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MARCELINHO CARIOCA | MAIO, 2001

Playboy Entrevista


O polêmico jogador fala das surras na infância, das brigas com Luxemburgo e pede perdão por ter se achado o dono do mundo


Contraditório, rebelde, explosivo. Assim como o anti-herói de Macunaíma, um dos poucos livros que leu, além da Bíblia, é claro. Em 12 anos de carreira, Marcelo Pereira Surcin, o Marcelinho Carioca, jogou no Madureira, Flamengo e Corinthians, com uma breve passagem pelo Valencia, da Espanha. Voltou em 1998 quando a Federação Paulista de Futebol fez aquele papelão ao recuperar o passe do jogador pelo sistema 0900 [em que as torcidas foram convocadas a fazer doações pelo telefone para angariar fundos para sua compra]. Uma pesquisa com jornalistas de esporte revelou que ele costuma ter uma cara na frente das câmeras e outra quando as luzes se apagam. Suas brigas com colegas e técnicos são famosas, mas ele sempre se defende com a máxima: "Não sei perder, nem mesmo campeonato de cuspe à distância". Quando perde, nem consegue dormir. Também não leva desaforo para casa. O que já lhe custou caro – suspensões e um bom tempo fora das listas de convocação para o time nacional.


Sua maior frustração era a Seleção Brasileira – só havia sido convocado duas vezes, em 1994, por Zagallo, e em 1998, por Luxemburgo, atuando apenas em três partidas –, até o dia 20 de abril, quando o técnico Leão o chamou para o jogo contra o Peru, dia 25 de abril, pelas Eliminatórias da Copa de 2002. Esta seria a última chance de vestir a camisa verde-amarela, acredita Marcelinho, que já está com 29 anos. É do tipo que fala o que quer e, depois, se achar que pegou pesado demais e que aquilo vai prejudicá-lo, volta atrás. "Me acho bastante carismático. Dentro e fora do campo", diz. Gosta de se esparramar na frente da tevê para assistir a filmes de Kung Fu, Stallone, Van Damme. Mora no tradicional bairro paulistano da Mooca, num grande apartamento, com a mulher Ana Cristina e os três filhos: Lucas, de 8 anos, e os gêmeos Mateus e Marcela, de 3 anos e meio. Passou nove meses separado da mulher, tempo em que seu site na internet ficou abarrotado de propostas de garotas louquinhas por seu sorriso de menino malandro do Rio.


O sobrenome Surcin é de origem francesa e vem de seu bisavô pelo lado paterno. Mas ele não sabe muito mais além disso sobre a história de sua família, bastante humilde, por sinal. Descobriu ter um bom tino para negócios – administra escolinhas de futebol bem-sucedidas, além de emprestar seu nome a vários produtos – , de cosméticos a vídeos com fundamentos de futebol. O livro A Cartilha do Marcelinho Carioca em que ensina crianças a jogar foi o campeão de vendas na última Bienal do Livro, em 1999. Costuma agradecer a Deus tudo o que de bom lhe acontece, até mesmo o pezinho de anjo – ele calça 35,5 e suas chuteiras são amaciadas pelas meninas que aprendem a jogar futebol em suas escolinhas. Em fevereiro de 1996, na Vila Belmiro, Pelé o homenageou com uma placa depois daquele fantástico gol em cima do Santos, vazado justamente pelo filho do Rei, o goleiro Edinho.


Deus e o diabo rondam o evangélico Marcelo Pereira Surcin. Para desvendar a personalidade contraditória do craque corintiano, PLAYBOY convocou a repórter Regina Echeverria. Foram três longos encontros em seu amplo apartamento paulista, separados por um intervalo de nove meses, tempo em que o Corinthians [e Marcelinho com ele] visitou o inferno perdendo 10 jogos consecutivos. Na última sessão da entrevista, o time já voltara de novo aos céus sob o comando de Wanderley Luxemburgo, com quem Marcelinho brigou e fez as pazes publicamente inúmeras vezes. O relato da repórter:


"Preciso confessar antes de mais nada: sou corintiana roxa e não pertenço à ala dos torcedores que odeia Marcelinho. Por isso, meu coração estava limpo de preconceitos ao me encontrar pela primeira vez com Marcelinho Carioca. Era preciso conhecê-lo antes de amá-lo ou odiá-lo fora dos campos de futebol."


"Primeiro, me impressionou a inteligência viva que suas palavras e as limitações da falta de estudo nem sempre conseguem traduzir. Também compreendi que uma criança que apanha muito na infância, é chamado de neguinho sujo na rua, xingado de filho de lixeiro e nunca é convidado para as festinhas do bairro na adolescência porque é pobre, não consegue esquecer tudo isso assim, do dia para a noite. Nossa entrevista teve duas fases e duas opiniões diferentes sobre o mesmo tema: Wanderley Luxemburgo. O dilema é saber se podemos acreditar que Marcelinho Carioca hoje, como ele diz olhando profundamente dentro dos olhos do interlocutor, é um novo homem".


PLAYBOY – Sua mãe diz que reza para você não machucar os adversários. É verdade?


