácio Werneck CINEMA — Sérgio Augusto POLÍTICA — Carlos Castello Branco COMIDA — Guilherme Figueiredo DE AMOR E DE AMORES — poesia por Carlos Drummond de Andrade CHARLOTTE RAMPLING — mulher VOCÊ NÃO PASSA DE UM CENTAUTO — sátira Carlos Eduardo Novaes A MÁFIA NO BRASIL — artigo Aguinaldo Silva AS BAHAMAS — viagem NEIDE — poster A BAIANA E O FIDALGO — lenda por Pyrard de Laval ADEUS, RAINHA LAPA — memórias por Mário Lago A ARTE DA TATUAGEM — serviço O FALSÁRIO — entrevista, De Hory HOMENS AO MAR — moda A NOVA VASECTOMIA — artigo por Euclydes Marques COMO GANHAR UM MILHÃO QUAL É SUA GAROTA? — teste O MEDO — depoimentos INSULTOS — ficção por Alberto Moraiva (veja o conto) Publicado em novembro de 1975, ed. 4. Editora Abril, São Paulo - SP.

  • XUXA | AGOSTO, 1996

    Playboy Entrevista Uma conversa franca com a rainha dos altinhos sobre Senna, Pelé, Michael Jackson, sexo, amor ideal, carência afetiva, cachorros na cama e outros bichos. Deixe para trás os trombadinhas e os camelôs, as obras nas calçadas, as garotas à beira-mar e as ondas azuis clareando na areia. Deixe para trás o inferno e o paraíso do Rio de Janeiro, porque nós vamos mais além. No alto de uma montanha, dezenas de quilômetros ao sul da Zona Sul da cidade, existe uma rainha que se alimenta de pipoca e chocolate. Como no tempo em que havia vida nos castelos, está tudo lá: os guardas, os muros altos, alamedas de flores, piscinas redondas de pedra e flamingos que se movimentam quadro a quadro, como num filme congelado. Sobe-se a estrada de Jacarepaguá, numa sucessão de curvas, e bate-se na entrada da mansão, que parece arquitetada por um cenógrafo de Hollywood — o portão é descomunal e sustenta dois brasões onde estão desenhadas as letras XM. Xuxa Merteghel. É aqui que ela mora. Xuxa vive sozinha num palacete cor de rosa de cinco quartos, a Casa Rosa, que antes dela pertenceu ao falecido cirurgião plástico Rogério Henrique Garraio e fica encravada no meio de um terreno de 70.000 metros quadrados. A 50 metros da sede está uma réplica do casarão, numa versão de três quartos, onde vive parte do clã da artista: o pai Luís Meneghel, capitão da reserva do Exército, uma irmã dele chamada Cleci e um sobrinho, Chester. Perto da casa dos agregados fica a garagem, onde a divisão é clara: de um lado espremem-se os Fiat, Gol e outros carros dos familiares e dos empregados domésticos; no outro, perfilam-se os quatro bólidos da apresentadora — dois Audi V-8, um Mitsubishi e uma Cherokee. Mas para percorrer os sete hectares da propriedade, avaliada em até 8 milhões de reais, Xuxa e seus convidados se valem de dois silenciosos carrinhos elétricos, daqueles utilizados nos campos de golfe. Com eles, sobe-se por uma alameda que passa por uma piscina, uma sauna, uma choupana com um sushi-bar, um quiosque com churrasqueira e por fim dá num heliporto. Dali do alto Xuxa pode voar para outros dos seus domínios: a Ilha Catitas, que comprou em Angra dos Reis, ou a fazenda de 350 hectares em Rio Bonito, no interior fluminense, onde cria gado leiteiro. Ou, ainda, o sítio de 10 hectares em Pedra da Guaratiba, no município do Rio, onde mantém duas relíquias — um zoológico particular e uma casa atulhada com tudo o que já ganhou dos fãs em treze anos de estrelato na televisão. Nesse sítio, que não fica longe da fundação em que alimenta e dá estudo diário para 250 crianças carentes, a um custo de 600.000 reais por ano, Xuxa costuma passar boa parte das suas tardes livres. Ela se fecha sozinha na casa, relendo cartinhas apaixonadas e mexendo em painéis, quadros, bonecas, fitinhas coloridas e badulaques de todo tipo. Mais do que qualquer coisa que possa comprar, estes são os seus tesouros favoritos. O resto todo ela tem à mão, mas amor não é tão fácil. A artista que fatura 1 milhão de reais por mês surpreendeu a todos, no fim do ano passado, ao se confessar pobre de amor. Em seu programa Xuxa Park, exibido pela Rede Globo nas manhãs de sábado, revelou que estava disposta a ter um filho por inseminação artificial, sem conhecer o doador do sêmen. Estava cansada de esperar por um príncipe encantado — uma constatação amarga, acima de tudo, para quem quase sempre conseguiu o que quis. Essa gaúcha de 33 anos, nascida em Santa Rosa do Sul, batizada Maria da Graça por ter sobrevivido a um parto difícil e crescida na Zona Norte carioca até chegar a 1,77 metro de formas perfeitas, conseguiu ser o máximo em praticamente tudo o que se propôs fazer. Primeiro venceu como modelo, depois como vendedora de discos (15 milhões de cópias até hoje) e como apresentadora de TV, desde sua estréia na Rede Manchete, em 1983. Na ocasião, Xuxa começou uma parceria aparentemente indissolúvel com Marlene Mattos, uma ex-professora primária maranhense de 44 anos que orienta toda a sua carreira e boa parte da sua vida pessoal. Esse, sim, foi um casamento que deu certo: pelas mãos de Marlene, que recebe 20% da maioria dos seus contratos e é sua sócia numa série de empreendimentos, Xuxa chegou a ter simultaneamente um programa diário na Rede Globo, outro gravado na Argentina e distribuído para dezessete países da América Latina, um semanal na Espanha e outro diário nos Estados Unidos. O programa americano foi, aliás, o único fracasso profissional de Xuxa, iniciado e encerrado em 1993. Ela explica que se sentiu sem domínio suficiente do inglês para lidar com as crianças americanas que, desabituadas ao calor latino, limpavam o rosto com um certo horror cada vez que a animadora, como sempre faz com seus pequenos fãs, lascava um beijo nas suas bochechas. "Fiquei presa, estranhando tudo", conta Xuxa. A aventura, que culminou com uma séria crise na coluna, responsável por sua internação num hospital em Nova York, serviu para que Xuxa repensasse não só a carreira como a vida afetiva, na qual ela também acumulou alguns desencantos em romances como os que manteve com os astros esportivos Pelé e Ayrton Senna. Xuxa já tinha falado longamente a PLAYBOY em 1983, quando era venerada como um dos maiores sex-symbols do Brasil, mas apenas engatinhava na televisão. Para entrevistar esta mulher ainda mais fascinante em que Xuxa se transformou de lá para cá, PLAYBOY destacou o editor-contribuinte Guilherme Cunha Pinto, que conviveu com ela durante uma semana, resumida nas seguintes anotações: "Fizemos quatro sessões de gravações. A primeira num terraço da Casa Rosa, numa ocasião em que ela vestia jeans, botas brancas e uma camisa de abotoar. Maria do Rosário, a governanta alagoana de 50 anos que cuida dela como de uma filha, serviu suco de melão, chás, pipoca com queijo cheddar e, por fim, um pote de cristal com chocolates Garoto sortidos. Perto da meia-noite, depois das primeiras 3 horas de entrevista, Xuxa interrompeu a gravação para fazer ginástica. Antes de irmos embora, Marlene Mattos me levou para conhecer a propriedade, ela própria guiando um carrinho de golfe na noite silenciosa, entre as sombras das árvores e dos guarda-costas espalhados por todo o terreno. "Continuamos a entrevista duas noites depois. Xuxa não acorda antes do meio-dia —, na sua suíte num hotel em São José do Rio Preto, no interior paulista. Nessa rodada, Xuxa vestia um abrigo cinza, de lãzinha, e havia um grupo de guarda-costas vigiando o corredor do hotel. A terceira sessão, na semana seguinte, foi durante um vôo de São Paulo para Porto Alegre num Lear Jet que a empresa de alimentos Arisco deixa à disposição de Xuxa; num beneficio adicional a um contrato de publicidade que vale em torno de 5 milhões de reais por ano. Durante o voo, Xuxa não tocou na colorida cesta de sanduíches que passou de mão em mão — os sanduíches de frango embrulhados em papel alumínio azul, os de peixe em alumínio prateado. Ela tem alergia, repulsa a carne vermelha em geral, e também rejeita carne de frango desde que viu num documentário como as aves são abatidas. "Terminamos a entrevista na própria noite da viagem, na suíte de seu hotel em Porto Alegre, num intervalo de seu encontro com um grupo de primos e sobrinhos gaúchos. Na tarde seguinte, Xuxa visitou um hospital infantil da capital gaúcha. Uma das crianças internadas, uma garotinha de 5 anos chamada Mariana, que sofre de hipotermia — quedas de temperatura para 33 graus —, destacou-se da multidão, correu para agarrar a mão do