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MARLENE MATTOS

Perfil


A dona da Xuxa

Atrás do fascinante sucesso da superestrela da Globo, há uma mulher misteriosa — meio fada, meio fera — que exerce com brilho seus poderes quase totais


Por MÔNICA BERGAMO


Ela vinha caminhando a passos rápidos em direção ao Teatro Fênix, que às terças e quartas-feiras se torna um dos locais mais movimentados do Rio de Janeiro. Ali, naqueles dois dias, é gravado o Xou da Xuxa, atração de todas as manhãs na Rede Globo. Ao reconhecê-la, o menino Daniel Vagner, de 8 anos, correu até ela:


— Moça, é você que é a dona da Xuxa?


— O que você quer? — ela concedeu constrangida.


— Um convite para entrar no programa.


A fila dos baixinhos se agitou. "É ela, a dona da Xuxa", gritavam, enquanto a cercavam, cadernos em punho, atrás de ingressos e autógrafos.


— Não, crianças. Não sou artista. A estrela é a Xuxa.


São completamente diferentes, verdadeiros opostos que se completam, mas essas cenas acontecem na vida de Marlene Mattos, "a dona da Xuxa". Chega a ser difícil de acreditar quando se olha para elas. Vejamos primeiro a bela. Olhos azuis faiscantes, cabelos louros, finos, caindo suaves sobre o rosto delicado, com sua ingênua sedução. E um corpo escultural, talhado em 1,77 metro de uma sensualidade que se desprende da pele, como um suave perfume. Com essas irresistíveis virtudes, Maria da Graça Meneghel, a Xuxa, mantém há quase uma década o cetro de rainha da televisão brasileira. Nos últimos três afios, ela tratou de solidificar, em torno de tanto fascínio, um império empresarial do mesmo porte e brilho. Formou oito empresas — são negócios em turismo, transporte, roupas, discos, vídeo e fazendas, além do licenciamento de uma série de produtos. Só no ano passado, ela faturou 2 milhões de dólares com tais empreendimentos.


Dona de quatro concorridas horas de programação diária na Globo, seu Xou da Xuxa permanece imbatível no horário da manhã. Sua audiência costuma ser três vezes maior que a dos concorrentes. Como cantora, já fez até Roberto Carlos engolir poeira e bateu seu recorde, com um total de 15 milhões de discos vendidos. Enfim, Xuxa é uma princesa encantada. Com dedos de Midas, capaz de transformar em ouro tudo o que toca. Atrás da bela, no entanto, existe uma espécie de fada e fera, que a vigia de perto, manda e desmanda em seu dia-a-dia.


Perto da bela, a fera, em seu 1,55 metro de altura, parece ainda menor. Seus cabelos negros, curtos e cacheados, realçam os traços firmes de um rosto nordestino, moreno e às vezes pouco simpático. A fera não se pinta, detesta saias, usa calças rasgadas de jeans com camisões desbotados e, como concessão à moda esportiva, calça tênis Reebok. Enquanto a bela sorri para todos, a fera não sorri para quase ninguém. Não permite intimidades. Xuxa é uma das raras pessoas que a chamam de Lene. Fora ela, é tratada de dona Marlene, de Marlene Mattos ou por seu nome completo: Marlene Mattos dos Santos, a misteriosa maranhense de 38 anos, taurina, solteira, que desde 1987 resolve cada detalhe dos negócios, do programa e da vida pessoal da mais bem-sucedida estrela da TV. "Eu mando na Xuxa mesmo", confirma sem meias palavras. "Ela faz exatamente o que eu quero."


AULAS DE ESPANHOL NO BANHO


Os poderes que a apresentadora lhe confere, como supervisora geral de suas empresas e diretora do Xou da Xuxa, são praticamente ilimitados. Marlene decide muitas vezes a hora em que Xuxa dorme ou acorda. Contratou os dez empregados de sua mansão na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, e os duzentos das empresas. Pouquíssimos privilegiados, fora da equipe de trabalho, falam com Xuxa sem passar por ela. Nem o pai escapou: implacável, barrou Luiz Meneghel, na porta do camarim, quando ele ainda chefiava os negócios da filha.