MARCELINHO CARIOCA – Isso saiu no jornal, mas acho que ela nunca falou. Ou talvez tenha dito naquela época, quando eu era mais explosivo e me aproximava mais do temperamento do meu pai, um homem nervoso, que gritava, batia. Bastante explosivo, temperamental. Eu nasci assim com um pouquinho dessas qualidades, tudinho do meu pai.


PLAYBOY – Qualidades?


MARCELINHO – Com o tempo, percebi que não eram qualidades para mim. Que eu criava situações que poderiam me comprometer no futuro.


PLAYBOY – Enfim, você carregou esse gênio herdado de seu pai para dentro de campo.


MARCELINHO – É, todo mundo dizia: "Você parece com seu pai", e que eu tinha um gênio assim muito forte. O tempo foi passando e eu fui mudando; mas eu levei isso pro futebol, sim. Pelo menos até os 25 anos. Então, meus filhos foram crescendo e o mais velho começou a fazer perguntas que me complicavam. Eu decidi: tenho que mudar, tenho que acabar com isso.


PLAYBOY – Que tipo de perguntas seu filho começou a fazer?


MARCELINHO – Ah! De tudo! "Pô, pai, porque essa briga dentro de campo? Por que cê fez isso?" Enfim, coisas que ele queria fazer também no joguinho de futebol dele com as crianças. Às vezes, eu não levava desaforo para casa, queria discutir com a autoridade maior no campo, que era o árbitro. Outras vezes, alguém me dava uma pancada e eu queria revidar. Eu precisava me controlar e não conseguia. Dava pancada. Dava mesmo. Porrada...


PLAYBOY – Quando você dizia que tinha experiência e sabia controlar seu gênio, estava falando a verdade?


MARCELINHO – Eu falava da boca pra fora. Dali a pouco, pum, fazia de novo. Era uma reação impensada, não falava lá do fundo do coração. Hoje entendo que aquele comportamento não iria me levar a lugar algum.


"Eu falava [que não sabia se controlar] da boca pra fora. Dali a pouco, pum, fazia de novo. Era uma reação impensada"

PLAYBOY – E o que foi essa tal mudança de 1998, à qual você se refere em muitas declarações como um marco importante na vida e na carreira?


MARCELINHO – Foi depois daqueles 19 dias [no final do campeonato paulista, em novembro de 1998] em que eu fiquei no cativeiro por ter desrespeitado o Wanderley Luxemburgo e passei aquele tempo todo sozinho, tendo que cobrar falta com massagista todos os dias, lá no centro de treinamento de Itaquera [zona leste de São Paulo] num frio danado. Foi ali que me conscientizei: tenho que mudar. Era preciso mudar dentro de campo. Nunca fui indisciplinado, nunca faltei a um treino. Sou o primeiro a chegar, o último a sair, puxo fila, sou exemplo para a meninada que está começando no clube. Então, qual era o meu problema? Falar com os árbitros, algumas entradas dentro de campo, às vezes ser explosivo e ser expulso? Aí eu parei tudo, fiz uma reciclagem, uma autocrítica, sozinho. E, ainda, conversei com o pastor na igreja, tomei esporro do meu pai, da minha mãe. Até meu filho novinho me falou: "Pô, pai, o que aconteceu lá?" Todo mundo me cobrava. Será que todo mundo estava errado e eu certo?


PLAYBOY – Um "Atleta de Cristo", como você alega ser, não deveria, por princípio, respeitar o semelhante e não agredi-lo em campo?


MARCELINHO – Na verdade, sempre fui mal-interpretado nas minhas declarações, mas dei motivo para isso. Eu falava muito no Evangelho, em Jesus. Só que chegava dentro de campo e fazia totalmente o contrário. Minhas palavras não condiziam com meu comportamento. Então, dei motivo, dei minha cara para bater. Eu nunca vou deixar de falar no Senhor, porque é prioridade na minha vida. Só que existem maneiras e momentos certos para falar. No futebol, vamos falar de futebol.


PLAYBOY – Mesmo assim, esse comportamento em campo não parece ser compatível com um "Atleta de Cristo".


MARCELINHO – Num jogo de futebol existem os contatos físicos, têm as jogadas ríspidas, os problemas dentro de campo, as confusões. Mas eu te falo uma coisa: o Mané e o Joaquim dão ibope para alguém? Não dão. Então falavam de mim. O povo quer ver notícia ruim, que vende jornal, ele quer ver aquela fofoca na televisão. No começo, eu ficava irritado com o que diziam e publicavam a meu respeito, me estressava. Agora, falem o que quiserem. Não dá para agradar a todo mundo.


"O Mané e o Joaquim dão ibope para alguém? Então falavam de mim. O povo quer ver notícia ruim, que vende jornal"

PLAYBOY – Mas você concorda que não é nenhum santinho.


MARCELINHO – Eu não sou santinho, mesmo. Sou um ser humano normal, passível de erro, mas tenho certeza de que eu tenho 90% de acertos, de amor no coração, de atitudes muito boas.


PLAYBOY – Qual torcida cobra mais, a do Corinthians ou a do Flamengo?


MARCELINHO – As duas.


PLAYBOY – No que elas diferem?


