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LUÍZA BRUNET | AGOSTO, 1984

Playboy Entrevista



Uma conversa franca com a morena mais desejada do Brasil sobre cantadas, cama, masturbação, primeira vez e os bastidores das passarelas — e se transa ou não com Humberto Saade


Ninguém pensaria em escrever um romance baseado na história de Luíza Botelho Brunet. Filha de modestos lavradores dos confins mato-grossenses, transformada, quase por acaso, numa das modelos mais bem renumeradas do país (10 a 20 milhões de cruzeiros mensais, somando o cachê dos desfiles no interior, cerca de três por mês), Luíza pareceria caber melhor numa daquelas historinhas em que a borralheira acaba encontrando seu príncipe encantado para viver feliz por muitos anos.


A própria Luíza jamais imaginou que sua biografia fosse interessante, tanto que, em todas as entrevistas que concedeu até hoje, ela fantasiava a realidade mesmo de dados inocultáveis, como o lugar onde nasceu, que não foi a cidade de Dourados, como a imprensa sempre mencionou.


A verdade, no entanto, é que a trajetória dessa modelo contém todos os ingredientes de um excelente best-seller: mistério, dinheiro, intriga, sucesso, paixão, ternura, sexo, violência e muito mais. Até Nélson Rodrigues parece ter contribuído com algumas páginas em sua vida, como na mórbida cena descrita nesta entrevista, em que ela se imagina morta, dentro de um caixão. Mas, para não ficar tão densa, a história tem também instantes descontraídos, dignos de um pastelão: Luíza trocando tapas e insultos com Humberto Saade, seu patrão, ou brigando com o engenheiro Gumercindo Sousa Brunet, o Gugu, seu marido há seis anos.


Luíza, porém, não é obra de ficção, mas de carne e osso (mais carne, na verdade), tem 22 anos e uma beleza herdada da mistura do pai, filho de índios, e da mãe, descendente de italianos. A altura, 1,75 metro, já que os pais são baixos, deve vir do avô materno, que media 1,90 metro.


Apesar da fama, Luíza Brunet continua a mesma menina simples e caseira de cinco anos atrás — faz questão de cuidar de sua casa, das plantinhas e do jantar. Até há poucos meses, nem tinha empregada e lavava toda a roupa, e passava. Dorme cedo ("às 10 horas já estou morrendo de sono"), pois acorda de madrugada para fazer uma hora e meia de ginástica de solo, "bem puxada", na academia Maxi-Forma, de Ipanema, a partir das 6 e meia. Come de tudo e raramente sai à noite. E cuida das próprias unhas, dos cabelos e da depilação das pernas, "com cera, pois gilete engrossa muito os pêlos".


Para entrevistar esse mito sexual dos anos 80, PLAYBOY designou o editor Léo Borges Ramos, que foi até a tranqüila rua Sambaíba, no elegante bairro do Alto Leblon, no Rio, para chegar a seu apartamento de quatro dormitórios e um salão.


Na cumplicidade da ausência do marido (que fazia motocross pelo interior do Estado), eles conversaram durante três noites, totalizando nove horas e meia de fitas gravadas, sem contar as confidências que trocaram enquanto jantavam, examinavam a casa, reviravam os armários, liam cartas de fãs ou manipulavam velhas fotos que Luíza guarda em uma grande caixa de papelão. Léo faz seu relato:


"Foi uma das mais deliciosas aventuras, entrevistar Luíza, que já conhecia do dia mesmo em que iniciou sua carreira, há quase seis anos. Temia sucumbir ao seu encantamento, mas não esperava me surpreender tanto com sua mutável personalidade geminiana. Como ela revelou, no mesmo instante em que está de beijinhos com o marido, dá-lhe um empurrão e começa a quebrar tudo. Mas continua sensível, capaz de se emocionar tanto com a carta de um presidiário (pedindo roupas, porque sairá da cadeia) como com o sofrimento de uma plantinha com um ramo quebrado.


"Na primeira noite, em companhia de seu poodle, Papi, de um ano, esperei na sala, observando as conchas do mar — que ela adora e que trouxe de suas viagens à França, Espanha, Havaí, Tunísia e Estados Unidos — e conferindo as selecionadas marcas de scotch de seu bem abastecido bar, enquanto ela tomava uma ducha no banheiro, revestido de jade. Voltou de cabelos molhados, envolta em um simples roupão que mal escondia os 92 cm de busto (sua cintura é 64 e os quadris 90).


"Em seu quarto, cheio de bonecas e retratos, Luíza guarda cerca de cem pares de sapatos, com bom espaço tomado pelas botas brancas — sua preferência. Com três guarda-roupas cheios, só veste Dijon: mesmo suas roupas exclusivas, que escolhe em figurinos, são confeccionadas nas oficinas de Humberto Saade.


"Madrinha da Copa em 82, Luíza diz não entender nada de política ('prefiro futebol'), mas admite que o Andreazza é uns gato. Sabe não ter cultura, raramente lê e confessa não se lembrar direito dos títulos dos livros, apenas que são sobre vida de modelos. Fala com sintaxe típica do Centro-Oeste, colocando os pronomes depois do substantivo (sapato meu) e confunde às vezes os plurais, que raramente usa. Como uma garota do seu tempo. Repete a toda hora fantástico', 'de repente', 'não tem nada a ver'; toda grande quantidade é 'mil' ou 'milhões', e tudo que é demais é 'super'. Os olhos sempre alertas, conforme falava, variavam de brilho, como luzes psicodélicas de uma boate: alegria, êxtase, ódio, tristeza, tudo se misturava, sem eu poder distinguir bem onde terminava a realidade e começava a ilusão.


"Sedutora, pareceu-me irresistivelmente insinuante quando, entre uma taça e outra de vinho — Dijon, é claro —, disse que sempre gostou de homens de olhos claros. 'Como os seus.' Pouco depois, ao falar que todo mundo, hoje, faz ginástica e está preocupado em manter o corpo bonito, acrescentou 'como você', e quase esqueci que estava, ali em missão profissional. Além de toda essa lisonjeira gentileza não passar de chacine, porém, senti depois que valeu a pena resistir a qualquer tentação de desertar desta tarefa jornalística. Desde a primeira pergunta, Luíza se mostrou atenta, necessitada de falar, desabafar talvez. Não fosse o gravador, dificilmente eu conseguiria captar as primeiras revelações dessa criatura irresistível, que se oculta por trás da falsa imagens de mulher de luxo e cabeça vazia."


PLAYBOY — Luíza, tem alguma história da sua infância que você gostaria de esquecer?