artista e não a largou até o fim da visita. Na despedida, Xuxa levou um choque ao ser informada do nome inteiro da criança: Mariana Sena da Silva. Nascida, aliás, de mãe solteira, no Hospital Xuxa Meneghel, em Santa Rosa do Sul. "Nos dias anteriores, Xuxa havia quebrado um longo silêncio e falado a PLAYBOY, como nunca em qualquer outra entrevista, sobre Ayrton Senna da Silva, sua última paixão. Por um instante, num corredor do hospital, ela fez aquele olhar para lugar nenhum, triste, de um azul abismado — o olhar de que existem coisas que só acontecem com ela." PLAYBOY — Quando deu sua primeira grande entrevista para PLAYBOY, treze anos atrás, você tinha um apartamento no Grajaú [Zona Norte do Rio de Janeiro], duas casinhas na praia de Coroa Grande [no sul do Estado], um e três telefones. Hoje, você sabe tudo o que tem? XUXA — Não. Sei que tenho muita coisa, mas não sei quantos apartamentos, onde e tal. PLAYBOY — Você pode ter dez apartamentos no Rio, por exemplo? XUXA — Não tenho ideia. Isso deixo sempre para a Marlene [Mattos] e para a Xuxa Produções. Às vezes, entra um dinheiro na firma e ela já compra no meu nome, entendeu? Mas nunca perguntei e nem quero saber. PLAYBOY — Você pode ter um apartamento em São Paulo e pode não ter? XUXA — Não sei. Por acaso fiquei sabendo, há pouco tempo, que tinha um em Miami. Estive lá e fui visitar um pessoa que trabalha para mim, a Lola. Comecei a elogiar tudo: "Que legal esse teu apartamento, que vista bonita!" Ela falou: "Não é meu, não. É teu." Eu não sabia! "É meu?" E ela: "É!" [Risos.] PLAYBOY — Mas como é sua vida financeira? Você faz cheques ou não? XUXA — Só cheque e cartão. [Repete, balançando a cabeça para a frente.] Só faço cheque e cartão. E quando entro num lugar não posso saber os preços, porque acho tudo caro. Uma noite entrei numa loja Versace, em Nova York — e o preço da Versace é uma coisa, não é? Peguei umas roupas, experimentei, achei lindas e dei o cartão. A mulher falou: "Você não quer saber o preço?" Respondi: "Não. Se me disser o preço não vou levar" [risos]. Quando cheguei em casa, liguei para a Marlene disse: "Comprei umas roupas lindas. Não me pergunte o preço." PLAYBOY — Quando você não era tão rica e famosa, quais eram os seus objetos de desejo? Roupas? XUXA — À noite eu só chorava. E rezava dizendo: "Um dia ainda vou ter muito dinheiro para comprar o que estiver fim". Queria comprar presentes para minha mãe, queria comprar coisas para mim e não podia. Uma vez, perto do Dia das Mães, fui a um supermercado em Bento Ribeiro [subúrbio do Rio] porque queria comprar umas bacias para a minha mãe bater bolo para a gente, para os cinco filhos. Queria tirar duas daquelas bacias de plástico, uma azul e uma rosinha, mas meu dinheiro não era suficiente. Então quis trocar o preço e um cara do supermercado me pegou. Chorei muito, pedi mil desculpas e disse que nunca mais eu iria fazer isso na vida. Hoje, saio de casa sem saber quanto vou ganhar. Não sei quanto ganho na Rede Globo, não sei nada. Quando vou fazer um comercial, não sei se dura 30 segundos, se dura 1 hora — faço da mesma maneira, porque sei que as pessoas que trabalham para mim brigaram para que eu ganhasse bem. PLAYBOY — Desde quando a Marlene Mattos cuida de tudo para você? XUXA — Quando eu era modelo, meu pai era o contador. Um ano e meio ou dois depois que comecei a trabalhar com a Marlene, na Rede Manchete, passei tudo para ela. No começo ela vinha com aqueles livros de débitos e créditos, quanto entrava e quanto saía por mês, porque queria que eu soubesse onde estava investindo. Falei: "Não estou a fim de saber." Simplesmente larguei na mão dela. É muito cômodo não querer, nem precisar saber. PLAYBOY — Ainda voltando à sua primeira entrevista a PLAYBOY: treze anos atrás você disse outras coisas interessantes. Por exemplo, que poderia ficar seis meses sem sexo. XUXA — Eu disse isso? Com 20 anos? Danadinha! [Risos.] PLAYBOY — Depois, numa entrevista mais recente, você revelou que já estava há mais de dois anos sem relações. XUXA — Quando a gente é jovem, pensa muito em transar. Em ficar com uma pessoa por ficar, ou para deixar as vontades em dia. Mas depois, quando a gente vai ficando mais velha, não há como fazer sexo — e sim como fazer amor. E isso a gente só faz quando gosta realmente da pessoa. Gosto muito do antes e do depois, sabe? O carinho que vem antes de transar. Gosto do depois, que é ficar agarradinha à pessoa. Fazendo o "S" da Sadia, aquele assim... [desenha um gesto no ar serpenteando a mão para o alto]. Sou carente de carteirinha, mas prefiro ficar sozinha do que mal acompanhada. Mesmo. PLAYBOY — Mas você está há quanto sem se relacionar? XUXA — Olha, vamos dizer assim: antigamente eu... [Faz uma pausa.] Acho, que isso não vem ao caso. O que importa é minha maneira de pensar. Só faço isso quando, realmente, gosto mais do que da ponta do nariz da pessoa. Se tiver essa química, essa essência no ar, e se achar que posso investir nesse relacionamento, aí pode acontecer. PLAYBOY — Mas você entende a curiosidade? Um das mulheres mais lindas do mundo, morando sozinha numa casa cinematográfica, anuncia que procura um pai para o filho que quer ter... Criou-se urna expectativa internacional, até, em torno de sua vida íntima. Isso incomoda muito? XUXA — Às vezes. As pessoas falam muito assim: "Ah, tadinha!" Esse "tadinha" me incomoda. Porque não sou "tadinha". Tenho a vida que escolhi e uma das coisas que não quero é ter um homem diferente a cada dia na minha cama. Se quisesse, isso poderia acontecer. Mas não quero. Não vou me forçar a nada para que parem de me chamar de "tadinha" ou parem de duvidar da minha sexualidade. Quero um namorado. Quero alguém por quem me apaixone. Uma pessoa que eu sonhe que possa ser o pai dos meus filhos, entendeu? É só isso. Mas como minha vida é pública, saem muitas notícias e parece que estou desesperada, à procura de um cara. PLAYBOY — Você pensa muito ou pouco em sexo? XUXA — Acho que o normal. O normal para uma pessoa de 33 anos, acho. Trabalho muito, penso muito no meu trabalho. Mas será mentira se disser que não penso em sexo. Afinal, ir para minha casa sozinha... Trabalhar com o sentimento de pessoas que demonstram carinho por mim o tempo inteiro, que falam: "Eu te adoro, eu te quero, eu te amo!" Já chego em casa com a minha carência gritando, entende? Com vontade de demonstrar o meu carinho por alguém. E quando não tenho essa pessoa... Quando vou dormir, sozinha, às vezes bate, sim. Dá uma vontade de ter alguém. PLAYBOY — E isso você compensa de que maneira? XUXA — Quando estou carente eu durmo. PLAYBOY — Come chocolate e dorme? XUXA — [Rindo.] Procuro dormir, rapidinho. Muitas vezes demoro. Fico lá com o olhão aberto, elétrica. E acabo fazendo muita ginástica, porque a energia tem de ir para algum lugar, não é? Fico 1 hora em cima de uma máquina, até sentir que estou um pouquinho cansada. Dormir bem para mim é muito importante. Preciso mais de dormir do que de comer. Falo para minha equipe: posso trabalhar 12, 14 horas — mas preciso dormir 10. PLAYBOY — O que você precisa ter em torno para dormir bem? XUXA — Gosto de dormir bem no escuro. Não entra uma claridade que seja, nem uma luzinha daquelas na televisão, nada. E no frio. Meu ar-condicionado é poderoso. PLAYBOY — Poderoso quanto? XUXA — Fica nos 12 graus. PLAYBOY — Isso é Estocolmo. [Risos.] Doze graus! Então você dorme com lã. XUXA — Não. Durmo sem roupa. Tenho muito calor. PLAYBOY — Sem roupa, como a Marilyn Monroe? Só com duas gotas de Chanel número 5? XUXA — Com dois vidros de Azzaro, porque sou exagerada [risos]. E um edredom por cima. O frio me faz bem. Tinha problemas no rosto, até que um dermatologista me explicou que minha pele pede o contraste entre o frio e o calor. Não é uma pele para o clima tropical. PLAYBOY — É verdade que você dorme com seus cachorros? XUXA — Com um, só. O Zé do Pimpo, aquele ali [aponta um Yorkshire Toy, de menos de dois palmos de comprimento]. PLAYBOY — Desculpe, mas não é meio mau-cheiroso, assim na cama?... XUXA — Não. Só a boca, mas não durmo cheirando a boca dele. PLAYBOY — Não corre o risco de você amassar o cachorrinho, se virando de repente em cima dele? XUXA — Uma vez acordei para ir ao banheiro, levantei a coberta e ele voou longe [risos]. Ele