MARCELINHO – Uma invade e a outra não. A do Corinthians entra em campo, quer agredir, quer bater. As duas são peso pesado, Mike Tyson. Jogar no Corinthians é sensacional, embora viva sempre nos dois extremos. Se a gente ganha o jogo, está na lua, se perde, vai para o abismo. Acho que, no Corinthians, é preciso estar mais preparado para perder do que para ganhar.


PLAYBOY – Muitos jornalistas esportivos definem você como uma pessoa de contrastes: malandro e evangélico, metido e simpático...


MARCELINHO – Como é que um cara pode ser metido e simpático ao mesmo tempo? Como pode ser evangélico e desleal? Sou evangélico, mas de carne e osso, tenho meus erros. Mas ser desleal não concordo. Não sou assim.


PLAYBOY – Como era a vida de sua família quando você era criança? Seu pai trabalhava em quê?


MARCELINHO – Ele trabalhava como eletricista na Piraquê, fábrica de biscoitos. Sofreu um acidente lá. Cortou o dedo, ficou em casa e perdeu o emprego. E tinha meus dois irmãos. Venho de uma família pobre, humilde, não tinha dinheiro para uma merenda, para uma roupa melhor. Minha mãe é do lar, mas ajudava no orçamento fazendo pastéis pra gente vender na feira, tapetes pra vender pela rua. Depois, meu pai foi trabalhar na Comlurb, Companhia de Limpeza Urbana, em que ficou bastante tempo. Aposentou-se ali.


PLAYBOY – Você é o caçula e também o capetinha da família?


MARCELINHO – Ah! Eu era agitadinho! Fazia muita arte mesmo, aprontava como todo menino travesso. Chegava em casa machucado, cortado, arrumava briga na rua. Eu era levado. Fazia de tudo, soltava pipa, jogava bola de gude, andava descalço. Era maravilhoso. Roubava goiaba, roubava pêssego.


PLAYBOY – E o castigo, vinha como?


MARCELINHO – Meu pai me batia. Minha mãe me batia demais. Batia de chinelo, de panela, de vassoura, com tudo o que via pela frente. Mas foi bom porque meus pais me deram uma educação muito boa. Tenho orgulho dos meus pais. Graças a eles, fiquei longe das drogas, das más companhias.


PLAYBOY – Lembra de alguma surra memorável?


MARCELINHO – Nossa! Apanhei bastante, toda vida. O que tinha na frente de meu pai ele tacava em cima, jogava. Certa vez, eu tinha saído do banho e apanhei tanto que tive que sair correndo nu pra rua. Minha mãe batia menos. Mas meu pai é assim até hoje.


PLAYBOY – E hoje, você bate nos seus filhos?


MARCELINHO – Evito muito. Mas quando tem que dar uma palmadinha no Lucas, de 8 anos, eu dou. Hoje nem é mais preciso. Basta olhar. Uma vez bati nele e fui dizendo: "Olha, o papai está te batendo por isso e por aquilo e espero que a partir de hoje eu conte só até três e você obedeça. Se chegar no três você vai apanhar como hoje!" Agora, quando começo a contar ele pára rapidinho porque se lembra que apanhou. E acho que foi até bom, um fator de correção, de educação para ele.


PLAYBOY – Mesmo tendo apanhado tanto na vida você ainda acha que é preciso recorrer ao castigo físico?


MARCELINHO – Eu não concordo com a idéia de bater nos filhos. Mas, quando você tem que corrigir com uma varinha...


PLAYBOY – E como foi resistir às chamadas más companhias e às drogas?


MARCELINHO – Eu vivia perto de Vila Valqueire, perto da Base Aérea dos Afonsos, uma área mais ou menos militar, perto do cemitério Jardim da Saudade [subúrbio da zona oeste carioca]. E muitos amigos meus entraram na onda das drogas.


PLAYBOY – E o que você acha que o segurou?


MARCELINHO – A família. Minha infância foi maravilhosa, mesmo tendo apanhado e sofrido discriminação, racismo, essas coisas todas.


PLAYBOY – Que tipo de racismo e discriminação?


MARCELINHO – A discriminação vinha das famílias que tinham uma situação financeira melhor do que a nossa. Porque éramos escurinhos, não nos vestíamos bem, não éramos convidados para festas. Lembro do tempo em que eu e meus irmãos íamos vender pastel na feira e chegavam aquelas senhoras com chofer do lado. Quando eu ia oferecer pastel, elas costumavam dizer: "Ô neguinho, sai daqui! Não sei de onde veio isso! Você limpou as mãos? Lavou as mãos?" Essas coisas eu jamais vou esquecer.


PLAYBOY – Isso contribuiu para que você manifestasse um gênio revoltado?


MARCELINHO – Não revolta, mas, com certeza, ficou alguma coisa. Eu não guardo mágoa. Mas as lembranças daquilo que você ouviu ficam, caramba! Hoje as pessoas não falam mais porque mudei de classe. Eu era pobre e hoje estou numa outra condição. E me pergunto sempre: por que essa mudança se sou a mesma pessoa? O Michael Jackson até mudou de cor. Eu não vou mudar nada e tenho orgulho da minha cor. Mas a discriminação ficou na memória.


