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AS PRIMEIRAS VEZES DA POLAQUINHA

Ficção


A iniciação sexual de uma jovem em Curitiba, no primeiro romance do maior contista brasileiro


Por DALTON TREVISAN


Bobinha, de mim já não falo. Me enxugava no banheiro. Puxa, que susto.


— Está nascendo cabelo...


Um por um, tentei arrancar — doía muito. Confessei o medo para minha irmã.


— Lá embaixo.


Ela me acalmou:


— Sua tonta, é assim mesmo.


Quando veio a primeira vez, bem me apavorei.


— Estou sangrando. Acho que vou morrer.


Correndo a toda hora ao banheiro.


— Estou me esvaindo...


De novo, minha irmã:


— Agora você sabe o que é moça. Daqui a um mês. Todo mês.


Me ensinou a usar toalhinha, ainda o tempo da toalhinha. Esquecida horas no banheiro, lavando, lavando. Para a mãe não ver.


O seio aflorando, o biquinho doendo — de sete novenas fiz promessa.


— Meu Deus, me acuda. Se aperto o biquinho, sai leite?


O primeiro namorado, orado, sabe o quê? Ah, o beijo único na boca. Já era pecado: duas línguas na boca. Me abraçava, eu tremia de gozo. Tanto medo: duro, grande, furando a calça. O tempo das primeiras calças justas. Ele descia reto: o começo ali no umbigo? Como adivinhar que se dobrava para cima?


Os dois de pé, na varanda, naquelas tardes fagueiras. Qual era o versinho antigo? A sombra das bananeiras, agarradinhos, debaixo dos laranjais. Pelos cantos, a sua terceira mão, na escola noturna. Oh, João.


Passamos o domingo na praia. Galinha com farofa, a descoberta do mar, o rosto em fogo do sol. De volta, no ônibus, minha mãe dormia ao lado. Começamos a nos beijar ali no escuro.


— É um jogo — eu disse. — O que faço em você, faz em mim.


Morria de vontade que me pegasse no seio. Qual seria a sensação? Primeiro um beijinho no nariz. Alisei o queixo, a penugem do braço. Abri-lhe a camisa, achei um cabelo crespo no peito. Um olho nele, outro na mãe dormindo. Se ela acorda, já pensou?


— Cuidado, menina. Eu faço o mesmo.


Ele mal desconfiava, só o que eu pedia. Fechei o olho — foi uma gritaria por dentro. Queria mais, da mãe esqueci, fiquei perdida. Ele se afastou, respirando fundo:


— Vamos parar. Não agüento mais. — Com falta de ar.


Altão, magro, só osso. Bronquite asmática — não podia ficar nervoso, entrava em crise. Quase morria, balão de oxigênio e tudo.


Um dia foi lá em casa. Fazia frio, decerto junho. Em férias, eu ainda na cama.


— Pula daí, menina.


— Ai, que gelo.


— Não seja preguiçosa.


— Deite você comigo.


Quase meio-dia. Lá embaixo a mãe se dividia entre a cozinha e o tanque de roupa. Minha irmãzinha brincava na outra cama.


Daí o João deitou. Chateada, a bruxinha negra saiu, com a garota pela mão. De repente o silêncio — não, o rádio ligado, quem era mesmo que cantava? E tinha sol — uma réstia amarela no tapete xadrez. Mil pontinhos de luz bulindo ali no ar. A porta aberta, eu enxergava o corredor, meu quarto era o último — se alguém subisse a escada...


"Começou a me abraçar e beijar. Afastou o lençol, já sob as cobertas — corpo a corpo. Ficou excitado. Uma bolina — como então se dizia — tão gostosa"

Eu no pijama de pelúcia. Ele, calça de lã e japona marrom. Começou a me abraçar e beijar. Afastou o lençol, já debaixo das cobertas — corpo a corpo. Ficou excitado. Uma bolina — então se dizia bolina — tão gostosa. Tirou para fora, era a primeira vez. Não cheguei a ver. Me fez pegar: grande, todo se mexia. Com medo, mas queria — como é que podia caber? Não, agora me lembro, o pijama azul de seda com bolinha. No meio das pernas, aquele volume palpitando. Pediu que me virasse. Baixou a calça do pijama, entre as coxas — tão quente, me queimou a pele, até hoje a cicatriz. Eu queria, mas ele só encostava.