LUÍZA BRUNET — Lembro que, duas ruas depois de onde a gente morava, meu pai tinha uma amante, Rosinha. Minha mãe tinha um ódio dela... Ela era morena, acho que paraguaia, bonita até. E aí minha mãe me botava para tomar conta quando meu pai ia lá. Ficava passando na rua de bicicleta e, quando ele entrava, eu avisava minha mãe. E ela dava o maior escândalo. No final da rua ficava minha escola. Foi uma infância marcante, mas também meio dura, porque meu pai e minha mãe sempre precisaram trabalhar muito. Depois a gente se mudou para outra casa, vivia se mudando, sempre em casas alugadas. Mas a gente juntava um monte de criança da rua e ficava o dia inteiro brincando.


PLAYBOY — E os meninos, brincavam com as meninas?


LUÍZA — Brincavam, era aquela brincadeira de queimada.


PLAYBOY — Mas sempre tem um menino mais sacana, que passa a mão nas meninas e quer vê-las peladas...


LUÍZA — Não me lembro do nome de nenhum garoto, mas sempre tinha um sapeca. Tinha um que eu paquerava à beça, morava no final da rua, Wanderley. Uma amiga sempre arrumava para eu me encontrar com ele atrás da igreja, ele aparecia e perguntava: "Você quer falar comigo?" Eu ficava toda vermelha, saía correndo e não conseguia falar. Paquerinha de 10, 11 anos.


PLAYBOY — E o que mais você fazia escondido?


LUÍZA — Eu lia fotonovela. Minha mãe comprava, eu roubava dela e lia escondido do meu pai. Me lembro também que passava sombra nos olhos e ia para a escola. Chegava o final da aula, tirava tudo.


PLAYBOY — Tudo isso aconteceu na cidade onde você nasceu?


LUÍZA — Não. Como eu disse, a gente vivia se mudando. Quando eu nasci, nós morávamos num sítio no interior de Mato Grosso, brincava na terra e comia as coisas do chão. Uma vez passei mal à beça, de tanto comer mamão quente do sol, apanhado no pé.


"Aos 14 anos fui trabalhar numa loja de tecidos. Saí porque o gerente queria transar comigo!"

PLAYBOY — Esse sítio era do seu pai?


LUÍZA — Não, meu pai trabalhava nele, plantava. Inclusive moravam ali outras famílias de lavradores. Ele nem tinha condições de comprar um sítio. Então, foi uma batalha para sobreviver e criar seis filhos — cinco mulheres e um homem. Depois a gente se mudou para uma cidadezinha do lado, Itaporã, a meia hora de Dourados. Eu tinha 8 anos e, só então, comecei a estudar.


PLAYBOY — O que vocês foram fazer em Itaporã?


LUÍZA — Meu pai começou com negócio de corretor de imóveis e terras, que era o grande lance na época. Aí conseguiu ganhar um dinheirinho e dar uma situação melhor para a gente. Mas nunca teve a cabeça no lugar e, de repente, perdeu tudo e ficamos na maior merda de novo.


PLAYBOY — Seu pai batia em você?


LUÍZA — Batia, nossa! A gente apanhou pra cacete. Acho que ele chegava com mil problemas e descarregava nos filhos. Minha mãe também tinha mania de bater. E eu apanhava mais, sempre fui mais levada.


PLAYBOY — Nessa época você pensava em ser o quê?


LUÍZA — Eu adorava ler novelas, via aquelas mulheres lindas e tinha mil sonhos de um dia sair na revista. Mas é difícil uma garota de 9, 10 anos ter um projeto do que vai ser.


PLAYBOY — Alguém já falava que você era bonita?


LUÍZA — Minha mãe tinha mania de vestir as cinco meninas iguaizinhas, vestidinho rosinha, com o mesmo tecido, rodadinho, manguinha. Eu detestava sair junto. Aí todo mundo falava: "Nossa, dona Alzira, que filhas lindas que a senhora tem".


PLAYBOY — E seu pai, o que esperava de vocês?


LUÍZA — Achava que tínhamos que estudar, mas nunca teve condições de botar-nos num colégio bom, sempre estudamos em escola pública. Não tinha nem condições de comprar material escolar. E, quando eu tinha 12 anos, já tive que trabalhar numa casa de família: cuidar de dois garotinhos. Eu pegava o dinheirinho que recebia e dava para a minha mãe.


PLAYBOY — Estudou até que nível?


LUÍZA — Fiz até o segundo ano colegial, mas nunca pude me dedicar aos estudos, porque tinha que ganhar dinheiro. Também nunca fui estudiosa. Não tinha planos, apenas sonhos de entrar na faculdade, de ser médica, mas nunca poderia.


PLAYBOY — Quando é que você veio para o Rio?


LUÍZA — Aos 11 anos. Quando viemos, estávamos mais fodidos do que em Itaporã, mas meu pai achava que iria ganhar melhor. Na verdade, nunca é assim, o pessoal sai do interior com planos, mas quase sempre acontece tudo errado.


PLAYBOY — Mas aqui também você logo deve ter arranjado namoradinhos.


LUÍZA — A gente tinha um monte de amiguinhos e, na sala de aula, começavam aquelas paquerinhas. Mas não acontecia nada, era só de ficar olhando. A gente enrolava a saia do colégio e botava cá em cima. Sempre fui vaidosa, gostava de ir bonitinha para a escola.


PLAYBOY — Parece que você já tinha um emprego melhor nessa época...


LUÍZA — É, de empacotadeira. Saí da casa em que trabalhava como babá porque a moça não teve mais condições de me pagar. Então arranjei emprego numa loja de tecido. Eu era empacotadeira, tadinha de mim, tinha 14 anos. Morro de pena quando hoje vou fazer compras e vejo aquelas meninas fazendo embrulhos. Passei de babá a empacotadeira, já melhorei um pouquinho. Acabei saindo porque tinha um gerente que era louco para me comer. Não posso nem lembrar. Filho da puta! Muita garota que trabalha nesse tipo de loja acaba se submetendo para não perder o emprego.


PLAYBOY — E por que você não cedeu?


LUÍZA — Não, jamais cederia, acho muito baixo nível esse tipo de pessoa e de proposta. Nem gosto de lembrar essas coisas, até me faz mal. Depois consegui outro emprego numa butique, Moda Nova, perto de casa.


PLAYBOY — Até quando você continuou não cedendo?