viaja comigo na primeira classe, quando vou ficar muito tempo fora. PLAYBOY — Xuxa, você sabe que se fala muito sobre sua sexualidade. Já se falou inclusive que você e a Marlene Mattos teriam um romance. Você pode dizer se isso é verdade? XUXA — Ah, já falaram isso para mim. Para a Marlene também. Isso surgiu na época em que comecei a trabalhar na [Rede] Manchete. As pessoas falaram descaradamente, assim. A princípio me enchia um pouco. Até fiquei preocupada, me perguntando: "Será que eu tenho cara? Será que eu tenho jeito?" Já falaram que eu teria um caso com as Paquitas. Diziam que o caso era eu, Marlene e uma das Paquitas, porque a gente andava muito juntas. Da [cantora] Simone já falaram. PLAYBOY — Você tem alguma dúvida sobre sua sexualidade? XUXA — Não. Não, mesmo! Uma coisa que posso dizer que está resolvida na minha cabeça é essa. Tenho muitos amigos heterossexuais, homossexuais, bissexuais, trissexuais, entendeu? Assexuados também. Conheço um monte de gente. Posso dizer que se fico sozinha, é por opção minha. Mas sei muito bem o que gosto e o que quero. Não preciso provar para os outros que sou mulher. As pessoas que ficaram comigo poderiam responder melhor. PLAYBOY — Você já teve alguma experiência homossexual? XUXA — Não. Mas acho que não precisa ter experiência. Pode ter vontade. PLAYBOY — E você já teve vontade? XUXA — Não. Por isso é que estou falando. Já ouvi mulheres dizendo: "Nossa, aquela mulher é linda! Com ela eu teria um caso." Eu nunca senti isso. PLAYBOY — Esses boatos podem ter aumentado depois que você anunciou a disposição de ter filho por inseminação artificial. Ficou a ideia de que não existe homem para você. XUXA — Tanto existe que estou procurando. Nunca disse que um pai para o meu filho não é importante. O que eu disse é que quero ter um filho, e o meu relógio está avançando para um limite — por tudo o que li, pelos médicos que ouvi, o ideal é uma mulher ter o seu primeiro filho até os 35 anos de idade. A partir daí, a gravidez passa a ter algum risco. E, se existe uma chance de colocar em risco a vida de uma criança, por que não tê-la antes? Isso que estou dizendo não é uma história desesperadora, de uma pessoa carente, querendo preencher a vida com o capricho de ter uma criança — e sim de uma mulher que tem vontade de fazer uma família. PLAYBOY — Mas não seria fundamental achar o pai antes? XUXA — Uma família pode ter pai ou não. O difícil é não ter mãe. Quero me apaixonar. Evidentemente, quero ter alguém. Mas, se não aparecer, vou ter essa criança sozinha. PLAYBOY — Você poderia adotar uma criança, depois de encontrar o parceiro — seja lá com que idade for. XUXA — Mas primeiro não sei se vou encontrar o parceiro. E, se encontrar depois de ter a criança, ele vai aceitar meu filho como se fosse seu — se não for capaz disso, em princípio, já não serve para mim. Se eu adotasse uma criança, ela não saberia quem é o seu pai e a sua mãe. Já se eu tiver o filho por inseminação in vitro, ele vai conhecer ao menos a mãe. PLAYBOY — Como as pessoas perto de você reagem a esse seu projeto? Seu pai, sua mãe, a Marlene... XUXA — A Marlene é contra. Ela acha que a criança deve ter um pai e ponto. Não importa se eu goste ou não goste. Já o meu pai eu não sei o que acha. Não falo muito com ele. PLAYBOY — Mesmo ele morando ao seu lado, vocês não se falam? XUXA — A gente se vê muito pouco. Fiquei sete anos sem falar com ele, virou uma coisa meio esquisita... [Referência a um rompimento acontecido em 1988, quando o pai de Xuxa, Luís Meneghel, foi flagrado num romance com uma garota chamada Ana Lúcia Rocha Borges — depois de ter negado para a família que estivesse vivendo uma relação extra-conjugal. No ano passado, houve uma reconciliação pública entre Xuxa e o pai no programa que comemorou o 33° aniversário da apresentadora]. Quando meu pai voltou, quando ele reentrou na minha vida, eu já tinha meus bichos que não o reconheciam. Eu mesma não o reconhecia, porque ele tinha um outro jeito, outra maneira até de sentar, de falar, tinhas as novas amizades dele. Houve uma quebra de intimidade, de confiança mesmo. E sinto que tenho uma dificuldade em perdoar, descobri isso em mim. PLAYBOY — E a sua mãe? XUXA — Minha mãe mora na Espanha desde que se separou, e buscou saber os lugares onde a inseminação pode ser feita na Europa. Na Espanha nenhuma clinica tem os genes que quero. Na Alemanha e na França tem. PLAYBOY — Que genes são esses? Você faz questão de algum tipo físico? XUXA — Não tenho o menor preconceito, mas já que fazendo inseminação vou ser o pai e a mãe da criança, quero que ela seja o mais parecida possível comigo. Os genes da minha família são uma mistura de alemão, austríaco, italiano e polonês. [Sonhadora.] Estou doida pra ver se vai nascer com a ponta do meu nariz, se vai nascer com pouco cabelo, como eu, ou se vai nascer com muito... PLAYBOY — Mas, afinal, qual é a dificuldade para encontrar um amor na vida, que evitaria essa decisão drástica? XUXA — Encontrar a pessoa certa não é fácil para ninguém, e ainda é menos fácil para mim. PLAYBOY — Você acha que os homens têm algum medo de se aproximar? XUXA — Acho que, normalmente, os homens se aproximam de mulheres que dependem deles, não é? E eu dependeria de um homem só afetivamente, porque o resto todo eu tenho. Não dependo de um homem que me sustente. Pelo contrário. Então acho que inibe, que é uma responsabilidade o cara já chegar pensando: "Poxa, será que eu vou conseguir fazer a Xuxa feliz? Porque ela não precisa de mim para nada! O dia em que estiver um pouco triste ela vai me dizer `tchau'." Entendeu? Ele precisaria ter uma estrutura muito forte para aguentar tudo o que vem comigo, tudo o que vão dizer, o que vão vasculhar na vida dele. Se o cara não tiver dinheiro, vão dizer que quer o meu dinheiro. Se for rico, vão dizer que quer a fama. Se for do meio artístico, vão dizer que quer aparecer... Coitado. Coitado do cara! PLAYBOY — E os seus medos, quais são? XUXA — Acho que muitas pessoas que chegam perto de mim, ou declaram que gostariam de estar comigo, me vêem como um objeto, um troféu. Tenho de me preservar. Não é que eu queira virar poesia na cabeça das pessoas, mas também não quero ser um objeto na mão de ninguém. Porque a pessoa vai sair dizendo "Eu comi a Xuxa!", em vez de dizer: "Eu fiz amor com ela." Já me falaram: "Ah, você não pode encucar com isso, senão não vai se relacionar com ninguém." Mas imagina se eu não fizesse isso: tem gente que se especializa, é profissional em enganar os outros! De fazer um esqueminha assim: "OK, a Xuxa gosta de atletas, então vou ajeitar o meu corpo. Ela não gosta de quem fume nem beba, então vou dizer que não bebo nem fumo." E a minha carência é tão grande, a vontade de encontrar alguém, o medo de ficar sozinha... Eu tenho esse receio. Um dos meus medos é ter procurado tanto, tanto — e cair de cara na lama. PLAYBOY — Como você pensa em ter a garantia de que encontrou a pessoa certa? XUXA — Não sei... Já racionalizei muito, já achei que ele deveria ter isso ou aquilo, mas hoje acredito que a única coisa fundamental é que goste muito de mim. O resto eu mudo [risos]. Deve ter, em algum lugar, uma pessoa em quem vou bater o olho e sentir: "É esta!" Acho que deve ser aquele amor fulminante, porque é besteira, é demagogia eu ficar dizendo para as pessoas que quero um tempo para a gente se conhecer bem, sair de mão dada... Não dá. Estou com 33 anos. O cara que vai me namorar eu vou botar dentro da minha casa, entendeu? PLAYBOY — Parece simples, desse ângulo. XUXA — Mas é muito complicado, porque é difícil as situações acontecerem com naturalidade. É só eu sair uma noite com um cara, para jantar, as pessoas já dizem que esse cara vai ser o reprodutor, o pai dos meus filhos! É muito, não é? PLAYBOY — Há algum tempo, a Folha de S.Paulo publicou a foto de um empresário paulista, o ex-modelo Luciano Szafir, informando que seria seu novo namorado. XUXA — Ah, o Luciano eu conheci antes do Ayrton [Senna]. A gente se conheceu numa sessão de fotos para a revista NOVA. Rolou um climinha, assim. A foto era de três homens me agarrando. Em quase todas as fotos eu estou olhando mais para ele — moreno, bonitão... [risos]. Uma das fotos era de um beijo e eu fiz com ele. Quando acabou, o fotógrafo disse: "Tá bom!" E