top of page

THE BEE GEES

Perfil


Os Bee Gees, nos embalos da fama e da fortuna

Como os fabulosos irmãos Gibb conseguiram se transformar no maior sucesso musical dos últimos tempos


Por Mitchell Glazer


Há muita tensão no estúdio C dos estúdios Criteria, em Miami. O produtor Arif Mardin ouve a fita da nova canção dos Bee Gees, Nights on Broadway, ao lado do empresário deles, Robert Stigwood. Arif pede a Barry Gibb, um dos irmãos que compõem o conjunto:


— Barry, você pode me dar umas improvisações bem malucas para usar no fundo?


Barry dá uns gritos, só para experimentar e vai para a sala à prova de som. A fita começa a rodar e ele improvisa: faz um eco para o verso "Blamin' it all" várias vezes. Sua voz vai ficando cada vez mais aguda e, de repente, pela primeira vez na sua vida, canta em falsete.


— Você consegue repetir isso? — pergunta Arif imediatamente.


Barry olha para os rostos atrás do vidro: eles estão esperando, com expressões que não pode decifrar. Tenta o falsete outra vez, a letra toda, correndo atrás da sua própria voz, durante a canção inteira. Quando acaba, vê Robert Stigwood fazendo gestos de entusiasmo.


— Parabéns! — diz o empresário. — Genial ! E isto é apenas o começo...


Como sempre acontece, Stigwood tinha razão. Nights on Broadway fez parte do LP Main Course, que marcou a nova fase dos irmãos Bee Gees. Nova fase em que eles fizeram a trilha sonora para o filme Os Embalos de Sábado à Noite, que pode muito bem se tornar o disco mais vendido de todos os tempos; em que os Gibb — Barry, Rabin e Maurice — escreveram, produziram ou cantaram cinco dos dez compactos mais vendidos nos Estados Unidos; em que co-estrelaram com Peter Frampton o incrível e lucrativo filme Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (com músicas dos Beatles) e em que fizeram uma triunfal temporada de três dias (em agosto) no Madison Square Garden, em Nova York. Uma nova fase, enfim, em que o domínio financeiro dos Bee Gees sobre o mundo fonográfico é incomparável.




Mas, como em toda história de sucesso, nem sempre foi assim. Em 1956, os irmãos Gibb se chamavam The Rattle Snakes e cantavam em troca de níqueis atirados por espectadores da pista de corridas cie automóveis em Manchester, na Inglaterra. Os gêmeos Maurice e Robin tinham 7 anos, Barry tinha 10. Depois, a família mudou-se para a Austrália, os irmãos se profissionalizaram como um grupo adolescente — e completamente desorientado. Maurice conta que, na Austrália, tiveram treze músicas de fracasso consecutivo, mas que um êxito, Spicks and Specks, animou-os a tentarem a sorte na Inglaterra, onde, na época, os Beatles dominavam a cena musical.


— Foi uma época de uma sorte incrível — diz Maurice. — Depois de três semanas num navio, chegamos da Austrália e quase imediatamente fomos contratados por Brian Epstein e pelo sócio dele, Robert Stigwood.


Os sucessos vieram logo e os irmãos Gibb entraram no louco frenesi da vida dos ídolos da música pop na Swinging London dos anos 60. Maurice bebia, "porque não suportava maconha", Barry e Robin chegaram a tomar drogas. Robin ficou, certa vez, muito doente, por doses excessivas de LSD. Barry conta:


— Nós achávamos que os Bee Gees tinham conseguido tudo. Era 1969, os Beatles estavam se separando, todo mundo estava se separando. Estávamos num caos total, havia dinheiro demais, drogas demais. Ficamos cada um por si, com uns grupos de puxa-sacos dizendo que deveríamos fazer carreiras separadas.


E foi o que ocorreu, embora por pouco tempo. Os Bee Gees ficaram separados por um ano e meio. Novamente juntos, eles conseguiram seu primeiro êxito nos Estados Unidos com a música Lonely Days. Em seguida veio outro sucesso, escrito no estúdio e gravado em seguida: How Can You Mend a Broken Heart.



— Aquelas músicas aconteceram depressa demais — comenta Barry. — Nós as escrevemos com ácido na cuca e, como conseguimos aqueles dois primeiros lugares consecutivos em 1971, pensamos: "Meu Deus, estamos no topo outra vez, nós conseguimos vencer". Pô, não estávamos no topo de coisa nenhuma...


Assim como veio, sumiu o sucesso dos Bee Gees. Começaram a fazer músicas parecidas umas com as outras, sem se arriscarem a procurar caminhos novos. E o público começou a se encher deles.