PLAYBOY – E seus irmãos, eles também pegavam no seu pé?


MARCELINHO – Nossa Senhora! Uma vez meu irmão ganhou uma Caloi 10, peguei escondido, não podia e quebrei o cadeado. O gravador que ele tinha tanto cuidado, tanto tititi, também roubei. Eu fazia de tudo.


PLAYBOY – Eles te batiam?


MARCELINHO – O do meio não. Mas o mais velho... Esse a gente tinha que escutar. E eu escutava. Às vezes, tinha uma roupa que ele guardava para usar dali a dois, três meses, eu queria usar antes, usava escondido.


PLAYBOY – E garotas? Quando você começou a namorar, a sentir atração?


MARCELINHO – Desde que eu comecei a entender o que era uma menina, né? [Risos.] Tinha as paquerinhas. Mas a minha primeira paixão mesmo foi uma menina que o pai dela não queria o namoro, tanto que a mandou para a França. Ela se chamava Mônica, era linda e branca. Eu tinha 13, 14 anos. Mas sempre namorei bastante. Gostava de sair, ir para os bailinhos, fazer aquelas festas americanas, quando os homens levavam refrigerantes, e as meninas, as comidas.


PLAYBOY – Mas como aconteceu essa história da garota loirinha que você queria namorar e o pai não deixava?


MARCELINHO – É verdade. Ela era filha de um marinheiro e ele não queria que a gente namorasse de jeito nenhum. Mas a mãe dela, que resolveu voltar para a escola depois de adulta, estudava comigo à noite e me conhecia. O problema era o pai, que não queria mesmo. Falava na minha cara e para todo mundo.


PLAYBOY – Você não o enfrentou?


MARCELINHO – Não, porque meu pai me ensinou a não desrespeitar os mais velhos. Mas, se ele fosse da minha idade, aí tinha coisa feia. Depois passou tudo. Digo isso porque, ao sair do Madureira e ser contratado pelo Flamengo, o pai dela passou a me olhar diferente. E aí eu fiquei decepcionado com a atitude dele e não quis mais batalhar pela Mônica. Acabou tudo.


PLAYBOY – Com o que você sonhava nessa época?


MARCELINHO – Em entrar para um grande clube e jogar no Maracanã. E, também, dar uma casa com piscina para a minha mãe.


PLAYBOY – A casa com piscina. O velho sonho de status, de consumo.


MARCELINHO – Sabe por quê? Porque a gente tinha que pular no quintal dos outros pra poder tomar um banho de piscina. Porque, mesmo morando num lugar pobre, tem sempre aquele que se dá um pouquinho melhor na vida e a primeira coisa que faz é construir uma piscina. Por exemplo, entre dez, doze casas num quarteirão, uma tinha piscina. E, quando invadíamos as casas que tinham piscina dava briga, chamavam a polícia. Aquela água imunda e a gente achando uma maravilha. Era o meu Caribe. Nem piscina Tony, aquelas de plástico, a gente tinha condição de ter. Tomava banho de mangueira. Ir à praia era difícil, era longe, precisava de dinheiro para a passagem e depois chegava lá não tinha dinheiro pra comer nada.


"A gente invadia casas que tinham piscina, chamavam a polícia. [...] Aquela água imunda e a gente achando uma maravilha"

PLAYBOY – Qual a primeira coisa que você comprou com dinheiro seu?


MARCELINHO – No Madureira, eu ganhava uma ajuda de custo e fiz um acordo com os dirigentes. Todas as vezes que eu marcasse gol nos times grandes, eles me davam roupa. Abriram um crediário para mim na Toulon. Eu queria roupa. Lembro que tinha uma festa de 15 anos de uma menina que eu estava esperando há um ano. E tinha que juntar dinheiro pra comprar roupa. E tinha que ser roupa de marca. Aí fiz de tudo pra comprar. Fiz gol pra caramba. Comprei pra mim e para o meu irmão. Era aquela calça com três costuras do lado, preta com as costuras brancas. Tinha que ser essa calça. E meu irmão, quando me viu descendo do ônibus com as sacolas ficou doido e nem deixou minha mãe fazer a bainha. Ele mesmo fez. De lá pra cá, nunca deixei de fazer gol. O gol te dá retorno. Fiquei com isso na cabeça.


PLAYBOY – E a sua primeira vez?


MARCELINHO – A primeira vez foi até engraçado porque cheguei pra minha mãe e pedi: "Quero um dinheiro". E ela: "Pra quê?" Eu só dizia: "Quero um dinheiro!" Eu tinha 15 anos e não foi legal. Era uma menina que fazia limpeza no Flamengo. Já era bem mais velha do que eu. Mas eu queria, né? E não foi legal. A primeira vez legal mesmo, de paixão, foi com a minha mulher. Digo isso porque nos separamos e descobrimos o verdadeiro amor, porque acabamos voltando.


PLAYBOY – Você transou com a primeira namorada, a loirinha?