a gente continuou lá, se beijando. PLAYBOY — Um beijo de verdade? XUXA — Foi. Eu não sou atriz! [Risos.] Aí a gente ficou um pouco, saiu um pouquinho. Mas ele era muito jovenzinho para mim, a cabeça era outra. Na época, ele tinha 20 anos e eu 25. PLAYBOY — Vocês só se reencontraram agora? XUXA — Em seguida conheci o Ayrton e a gente ficou namorando. Nunca mais tinha visto o Luciano, mas ele continuava falando com minha mãe e com algumas pessoas que trabalhavam comigo. Recentemente fui fazer umas fotos para a NOVA, outra vez, e ele estava lá. A gente saiu para jantar, com o fotógrafo, a mulher do fotógrafo e tal. No outro dia, já foi publicado que a gente estava namorando. PLAYBOY — E não é verdade? XUXA — Não é verdade. No outro dia, fiz fotos para a ELLE, e ele estava lá também. O Luciano se modificou, está mais homem, mais bonito. Queria conhecê-lo, mas não dá, entendeu? Nem dá para conhecer, porque as pessoas já dizem que vai ser o homem que... Já me sinto mal. É uma coisa esquisita, não dá nem tempo de conhecer alguém. As pessoas já te casam, te separam. PLAYBOY — Sabe uma impressão que fica? Que uma pessoa comum nunca vai ter chance com você. Pensando nos seus namorados, ou são celebridades como Pelé e Ayrton Senna, ou modelos de beleza; como esse rapaz. É isso? XUXA — Não, não é. As coisas simplesmente aconteceram. O encontro com o Pelé foi por acaso, a gente se conheceu numa fotografia que fui fazer. E no caso do Ayrton foi ele quem buscou, de todas as maneiras, chegar perto de mim. Eu me apaixonei por duas figuras conhecidas, mas pode pintar qualquer pessoa. PLAYBOY — A aparência não é importante? Se não for um sujeito bonitão... XUXA — E tu acha o Pele bonitão? PLAYBOY — [Confuso.] O Pelé? XUXA — Na época eu achava ele o máximo! Lindo. Mas já achava e continuo achando o pé dele horrível. O resto eu achava maravilhoso. Entendeu? PLAYBOY — Você não gosta dos pés do Pelé? XUXA — São horríveis. PLAYBOY — Aqueles pés que fizeram... XUXA — Horríveis. Parecem garras. PLAYBOY — Aqueles pés ganharam três Copas do Mundo! XUXA — Uma mulher que gosta de pé não pode olhar para o pé dele. PLAYBOY — Você deve ser a única pessoa do mundo que não admira os pés do Pelé. XUXA — Eu dizia para ele: "Se um dia tu arrumar uma namorada que tenha tara por pé, tu tem de ficar de meia." Você não viu o pé dele [risos]. PLAYBOY — Você e o Pelé namoraram durante seis anos, no começo da sua carreira. Agora faz tempo que não se falam? XUXA — [Séria.] Eu não falo mais com ele. Faz tempo, já. PLAYBOY — Foi por causa da entrevista que ele deu para PLAYBOY três anos atrás? [Nessa entrevista, em meio a diversos outros comentários e afirmações sobre Xuxa, Pelé disse que ela teria revelado ser virgem quando os dois se conheceram no início da década de 80. E que a teria aconselhado a "resolver esse problema" antes de se envolver com ele.] XUXA — Não. Foi por uma série de coisas que aconteceram. PLAYBOY — Mas e o que ele falou na entrevista? XUXA — O Pelé faz parte da minha história e eu faço parte da história dele, mas acho que isso era uma coisa que não deveria ser dita, porque se alguém teria de falar seria eu. Ficou uma coisa grotesca. E, já que ele resolveu falar, que falasse a verdade. Quando a gente se conheceu, ele não sabia que eu era — eu não me apresentava às pessoas e dizia: "Olá, meu nome é Xuxa, eu sou virgem." Eu era virgem, mas ele só foi descobrir depois, quando a gente já estava junto. PLAYBOY — Você teria dito, depois dessa entrevista do Pelé, que se por acaso se apaixonasse de novo por um rei, não seria um rei tão pequeno como ele. A raiva continua tão grande? XUXA — Vamos dizer assim: tive momentos bons e ruins com ele. Às vezes, a gente aprende muito mais errando. E eu aprendi muito com ele. Hoje, não poderia ficar com uma pessoa tão pequena. PLAYBOY — Pequena em que sentido, precisamente? XUXA — É aqui [apontando a cabeça]. Saem coisas que, às vezes, não dá para entender. Dá o microfone para ele falar, que você vai sentir, vai ouvir. Ele é pequeno. Mas faz parte, fez parte da minha vida. Não posso negar isso, nunca. PLAYBOY — Numa certa medida ele apresentou o mundo para você, não foi? XUXA — Ele me apresentou muita coisa. Muita coisa boa, também. Um ponto que o Pelé tinha de legal é que queria me ver crescendo profissionalmente. Mas talvez não soubesse que eu teria tantas oportunidades. Uma vez ele disse para mim: "Nunca queira ser a melhor. Porque é muito difícil ser o primeiro." Quando eu quis sair da Manchete para ir para a Globo, ele disse: "Não faça isso. Não queira. Você vai ter de provar que é a melhor todo dia." Pois hoje posso dizer que é muito bom ser a melhor. Não gostaria de ser a segunda. PLAYBOY — Você tem uma história forte com vencedores. Primeiro, o Pelé. Por último, o Ayrton Senna — ele foi a sua última paixão? XUXA — [Quase inaudivelmente.] Foi. PLAYBOY — Por que você tem evitado falar sobre o seu romance com ele? XUXA — Ao contrário de muita gente que quer tornar público o que viveu, eu não quero. Tenho ciúme dessa história, sabe? Tenho ela como minha, só. Até porque ninguém acreditou. Então acho que não tenho de provar para ninguém. O que vivi com ele, o que a gente viveu, vou guardar só para mim. [Faz uma pausa, emocionada.] Só gostaria de... As pessoas... Antes de ele morrer, as pessoas gostavam dele. Hoje adoram. Idolatram. Gostaria que ele estivesse vivo para ver isso. [Corrigindo.] Para viver isso. Ver, talvez ele até esteja vendo. Mas viver isso. PLAYBOY — Ele não se sentia muito querido? XUXA — Não. Pelo público dele, pelas pessoas que o admiravam, sim. Mas era muito cobrado, não é? PLAYBOY — Bom, havia uma divisão: a turma do Senna e a turma do Nelson Piquet, que inclusive espalhava alguns boatos... XUXA — Sei lá. É. Em outras coisas, também. Ele era muito cobrado e ficava meio... Ele era um crianção. A única coisa que posso deixar bem claro também, para as pessoas que não o conheceram, é que ele era muito criança. Muito, muito brincalhão. E também uma das pessoas mais cheirosas que já conheci [risos]. PLAYBOY — Cheirosas? XUXA — Cheirosas. Muito cheiroso. Limpinho, cheirosinho. Em todos os sentidos. De longe, já dava para saber que ele estava em casa. "Tem homem cheiroso em casa!" Eu já sabia que ele estava chegando. PLAYBOY — Como era a química entre vocês? XUXA — Ele era ariano, e eu também. Ele nasceu dia 21 de março e eu 27 de março. A gente era bem parecido. PLAYBOY — Deu para notar isso logo? XUXA — Já percebi que a coisa ia ser meio esquisita porque meu cachorrinho grudou nele [risos]. O Zé do Pimpo tem ciúme de qualquer pessoa que chegue perto de mim, e já grudou nele. Eu falei: "Caramba!" E quando a gente foi se cumprimentar ficou muito tempo apertando a mão, um olhando a cara do outro. Pensei: "Que coisa estranha!" Não sou de fazer isso. PLAYBOY — Quando duas pessoas se identificam muito, a intensidade tem dois lados — quando surgem os conflitos... XUXA — É brabo. Eu sabia que, quando desse o choque, ia ser... PLAYBOY — A pessoa é capaz de brigar por causa de uma besteira completa. XUXA — [Cada vez mais triste.] Por nada! PLAYBOY — No caso de vocês, qualquer um podia pegar seu próprio avião e sair voando. XUXA — Ele era uma criança muito pura. Brincava de fazer barulho com a boca [imita o motor de um carro de corrida], dizendo: "Passou uma Ferrari agora!" Fazia a marcha e tudo com a boca. "Agora uma Benetton!" PLAYBOY — A impressão que se tinha de longe é que o mundo dele era muito motorizado. Tudo girava em torno de corrida. XUXA — A gente falava de um monte de coisa, também, além disso. Mas eu também tenho um fascínio por carros. PLAYBOY — Você assistiu a mais alguma corrida de Fórmula-1 depois da morte dele? XUXA — Não. PLAYBOY — Você assistia? XUXA — Assistia por ele, só. Assisti duas vezes ao vivo, com ele. Eu não podia deixar de trabalhar, de fazer tudo o que fazia, porque tenho várias atividades e uma é tão importante quanto a outra — a televisão é importante, o disco é importante, o show, as fotografias. Anda tudo junto. Eu tinha de fazer várias coisas, sabe? E não era o caso dele, porque ele tinha de treinar e correr. Ele tinha pouco tempo, também, mas tinha mais tempo livre do que eu. Muito mais. PLAYBOY — É difícil, mesmo para uma celebridade, aceitar a independência