LUÍZA — Até conhecer o Gugu [Gumercindo Brunet, marido de Luíza]. Meu pai trabalhava num bar, tipo boteco que vende cachaça, salgadinhos, em Inhaúma, ao lado do posto de gasolina do pai do Gugu. Então, um dia fui pegar dinheiro para comprar gás, quando ele chegou e pediu uma soda. Achei-o tão bonito, assim queimado de sol, olhos claros. Sempre gostei de homem de olhos claros, assim como os seus. Fiquei olhando e ele também. Quando saí, ele perguntou quem era aquela moça, e meu pai, que sabia ser o filho do dono do posto de gasolina, já ficou interessado. Em casa, me falou que aquele moço tinha gostado de mim. Fiquei toda envergonhada. Só sei que o Gugu acabou indo lá em casa uma noite e começamos a namorar. A vizinhança toda achava ele o máximo. Me lembro que morava assim numa rua pequenininha, perto da avenida João Ribeiro, ao lado da linha do trem. Imagina o barulho! Quando o trem passava, sacudia tudo. A casa estava caindo aos pedaços por isso. E, quando o Gugu chegava, ficava toda a vizinhança na porta para ver o galã, porque ele tinha um Passat do ano.


PLAYBOY — Nessas alturas, seu pai estava vendo o Gugu como a salvação da família, não é?


LUÍZA — Meu pai de vez em quando bebia, chegava em casa, quebrava tudo, brigava com minha mãe. Aí o Gugu chegava e ele ficava calminho: "Não sei o quê, meu futuro genro", aquelas coisas. Na segunda semana, meu pai perguntou-lhe quais as suas intenções para com a filha. Gugu ficou puto da vida e sumiu um mês. Depois apareceu de novo.


PLAYBOY — E como era esse namoro de vocês?


LUÍZA — Eu não conseguia entender o que ele queria. Era filhinho de papai, tinha 28 anos, morava na avenida Epitácio Pessoa, aqui na Lagoa, era bonito, tinha carro e inventou de paquerar logo uma filha de empregado de botequim e que tinha acabado de fazer 15 anos! Coisa assim de conto de fadas. Fiquei completamente apaixonada. Um mês depois que a gente se namorava, ele começou a dar umas voltinhas assim meio estranhas. Isso eu nunca contei para ninguém. O carro tinha banco que reclinava, então aconteciam os beijinhos, os sarros, foi amansando a fera. Até que acabamos transando.


PLAYBOY — No carro?


LUÍZA — Não, fomos para um motel, na avenida Brasil ou na via Dutra, sei lá. Achava que era errado e tal, mas eu também estava querendo. Sempre fui decidida. Nem me lembro se foi ele que me tirou a roupa, só sei que deitei nuazinha, mas não queria abrir as pernas. Depois, em casa, sonhei que estava grávida, acordei e não consegui dormir. No outro dia, fiquei arrasada, com medo. Eu chorava... Liguei para ele de manhã: "Estou grávida, não sei o quê", e ele me levou ao ginecologista, pela primeira vez na vida. Mas não foi nada, só alarme falso.


PLAYBOY — Em casa vocês tinham alguma orientação sexual?


LUÍZA — Nenhuma. Meu pai e minha mãe nunca instruíram qualquer das filhas, nem o filho. Tínhamos noção do que era errado, que não podia fazer isso, não podia tocar ali. Na rua onde a gente morava, tinha uma garota de 15 anos que transou, ficou grávida e teve um filho. Então eu tinha pavor de engravidar.


PLAYBOY — Se o Gugu fosse pobre você teria dado para ele?


LUÍZA — Pela minha maneira de ser, ele poderia ser um pobretão que teria gostado dele. Isso não me influenciou. Nem hoje dou muito valor às pessoas que têm dinheiro. Não chegamos a namorar nem um ano e, como meu pai estava fazendo muita pressão, resolvemos casar. E fomos fazer o curso de noivos. Mas o padre começou a falar um monte de besteira, que o casal tinha obrigação de ter relações sexuais cinco vezes numa noite e, se a mulher quisesse transar, o homem tinha que estar lá de pau duro. Aí o Gugu ficou puto da vida, saímos do curso e resolvemos casar só no civil.


"Achava errado, mas eu queria. Nem me lembro se foi ele que me tirou a roupa, só sei que deitei nuazinha, mas não queria abrir as pernas"

PLAYBOY — E ele não dava cinco?


LUÍZA — Não é isso, é que nunca tive esse sonho de casar na igreja, de véu e grinalda. Minha mãe ficou apavorada, achava que tinha que ser vestida de noiva.


PLAYBOY — E como foi essa mudança, de balconista de loja para esposa de um homem rico?


LUÍZA — Mudança nada. Casamos, mas o pai do Gugu resolveu não dar apartamento porra nenhuma. Aí fomos morar no apartamento de solteiro do irmão do Gugu. Ele ficava num quarto e nós no outro. E como eu não estava trabalhando, tomava conta da casa, arrumava, fazia comida para os dois, o que é uma situação chata: casar e ir morar com o cunhado é horrível!


PLAYBOY — E como pintou essa de ser modelo?


LUÍZA — O Gugu era amigo do Luiz Orlando, modelo. Sempre jogava bola com ele na estrada das Canoas, onde morava. Aí conheci ele. Achei o máximo, pois via suas fotos nas revistas e achava-o maravilhoso. Então ele falou que eu era bonita e que um dia ia me levar na Manchete para o fotógrafo Nilton Ricardo me tirar umas fotos. Fez um monte de fotos minhas, até boas para quem nunca tinha fotografado, e uma semana depois me entregou. Aí, levei para o Roberto Barreira, na Bloch, que olhou minhas fotos de maiô e me chamou para fotografar uma moda de lingerie no dia seguinte. Nossa, o coração começou a bater a 180 por hora. Aí, no outro dia, já comecei a fotografar.


PLAYBOY — E quando pintou o primeiro nu?


LUÍZA — Na semana seguinte, fui convidada para fazer um calendário da Petrobrás: de um lado, numa moto e, do outro, em cima de um cavalo. Eu tinha o maior medo de fotografar nu, porque diziam que isso queimava. Mas fiz um monte de matérias e me dei bem.


PLAYBOY — A Xuxa diz que modelo mesmo é a que faz nu. Você concorda?


LUÍZA — Acho que a Xuxa tem toda razão. Posar nua é mais difícil que posar com uma calça ou vestido, porque não tem onde botar a mão. Botar na cintura, com peito e bunda de fora, fica meio esquisito. Para posar nua tem que ser mesmo profissional.


PLAYBOY — Você acha que quem posa nua tem melhores oportunidades como modelo, mesmo de moda?


LUÍZA — Acho, sim. Posar de roupa esconde os defeitos: peito caído, barriga flácida, perna fina. Posando nua, você mostra logo que é mesmo a melhor. Todo mundo dizia para não fazer, senão depois não fazia moda, capa de revista, não fazia anúncio. Isso não tem nada a ver, faz parte da profissão. Nenhuma modelo deve ter medo de fazer. Uma foto nua bonita, bem produzida, ajuda muito a carreira. Na primeira semana que comecei, fiz logo aquele poster e nem por isso deixei de fazer capas de Claudia, Nova, Vogue, Desfile, além de centenas de desfiles em passarela.