MARCELINHO – Não, porque eu gostava tanto dela que a respeitava. Por isso a mãe dela gostava de mim. Eu afirmei: "Sua filha é virgem, namoramos há tanto tempo e eu não vou fazer isso com ela." Aí foram ao ginecologista conferir. E ela era virgem. Eu tinha medo naquela época, porque já tinha o pai dela que não gostava de mim porque eu era preto e pobre. Mas eu gostava tanto dela que um toque, um carinho, um beijo já me deixava feliz. Isso durou até os 16 anos.


PLAYBOY – Aí você caiu na vida?


MARCELINHO – Aí fui embora. Tive várias experiências, mas tudo pelo prazer, não pelo amor. Eu gostava de sair, mas nunca fui de beber. Não vou dizer que nunca experimentei bebida alcoólica, mas aos 17 anos tomei um porre de cerveja numa festa e, por causa disso, meu pai e meu tio me trancaram dentro do carro até o final da noite. De lá pra cá, não bebi mais cerveja. Foi o único porre que tomei na vida. Não há como um atleta beber.


PLAYBOY – Como a religião entrou em sua vida?


MARCELINHO – Aos 16 anos, embora saísse bastante à noite, nunca estava feliz. E quando me tornei evangélico senti a paz na igreja, onde a música é mais calma, onde posso refletir. Eu sei que tenho que agradecer a Deus, olhar mais pra Deus. Minha vida deu um giro de 180 graus e comecei a conquistar coisas, dar presentes para os pais, os irmãos. Se não tiver autocontrole, você começa a fazer besteira, vai querer pegar todas as mulheres, vai querer gastar todo seu dinheiro. Comecei a freqüentar a igreja por opção e vou freqüentar até o resto de minha vida, porque me sinto bem. Gosto daquele ambiente, daquelas pessoas, da conversa, do hábito de agradecer pelo amigo e até pelo inimigo. Antes, eu acreditava que era preciso pagar na mesma moeda. Não é que alguém enfiou isso na minha cabeça, me deixou bitolado, nada disso. Maldito é o homem que confia no homem: este pode enganar qualquer um, mas a Deus ninguém engana.


PLAYBOY – Então você é daqueles que acreditam que fama, dinheiro e sucesso não necessariamente trazem felicidade.


MARCELINHO – Não trazem. Porque com 16 anos eu comecei a viver esse mundo, a aparecer na televisão, nos jornais, a ganhar um pouquinho melhor e a verdadeira felicidade não veio. Só veio quando me converti.


PLAYBOY – Quer dizer que quando você ganhou dinheiro ficou infeliz?


MARCELINHO – Com 17, 18 anos, eu já tinha meu carro, já saía e pegava as melhores mulheres, ia nos melhores lugares. Só que nada disso satisfazia meu coração. É uma coisa individual. Não estava me dando a alegria que eu queria. Eu conversava com minha mãe. Chegava sábado, domingo, ficava em casa e ela perguntava: "Mas você não queria jogar no Flamengo, não queria ter dinheiro?" Eu respondia: "Queria, mãe, mas não estou feliz". Foi aí que comecei a aceitar Jesus, passei a me sentir em paz. Cada um se sente bem em um lugar. Me sinto bem dentro da igreja.


PLAYBOY – Não foram as drogas que acabaram levando você à religião?


MARCELINHO – Nunca experimentei droga alguma, juro. Se tivesse experimentado, falaria mesmo. Convivi com amigos que usavam.


PLAYBOY – O que mudou em sua rotina depois que você virou evangélico?


MARCELINHO – Deixei de ir a certos lugares que eu freqüentava, como os bailes funk, por exemplo, festas de periferia, bares. Também larguei certos hábitos: se estivesse numa roda e a conversa descambava para a sacanagem, também passava a evitar.


PLAYBOY – Sua primeira briga pública aconteceu ainda no Flamengo. [Em agosto de 1992, com o diretor de futebol do Flamengo, Vinícius França, durante excursão do time à Europa.]


MARCELINHO – Foi. Aquele foi um ano difícil. Dei um chute e senti uma dor na região pubiana. Acabei operado. De lá pra cá, fiz muitos tratamentos. Chuto diferente dos outros atletas. Porque aprendi um jeito, chuto muito de chapa, com a parte interna do pé, que mexe bastante com o adutor e chega na região pubiana. Uso esse jeito de bater nos chutes, nas faltas e treinos. Mas é verdade, em 1992 discuti com o Vinícius França, trocamos empurrões, alguns socos.


PLAYBOY – Nesses momentos de reação incontrolada, você fica cego, não vê nada na frente?


MARCELINHO – Tinha aqueles três minutos meus que, depois que passavam, eu pensava: "Que será que eu fiz?" Mas de 1998 pra cá resolvi tirar os três minutos da minha vida, que podiam me prejudicar e me comprometer. Entendi que corria o risco de ficar sem crédito. Tudo bem que os gols abafaram muitas coisas, mas, para a minha integridade, não é bom.


PLAYBOY – Você disse que mudou devido à punição que recebeu de Wanderley Luxemburgo. Qual foi o motivo da briga de vocês?


MARCELINHO – Foi questão de temperamento. Não gostei de certas atitudes dele. Principalmente quando fiquei 19 dias na solitária. Fiquei maluco, p... da vida. Eu queria matar o homem. Só que dali comecei a pensar, analisar. Pensei por que estava ali, o que havia feito, e planejei voltar de uma maneira mais forte.