da mulher? Você acha que isso pode ter prejudicado... XUXA — Acho que ali acima de tudo foi falta de tempo. Acho que ele estava procurando uma pessoa para acompanhar a carreira dele, para seguir nos boxes com ele. Normalmente os corredores levam suas esposas, estão sempre com mulheres por perto, e ele estava sempre sem ninguém, sozinho. Me ligava às vezes do motor home: "Ah, estou aqui, não sei o quê." PLAYBOY — E havia aquela história maldosa de que não se interessava muito pelas mulheres. XUXA — Ele estava buscando se livrar de todos os fantasmas de que falaram. E, além do mais, a carência dele estava... Ele estava querendo alguém perto. PLAYBOY — E você também. XUXA — Acho que aí é que a coisa pegou. Não sei até se eu gostaria de alguém me acompanhando nos shows. Mas é muito bom chegar em casa e ter alguém te esperando. Eu nunca tive uma coisa assim, a não ser com o Béco [apelido de Ayrton Senna]. Aconteceu de eu ligar: "Daqui a 15 minutos vou estar aí." E ele dizia: "Vê se vem mais rápido." Aí eu chegava em 10 minutos, o motor do carro pegando fogo. E ele falava: "Muito rápido! Vai mais devagar." Eu nunca tive isso, entendeu? Alguém esperando. PLAYBOY — Mas esse ritmo de vida foi desgastando o romance. XUXA — A gente só podia ficar junto na folga dele. A princípio, ele disse: "Para ficar com você eu tenho de saber o quanto teu trabalho é importante." Depois de algum tempo, disse: "Não, não! Tem de diminuir o trabalho, senão não dá..." Mas eu tinha muito mais trabalho naquela época, estava fazendo muita coisa. Muita coisa. Estava com um programa diário no Brasil e outro na Argentina, estava com um programa semanal na Espanha e estava estudando inglês para fazer um programa diário nos Estados Unidos. E fazia quarenta shows ao vivo por ano. PLAYBOY — O Ayrton Senna chegou a pedir para você parar com tudo para ficar com ele? XUXA — Ele falou: "Ou você diminui o teu trabalho, ou arruma um espaço para mim." PLAYBOY — Você chegou a discutir isso com a Marlene? XUXA — Imagina! A Marlene nem sabe disso. Não falei porque nem considerei essa possibilidade. Para mim, o mais importante continua sendo o meu trabalho. PLAYBOY — Mesmo se pudesse voltar no tempo, não consideraria essa possibilidade? XUXA — Eu pensaria duas vezes. Não falaria um "não" tão seco quanto eu falei. Falaria um "não" mais devagar. Falei: "Não, nem pensar!" Hoje eu diria: "Vamos conversar." PLAYBOY — Você já revelou, numa outra entrevista, que sua primeira relação foi com um namorado chamado Marquinhos, que era juvenil do Flamengo. Namorou também um outro jogador de futebol, chamado Valtinho "Coalhada". Depois foi o Pelé, depois o Senna. Os atletas têm mais chances com você? XUXA — Não é isso. Talvez tenha acontecido porque, na maioria das vezes, os atletas não bebem e não fumam, porque têm de trabalhar com o corpo. Sempre gostei mais das pessoas que cuidam do corpo, porque é além de tudo uma demonstração de amor próprio. Eu não fumo e não bebo, então vai ser chato se eu ficar namorando alguém que fume. Eu beijo a pessoa cheirando. A pele é muito importante para mim. O cheiro da pessoa, o gosto. PLAYBOY — Pelo que você vê na televisão e nas revistas, quais são os modelos de beleza masculina que estão no esporte? XUXA — Existe um cara na Espanha, um triatleta, chamado Duran. Nossa, menino! É bonito, viu? Bonito! PLAYBOY — E no futebol? XUXA — [Depois de pensar um bom tempo.] O Raí. PLAYBOY — E os rapazes do vôlei, que provocam uma histeria entre as adolescentes? XUXA — Eles são legais. Outro dia me encontrei com eles no aeroporto, aproveitei e tirei fotos com todos. "Marlene, vamos trocar as Paquitas por eles! Olha, Marlene, que monte de homens!" [Risos.] Eles são enormes. PLAYBOY — E nadadores? Você fez um comercial com o Xuxa. XUXA — Não, não vi nenhum, assim... Tem uma pessoa, que não é atleta, mas que eu acho muito bonito. É o John-John [Fitzgerald Kennedy JR., filho do falecido presidente americano John Kennedy]. PLAYBOY — Já íamos chegar lá [risos]. Ficou famoso um flerte seu com ele. XUXA — Jantamos uma vez, em Nova York. Aquele carinha é muito bonitinho. Olhos de mel, pele morena, cabelo preto — talvez por ser loira, me chama a atenção homem moreno. Gosto assim de homem mais de moreno para mulato... PLAYBOY — Sem preconceitos. XUXA — Me choca quando as pessoas falam isso de preconceito. Admiro também muitos homens louros, como o Mel Gibson, já namorei pessoas bem claras. Mas quando vejo uma pele tostada! Tostadinha, parecendo chocolate... Uma das coisas que me chamavam muito a atenção, quando eu estava com o Pelé, era a cor dele. Eu ficava olhando, assim... Eu lambia, mordia, para ver se saía [risos]. PLAYBOY — Voltando ao John-John Kennedy. XUXA — Eu tinha uma foto dele no meu quarto. Uma dele e uma do Ayrton. O Ayrton até falava: "O que é que a foto dele está fazendo aqui?" Eu dizia: "Olha, a sua foto é maior do que a dele. Você é o titular, é o meu namorado. Mas ele é tão bonito..." [Risos.] E o Ayrton: "Você gosta desse cara!" PLAYBOY — Entre as notícias mais recentes a respeito de John-John, uma foi sobre o leilão que os filhos fizeram de objetos que pertenceram a John Kennedy e a Jacqueline Kennedy Onassis, seus pais. Você pensou em comprar alguma coisa? XUXA — Se o filho estivesse à venda, eu dava qualquer lance. Falei para a Marlene que dava até a Casa Rosa [risos]. PLAYBOY — Outra notícia é que ele foi visto num bar na West Broadway, em Nova York, fazendo uma pirâmide de copos de tequila. XUXA — Tadinho! PLAYBOY — Se for o John-John Kennedy , tudo bem beber? XUXA — [Compreensiva.] Bom, nem sei se esses copos seriam todos dele. Pelo que eu sei, ele não bebe. Deve ter bebido aquilo por algum motivo. Ele deve estar precisando de alguém, de uma amizade. Alguém com pulso forte [risos]. PLAYBOY — Muitos homens já disseram "não" para você na vida? XUXA — Um monte, na época da adolescência. Chegando perto dos 18 anos, eu queria deixar de ser virgem de qualquer jeito — e eles ficavam com medo. PLAYBOY — Isso você chegou a mencionar, naquela primeira entrevista sua para PLAYBOY. Contou que no meio das modelos, naquela época, você era motivo de zombarias por não ter experiência sexual. Mas era uma outra época: não havia surgido a Aids, estávamos em plena explosão da liberdade sexual. Agora, passados treze anos, dá para entender melhor seus conflitos nessa fase? XUXA — Me lembro que nessa época não existia ninfeta fotografando. As modelos eram todas mais vividas. Depois é que veio a [atriz americana] Brooke Shields e começaram a pintar as meninas mais novinhas. Na época em que comecei a fotografar, com 16 anos, isso não era comum. Eu vim novinha do subúrbio, insegura, não querendo destoar. PLAYBOY — Mas você já apareceu fazendo fotos sensuais. XUXA — A primeira vez que fotografei, com 15 para 16 anos, o cara falou assim: "Cara de tesão, minha filha!" Fiz uma cara qualquer e ele disse: "Você não sabe o que é tesão?" Respondi: "Não, senhor" [risos]. Então ele se aproximou e começou a explicar: "Está vendo essa luz? Olha pra essa luz e faz olhar de mormaço, faz de conta que não está aguentando a luz. Aí, fica assim!" Depois veio com um lápis e disse: "Põe o lápis atravessado na boca. Morde o lápis. Isso! Agora tira o lápis, mas não mexe a boca! Chupa o ar. Aí!" [Risos.] Então isso era cara de tesão. Em todas as fotos sensuais na época eu fazia isso. PLAYBOY — Quando você começou a despertar para o sexo? XUXA — Eu era tão ingênua que, na época dos bailinhos em Bento Ribeiro, achava que podia engravidar com beijo. Uma menina amiga minha explicou que não e trouxe uma revista de sexo explicito. Abriu e disse: "É assim, ó." E eu [carregando no acento gaúcho]: "Bá, o pai faz isso com a mãe!" PLAYBOY — Eram fotos ou desenhos? XUXA — Fotos, horríveis. Era um carrasco. A revista era sadomasoquista e tinha um cara com um capuz na cabeça, chicote, a mulher estava amarrada na cama [risos]. Fiquei desesperada: "Meu pai faz isso com a minha mãe!" Sempre que minha mãe trancava a porta eu achava que ele ia colocar aquele treco na cabeça e começar. Passei dias sem conseguir nem olhar para o meu pai, morrendo de pena da minha mãe. Entrei no quarto deles e procurei em todos os lugares, embaixo da cama, no armário, para ver se encontrava o capuz [risos]. Fiquei