PLAYBOY — E como é que o Gugu, recém-casado com você, via essa sua repentina desinibição? Vocês precisavam da grana?


LUÍZA — Nessa época ele começou a trabalhar na Furnas, onde está até hoje. Mas, quando casamos, o pai dele tinha cortado todas as mordomias. Quer dizer, uma graninha a mais era uma boa. E eu sempre fui acostumada a trabalhar. Então, quando pintou o calendário, aparecendo um pouquinho do busto, ele não queria deixar. Mas eram 50 mil cruzeiros. Há cinco anos era uma grana boa, talvez 1 milhão hoje. Para quem ganhava salário mínimo era uma festa. Me lembro que fui para o estúdio e aí o Gugu apareceu lá e, quando me viu em cima da moto, de bota, com uma calcinha preta e uma jaqueta com o peito de fora, ele queria me tirar dali, foi um horror. Aí paramos de fotografar, fomos todos lá para fora e convencemos ele que não era nada disso. Então foi acostumando.


PLAYBOY — Quem ensinou você a posar?


LUÍZA — Ninguém, aprendi sozinha. Todo mundo pergunta onde fiz cursos. Eu nunca fiz e acho que não ensinam coisa alguma, só tomam a grana da garotada.


PLAYBOY — Depois que fez as primeiras fotos, como o ensaio do Duran em PLAYBOY [maio de 81], como foi a reação das pessoas na rua?


LUÍZA — Alguns davam força, outros mexiam, jogavam piadinhas, falavam coisas engraçadas. Alguns poucos vinham com cantadas obscenas. Eu ficava chocada, mas tudo bem, estava ali na fotografia, tinha que saber aceitar o que as pessoas falavam.


PLAYBOY — Conte um caso concreto.


LUÍZA — Eu ia pela rua Visconde de Pirajá, em Ipanema, e um cara disse: "Ah, gostosa, estou a fim de comer você". Eu fiquei puta da vida e mandei tomar no cu. E o cara falou: "Que é isso? Posou nua, deve estar trepando com todo mundo e fica dando uma de gostosa comigo". Esse tipo de coisa era o maior baixo astral. Na época, algumas pessoas não entendiam que posar nua é um trabalho profissional e achavam que a gente tem que sair trepando com todo mundo. Hoje as pessoas já entendem melhor tudo isso.


PLAYBOY — Você recebia trotes pelo telefone?


LUÍZA — Recebia milhões de telefonemas de homens fazendo mil propostas, de mulheres falando que eu era puta, era piranha, e que se me encontrassem iam me dar porrada. Ligavam agências também. Tinha uma agência em Botafogo que usava um book de mulheres que posaram nuas. Então chamava a modelo para fazer um trabalho: "Tem um trabalho assim, assim, para você fazer". Comigo aconteceu isso, era no Hotel Caesar Park. A gerente da agência falou: "Olha, você tem que estar lá às tantas horas, o cachê é tanto, para fazer umas fotos de biquíni, mas é no hotel mesmo". Achei estranho e resolvi ir. Ai com o Gugu. No apartamento, estava um cara com uma garrafa de vinho, duas taças, e uma bolsa com uns biquínis dentro. Quando ele viu o Gugu, não acreditou, perguntou se era meu chofer. Eu falei: "Não, é meu marido". Na verdade, a agência tinha combinado para eu transar com o cara. Que veio de São Paulo só para isso.


PLAYBOY — Tem muita agência que faz isso?


LUÍZA — Hoje ainda deve ter alguma. Vendem a modelo para o freguês sem ela saber. Acontecia isso muito, porque as agências aqui no Brasil eram verdadeiras merdas. Agora, imagina se o Gugu não tivesse ido: o cara podia me agarrar, sei lá fazer o quê. Tomei do vinho que ele me deu e fiquei tontinha. Tinha alguma coisa dentro.


PLAYBOY — E como é que ficava a situação do seu marido, trabalhando numa empresa onde sabiam que a mulher dele era aquela que estava fazendo o maior sucesso nua nas revistas?


LUÍZA — O Gugu no começo teve mil grilos no trabalho. Alguns colegas compravam a revista e deixavam na mesa dele com bilhetinhos, como se ele não tivesse visto. Brigou com vários colegas por minha causa até. Quando comecei, as pessoas todas, principalmente mulheres, amigas dele, insinuavam: "Poxa, como você deixa sua mulher fotografar nua, você não sabe o que acontece na hora, no estúdio, quando está fotografando: o fotógrafo fica instigando e ela acaba transando". E na verdade tem um fotógrafo, que foi me fotografar nua, eu não vou dizer o nome, é um babaca. Fotografa muito bem preto e branco. Mas ele veio me dizer que toda modelo que ele fotografava transava com ele, porque tinha o peru desse tamanho [faz o gesto].


PLAYBOY — E tamanho é documento?


LUÍZA — Não, nem um pouquinho. Não quer dizer nada. É muito mais importante aquela brincadeira do antes da transação, muito mais gostosa e excitante do que a penetração. [Pausa.] Mas de que a gente estava falando?


PLAYBOY — Dos problemas de seu marido no trabalho.


LUÍZA — É, as secretárias, algumas amigas, colocavam mil caraminholas na cabeça dele. Ele chegava em casa puto da vida, brigava comigo até. Eu ficava: "Pô, Gugu, não fiz nada". E ele perguntava se o fotógrafo tinha tentado alguma coisa comigo. Hoje ele tira de dez a zero esse negócio, sabe que só cai nesta quem é burro. A profissional está a fim é de fotografar e se mandar, pegar o dinheiro no final do mês e ver a foto maravilhosa nas bancas.


PLAYBOY — Você teve que dar para alguém, mesmo não sendo fotógrafo, para fazer sua carreira?


LUÍZA — [Muito séria.] Graças a Deus, não. E meu temperamento não combina com esse tipo de coisa. Se alguém se insinua, mando o cara tomar no cu e vou embora. Não quero nem saber se ia ganhar 5 milhões, 500 milhões ou 50 cruzeiros. Explodo na hora e não faço porra nenhuma de foto.


PLAYBOY — Mas tem gente que tem que dar, não tem?


LUÍZA — Deve ter, sim. Sempre tem as meninas que, sonhando em sair na capa de uma revista, dão para todo mundo [risos].


PLAYBOY — E as cantadas, como são?


LUÍZA — Cantadas pintam na vida de qualquer mulher. Não precisa ser modelo. Se ela é casada, mais ainda, porque o cara sente aquele desejo de tomar a mulher do outro. Fazendeiros do interior me fazem mil propostas: "Pô, larga seu marido, vou te dar uma vida boa, a gente viaja pra Europa, Estados Unidos, você vai ter peles e os carros que quiser..."