Certa noite, em 1972, Barry, Robin e Maurice eram a atração da noite do Batley's Variety Club, em Las Vegas — uma quase espelunca, e um espetáculo que dificilmente poderia ser classificado como de categoria. O apresentador promete ao público barulhento que os Bee Gees vão cantar "todas as maravilhosas canções que todos vocês amam".


Robin não está se sentindo bem. Vê o público, ouve os assobios nas músicas mais velhas e se sente pior ainda. No meio de Words, uma garçonete deixa cair uma bandeja cheia de copos. Não faltava mais nada. O show termina e os irmãos correm para o camarim. Barry bate a porta com força:


— É isso aí! Conseguimos chegar no fundo do poço. Estamos acabados. A não ser que encontremos um jeito para voltar lá pra cima.


Hoje, quando praticamente aquece o ar à sua volta com o calor da fama e da fortuna, Barry relembra:


— Tínhamos perdido a vontade de escrever grandes músicas. Tínhamos o talento, mas a inspiração desaparecera. Discutimos muito e decidimos, ali mesmo naquele camarim, que a partir de então tudo teria de mudar. Mas não tínhamos a menor idéia do que devíamos fazer.


Como parte da procura de um novo som para voltarem ao topo, os Bee Gees decidiram ir até Miami, gravar num estúdio que estava sendo muito badalado como lugar de boas gravações, o Criteria. Ele tinha fama de melhor fábrica de soul e rythm'n blues, atraindo produtores famosos como Jerry Wexler e Arif Mardin (que acabou produzindo o primeiro disco da nova fase dos Bee Gees) e astros como Ray Charles, Brook Benton, Aretha Franklin, os Allman Brothers, Eric Clapton, os conjuntos Eagles e Chicago, entre outros.


Quando Arif foi produzir pela primeira vez um disco dos irmãos Gibb, percebeu que eles estavam absurdamente dessincronizados com a própria atividade, com a própria época que estavam vivendo.


— Naqueles tempos — diz Barry —, estávamos presos às pavorosas canções de amor...


A primeira coisa que Mardin fez foi insistir que os Gibb comprassem e realmente estudassem os vinte discos mais vendidos da época. Foi o que eles fizeram.


Alugaram uma casa no Ocean Boulevard, perto do estúdio. Depois da revelação do falsete de Barry em Nights on Broadway, Arif ouviu o novo tratamento dado a Jive Talkin:



— Foi uma revelação e ficou provado que estávamos no caminho certo. Foram alguns dos momentos mais importantes da minha vida. Era excitante ver Barry e os seus irmãos criando todas aquelas músicas novas.


Com o trabalho de Arif Mardin, Main Course vendeu mais de 1 milhão de exemplares e ganhou um disco de platina. Além de modificar toda a imagem dos Bee Gees. O disco seguinte seria Children of the World. Mas a RSO Records, a companhia de Stigwood, logo a dos Gibb, tirou sua distribuição da Atlantic, a firma de Mardin, e deu-a para a Polydor. Mardin afastou-se da produção do disco, em troca.


— Nós entramos em pânico — confessa Barry. — Sabíamos que tínhamos material para fazer um disco excelente, mas não a fé necessária para conseguirmos transmitir tudo aquilo. Precisávamos de alguém que ouvisse e nos pudesse ajudar enquanto estivéssemos gravando...


Aí, apareceu Albhy Galuten. Ele tem a aparência de alguém que ficou preso num elevador durante anos. Tem um sorriso cego e meio louco, as pupilas dilatadas de quem viveu emparedado muito tempo. Passa o tempo todo tomando litros de chá e comendo sanduíches de creme de abacate. Ele já tinha trabalhado com Eric Clapton e aceitou co-produzir o disco dos Bee Gees. Maurice conta:


— No começo, quando eu o vi descalço no estúdio e comendo um daqueles sanduíches, fiquei com medo.


Mas Barry, após problemas iniciais de ajustamento, acertou os ponteiros com Albhy e o resto é história: Children of the World, Here at Last, Bee Gees Live, Saturday Night Fever, todos gravados ou mixados em Miami, ganharam discos de platina — principal prêmio do mercado fonográfico dos EUA. Albhy, co-produtor dos 12 milhões de discos que os Bee Gees venderam em 78, murmura, alisando a barba com suas longas unhas:


— Não é possível controlar a coisa. Os filhos da puta continuam vendendo cada vez mais... agora, há semanas em que a cifra chega a um milhão de discos. São os tais, mesmo!


E é assim que eles chegam, agora, ao estúdio D da Criteria, recém-construído. Os tais, os reis do mundo pop. Há uma tensão elétrica no ar quando o conjunto está presente. Nesta noite, por exemplo, Andy Gibb, o irmão caçula que faz sucesso com o compacto Thicker than Water, está acabando um LP e Maurice quer dar uns palpites na gravação.