horrorizada, achando que eles tinham feito isso para eu nascer. PLAYBOY — Você é a caçula de cinco filhos de um militar gaúcho. Sexo e corpo eram assuntos reprimidos na sua casa? XUXA — Não, não, a minha mãe sempre tratou isso de uma forma muito natural. Não na teoria, porque ela casou muito cedo, com 15 anos. Com 16 já teve o primeiro filho... Então tinha coisas que ela mesma não sabia, para passar para a gente nessa fase. Mas ela não queria que a gente tivesse vergonha do corpo, sabe? Nós morávamos num apartamento de dois quartos — um quarto era dos meus pais, no outro ficavam quatro filhos e um irmão dormia na sala. Eram três meninas e dois meninos, para um banheiro só. Minha mãe dizia: "Rápido! Tomem banho vocês dois juntos." Não tínhamos ar-condicionado. Muitas vezes minhas irmãs dormiam nuas, ou só de calcinha, e já tinham peito e tudo. Eu sempre cresci vendo isso, sem problema. PLAYBOY — Essa naturalidade deve ter ajudado bastante em sua carreira de modelo, apesar da ingenuidade. XUXA — A primeira vez em que fiz [a revista] Ele Ela era uma foto só de bumbum. O texto era: "Abertura no Carnaval" [risos]. Eles precisavam de um bumbum num biquíni com umas franjinhas. Eu tinha 17 anos. Levei minha mãe para o estúdio e ela perguntou se podia me ver fotografar. Quando falei que podia, eles ficaram cheios de medo: "Ai, meu Deus, e agora?" Minha mãe olhou e falou: "Mas essa franja não está muito grande, não?" Pegou uma tesoura, cortou a franjinha e perguntou: "E se passar um óleo no bumbum dela?" Todo o mundo: "É bom, é bom!" Ainda arrumou um ventilador, para ter o efeito das franjinhas subindo... No outro dia, o pessoal do estúdio queria saber: "Quando é que tua mãe vem aí?" [Risos.] Ela adorou, quando a foto foi publicada em página dupla. Mostrava para todo o mundo: "Olha que lindo!" Era só uma foto. Ela tinha feito uma coisa para a foto ficar bonita — não estava vendendo meu corpo. PLAYBOY — Você e a Luíza Brunet marcaram uma mudança no estilo das modelos brasileiras, não é? Recuperaram as curvas. XUXA — Quando nós começamos a trabalhar — e ela começou um pouco antes que eu —, modelos de beleza eram aquelas mulheres mais esguias. Aparecemos como uma coisa mais Brasil, numa época em que as pessoas acho que estavam precisando de algo mais sensual. A gente era rechonchuda não porque quisesse, mas porque não conseguia emagrecer. Nós tentávamos de todas as maneiras. Logo fizemos amizade e andávamos juntas para todo lado. Chegávamos num hotel decididas: "Não vamos comer, não é?" "Não." "Vamos pedir um chá?" "É, um chá completo" [risos]. Aí a gente comia tudo: pãozinho, torrada, bolinho... Acabava com tudo. A gente era grudadíssima. Quando íamos fotografar fora do Rio, reservavam dois apartamentos, mas nós preferíamos ficar juntas. Lembro que uma vez. me queimei, quando tive a ideia de deixar a água bem quente para enfumaçar o banheiro e improvisar uma sauna. Começou a sair um foguinho da fiação, fui desligar e me queimei. A Luíza saiu correndo para o corredor, pelada e gritando: "Socorro! Socorro!" Os caras ficaram loucos. Ela trouxe um médico, ficou a noite toda cuidando de mim. Eu me mexia e ela dizia: "Você está bem?" PLAYBOY — Vocês ainda são muito amigas? XUXA — Tenho o maior carinho por ela e sei que ela torce por mim, mas não é mais a mesma coisa. Não é a paixão que a gente tinha. Primeiro houve um distanciamento natural, quando ela passou a ser modelo exclusivo da [griffe] Dijon e a gente deixou de trabalhar tão juntas. E depois aconteceu uma história. Quando a Luíza casou pela segunda vez, uma pessoa me fez uma fofoca do marido dela. Achei que deveria contar para ela, como amiga, e contei. Acho que se estivesse no lugar dela teria uma reação igual, iria falar com o meu marido e o meu marido diria alguma coisa como: "Ela está querendo separar a gente." Sei lá, nem sei se foi isso. Sei que, há um ano e meio, nós nos reencontramos. Ela foi lá em casa e, por mais que eu quisesse abraçá-la e falar... estava esquisito. Quebrou o encanto. Mesmo da parte dela, também. Parece que quebraram um copo, tentaram colar, colou, mas está trincado. Eu era doida por ela, sabe? Era a irmã que eu queria ter. PLAYBOY — Ingênua do jeito que era, como você enfrentou o assédio que deve ter acontecido depois que virou sex symbol? Houve inclusive um episódio dramático em Cleveland, nos Estados Unidos, que até hoje nunca ficou muito bem explicado. Como foi aquilo? XUXA — Fui chamada para fazer umas fotos nos Estados Unidos, em janeiro ou fevereiro de 1980. Lembro da data porque estava para fazer 18 anos. Meu pai teve de assinar uma autorização, uma pessoa levou o contrato até em casa, no Grajaú, depositaram no banco 50% do valor e eu viajei. No avião conversei com um militar brasileiro que me perguntou o que eu ia fazer em Cleveland. Disse que ia fotografar e ele estranhou. Me deu um cartão com o telefone dele e o nome de uma secretária. Falou: "Se precisar de alguma coisa, entre em contato comigo." Cheguei e tinha uma limusine me esperando, com um motorista brasileiro. Eu estava toda feliz na limusine, pulando de um banco para o outro. Falei alguma coisa com o motorista e ele perguntou: "Você sabe por que está aqui?" Respondi: "Vou fotografar." Ele riu: "Te disseram que e pra fotografar? Olha, é bom saber: acho que não é isso não." Fiquei com um pouco de medo, mas estava me divertindo tanto... Chegando no hotel, ele perguntou se eu queria alguma coisa, e comprei um monte de pipocas, de vários sabores, e muitos doces. Quando cheguei ao quarto, tinha um guarda na porta, fardado. O motorista disse: "Pronto. Está entregue." Me explicou que eu iria receber uma visita às 4 da tarde e que não poderia sair até lá. O guarda ficou do lado de fora, sem dizer uma palavra. Eu queria tomar banho, mas não achava a água quente. Abri a porta, para ver se o homem me ajudava, mas ele não se mexia. Eu disse: "O senhor não pode entrar pra arrumar o meu chuveiro? O senhor fala português?" O motorista acabou me ligando para me alertar que não haveria foto nenhuma e que um militar graduado iria entrar no quarto. Comecei a chorar, desesperada, mas não consegui ligar para a minha família no Brasil. Estava num terceiro andar. Pensei: "Meu Deus, vou pular daqui!" Aí me lembrei de ligar para aquele outro militar, que tinha me dado o cartão no avião. No cartão tinha o nome da secretária, Bárbara. Liguei e ela atendeu: "Bárbara?", perguntei. Ela disse: "É." Comecei a chorar: "Pelo amor de Deus..." Ela perguntou a minha idade. Eu disse: "Quase 18." Ela falava: "Calma, Calma." PLAYBOY — Em 1980 estávamos no fim da ditadura. Hoje, passados dezesseis anos, você pode dizer o nome desse militar que chegaria às 4 da tarde em seu quarto? XUXA — Não tive contato com essa pessoa. Não sei se o motorista falou o nome certo. Não posso falar uma coisa que não tenho certeza. PLAYBOY — Mas era uma pessoa ligada ao governo do então presidente João Figueiredo? XUXA — Como assim, uma pessoa do governo? Era um militar. E foi um outra militar que me tirou de lá... PLAYBOY — Sim, o governo estava cheio de militares. Esse que ia chegar era ministro? XUXA — Bá, não vou dizer o nome. Era um militar. PLAYBOY — Do alto escalão? XUXA — Alto escalão, mesmo. Cheio de estrelona. PLAYBOY — Está vivo? XUXA — Não sei. [Rindo, com ar impaciente.] Não sei se está vivo. Não vou falar mais sobre isso. PLAYBOY — Em poucos anos, você era não só uma modelo de sucesso ou um dos maiores símbolos sexuais do país — você já tinha se transformado numa apresentadora de televisão de extraordinário sucesso e, além disso, começava a bater todos os recordes de vendagem de disco. Quando você se deu conta desse fenômeno? XUXA — Uma vez, quando ainda estava na Manchete, me convidaram para ir para a Rede Globo, mas falaram que eu não poderia ter um programa com meu nome, porque não era costume da casa. Falei que só iria então quando pudesse ter um programa com meu nome. Uma outra vez conversei com uma pessoa da Globo, que me aconselhou a esquecer que era a Xuxa, teria de recomeçar como Maria da Graça. Eu só disse: "Vocês ainda vão falar muito desse nome." Passou-se um ano, acho que não chegou a dois anos, eu sei que um dia estava na Globo, deitada num bolão de cartas, esperando uma troca de câmera num intervalo