"Fiquei maluco, p... da vida. Eu queria matar o homem. Só que daí comecei a analisar e planejei voltar mais forte"

PLAYBOY – É, mas depois desse período você declarou assim: estou em má forma porque o Wanderley Luxemburgo me deixou 19 dias sem treinar.


MARCELINHO – Mas é lógico, é verdade. Eu já tinha concordado que ele havia me dado uma lição em termos de comportamento, de aprendizado, de profissionalismo. Mas, em termos técnicos, tive uma perda, do meu condicionamento físico, da minha parte técnica. E houve uma cobrança. As pessoas queriam que eu voltasse e metesse gol de bicicleta, de escanteio. E eu não fiz aquilo. Por quê? Porque fiquei 19 dias sem ritmo de jogo.


PLAYBOY – A confusão entre você e Luxemburgo teria começado em Salvador, onde o Corinthians disputava o torneio Maria Quitéria [em julho de 1998]. Você contou, dias depois, que ultrapassara o horário de retorno ao quarto do hotel em cerca de dez minutos e que, por isso, fora desligado do elenco.


MARCELINHO – Foi o seguinte: tínhamos que estar às onze horas dentro do quarto. Mas você não vai dormir às onze horas, fica no quarto de um, no quarto de outro, e aí quando eram onze e dez, onze e quinze, eu estava passando pelo corredor. Eu tinha ido para um outro andar e estava retornando quando o segurança apareceu dizendo que eu não podia estar ali. Aí, eu falei: "Por que não pode? Estou voltando para o meu quarto". Nisso, o Wanderley vinha chegando também e, em vez de falar na boa comigo, com educação, ele foi autoritário. Aí eu não aceitei e aconteceu aquela confusão no corredor. O Wanderley, na verdade, nunca gostou que ninguém o enfrentasse. Só que é o seguinte: eu também não levo desaforo pra casa, e eu fui lá e enfrentei sim. Disse: "Você tem que me tratar com respeito!" Aí, ele quis falar mais alto e eu quis falar mais alto ainda e o pau comeu. Ele me desligou daquele jogo e voltei para São Paulo.


"O Wanderley nunca gostou que ninguém o enfrentasse [...] Ele quis falar mais alto e eu quis falar mais alto ainda"

PLAYBOY – Em outubro de 1998, Wanderley Luxemburgo voltou a criticar a sua atitude depois de um jogo contra o Palmeiras. Você foi substituído aos trinta minutos do segundo tempo e, quando soube que não teria que fazer exame de doping, pegou um táxi e foi embora. Você era o capitão do time. Aos jornalistas, o técnico declarou que era sua obrigação ficar e dar explicações à imprensa sobre a derrota.


MARCELINHO – Não foi nada disso. Ele falou pra mim: "Marcelinho, você vai ter que acompanhar o Júnior até o final". Eu respondi: "Wanderley, os nossos dois homens de frente precisam receber a bola e eu sou o homem que faz gols". Ele disse: "Não interessa, você vai ficar ali!" Aí eu fui para o meio e meti um passe não sei para quem fazer um gol. O Junior escapuliu duas vezes e cruzou duas bolas e o Palmeiras ganhou o jogo por 3x1. O Júnior cruzou duas bolas, e o Wanderley, em vez de assumir a responsabilidade, não assumiu. Transferiu toda a culpa da derrota para mim.


PLAYBOY – Logo em seguida, houve outra confusão num hotel em São Paulo [final do campeonato paulista, em novembro de 1998]. Qual é sua versão?


MARCELINHO – Um dia antes do jogo contra o São Paulo, o Wanderley começou a colocar os seguranças na minha cola, tipo para me irritar, e eu falei com um deles: "Tem 25 atletas aqui, por que você tem que andar na minha cola?" Eles respondiam: "O Wanderley mandou". Aí o pau comeu, eu falei para o segurança: "Atrás de mim você não vai ficar não". Saiu aquela discussão violenta e no outro dia eu fui almoçar e quando estava para colocar a primeira garfada na boca, o Wanderley falou no meu ouvido: "Não quero que você faça isso, porque quem manda aqui sou eu!" Eu disse: "É o seguinte, Wanderley, a minha briga não é com você, você fala então para o seu segurança não ficar na minha cola". Aí o tom dele começou a mudar e ele deu uma porrada na mesa. Eu levantei da cadeira e fui pra cima dele para discutir. O Wanderley também não joga para perder, ele não gosta de perder. Tudo bem, eu tinha que olhar para o meu lado e pensar: tenho que respeitá-lo. Houve um desrespeito da minha parte em relação à autoridade.


PLAYBOY – Agora, quando ele está novamente no comando do Corinthians, como ficou a relação entre vocês dois?