Xuxa não assina um cheque sem que Marlene depois saiba para quem foi e seu valor. No início do ano, sem consultá-la, alugou um helicóptero para visitar o namorado Ayrton Senna em Angra dos Reis (RJ). Deu briga. "A Xuxa pode gastar o que quiser, onde quiser", afirma Marlene. "O problema é que, sendo ela, lhe cobram mais caro. Como cuido de seus negócios, zelo para que não perca dinheiro. Enquanto me quiser administrando sua carreira, Xuxa tem que seguir minhas regras."


A apresentadora alugou um helicóptero para visitar o namorado Ayrton Senna. E levou a maior bronca: "Ela tem que seguir as minhas regras", diz Marlene.

As duas, na verdade, estabeleceram uma divisão inteligente de papéis. Xuxa, de um lado, sabe que é uma marca excepcional e deixa para sua onipresente empresária a tarefa de dirigir esse produto. Marlene, de outro lado, assume a responsabilidade de fazer com que tudo em volta funcione perfeitamente. "Não tenho a menor idéia dos problemas ao meu redor, porque a Marlene cuida deles", conta a bela. Quando Marlene entrou em cena, os contratos de Xuxa eram gerenciados por duas empresas. Nesses três anos, o império triplicou, e elas abriram até uma locadora de limusines em Nova York. Não perdem uma parada — nem como parceiras de jogos de buraco com as amigas. "São imbatíveis", garante dona Alda Meneghel, mãe da Xuxa. Se eventualmente perdem uma partida, Marlene impõe uma revanche. E a negra. Ela não admite uma derrota.


Xuxa repete sempre que, se venceu na vida, foi por causa de Marlene: "Devo tudo a ela". Não seria exagero? Afinal, antes de se conhecerem, em 1983, Xuxa já era uma modelo de primeiríssima grandeza e aumentara sua fama ao namorar Pelé. Ocorre que Marlene desde então foi muito além da direção do seu programa e de seus negócios. Para começar, tirou seu hábito de acompanhar cada palavra com uma gíria. Para tanto, deu-lhe longas lições de português, com ditados extraídos de discursos do ex-presidente Jânio Quadros — acompanhados de algumas broncas. "Faço o que for necessário e, se precisar, lavo a calcinha dela", radicaliza.


Não há notícias de que tenha ido tão longe. Mas Marlene parece permanentemente empenhada no aperfeiçoamento profissional de Xuxa. Inventou agora para ela um curso de etiqueta internacional e, antes do final do ano, pretende lhe arranjar uma professora de canto. Para lançar seu recente disco em espanhol, Xuxa teve aulas com uma professora que, por ordens de Marlene, não desgrudava dela nem no banho. Em uma semana de mergulho total, expressava-se com desembaraço.


Como resultado de sua crescente influência sobre um dos grandes ídolos nacionais, Marlene Mattos viu nascer uma enorme curiosidade dos fãs em torno de sua própria vida. E isso a irrita. Com seu jeito seco, durão e em determinadas ocasiões indelicado, ela procura se manter nos bastidores. Detesta entrevistas e fotografias. Tantos cuidados, no entanto, não impedem que crianças a reconheçam — mesmo porque Xuxa não pára de citá-la no programa e em aparições públicas. Assim, abandonou há algum tempo o costume de conversar com o público que se aglomera à entrada do Teatro Fênix, onde, anônima, gostava de recolher críticas e sugestões.