da gravação do meu programa. Estava olhando para o teto, vendo o meu nome enorme escrito com umas luzinhas, deitada naquelas cartas, e falei: "Puxa vida, meu nome! Meu programa na Globo!" Nunca vou esquecer aquelas luzinhas brilhando, e eu ali embaixo deitada. Feliz, mais do que tudo, porque tinha conquistado tudo aquilo com meu trabalho, sem me vender. Ninguém tinha me dado nada de graça. PLAYBOY — Você tinha ideia de que poderia ir tão longe? XUXA — Quando era pequena eu falava coisas que não tinham o menor cabimento, vendo ali na hora. Como pegar uma revista e dizer para as pessoas lá em casa: "Vocês ainda vão me ver aqui." Uma vez o Pelé estava dando uma entrevista na televisão e eu parei de pular corda e disse: "Vou casar com ele." As pessoas olhavam espantadas para mim: "Está maluca, Xuxa?" O meu pai falou: "Não liga não, que ela é assim mesmo." Um amigo do meu pai que estava em casa é que me lembrou dessa história, outro dia, porque eu não lembrava mais. A primeira vez em que saí da Zona Norte e fui para a Zona Sul do Rio, fiquei deslumbrada com a Lagoa [Rodrigo de Freitas] e falei para minha irmã e o namorado dela: "Eles fazem prédios em cima das pedras! Ainda vou ter um apartamento aqui." Muitos anos depois, quando comprei meu primeiro apartamento, e não fui nem eu quem procurou, o apartamento era na lagoa. PLAYBOY — Você era muito mística? Rezava muito? XUXA — Falava muito com Deus. Batia altos papos. Chamava Ele de Cara, o Cara Lá de Cima, e as pessoas não entendiam, achavam pejorativo. Mas eu tinha muita intimidade, pedia tudo pra Ele... E sabe que Ele realizava? Pedidos de criança, coisas bobas tipo: "Quero um passarinho". Bá, a janela ficou aberta e, depois de uns dois dias, entrou um periquitinho azul, o Nando. Eu dizia: "Nossa, que rápido! Obrigada." Queria um cachorro, aparecia um em seguida. Eu era ruim de matemática, pintou um professor que gostou muito de mim. Eu era baixinha, chorava à noite por causa disso, e fiquei a mais alta entre as irmãs. Teve uma fase em que eu queria ter o cabelo preto como a Branca de Neve, e foi a época em que o meu cabelo escureceu mais, na minha vida toda. Pode parecer criancice para algumas pessoas, mas Ele conversa comigo muitas vezes. PLAYBOY — Até hoje? XUXA — Às vezes estou com uma pergunta na cabeça, pensando comigo mesma, e passa uma pessoa dizendo a resposta. Parece uma coisa de doido. Eu vinha vindo no corredor da Globo, pensando numa coisa e me perguntando se ela poderia acontecer ou se era ilusão minha. Aí passaram dois caras conversando e um falou para o outro: "Não, meu, isso nunca vai acontecer, é ilusão." Entendeu? Falei: "Caramba!" PLAYBOY — Você teve a visão de alguma coisa que não aconteceu ainda? XUXA — As coisas não vêm assim como uma visão. Não sei... Eu quero ter filhos gêmeos, sempre falei isso, desde pequena. E, se fizer inseminação artificial, a chance é maior, não é? Então, o fato de não ter encontrado uma pessoa pode levar a isso. PLAYBOY — Você brincava mais do que, quando criança? XUXA — Tive uma infância muito rica. Não era de brincar com bonecas. As bonecas não mexiam! Gostava de brincar com bichos. E tinha uma amiga invisível, conversava muito com ela. O nome dela era Anne. Tinha os cabelos meio encaracolados, usava uma roupa clara. Aparecia de repente e começávamos a brincar. Tomávamos banho juntas, fingindo que estávamos passeando na rua, no meio da chuva. A noite, eu deitava na beira da cama e minha mãe mandava eu ir mais para o meio. Eu dizia que não podia, porque aquele era o espaço da Anne. E a minha mãe, com aquela cabeça fantástica dela, falava: "Está certo, mas então diz para a Anne se apertar um pouquinho mais para lá, se não você vai cair" [risos]. PLAYBOY — Essa amiga invisível ficava direto com você? XUXA — Ela me levava até a escola, mas não entrava. Eu dava um sorriso de despedida para ela e entrava. PLAYBOY — As pessoas não achavam que você era maluca? XUXA — Muitas achavam, porque eu ficava falando sozinha. Isso aconteceu quando eu tinha entre 8 e 10 anos. Depois dos 10 anos mudou, tanto que falei para as pessoas: "Fiquei adulta! Cresci!" Porque a Anne não apareceu mais. Chorei muito quando completei 11 anos, que foi quando houve uma virada muito grande na minha vida — dei o meu primeiro beijo, perdi a minha amiga. PLAYBOY — Hoje, existe unta amiga muito visível, com você o tempo todo — Marlene Mattos. Você acha que teria chegado onde chegou sem ela por perto? XUXA — Não acho, tenho certeza absoluta de que não. Certeza absoluta. PLAYBOY — Onde ela é fundamental na sua vida? XUXA — Na minha vida pessoal e na minha vida profissional. PLAYBOY — Bom, não sobra muito mais, não é? XUXA — A única certeza absoluta que tenho na vida é a de que eu só pude ter tudo isso porque alguém deu 24 horas do dia dela, nesses treze anos juntas, pensando e fazendo coisas para mim. E essa pessoa é a Marlene. PLAYBOY — A Marlene Mattos diz que não tem a menor preocupação em ser simpática ou antipática para as pessoas, porque a única preocupação dela é proteger você. Ela está à sua frente para impedir que algo possa aborrecer ou incomodar você. Mas essa proteção toda não faz você se sentir, assim... XUXA — Alienada? PLAYBOY — É. XUXA — Até em alguns pontos penso que sou. Mas eu também escolhi isso. PLAYBOY — Como você se informa sobre o que está acontecendo no mundo? Vê os noticiários na televisão, por exemplo? Lê revistas? XUXA — Telejornais, às vezes. Revistas, leio quase todas. Leio bastante no avião, porque viajo muito e as viagens são longas. Gosto muito da Marie Claire e da ELLE. PLAYBOY — E jornais, você não lê? XUXA — A gente assina o Jornal do Brasil e O Globo lá em casa. Às vezes eu leio um pouquinho. Não gosto muito de ler jornal, porque me dá muita preocupação. Não é uma coisa que não posso saber, ou que não tenho interesse em saber — eu não devo saber, entende? Eu, realmente, fico... caio em depressão. Teve uma época em que a Marlene me obrigava a ler. Eu abria a porta, já estavam todos os jornais ali. Eu ia tomar café, e ela mandava as pessoas lá de casa: "Pede pra Xuxa ler, nem que sejam as primeiras páginas, para ela saber o que está acontecendo." A minha tia Cleci, que mora comigo, marcava com bolinhas as coisas que achava que eu deveria ler mais... Tive uma crise, alguns anos atrás, por causa disso. PLAYBOY — Que tipo de crise? XUXA — Todo dia queria ler as notícias, até para ver se já tinha mudado alguma coisa, se já estava melhorando. E passava isso no programa. Não sou uma atriz, para segurar aquilo como informação e usar num personagem. Sou verdadeira e aquilo tudo estava na minha cara. Tinha dias em que eu abria o programa dizendo: "Se está ruim pra você, pensa positivo. Vai melhorar. Acredite que vai melhorar." Tinha dias em que eu falava: "Está ruim para todo o mundo, viu, gente? Está um horror!" E a Marlene: "Mas o que ela está falando? Não era pra ela falar isso!" Mas é que eu me via no programa, alegre, dizendo que o mundo era ótimo, e via o que estava acontecendo no mundo, um matando o outro. Me sentia fazendo papel de idiota. PLAYBOY — Como você saiu dessa crise? XUXA — Concluí que o meu público não é aquele que lê jornal, ou que precisa saber de tudo o que está no jornal. A criança, até uma certa idade, só tem a obrigação de se divertir. A infância passa rápido. A criança se preocupa muito em querer virar logo um adulto, mas ser adulto é sinônimo de problema, de obrigações. E a criança só tem uma obrigação: ser feliz. PLAYBOY — Você acha que as pessoas devem formar ali uma reserva de felicidade que sirva de referência, de busca, quando elas estiverem enfrentando a vida mais tarde? XUXA — Mais ou menos isso. Acho que existem várias pessoas amarguradas porque não tiveram uma infância boa, porque não puderam ou não souberam aproveitar. Então acho que minha função no programa é ser a hora do recreio. As brincadeiras que levei para o Xou da Xuxa eram muitas das que fiz quando pequena. Tanto é que a Marlene nem mexe nisso, talvez porque ela não tenha tido uma infância tão rica como a minha. Quando a gente prepara o repertório dos meus discos, ela deixa para mim a escolha das músicas bem infantis, as músicas de besteirol. E escolhe aquelas com mensagem, para ensinar, porque já foi professora no Maranhão e