PLAYBOY — Uma cantada inesquecível.


LUÍZA — Foi em Saint-Tropez, quando conheci um árabe, filho de uma princesa chamada Agatha. Um cara muito bonito, moreno e supercheio da grana. Propôs de eu ir morar com ele. Mas o fato de ser rico não me impressionou. Gosto muito mais das coisas que eu conquisto. Não sou o tipo de mulher que se satisfaz sendo sustentada por homem, gosto de ter as minhas coisas, de conquistar o meu homem também.


PLAYBOY — Como foi a história do Falcão, na época da Copa? Vocês namoraram?


LUÍZA — Não, nunca namoramos. Ele não me cantou, apenas fizemos umas fotos para uma revista. Nem chegaram a publicar. Se o Falcão tem fama de comedor, deve ser folclore. Ele é uma gracinha de pessoa, mas não faz meu gênero. É inteligente, mas nem me cantou. [Risos.]


PLAYBOY — Voce é paquerada também por mulheres?


LUÍZA — Sou! E acontece de mulher ligar aqui pra casa e falar um monte de coisas: "Eu queria chupar você, te lamber inteirinha, queria transar com você"... essas babaquices. Não vou citar nome, mas tenho uma amiga que um dia se apaixonou por mim. Chegou em casa assim meio de porre — acho que estava passando por algum problema — e falou que me amava, que estava apaixonada. Me deu uma tremedeira, quase desmaiei, comecei a chorar, fiquei arrasada.


PLAYBOY — Aí ela aproveitou e deu-lhe um beijo?


LUÍZA — Não, não tem nada a ver. Não aconteceu nada. Não faz meu gênero [Risos].


PLAYBOY — Você nunca transou com mulher nem no colégio?


LUÍZA — [Risos e pausa reflexiva.] Sabe por que não aconteceu comigo? Não estou querendo me justificar, mas casei quando estava descobrindo meu corpo. Não tive tempo de fazer brincadeira de papai com mamãe, de transar com amiguinho. Tinha 15 anos, ia fazer 16, casei. Estava com o peito pequenininho, nascendo os pelinhos e já estava casando. Agora, não acho errado mulher com mulher. Se ela transa com homem e não se satisfaz, e acha em outra mulher coisas que o homem não faz nela, acaba mudando, pois uma mulher sabe exatamente quais os pontos para conseguir o orgasmo.


PLAYBOY — Como você se sente sabendo-se permanentemente desejada por todo mundo?


LUÍZA — [Risos descontraídos.] Faz um bem terrível para o ego. Tem pessoas que me mandam flores, de vez em quando pinta uma jóia com cartãozinho assim: "Se você ficar comigo, vai ganhar muito mais". Mas tem o lado "objeto". A pessoa quer transar uma vez, duas, e só isso. Então, mando devolver imediatamente. Graças a Deus sou casada, tenho meu marido, minha vida já feita. Gosto muito mais de uma coisa segura do que desse tipo de cantadinha de homem rico.


PLAYBOY — Essa sua busca de segurança, não só no casamento mas também no seu contrato exclusivo com a Dijon, tem a ver com as privações por que você já passou na vida?


LUÍZA — Acho que sim. Segurança é uma coisa que todo mundo almeja, ter sua casa própria, um trabalho fixo. Gugu diz que é por causa disso que estou na Dijon, para poder comprar apartamento, ter meu dinheiro no final do mês, pagar as contas em dia. Quando era criança, passava muito por este tipo de problema, de não ter dinheiro no final do mês e a luz ser cortada, de morar em casa alugada. Isto influiu muito e agora quero me agarrar à segurança. Mas não acho que o casamento seja pela segurança. Gugu é uma pessoa de quem gosto, a gente se transa bem, estou casada há seis anos, mas se deixar de gostar dele vou conhecer outra pessoa. Isso não tem que durar o resto da vida. Se encontrar outro por quem me apaixone, vou estar com ele.


"Alguns homens me mandam jóias. Junto, vem um bilhetinho: 'Se você ficar comigo, vai ganhar muito mais'"

PLAYBOY — Aí envolveria então uma segurança sexual, saber que com ele é bom...


LUÍZA — Não, Gugu, sexualmente, é uma pessoa que me satisfaz, porque faz em mim o que eu gosto. E também acho que o satisfaço. Mas o corpo da mulher tem tanta coisa para ser descoberta... Se eu conhecer outra pessoa que me estimule outros sentidos, pode ser que goste e fique com ela.


PLAYBOY — E o que é que o Gugu faz em você assim tão bom?


LUÍZA — Que pergunta indiscreta! [Risadinha nervosa.] Você acha que vou dizer? Ele é a pessoa que me descobriu e não vou entregar o mapa da mina.


PLAYBOY — Quando o sexo é mais gostoso para você?


LUÍZA — Depois de ter tomado um vinhozinho, tudo fica mais gostoso. Transar num lugar que não o quarto ou que não seja em cima da cama faz mais minha cabeça. E gosto de uma penumbra, nem breu nem luz escancarada. Uma luzinha.


PLAYBOY — Qual o tabu sexual que você ainda não quebrou?


LUÍZA — Sei lá, a coisa que tenho mais medo é de dar a bunda. [Risos.] Verdade! [Risos.] Não sei se você vai escrever isso, mas... [Pausa.] Não, não tenho qualquer tabu. Sou liberal, tudo que alguém faz entre quatro paredes, com a pessoa de quem gosta e curte, é bem aceito. Não existe o que eu não faça ou não deixe o outro fazer comigo.


PLAYBOY — E quantas vezes?


LUÍZA — Depende. Posso passar muitos dias sem transar, porque não pintou aquela situação, e também transar numa noite quatro ou cinco vezes e de manhã ainda transar mais. Na hora do sexo sou extremamente sensual, gosto mesmo de fazer amor. Vai depender de quanto a pessoa que estiver comigo agüentar.


PLAYBOY — Com toda essa sensualidade, você se masturba muito?


LUÍZA — Vou desligar o gravador, hem! Que perguntinha mais sacana. [Pausa.] Pouco antes dele morrer, participei com Pedro Nava de uma entrevista na televisão e, sobre masturbação, ele disse que a primeira pessoa por quem a gente se apaixona é pelo próprio corpo. E ele tem razão. Por que não fazer uma coisa tão boa e que está à mão?


PLAYBOY — Já lhe falaram que você não é tão bonita pessoalmente como nas fotos?


LUÍZA — Não, exatamente ao contrário. Falam que sou mais jovem e mais bonita pessoalmente.