Naquela terça-feira de abril em que foi reconhecida, livrou-se com dificuldade da pequena multidão e entrou. Se pudessem segui-la, os baixinhos, com sua maneira simples de definir as coisas, deixariam a gravação convencidos de que, ao chamar Marlene de dona da Xuxa, acertaram no alvo. Primeiro, ela passou pelo palco e checou o cenário, distribuindo reprimendas diante de cada objeto encontrado fora do lugar. Na suíte, a sala de onde comanda as gravações, ralhou com os técnicos. É um local apertado, escuro e abafado, com paredes de cortiça revestidas por carpete azul-marinho. A mesa de operações, repleta de botões e sinais luminosos, fica em frente ao painel de TV. Através de oito telas, Marlene fica atenta às imagens da apresentadora no palco.


— A Xuxa está pálida e com olheiras. Arruma essa luz aí!


PAQUITAS COM BOTAS FURADAS


As gravações, que começam às 2 da tarde, não terminam antes das 11 da noite. Naquele dia, além de uma dezena de brincadeiras e sorteios, Xuxa gravou "Papo Sério", um quadro do Xou, que, em linguagem acessível, aborda temas como Aids. Para falar do problema, ela entrevistou um psicólogo e um paciente. No intervalo, estudava as fichas com as perguntas que Marlene lhe passara para a entrevista. O que é Aids? Como se pega? Como não se pega? Enquanto repassava, ela conversou rapidamente com os convidados:


— Estou branca, né? Como a Mortícia...


No microfone ligado a um receptor de som invisível, colocado apenas no ouvido de Xuxa, Marlene explodiu:


— Pára de falar de morte aí, pô!


— Não, Lene, estou falando daquele monstro...


— O, Xuxa, te acalma, tá? Isso não é brincadeira de roda. Fica quieta aí.


Se ela escorrega no português, Marlene corrige em cima:


— Xuxa, não é virginidade, não. É vir-gin-da-de. Fala direito: vir-gin-da-de.


São momentos como esse que mostram a extensão dos poderes de MarIene, indiscutivelmente uma tremenda profissional, goste-se ou não de seus métodos. "Odeio pessoas boazinhas", afirma. "Se pudesse, emparedava e acabava com elas." E é no programa que Marlene chega mais perto da glória. "O Xou é a cara dela", observa Nilton Gouveia, coordenador da equipe de produção. "A Xuxa é uma máquina de talento e fala tudo de improviso. Mas suas palavras são idéias que Marlene lhe transmite." É ela, de fato, quem cria quadros, arma o roteiro, discute cenários. Também é ela quem escolhe, entre milhares de candidatas de todo o país, aquelas que serão as paquitas — as ninfetas uniformizadas que contracenam no programa. Por causa delas, uma vez invadiu aos berros a sala do diretor de produção Marcelo Paranhos para reclamar que as botas das meninas estavam furando.


"Nunca um diretor gritou assim comigo", confessa Paranhos. Outros colegas, entretanto, ouviram coisas parecidas. São lendários, no Teatro Fênix, seus bate-bocas com o diretor executivo de shows da Globo, Walter Lacet, recheados de muitos palavrões. Imagine-se o que sobra para uma pobre paquita que saia da linha. "Quero que as meninas sejam profissionais e disciplinadas", exige Marlene, batendo na mesa. "Do contrário, eu arranco isso delas. Da pior maneira possível."


A ex-paquita Andréa Faria, a Sorvetão, que deixou o programa no início do ano, passou por essa dura experiência. Em outubro passado, flagrada no hotel ao tomar um sorvete, depois de um show em Belém, foi imediatamente suspensa. Em abril, aconteceria a mesma coisa com Tatiana Maranhão, a Paquitita, de 13 anos. Como Andréa, ela recebera ordens de Marlene para seguir um regime alimentar. Afastada das gravações, Tatiana ficou à beira de um ataque de nervos. Em duas semanas, conseguiu emagrecer 4 quilos. "Chorei quando vi um ovo de Páscoa", diz a garota. "Sou brava mesmo", admite Marlene. "E as mães das paquitas não se metem. Querem filhas gordinhas e famosas? Não é aqui." Pois mães e filhas se rendem. "Se não fosse ela, não seríamos nada", reconhece Tatiana, agora com 1,70 metro e 53 quilos.