MARCELINHO – Depois que ele saiu do Corinthians, nós nos encontramos em festas, em vários lugares. Aí o relacionamento foi melhorando. Quer dizer, lógico que ele falou mal de mim quando saiu do Corinthians e eu falei dele e ficou aquela briguinha. Então resolvemos pôr um ponto final, um basta. Peraí, pô! Trabalhamos juntos, vamos ficar agora um falando do outro? Vamos parar com isso. Eu disse: "Porra, Wanderley, você já está cheio de cabelos brancos, eu já estou com 29 anos de idade, e nós vamos ficar de briguinha de menininhos?" Aí saímos, jantamos e ficou até legal. Quando ele voltou para o Corinthians, nosso relacionamento já estava ótimo.


PLAYBOY – Wanderley Luxemburgo é um bom técnico de futebol?


MARCELINHO – Ele nasceu para ser treinador de futebol, para trabalhar com jogador de futebol. Sabe dar o esporro na hora certa, não faz distinção entre os jogadores: ele coloca no time ou não coloca. Ele é realmente um gênio, um cara que sabe demais. Não estou fazendo média, porque eu estava no Corinthians quando o critiquei e vi que ele nunca mudou o esquema, nunca mudou a forma de conduzir o jogo, tanto que ele tirou o Corinthians da pior, do abismo, da merda, e levou o time de novo ao topo.


PLAYBOY – Ao que parece, vocês estão mesmo reconciliados.


MARCELINHO – Wanderley Luxemburgo jogou futebol, sabe como tratar um jogador. Vamos dizer que o jogador de futebol é quase igual à mulher de malandro: às vezes tem que apanhar para aprender...


PLAYBOY – Como você reagiu quando Wanderley Luxemburgo foi acusado de receber propina e foi investigado? Vocês estavam brigados na ocasião.


MARCELINHO – Olha, eu não me vangloriei, não soltei fogos de maneira alguma. Nem vou dar risada da desgraça dos outros. Acho que isso é muito forte e estou aprendendo a não falar mal de ninguém, não vibrar com a derrota de ninguém.


PLAYBOY – O que você acha da CPI que investiga irregularidades na CBF?


MARCELINHO – Não quero falar nada sobre isso. Porque não tem nada a ver comigo. Jogador tem que jogar bola, não tem que falar nada.


PLAYBOY – Você teve um romance com Tiazinha?


MARCELINHO – Não! Eu não ia ter prazer em trair minha esposa, porque ela me satisfaz. E, depois, quando você quer fazer uma coisa dessas, ter um romance secreto, tem que fazer bem-feito. Se não, passa atestado de burrice.


PLAYBOY – Em abril de 1999, desfez-se o lar de Marcelinho Carioca. Por que você se separou?


MARCELINHO – Acho que isso é assunto particular do casal.


PLAYBOY – Quanto tempo de casamento vocês tinham na época da separação?


MARCELINHO – Sete anos. É assunto particular do casal, não vou expor isso e falar alguma coisa, não vou falar nem comentar. O importante é que agora estamos bem, voltamos até mais fortes.


PLAYBOY – É verdade ou não que você teve vários casos de amor no período da separação? A [apresentadora infantil] Eliana...


MARCELINHO – Não, não, a Eliana é muito minha amiga.


PLAYBOY – Parece que com a [modelo paulista] Vanessa Ferrari foi mais sério.


MARCELINHO – Não namorei a Vanessa. Eu tive assim, aquele famoso "fica", fiquei com ela duas vezes, mas não namorei. Teve um flertezinho com a [atriz] Thaís Fersoza, de telefonema, uma vez fomos ver um show juntos, ela estava com a mãe dela, mas não houve beijo nem nada, houve uma paquera gostosa. A [dançarina do É O Tchan] Carla Perez é minha amiga pra caralho, o pessoal confundiu. A única menina que eu namorei foi a Priscila, de Santo André, quando estive separado e ela não é uma pessoa conhecida, foi a única menina que eu namorei, depois de cinco meses separado. Ela fazia faculdade, era estudante, menina de família, sensacional, maravilhosa, tinha uma condição financeira boa, foi muito legal.


"Teve um flertezinho com a Thaís Fersoza [...] não houve beijo nem nada. Só uma paquera gostosa"

PLAYBOY – E por que terminou?


MARCELINHO – Porque reatei com a Ana Cristina, minha mulher.


PLAYBOY – E como foi a volta ao casamento?


MARCELINHO – Foi maravilhoso, mas aí inventaram uma porção de coisas, queriam arrumar namorada para mim. E não tinha nem clima porque eu estava arrasado, com saudades dos meus filhos. Fiquei com medo de começar um outro relacionamento, porque no fundo eu sabia que ia voltar, não por causa dos filhos, mas porque a gente se gosta, se ama, se respeita.


PLAYBOY – Você acredita que manter relações sexuais antes de um jogo atrapalha o atleta?


MARCELINHO – Um dia antes do jogo pode ser, depende do organismo da pessoa. Eu nunca tive o costume de fazer antes de uma partida. Houve ocasiões em que fiz sexo com minha esposa e os resultados dos amistosos foram maravilhosos. Outras vezes, deu uma balançada na perna. Então, depende. Se vou jogar um amistoso no dia seguinte, às dez horas da manhã, e faço sexo até as duas da madrugada, com pouco tempo para se recuperar, sinto um grande desgaste físico.