PLAYBOY — Mas, sinceramente, você se considera linda e deliciosa ou acha que as fotos consertam os defeitos?


LUÍZA — Acho que foto conserta à beça. Ninguém anda com a mão no bolso, com a perninha assim do ladinho. Não me considero uma mulher feia, sei no entanto que tenho mil defeitos.


PLAYBOY — Quais, por exemplo?


LUÍZA — Bom, tenho essas manchinhas de praia na pele, tenho uma cicatriz aqui no joelho, de acidente de moto, que preciso maquilar para fotografar. Sei que tenho pés e mãos grandes, não tenho o nariz bonito, enfim, não sou perfeita.


PLAYBOY — Quando fotografa, você fica sempre séria. Isso também é para corrigir algum defeito ou é um estilo?


LUÍZA — É um estilo que gosto de manter. Não sou como a Xuxa, que tem um ar muito de moleque, esportivo. Mas fico séria também para corrigir o rosto, muito redondo, né? Se começo a sorrir, fico com a cara muito redonda.


PLAYBOY — Luíza, você é indiscutivelmente uma das mulheres de maior sucesso no país. Como é que isso funcionou na sua cuca?


LUÍZA — A Luíza Brunet que se destacou um pouco mais das outras modelos pintou quando fiz meu primeiro ensaio fotográfico nu para revista, com meu nome e tudo. Logo publicaram na Manchete e botaram assim: "A nova modelo sensação". Fiquei toda besta. Mas nunca fui uma deslumbrada. Se fosse, não estaria onde estou. O deslumbramento pode derrubar a modelo, pois ela se sente a maravilhosa, a melhor, e as pessoas começam a cortar. Ninguém, em agência, revista ou estúdio, gosta desse tipo de pessoa.


PLAYBOY — A Xuxa surgiu mais ou menos na mesma época que você, não foi?


LUÍZA — Comecei a fotografar um pouquinho antes que ela, mas acho que sempre fui mais fechada e ela sempre foi aquele tipo risonho, que falava com todo mundo. Então ela se entrosou mais e eu demorei um pouco para fazer amizade no meio de moda e tal.


PLAYBOY — Mas existe uma grande amizade entre vocês ou era tudo armação para vender revistas?


LUÍZA — Conheci Xuxa fotografando no estúdio, isso há uns cinco anos. Ela foi fazer uma capa de revista. Era uma gracinha, bem garotinha, acho que tinha 14 ou 15 anos, o cabelinho louro escorrido. Era linda! Aí a gente passou a andar juntas. Eu passava todo final de semana na casa dela, em Coroa Grande, no Estado do Rio, e tomávamos banho de sol nuas. Até PLAYBOY deu notinha sobre isso [risos] [ver PLAYBOY, março de 82]. Na época quase ninguém fazia isso. Então a gente estava sempre com o corpo queimado por inteiro, e para fotografar isso é bom. Então fez-se uma amizade assim: se alguém perguntasse: "Você conhece alguma modelo que fotografe e desfile?", eu respondia: "Xuxa". E ela também: "A Luíza". A gente trabalhou demais juntas, e hoje não temos muito contato por causa da vida que cada uma leva. Inclusive porque o Humberto [Humberto Saade, da Dijon] não se dá muito com ela. E como sou modelo exclusiva da Dijon... Então tive que cortar um pouco o contato. Mas ela é uma pessoa que curto demais. Nossos encontros mereceriam uma reportagem fotográfica, porque a gente se beija, se abraça.


"Eu passava todo fim de semana na casa da Xuxa, na praia, nós duas sempre juntas, nuas, tomando banho de sol"

PLAYBOY — É, mas parece que ela está faturando muito mais do que você. Com o contrato de exclusividade da Dijon, você não acha que saiu perdendo?


LUÍZA — Acredito que ela esteja faturando muito mais, porque está com um programa de televisão, faz muito mais desfiles — não sei quanto que ela está cobrando atualmente, deve ser tanto ou mais que eu —, faz fotografias, anúncios, muito mais coisa. Então, acredito, tenho certeza de que ela fatura mais. Isso às vezes me dá mil grilos. Estou na Dijon há dois anos e meio e acho que já está na época de sair; mas até tirar essa imagem, o pessoal não vai me aceitar para outro tipo de anúncio. Acho que, se saísse da Dijon, hoje estaria ganhando muito mais. É um conflito que tenho comigo.


PLAYBOY — E o que é seu trabalho na Dijon, além de fotografar com o Humberto Saade?


LUÍZA — É muita coisa. Normalmente chego às 11 horas na loja de Copacabana e fico por lá. À tarde vou para a loja de Ipanema. Sempre a Madeleine [mulher do Humberto e estilista da Dijon] está fazendo roupa nova para a coleção, e fico experimentando o dia inteiro. Às vezes dou opiniões também.


PLAYBOY — Experimentando roupas para os clientes verem?


LUÍZA — Não, roupas para serem aprovadas, a chamada "peça-piloto". Ela é toda alfinetada no meu corpo. Mas tem cliente de fora também que quer me conhecer, leva filhos para me verem. O Humberto faz, por exemplo, 10 mil posters para distribuir nas lojas. Tenho que fazer dedicatória, autografar, depois faço um coraçãozinho ou dou um beijinho com batom. Tiro também fotografias com as crianças. Tem cliente que só quer ser atendido por mim. Fico lá, faço cafezinho, uma rotina meio chatinha, que não tem nada a ver comigo. Sou muito agitada, gosto de fotografar, de viajar. A rotina na Dijon não é exatamente o que eu gostaria de fazer. Por outro lado, é gratificante pela grana, pela segurança, porque não tenho que me matar de trabalhar. Modelo free-lancer tem que correr atrás de trabalho, depois correr para receber a grana, e alguma coisa acaba não recebendo.


PLAYBOY — E quanto é que você ganha por esse trabalho?


LUÍZA — Não dá pra falar. [Risos.] Uma vez caí na besteira de contar numa entrevista e você não sabe a quantidade de parentes que apareceu pedindo coisas. [Risos.] Pô, fiquei danada e nunca mais disse.


PLAYBOY — Você está ganhando mais ou menos que o Gugu?


LUÍZA — Mais, bem mais.


PLAYBOY — Ganha mais na Dijon ou no overnight?


LUÍZA — [Espantada.] Quem disse que aplico no over? Você é foda. Na Dijon, é claro, pô! [Risos.]


PLAYBOY — Você tem carteira de trabalho assinada?


LUÍZA — Não, por não ser assalariada, acho que não tenho direito a fundo de garantia, 13.° salário, essas coisas. Nem sei como isso funciona. Também não tenho qualquer contrato assinado. Sei que estou perdendo uma boa grana, mas tudo bem.