Quando chega o fim do ano, as paquitas vão lhe mostrar o boletim escolar. Ai de quem tiver notas baixas. É suspensão certa. Curiosamente, Marlene foi reprovada por faltas logo no primeiro semestre do curso de Direito que freqüentava no ano passado numa faculdade do subúrbio carioca de Bonsucesso. Ressalve-se, contudo, que quando tinha a idade das paquitas Marlene era a primeira aluna da classe. No colegial, sua menor nota foi em Francês: 7.


AOS 20 ANOS, O ÚNICO NAMORADO


Todo esse esforço de Marlene foi recompensado pelo destino, que levou duas mulheres com vidas tão diferentes a se cruzarem. Xuxa nasceu em Santa Rosa, no Rio Grande do Sul. Marlene nasceu no outro extremo do Brasil, em São José do Ribamar, no Maranhão. Caçula de cinco irmãos, Xuxa cresceu cercada por mimos. Mais velha das três filhas da costureira Odete Mattos Azevedo, Marlene atravessou uma infância difícil. Quando ela tinha 4 anos, a mãe foi tentar a vida no Rio. Deixou-a com as irmãs na casa da avó, Dada, uma neta de índios. No trailer de Dada, Marlene vendia bolo, café com leite e peixe frito. Mais tarde, boa aluna, ajudou a alfabetizar crianças mais pobres em São Luís, recebendo em troca ovos, leite e frango.


Com a avó, aprendeu a trabalhar e a ser disciplinada — exatamente o que cobra hoje das paquitas. Da mãe, aos 14 anos, recebeu o chamado para morar com ela no Rio, onde continuou a estudar. Viviam numa casa modesta, no subúrbio de Parada de Lucas, na Zona Norte da cidade. Em 1975, foi aceita como datilógrafa do Sítio do Pica-Pau Amarelo. E resolveu que, à custa de qualquer sacrifício, faria uma carreira profissional na televisão. Em poucos meses passou a ser a principal assessora do diretor administrativo do programa. Seu padrasto, Antônio Azevedo, que se aposentou como chefe de garagem do Automóvel Clube do Brasil, recorda com orgulho que, ao regressar de madrugada das gravações do Sítio, ligava a luz do quarto para poder ler e estudar.


Foi sempre retraída, de poucos amigos, poucos sorrisos e poucas palavras. É extremamente profissional. Na sua festa de debutante, a mãe precisou brigar para que vestisse uma roupa nova. "Odiava usar saia", lembra dona Odete. Jamais elegeu o casamento como um projeto em sua vida. Tanto que apresentou um único namorado à família. Ela tinha 20 anos. "Disse que o namoro ia atrapalhar seus estudos e pedi que ela escolhesse entre um e outro", relata o padrasto. Marlene deixou o rapaz e nunca mais levou um pretendente em casa. Na produção do Sítio, era chamada de Padre: só ouvia, não falava. Demitiu-se para trabalhar em rádio, onde conheceu o diretor Maurício Sherman. Ao assumir a direção artística da Rede Manchete, ele a levou para ser sua assistente. Ao mesmo tempo, Sherman convenceu a então modelo Xuxa a comandar um programa infantil na emissora, o Clube da Criança. "O programa não tinha figurino, cenário, diretor", diz ele. "Corno a Xuxa vivia reclamando, mandei a Marlene ajudá-la."