— Um dia eu faço. Se a gente casar.


— Não, amor. Depois a gente. Agora. Eu quero. Sim.


Acho que fiz muito escândalo, devo ter gemido, quem sabe gritado. O João se assustou, ficou com medo. Se minha mãe sobe a escada, já viu? Eu xinguei, decepcionada e furiosa. Ele à tarde estava com outra calça.


Daí fiquei meio louca. Fizemos mais vezes. Ali no quarto. Aquelas férias todas. O jogo enervante, no mais bom interrompido. A mãe não desconfiou, ainda com as panelas, sempre batendo roupa. Minha irmã mais velha, sim. Viu ele entrando no quarto, discutiram. Deu uma desculpa, ela não acreditou.


Achei que bem o contrário.


— Então é assim?


No meio daquela confusão toda. Sempre duro, assim grandão, podia ficar mole? Crente que não murchava. Por isso as calças largas. Curiosa, embora com receio.


Mistério não discutido em casa. Meu pai discreto, quem viu sem camisa? Éramos só mulheres. Tevê, hora certa para assistir. De dia, nunca foi ligada.


O do João, duro sempre. Eu perguntava:


— Não machuca? Nem te incomoda?


Em mim, a primeira vez ia doer, mas era bom. Espirrava um leitinho. Uma gotinha para engravidar.


Aflitos, olhando dos lados. Um barulhinho, uma sombra. Sondando com a mão, já largava, e com a outra. Bem eu queria ver. Não dava: mal abria o zíper. Tudo frenético, ali na beira do abismo. Se a mãe chega de repente, já viu? Eu grávida... Os dois, menores!


A vergonha do pobre João: ser magro. E feio, os dentes todinhos tortos — sorria de mão na boca. Antes de mim, só uma namorada. Além de asmático. Como é que fui me encantar? De homem bonito não gosto. Feiosa, posso namorar gostosão? Complexada, por que baixinha?


Não que o achasse feio, feio. Ao menos engordando um pouquinho. De roupa ainda passava. No inverno sofria. Não podia se resfriar. E sempre resfriado. Usava um vaporizador, chamava de maquininha. Na crise, três vezes ao dia. Aspirava fundo, alivia os brônquios — dava taquicardia. Seguido de cama, resfolegante.


E ainda fumava, o desgraçado — ele que me ensinou. O peito abaulado, não tinha pêlo. Nas pernas, sim, cabeludo. O peito e o braço lisinhos. Barba rala. Às vezes deixava crescer; não enfeitava, mais abatido. Minha paixão era a mesma. Paixão não, que é passageira. Amor. Bem que simpático, com muitos amigos, já brincavam: eu a bela, ele, a fera.


Ali de pé na frente de casa. Se abrisse o portão, o cachorro latia. Na calçada, contra o murinho. A primeira vez bem rápido. Correu o zíper, pediu que botasse a mão. Eu na dúvida, ele tirou fora. Olhei de relance:


— Então é assim?


Muito tempo depois fui descobrir. O João chegava, abraços e beijos. Pronto, bem rijo. Ele garantia que. Só distrair um pouco. Quando ia ver — oh, não. Outra vez impávido, forte, colosso, gigante. No meio das pernas uma raiz peluda de que rosa ou lírio? Nunca entra — medonha de tão grande.


— E mulher preta, João? Tem seio preto?


Ao seio não me referia. A dúvida mesmo era: "E preto, João? Tem pênis preto?"


Na escola sempre um ano adiantado. Minhas lições difíceis ele fazia. Daí explicou: vários tamanhos, cores, espessuras. A ereção por causa do sangue.


— Do teu pai, por exemplo. Assombrada com a revelação.


— Grande e vermelho.


Ah, se pudesse ver, que bom. Lá eu podia pedir:


— Paizinho, mostre. Oh, pai. Seja bonzinho.


Daí eu queria ver todos.


— De moreno é mais para o roxo.


Ao perguntar muito, ele se ofendia:


— Que tanto quer saber? Quando casar aprende.


Nunca fui dessas que se deitam para sonhar. De pequena estudando e logo trabalhando. Me estendia pobre de cansaço, já desmaiada. Sonhava era na rua, espiando disfarçada a calça de todo homem.


ILUSTRAÇÃO ANTÔNIO HENRIQUE AMARAL




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