vê o outro lado. PLAYBOY — Você gosta da sua voz? XUXA — Odeio a minha voz. Odeio [risos]. Acho chatinha de ouvir. Quando ouço alguma coisa que gravei, e estou distraída, sempre acho que é uma criança que está falando. PLAYBOY — Você não ouve os seus discos? XUXA — Não ouço. Não gosto mesmo. Meu disco não toca em casa, de jeito nenhum! [Risos.] Ouço as músicas para aprender, gravo, ouço mais uma vez no carro, para ver se está legal. Depois que está pronto não tenho mais por que ouvir. Quando fui fazer aulas de canto, a primeira coisa que queriam fazer era mudar minha voz. Mas fiquei com medo. Porque esta voz, que eu não gosto, o público gosta. Muita gente pensa que falo de brincadeira, que fico fazendo essa vozinha infantil. Mas ela é assim. PLAYBOY — Por que o seu programa deixou de ser diário? XUXA — Porque a fórmula estava sendo muito usada, estava desgastada. Parei com o programa diário porque quis, poderia ter continuado aqui e na Argentina, fazendo programa para a América Latina inteira. Mas preferi ficar só com um semanal, tanto no Brasil como no programa em espanhol, que estou relançando na Argentina agora em setembro. Eu quis diminuir meu trabalho e também achei que o esquema do diário estava cansando, estava tudo muito parecido. Eu botava alguma coisa, mudava o canal e pouco tempo depois estava lá também — se eu punha bandeira, pompom, eles punham também. Comecei com quatro Paquitas, colocaram quatro meninas; mudei para oito, passaram para oito. As músicas, as roupas eram parecidas. Achei assim: "Se eu paro, eu que sou a base, as pessoas que me imitam não vão ter onde se espelhar, vão ter de parar." Que foi o que aconteceu, não é? Começaram a fazer qualquer coisa. Nesse sentido, acho que a fórmula do Xou da Xuxa foi guardada. PLAYBOY — A direção da Globo não deve achar isso, porque contratou a Angélica para um programa diário. XUXA — [Neutra] Isso eu não sei. PLAYBOY — Você acha que alguma das apresentadoras que seguiram o seu caminho tem um estilo diferente, tem vida própria? XUXA — Tem. Cada uma tem o seu valor. Acho que a Mara tem uma voz maravilhosa. Eu acho que ela é a cantora. A Angélica dá muito certo com adolescentes, passa uma coisa legal e tem uma imagem bonita. E a Eliana é bem infantil. Costumo chamá-la de Eliana dos Dedinhos, porque ela faz aquela coisa dos dedinhos. PLAYBOY — Na sua opinião, existem mulheres mais bonitas do que você no Brasil? XUXA — Muitas. Nem me acho muito bonita. Acho que sou fotogênica. Às vezes olho fotos minhas e digo: "Danada, bichinha, tu estava horrível e saiu bem na foto!" Mas o conjunto funciona. PLAYBOY — De que você não gosta no seu rosto? XUXA — Não gosto do meu nariz, que é bicudo, não gosto do olho, que acho pequeno, não gosto do cabelo, que é fino e pouco. Queria ter um cabelão grande, pesado. PLAYBOY — Qual é a cor do seu cabelo? XUXA — O cabelo é meu. É esta cor que está aqui. Só uso uma camomila que minha mãe manda da Espanha. Boto camomila no sol, e ele vai clareando. PLAYBOY — Mas quem você acha mais bonita que você? XUXA — A Luíza [Brunet]. PLAYBOY — Só? XUXA — A Ana Paula Arósio. Ela é muito linda. Muito. Uma Brooke Shields melhorada. Como padrão de beleza, prefiro as morenas, mais tipo Gabriela. Sempre gostei das belezas mais selvagens — entre as loiras, mais para Brigitte Bardot do que para Marilyn Monroe, entende? PLAYBOY — Você acha a Adriane Galisteu bonita? XUXA — [Secamente.] Feia ela não é. [E repete.] Feia ela não é. PLAYBOY — Xuxa, você convive com ídolos no Brasil e no exterior, é recebida por presidentes de vários países. Você tem algum interesse por política? XUXA — Não. PLAYBOY — Em quem você votou para presidente? XUXA — É segredo, tá? O voto é secreto. PLAYBOY — Mas você votaria pela reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso? XUXA — Eu não falo sobre política. PLAYBOY — Não é nem política, é uma questão de pele, de confiança: você compraria um carro usado do presidente? XUXA — Não sei o suficiente para falar. Não acho nada, nem quero achar. Na política só tenho um amigo, de quem eu gosto muito. É o [governador do Ceará] Tasso Jereissati. PLAYBOY — Ele é amigo do presidente Fernando Henrique, também, por acaso. XUXA — Sei, mas eu não me meto nas amizades dele. [Risos.] Sabe do que eu gosto nele? Não é aquele político que diz: "Meu povo!" Ele é diferente, aperta a mão, olha no olho. Já disse para ele que, se for candidato a presidente, visto uma camiseta escrito: "Eu vou votar no Tasso." Ele disse que eu falo isso porque sei que ele nunca vai ser candidato. PLAYBOY — De todas as celebridades que você conheceu nesses anos, juntando o Papa, os presidentes e os popstars, qual foi a mais impressionante? XUXA — Michael Jackson. PLAYBOY — Por quê? XUXA — É um mistério. PLAYBOY — Quantas vezes você esteve com ele? XUXA — Duas. A primeira foi antes de um show dele. Na segunda, jantei com ele em Neverland [nome do rancho de Michael Jackson na região de Santa Barbara, Califórnia, nos Estados Unidos]. Perguntou sobre as crianças no Brasil e na Argentina, perguntou qual país precisava mais de ajuda. Sabia que tenho uma fundação, perguntou se ela precisava de alguma coisa. PLAYBOY — O que mais ele sabia de você? XUXA — Sabia que eu gostava de bichos. Me levou para ver os animais dele — tem girafa, elefante, chimpanzé... E tem um lugar onde ficam cobras, muitas cobras de vários tamanhos. Ele ficou preocupado porque uma vez por semana as cobras têm de comer bichos, e logo no dia em que fui lá as cobras estavam comendo uns coelhinhos. Ele ficou tapando o meu olho, dizendo [num tom de quem foi apanhado numa travessura]: "Não, Xuxa, não!" Imagine a cena! PLAYBOY — Ele estava de luvas? XUXA — Não. Estava normal. Sem maquiagem, sem nada. Ele me mostrou onde dança, onde ensaia, e fomos ao cinema que construiu, um cinemão mesmo, com duas poltronas especiais para ele e para um convidado. Tinha carrinhos de chocolates e doces espalhados por todo lado. Depois sentamos para ver alguns clipes dele. No terceiro eu comecei a chorar, olhava para a tela, olhava para o moço ali do meu lado. Lembrei de um pôster que tinha dele no tempo do Grajaú, do tanto que queria conhecê-lo. Comecei a chorar com o rosto de lado, disfarçando. Mas ele viu e pegou na minha mão. Começou a fazer um carinho, assim, e quanto mais pegava na minha mão mais as lágrimas escorriam. Quando acabou o clipe, me deu um abraço bem apertado e disse assim: "Fico muito feliz em saber que as crianças do Brasil estão em boas mãos." PLAYBOY — É curioso ter selecionado esse momento. Tanto você como o Michael Jackson se rodearam de um mundo mágico, como num paraíso infantil. E você falou aquilo da busca da felicidade da criança. Você acha que ainda vai ser completamente feliz, algum dia? XUXA — Completamente feliz a gente até pode ser, por algum tempo. Ninguém é por muito tempo. Acho que a gente tem momentos felizes. Sou uma pessoa contente. Mas, completamente feliz? PLAYBOY — Alguns geriatras garantem que o ser humano está equipado, biologicamente, para viver muitos anos mais do que se vive. Quem, entre todas as pessoas do mundo, você gostaria que vivesse 200 anos? XUXA — Minha mãe. Mas acho que é um egoísmo a gente querer que alguém viva demais, porque depois de uma certa idade é difícil viver bem. Se você me perguntar se eu gostaria de morrer cedo, eu diria que sim. Eu gostaria de morrer cedo. PLAYBOY — É mesmo? Por quê? XUXA — Eu não invejo as pessoas que vivem muito, com tanta violência, tanto desrespeito por aí, hoje em dia. Na minha opinião, seria melhor que a gente vivesse bem e morresse cedo, para não ficar sofrendo, amargurado com a passagem do tempo. PLAYBOY — Mas tem também o medo de não suportar se ver envelhecendo fisicamente? XUXA — Também. É muito difícil, para mim, que comecei como modelo, que vivi a vida toda trabalhando, precisando, no meu trabalho, do meu rosto, da minha cara... Eu preciso do meu rosto. Faço bastante ginástica para que me sinta bem com o corpo, e o que mais me preocupa é isso. É poder rir sem estar preocupada que alguém diga: "Nossa, olha como ela está de rugas!" Entendeu? POR GUILHERME CUNHA PINTO FOTOS ANDRÉ DURÃO Entrevista publicada em agosto de 1996, ed. 253. Editora Abril, São Paulo - SP.

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