Elas nunca mais se separaram. Convidada para montar um programa infantil na Globo, em 1986, Xuxa quis que sua diretora fosse junto. "Sem Marlene, não trabalho", argumentou. No ano seguinte, ela assumiria o cornando de suas empresas, que estava nas mãos da família Meneghel. Com a separação dos seus pais, Xuxa tomou o partido da mãe. Tirou o pai da área de seus negócios e colocou tudo nas mãos de Marlene — que, segundo se comentou na época, trocou a família Meneghel pela família Mattos. Realmente, quatro de suas irmãs (incluindo a cantora Angel Mattos) e um cunhado trabalham nos empreendimentos de Xuxa. Cirano, irmão da apresentadora, esclarece que não fiei bem assim. "Há algum tempo a Xuxa jogava a indireta de que éramos amadores e ela mesma decidiu nos afastar", testemunha. "Marlene entrou em sua vida no lugar da família e hoje faz até o papel de mãe dela."


Empossada com todas essas funções — diretora, empresária, irmã, mãe —, Marlene impôs seu estilo. Antes de tudo, disciplina. E disciplina férrea. Ela não brinca em serviço: "Sou autoritária". Quem duvida? Quando precisa agir, ela age. Certa vez, ao retornar de uma gravação, Xuxa encontrou dois de seus quatro seguranças dormindo na porta da casa na Barra da Tijuca. Ela telefonou para Marlene, que chamou o chefe dos guardas e determinou que os dois fossem imediatamente demitidos.


SÓCIA NA FIRMA DE LIMUSINES


Mas seria um erro pensar nela como fera em tempo integral. Marlene tem, igualmente, seu lado de fada — uma fada-madrinha que sabe como surpreender e agradar. Em 1987, o presidente da Som Livre, João Araújo (pai do cantor Cazuza), resolveu dar um grande presente para o carro-chefe de sua gravadora, corno uma homenagem pelo Dia da Criança. Marlene saiu a campo para cumprir mais uma missão. E foi perfeita! Quando chegou em casa, ao fim de um dia exaustivo de trabalho, Xuxa deparou à porta com um enorme embrulho em papel celofane. Ao rasgá-lo, viu realizado um velho sonho: ela acabava de ganhar uma Mercedes-Benz esporte, de cor prata, modelo 450 SL.


A rainha dos baixinhos encontrou na porta uma Mercedes esporte embrulhada em papel celofane. Mais uma obra de sua fada: "Eu realizo seus desejos"

"Xuxa tem os desejos", resume a fada. "Eu os realizo." Ela encara o uso da varinha de condão como uma de suas intermináveis tarefas, que lhe consomem, às vezes, 20 horas por dia. E quanto ela ganha por suas magias? "O suficiente para viver com dignidade", desconversa. Nos corredores do Jardim Botânico, afirma-se que seu salário na Globo, em abril, era de 180.000 cruzeiros, acrescido de porcentagens no merchandising do Xou. Como principal executiva dás Organizações Xuxa, ela ganha através de sua empresa, a 2 MS Produções — e garante que não é sócia da apresentadora. Há aí uma dúvida. Carlos Augusto Silva, assistente particular e amigo de Marlene há quatorze anos, admite que ela não queria ser sócia de Xuxa. "Mas é", informa. "Ela tem 50% da empresa de aluguel de limusines em Nova York." Foi o próprio Carlos Augusto quem cuidou da papelada da empresa nos Estados Unidos.


SUA MUSA É MARILYN MONROE


Seja quanto for, urna parte de seus salários vai para dois sobrinhos órfãos. Ela mora sozinha, no jardim Botânico, a seis quarteirões da Globo. É um apartamento pequeno, ainda mais para as necessidades da proprietária: os dois quartos vivem entulhados de telefones (tem quatro linhas), aparelhos de som, videocassetes e um telão. Ela fez uma decoração com móveis tubulares e pregou em todas as paredes quadros e mais quadros da atriz Marilyn Monroe. "É a minha musa", esclarece. Sob as vistas de Marilyn, nos fins de semana Marlene assiste a vídeos que aluga numa locadora do próprio prédio e lê livros de pensamentos, como os de Buda, ou biografias. Há pouco, terminou a de Jacqueline Onassis.