PLAYBOY – Então o problema não é sexo. O desgaste físico deve vir do fato de você não dormir tempo suficiente.


MARCELINHO – É isso aí. Você matou a charada. O problema está em não dormir. Fazer sexo é maravilhoso! De qualquer maneira, eu não estou acostumado a fazer sexo antes de jogos. Costumo ficar mais concentrado na partida. Às vezes, gosto muito de estar sozinho.


PLAYBOY – Antes do jogo?


MARCELINHO – Antes do jogo e na minha vida normal, eu gosto muito do meu canto, penso muito nas jogadas que pretendo fazer. Às vezes, ouço música, vejo tevê ou não faço nada e fico olhando para o teto, pensando. Principalmente em véspera de clássicos como Corinthians e Palmeiras, penso nas jogadas que posso fazer.


PLAYBOY – É verdade que sua verdadeira paixão são os carros? Quantos você tem?


MARCELINHO – Tenho dois, uma Mercedes-Benz e uma perua Lexus para levar as crianças na escola. Gosto demais, desde menino.


PLAYBOY – De correr?


MARCELINHO – Não, não. Gosto do aerofólio, do visual. Se aparecer uma Mercedes maravilhosa, mas com motor de fusca, eu não me importo: só de ter aquele retrovisor, aquele aerofólio atrás, teto solar, tudo bem. Aquelas rodas me matam.


PLAYBOY – Sair na capa da Placar, a maior revista especializada em esportes do Brasil, como o jogador mais odiado foi forte [edição de abril de 2000]?


MARCELINHO – Acredito que 90% dos votos devem ter vindo de palmeirenses.


PLAYBOY – O resultado da pesquisa o incomodou muito?


MARCELINHO – Me deixou triste pra caramba. Depois, comecei a analisar e pensar que o sucesso incomoda as pessoas.


PLAYBOY – Em futebol o perdão vem só com o gol?


MARCELINHO – No futebol, você não pode errar. Por isso tenho uma coisa na cabeça, seja no treino ou no jogo. Não gosto de perder. Nem cuspe à distância, nem bola de gude, nada.


PLAYBOY – E essa sua língua incontrolável?


MARCELINHO – Eu não falo mais mal de ninguém.


PLAYBOY – Às vezes, você fala sim.


MARCELINHO – A raiva pode ser controlada, entendeu? Sentimentos todo mundo tem, mas você tem que saber colocá-los para fora com inteligência.


PLAYBOY – Qual é a sensação de perder um pênalti?


MARCELINHO – É horrível. Você quer que as coisas boas aconteçam só para você e se esquece de que o goleiro também merece pegar a bola. O sol nasce para todos.


PLAYBOY – E como foi esse recente período negro no Corinthians, com dez derrotas seguidas?


MARCELINHO – Nossa! Nunca tinha passado por isso, perder 10 jogos seguidos. Não podia sair de casa, acho que foram os meses em que fiquei mais em casa, os meses em que fui mais para o sítio. Fiquei entocado.


PLAYBOY – Mas o que exatamente fez a torcida corintiana nesse período?


MARCELINHO – Ah...tudo, tudo o que se possa imaginar. Pense o Corinthians perdendo 10 jogos seguidos. Eu não podia ir a lugares públicos porque virava motivo de chacota. Faziam piada, enfim, tudo que possa imaginar. Aí pensava: "Caramba, será que o que nós fizemos no passado não serve para nada?" Mas o próprio ditado diz: quem vive de passado é museu. E para mim foi uma coisa pesada porque a torcida pegou no pé, achavam que eu estava jogando sozinho. Teve nego que entrou no campo, invadiu, e o pessoal só vinha falar comigo. Tudo era comigo. Foi como a bomba de Hiroshima para mim. Meu pai do céu! Eu tinha terror de jogar no Pacaembu. Medo de entrar em campo...


"Eu não podia ir a lugares públicos porque virava motivo de chacota. Faziam piada... tudo o que se possa imaginar"

PLAYBOY – Deve ser um terror jogar no Corinthians.


MARCELINHO – Mas é maravilhoso. É uma coisa inacreditável. A camisa do Corinthians tem um peso. É um negócio inexplicável, inacreditável.


PLAYBOY – É amor e ódio. Tudo ao mesmo tempo.


MARCELINHO – Tudo junto. O futebol tem uma mudança muito rápida e o gol é o ícone de tudo. O gol é a realização de tudo. É o céu.


PLAYBOY – Agora que você foi finalmente convocado para a Seleção, um sonho tão antigo, o que pretende fazer para jogar a Copa de 2002?


MARCELINHO – Quero que pensem que sou uma pessoa diferente hoje. Falei muitas coisas da boca para fora, coisas impensadas. Espero que se lembrem de que eu era um garoto que virou ídolo muito jovem, mal saído da adolescência. Jogar no Corinthians também nos dá uma euforia às vezes incontrolável, quando se está no coração da torcida ela faz com que você se sinta poderoso, quase um Deus. Você se sente dono do mundo. Então, pelo amor de Deus, me perdoem. Eu era um menino, apenas um menino.


POR REGINA ECHEVERRIA

FOTOS CACALO KFOURI



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