PLAYBOY — Você não é assalariada, como assim? Tem comissão de vendas?


LUÍZA — Não, só o fixo.


PLAYBOY — Então é salário. Bom, com esse dinheiro deu para adquirir que patrimônio? O que você tem atualmente?


LUÍZA — Tenho este apartamento de quatro quartos, que comprei o ano passado e que hoje mandei avaliar e está em 120 milhões de cruzeiros, um Monza e algumas jóias. Quer dizer, não é grande coisa para quem trabalhou como trabalhei. Tenho outro apartamento que acabo de comprar, no Flamengo, e já assinei a escritura. Custou 35 milhões, à vista. Comprei para minha mãe e para minha irmãzinha, Luciana, de 12 anos. É uma segurança que quero dar para elas.


PLAYBOY — A Luciana vai posar para a revista daqui a cinco anos?


LUÍZA — Se Deus quiser. Ela é uma gracinha. Eu gostaria de começar a fazer umas fotos dela nua agora, para guardar, tipo aquelas fotos da Brooke Shields. Está começando a nascer peitinho, pelinho, uma gracinha. [Pausa longa.] Eu deveria ter muito mais coisas, mas, como tenho que sustentar mamãe, papai, essa irmãzinha que, mesmo pequena, dá um gasto danado, mais um outro irmão e outra irmã casada, minha grana vai quase toda em despesas. Tudo bem, quero mais é que minha família esteja numa boa, fico tranqüila comigo, durmo numa boa, e eles também. Acabei de comprar esse apartamento; agora, só daqui a seis meses. [Risos.]


PLAYBOY — Até lá, vai dar para comprar o quê, outro apartamento de 120 milhões?


LUÍZA — [Dúvida.] Estou pensando em comprar uma casa em Búzios.


PLAYBOY — Daqui a pouco já posso calcular quanto você ganha na Dijon.


LUÍZA — Até que não. Cobro 5 milhões para cada desfile, quer dizer, faço dez desfiles e dá para comprar um apartamento.


PLAYBOY — A exclusividade da Dijon permite que você faça outros desfiles?


LUÍZA — Pinta o pessoal do interior que me chama para desfilar como atração. Mas só desfilo com roupa Dijon. Pegam por exemplo eu, ou a Xuxa ou a Monique Evans, e anunciam, distribuem prospectos. Então vendem bastante mesas. Por isso eles têm condições de pagar um cachê legal. Tem sempre um pessoal achando que vou mostrar o busto, porque fotografo para a Dijon sem camisa.


"Quando desfilo no interior, tem sempre alguém achando que vou mostrar o busto, porque só fotografo sem camisa, na Dijon"

PLAYBOY — Até há pouco tempo, pouca gente sabia da existência do Gugu: nunca aparecia em fotos, colunas sociais, reportagens. Você o escondia ou era exigência da Dijon?


LUÍZA — Não era exigência. Normalmente, quando vou a alguma festa, o Humberto faz questão de entrar comigo, porque, no seu esquema de marketing, temos que aparecer juntos para divulgar a Dijon. Então a gente procura entrar e ser fotografado junto. Agora é que o Gugu começou a aparecer, mas ele não gosta. Quando vê um fotógrafo, ele sai. Fico puta da vida: "Cadê o Gugu?" Ele está lá atrás, no banheiro, ou sei lá onde. É um cara retraído, até tímido. Em certas festas, ele quer entrar e sair. Não gosta, porque o pessoal fica olhando para ele, comparando. Todo mundo quer saber como é o marido da Luíza Brunet, acham que é um homem de 2 metros de altura, aquelas coisas que as pessoas fantasiam.


PLAYBOY — Seria esta timidez que levou o garotão de Ipanema, filho de dono de posto de gasolina, a preferir namorar uma suburbanazinha a uma das garotas que o acompanhavam a Búzios?


LUÍZA — Acho que pode ser, também. Por ser bonito, boa-pinta, filhinho de papai que só começou a trabalhar com 30 anos e que conheceu milhões de filhinhas de mamãe, com merda na cabeça, talvez ele procurasse mesmo uma menina do interior, do subúrbio, para colocar alguma coisa na cabeça dela. Acho que procurou uma mulher diferente das que conhecia. Casou comigo, pensando numa dona-de-casa, para ter filhos. Mas eu mudei totalmente e isso deve ter mexido com a cabeça dele.


PLAYBOY — Vocês pretendem ter filhos?


LUÍZA — Pretendemos, adoro crianças. O Gugu também. Ele quer ter um de qualquer maneira este ano. Fez 36 anos e tem medo de depois não acompanhar o raciocínio do filho quando crescer. Ele tem razão, mas não posso cortar meu trabalho agora para ter filhos.


PLAYBOY — Você teve que fazer algum aborto, porque filho não estava nos seus planos?


LUÍZA — Eu já. Quando casei, comecei logo a fotografar, e engravidei, apesar de o ginecologista ter falado que eu tinha o útero infantil e que precisaria até de fazer um tratamento, quando quisesse engravidar. Mas engravidei e fiquei naquele dilema de ter que optar entre uma carreira e um filho. [Muito terna.] Hoje poderia ter um molequinho, correndo aqui, gritando "mamãe, mamãe". Seria um barato, mas não sei se estaria fazendo as coisas que faço hoje.


PLAYBOY — E se, por um acaso, você mais tarde descobrir que não pode mais ter filhos?


LUÍZA — Vai ser uma coisa que arrasará o resto da minha vida. Acho que dou um tiro no ouvido.


PLAYBOY — Como você se imagina aos 40 anos?


LUÍZA — Hum, eu me imagino assim uma coroa lindérrima, gostosérrima, cheia de filhos. [Risos.] Tô brincando. [Muito séria.] Não sei se vou durar até 40 anos. Tenho milhões de grilos, acho que vou morrer daqui a pouco. Não sou do tipo que vai durar. Mas, se chegar lá, os garotos que me aguardem, que vou ser uma coroa gostosérrima. [Risos.]


PLAYBOY — Você já teve idéia de suicídio alguma vez?


LUÍZA — Às vezes tenho. É uma tremenda fraqueza, entende, mas às vezes sou fraca, penso em me jogar da janela aqui de casa. Dar um tiro no ouvido não, porque vai sair sangue e vou ficar tão feia. As pessoas só vêem aquela minha estampa maravilhosa nas revistas, mas o que se passa comigo ninguém imagina, e às vezes realmente penso em suicídio. Pode ser uma fuga ou até uma necessidade de chamar a atenção. Sou uma pessoa tão cobrada, vivo em função dos outros, da minha mãe, do meu marido, da Dijon. Não tenho tempo de pensar em mim. É terrível não ser dono da própria vida. Isso enche o saco e fico pensando em acabar logo com tudo isso. Às vezes estou angustiada pra cacete, mas o que vou fazer, dar soco na parede? Não, machucaria minha mão e não posso, tenho que fotografar no outro dia. O jeito é chorar. Me matar, não sei se teria coragem, acho que ficaria feia. [Risos.] E quando morrer, quero estar bonita, maquilada, e estar bonita dentro do caixão também, vestida de branco. [Risos.] Papo escroto esse, hein?