Não cozinha e se alimenta irregularmente. "Se a gente não insiste, ela esquece", diz Lenice Coelho, sua secretária. Em geral, Maria, a governanta da casa de Xuxa, leva para ela a mesma refeição que prepara para a patroa — à base de comida natural. Mas o prato preferido de Marlene é galinha de cabidela ou coração de frango, que belisca como aperitivo enquanto joga buraco.


De hábitos discretos, sai de casa entre 9 e 10 horas da manhã, muitas vezes a pé, deixando na garagem seus quatro carros. Um deles é um Fiat Uno que Xuxa lhe presenteou. A volta é imprevisível: Numa segunda-feira de abril, retornou às 23 horas. Embora não fosse dia de gravações, havia recebido empresários, conversado com as paquitas e analisado produtos a serem lançados com a marca da apresentadora. Xuxa, por sua vez, aproveitara a folga para ir ao dentista e ao médico. Quando sai, é acompanhada pelo motorista e por um de seus enormes seguranças. Sendo uma celebridade, evita locais em que possa provocar tumulto. Por isso, usa roupas feitas por sua mãe ou compradas no exterior e não entra em supermercados, de onde os empregados lhe trazem o que ela precisa.


AS CARETAS QUE DÃO RUGAS


Às 21 horas, enquanto Marlene começava a experimentar sucos de mamão e maracujá cujos fabricantes tentavam o licenciamento, Xuxa entrou em seu escritório e lembrou que era tarde. É uma sala de 15 metros quadrados, toda branca, com banheiro privativo. Tem um sofá de couro, televisor, vídeo, conjunto de som, dois telefones, imagens de santos (embora não seja religiosa) e, claro, um enorme pôster reproduz a capa do disco 4.º Xou da Xuxa, em que ela está mergulhada na água, ombros de fora, sorrindo para quem entra.


Ao vê-la chegar, Marlene levou um susto em sua cadeira preta, alta, de rodinhas. E se apressou em apagar o cigarro. Ela fuma escondido de Xuxa, que detesta fumaça e costuma atirar maços e isqueiros pela janela.


— Nossa! Só se trabalha aqui? — perguntou Xuxa.


— Eu ia mexer no roteiro do programa de amanhã — disse Marlene. — Experimenta este suco, Xuxa.


Aprovou o de mamão, achou o de maracujá "passado". Em casos como esse, a palavra final é da estrela — não gostou do produto, não aprova o licenciamento. As duas, depois, passaram a tratar do programa do dia seguinte.


— Foram oito dentes, Lene — Xuxa mudou de assunto.


— É, fiz bem de marcar a consulta.


— Fui ao médico também e falei das rugas. Ele disse que não tenho nada. Isso é das caretas que faço no programa.


— Eu falei! Ele não explicou que não tem nada para fazer?


— Só se cauterizar. E não vai dar o resultado que eu quero.


— Ah, então acabou, tá? O, Xuxa... baixa o facho. Tu tens apenas 27 anos.


Deixaram o escritório depois das 22 horas. Fora um dia calmo e, perto dos outros, pouco trabalhoso. Até quando elas continuarão juntas? "Uma vez por ano, pergunto se Xuxa quer parar, pois tem dinheiro para isso", explica Marlene. "Ela responde que não, e então exijo que se entregue totalmente ao que faz." Quando Xuxa se afastar da carreira, Marlene pretende escrever biografias. Ainda não sabe de quem, embora uma das irmãs diga que ela sonha em fazer sua autobiografia, o que a empresária não confirma. Até lá, pensa em manter essa associação mágica mais e mais viva, mais e mais rica. Nessa união que deu tão certo, uma é Xuxa, a bela. A outra é a dona da Xuxa, a fera. Ou seja, dois lados de uma história de sucesso que só poderia ter um final feliz.


ILUSTRAÇÃO BRASÍLIO MATSUMOTO


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