No estúdio, sacos de papel amassados, latas de refrigerantes, cinzeiros cheios, tudo indica muito trabalho durante noites e noites de gravação. Karl Richardson, outro co-produtor e engenheiro de som, prepara sua floresta de alavancas para mais uma passagem da música que integrará o LP Shadow Dancing. Andy, na sala à prova de som, pede que as luzes sejam diminuídas, até sobrar apenas uma leve auréola sobre seus cabelos louros. Barry aperta o botão "speak":


— Agora, Andy, chegue mais perto do microfone e faça a letra ficar mais sexy.


— É difícil ficar tesudo num hospital — diz Andy na cabine.


O estúdio é o ambiente natural de Barry. De olhos fechados, ele balança o corpo todo ouvindo a música. Quando o take chega ao fim, ele se inclina para a frente e diz:


— Quero mais fogo.


Barry é o mestre aqui. Ouve versões imperceptivelmente diferentes das mesmas frases, dobra e triplica algumas para criar um solo perfeito.


— Outra vez — diz. — Outra vez.


Quando o take parece perfeito e todos sorriem, Barry ainda pede:


— Você não pode melhorar isso ainda mais, Andy?


Cada frase é separada, testada sozinha e depois reintroduzida no todo, até que todas as peças se juntem, formando um disco perfeito; de sucesso garantido.


Barry é o líder no estúdio e ninguém contesta sua posição. Todos parecem sentir o que Mardin disse recentemente:


— Houve um momento no qual Barry se tornou perfeitamente sintonizado com o seu tempo. Esse é o fenômeno. Hoje ele está perfeitamente ligado nas coisas que as pessoas estão ouvindo e no que elas querem ouvir. Não há a menor dúvida de que este tempo é o tempo deles.


O grande segredo dos Bee Gees para o sucesso: uma versão especial do pensamento positivo

Como chegaram a isso? Teria havido alguma "fórmula secreta" de sucesso? Pode parecer careta, quadrado, convencional, mas a verdade é que todos eles responderiam em uníssono: pelo poder do pensamento positivo. Devido à necessidade, os irmãos Gibb desenvolveram uma versão toda pessoal do pensamento positivo. Eles têm a crença de que não existe nada que eles não possam fazer, de que nada limita ou bloqueia seus talentos. E não é egocentrismo provocado pelo sucesso: trata-se de autoconfiança.


Talvez o grande modelo para todo esse fervor seja Robert Stigwood, o empresário do grupo. Toda a carreira dele foi construída sobre jogadas instintivas e sobre uma fé teimosa em si mesmo. Hoje, ele está no auge. Como exemplo, os pacotes de Os Embalos de Sábado à Noite e Sgt. Pepper são projetos dele. E explica:


— Imagino que, a partir da minha crença e das minhas ações, acabei comunicando uma atitude muito positiva a eles.


Stigwood, na época em que os irmãos se afundavam nas baladas medíocres, absorveu os prejuízos de um disco pronto (ainda nos arquivos da RSO) e exigiu que eles reingressassem na corrente central da música pop:


— Fiz isso porque achava que eles deviam manter os pés no chão e curtir o que estavam fazendo. Sempre disse a eles que não existia nada que não seriam capazes de fazer.


E parece que Stigwood estava certo. Olhando para a direção da ilha em que fica sua casa, uma impressionante mansão cor de coral com piscina, quadras de tênis, cais e garagem de barcos, Barry Gibb, líder da maior atração do mundo no show business, faz um rápido monólogo sobre o fenômeno Bee Gees.


Aos 31 anos, milionário e famoso, seu rosto que, nos anos 60, fazia as adolescentes brigarem pela capa de seus discos, está coberto com uma barba curta. Os cabelos castanhos, após um ano de sol da Flórida e da Califórnia têm agora uma cor loura, desbotada. A expressão do rosto mudou, amadureceu, tornou-se bonita. Ele começa a falar sobre seu trabalho mais recente, enquanto vai dar um passeio pelo quebra-mar de Miami:


— Pessoas gritando por ajuda. Canções desesperadas. Essas são as que se tornam grandes. No instante em que você consegue capturar isso num disco, é ouro puro. Stayin' Alive é isso.


Desviando o olhar de sua casa — a mansão dos sonhos de muita gente — ele completa:


— Todo mundo luta contra o mundo, luta contra as coisas que podem tornar as pessoas infelizes. E sobreviver, apenas sobreviver, já é uma vitória. Mas quando se consegue cair e voltar ao topo, voltar com uma vitória ainda maior... bem, isso é uma coisa que todo mundo admira, pois pouca gente consegue.


Começando a caminhar em direção a seu iate, onde Linda, sua bela mulher, o espera para um passeio, ele conclui:


— E é bom, na verdade muito bom, ter conseguido.



ILUSTRACÃO ED PASCHKE


130 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page