PLAYBOY — Fala mais do seu interior.


LUÍZA — Meu interior é normal, como o de qualquer ser humano, com sentimentos, conflitos, coisas boas e ruins. Eu saí do nada, estou alto demais. Acho que todo mundo que alcança o auge tem medo de cair, seria horrível. As pessoas gostariam de estar no meu lugar, recebo milhões de cartas dizendo isso, e eu gostaria de estar no lugar delas, com a vidinha tranqüila.


PLAYBOY — Você nunca pensou em fazer análise?


LUÍZA — Hum, não sei. [Sorrindo.] Todo mundo que faz acaba transando com o analista, não é isso que dizem?


PLAYBOY — Se fosse verdade, então a primeira coisa seria escolher um que faça seu tipo.


LUÍZA — Como não há nenhum assim, jamais vou fazer análise. Aliás, esta entrevista está me fazendo muito bem, parece uma análise. Estou falando do que nunca falei. Sou fechadíssima, nunca falo de coisas pessoais, do que estou pensando, sentindo. Nem sei por que estou falando tanto assim. Já estou até com câimbra no queixo. [Risos.] As pessoas vão conhecer uma nova Luíza, porque nas entrevistas eu falava de bobagens que copiava dos outros, nada daquilo que eu falava era a realidade. Eu captava frases dos outros, mas que eu gostaria de ter dito, e repetia.


PLAYBOY — Já que estamos em análise, então: você freqüenta festas porque adora altos jantares e grã-finos ou você o faz profissionalmente?


LUÍZA — Faço profissionalmente. Festa de sociedade é sempre um saco. Nem sei se devo dizer isso, sei lá. Para o relacionamento profissional é bom, acabo conhecendo pessoas que interessam ao meu trabalho e tenho que fazer aquela média. Mas, se tivesse que fazer uma opção entre sair para jantar, aturando um monte de pessoas, e ficar em casa, preferiria ficar vendo um vídeo ou televisão. Mas tenho que ir.


"Já cometi gafes, já peguei o talher errado. Mas fui observando e aprendi. Hoje, sou capaz de distinguir um bom vinho pelo paladar"

PLAYBOY — No fundo, você está dizendo que é desagradável conviver com grã-finos?


LUÍZA — [Risinho.] Não vou ser mais convidada para festa nenhuma depois disso. Você não presta.


PLAYBOY — Quem lhe ensinou a segurar no garfo ou na taça para freqüentar esses ambientes?


LUÍZA — Hoje não tenho medo de dar gafes. Antes tinha medo de pedir scargot, porque achava que tirar lá de dentro, com a colherzinha, aquele negócio ia cair. Então ficava com medo e apenas observava. Tinha medo de comer caviar ou de segurar uma taça. Pedia a coisa mais simples nos restaurantes, com receio de não saber comer. Claro que cometi gafes e já peguei o talher errado, mas fui aprendendo sem ninguém me ensinar, só observando. Nunca tive esse tipo de educação. Hoje sou capaz de distinguir um bom vinho pelo paladar.


PLAYBOY — Você recebeu no ano passado o título de Model of the Year, numa festa em Nova York. Como é que foi isso?


LUÍZA — O Ricardo Amaral tem lá o Club A e resolveu fazer o concurso. Uma agência escolheu várias modelos do mundo inteiro e fui escolhida pelo júri. Não sei se por a boate ser de um brasileiro e eu também. Mas foi um concurso que ganhei.


PLAYBOY — Não foi título comprado?


LUÍZA — Todo mundo falou que foi marmelada, que o Ricardo Amaral produziu e o Humberto pagou. Não foi. Realmente a escolha foi pelos books das várias candidatas e, por acaso, fui escolhida, pois minhas fotos eram as melhores. As pessoas do júri foram do tipo John Travolta, Charles Aznavour, o príncipe Egon Von Fustenberg. As pessoas podem dizer o que quiserem, por frustração ou por vontade de estar no meu lugar. Só sei que sou uma profissional maravilhosa, sem egoísmo nem esnobismo, e tenho qualidades para ter sido escolhida, que que há, não posso? [Risos.] Saiu nas televisões de lá, deu nos jornais de Nova York e de Miami, até mostro depois, se você quiser.


PLAYBOY — Mas, afinal, quem pagou, foi a Dijon ou foi o Ricardo Amaral?


LUÍZA — Cê pára, hein! [Risos.] Acho que o Humberto bancou a festa porque eu ganhei o prêmio e sou sua modelo.


PLAYBOY — E esse prêmio já tinha tradição?


LUÍZA — Já, esse concurso foi feito antes por outra agência e outra boate. Não sei se eles copiaram esse concurso ou se foi seqüência do que Brooke Shields ganhou.


PLAYBOY — E o título de Rainha da Banda de Ipanema, neste último carnaval, foi comprado?


LUÍZA — Não, foi o próprio Albino Pinheiro que me convidou pessoalmente, as coisas não foram transadas com o Humberto nem com a Dijon. Contei para o Humberto e ele achou fantástico. Adorei ser a escolhida. A Leila Diniz, a primeira Rainha da Banda, foi uma mulher incrível, pelo que ouvi falar. Achei ótimo, pois sou assim atirada como ela era. Não estou fazendo comparações, mas gostei de estar num lugar que já foi ocupado por uma estrela maravilhosa, com uma cabeça incrível.


PLAYBOY — Diversas vezes você disse que algum homem não fazia o seu tipo. O que lhe atrai em um homem?


LUÍZA — [Meditativa.] Acho que o homem tem que ser macho, mas ao mesmo tempo fresco e até feminino, ter aquele tchanzinho da mulher. [Decidida.] Tem que ser como uma mulher, saber até ser veado de vez em quando.


PLAYBOY — Epa! Explica isso direito, senão muito leitor vai ficar chocado!


LUÍZA — É que o homem tem que ser macho no sentido de ficar de pau duro na hora certa, mas saber ser docinho, delicado, dengoso e carinhoso, dizer coisas bonitas sem vergonha de ter gente ouvindo. Enfim, ser bem fresco mesmo com a mulher.


POR LÉO BORGES RAMOS

FOTOS FERNANDO SEIXAS



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